Capítulo 14
Ir por Água Abaixo
Narrado por Mia
— Mia! — ele me chama, ligeiramente mais alto, e eu desperto do meu transe.
— Ahhh, sim, ai desculpa, é que me apanhaste de surpresa, não estava à espera disso.
— Que eu te pedisse em namoro? Acho que era previsível que o fizesse, eu apaixonei-me por ti, Mia.
Eu continuo com cara de xoné, santo Deus.
Como sou uma lady e não quero passar por mais retardada do que eu sou mesmo, dou o meu mais lindo sorriso, afinal de contas ele acabou de dizer que está apaixonado por mim, vou ficar aqui feita muda?? Não, né?
— Damien, eu também estou apaixonada por ti. — Falo por fim.
Parece que estou a ver um filme romântico, que belezura.
— Então aceitas? — pergunta eufórico.
— Claro que sim.
Ele abraça-me e damos o nosso primeiro beijo à porta das urgências do hospital.
Olhem só que lindo, até parece aquelas cenas que dá nos episódios da Anatomia de Grey.
No início, o nosso namoro não podia ser melhor, estávamos apaixonados demais, fazíamos amor tantas vezes que chegava a doer-me a minha bitó, mas era tão bom que nem me importava com isso, queria era dar uso à dita cuja, que andava a algum tempo a ganhar teias de aranha.
Olhem só que desperdício, não queria isto só para fazer xixi, no é verdade, ahahah.
E foi assim os primeiros sete, oito meses, e quando eu pensava que finalmente eu tinha arranjado um homem sem merda na cabeça no lugar dos miolos, Damien fez a primeira cena de ciúmes, tudo porque eu estava a falar com um colega na pausa, ele resolveu aparecer, viu, chamou-me à parte e disse que aquilo era uma falta de respeito para com ele.
Oi??? Estou a ouvir bem??
Óbvio que o coloquei imediatamente no seu devido lugar.
— Que é isso, Damien? Estás louco? Bebeste? Ele é meu colega, e vou falar com ele ou com qualquer outro sempre que me apeteça, agora vai, que eu tenho mais o que fazer. — disse, demonstrando bem o meu desagrado.
Dei-lhe as costas e saí andando p**a da vida. Mas quem ele pensa que é? Meu dono? Quem tem dono é cão, ele acha que eu sou o quê? c****a dele? Eu hein, sai para lá, Belzebu.
Santa paciência das causas improváveis.
Ficou de cara amarrada uns dias e depois fingiu que nada se passou e a vida continuou, mas a partir daí as coisas foram piorando consideravelmente.
Damien que era um homem bom, bondoso, amigo, compreensivo, se tornou intempestivo, ciumento e grudento.
Passamos de um relacionamento saudável a um relacionamento tóxico, assim, quase sem eu me dar conta.
Perto das outras pessoas era um amor, que tudo estava bem para ele, mas depois quando só estávamos os dois as cenas de ciúmes, as cenas por merda nenhuma vinham e assombravam cada vez mais a nossa relação.
Até que, ao fim de um ano e meio de namoro coloquei um basta, eu já o tinha avisado, e já lhe tinha dado muitas oportunidades, ele prometia que mudava, mas a promessa durava no máximo uma semana, depois lá vinha ele com as suas paranóias e situações mirabolantes. Ele era a vítima e eu a causadora de toda a merda cagada que havia naquela relação, ele fazia o que fazia porque se preocupava comigo e me amava para além do infinito.
Mas que c*****o me importava que ele me amasse no infinito??? Eu queria que ele me amasse aqui, não no infinito. Cheguei a perguntar-lhe se ele não andava a fumar aquilo que faz rir, porque só podia, ele estava a viver num mundo paralelo ao meu. Alucinado.
Uma noite, estava eu a sair de um turno de 12 horas quando ele está encostado no meu carro à minha espera, estávamos chateados há três dias, e nesses três dias não lhe atendi o telemóvel nem respondi a nenhuma das suas mensagens.
Ele tinha feito uma cena no cinema, porque meteu na cabeça que o homem do outro lado estava a olhar para mim na fila das pipocas, depois meteu na cabeça que ele devia me levar e buscar no trabalho, para eu não andar sozinha a conduzir, eu claro que disse que não, que ele não tinha que andar feito lapa colado em mim, que eu tinha uma vida para além de namorar com ele, óbvio que ele fez mais uma das suas cenas mirabolantes, que eu queria era andar sozinha, para fazer o que queria, para todos andarem a olhar para mim na rua. Estão a ver o problema?? Pois, para mim chegava daquilo, eu nunca tive paciência para estas cenas bizarras.
Homens com merda no lugar dos miolos?? Não, muito obrigada.
Então ele estava ali, e eu já antevia uma discussão na certa, porque a minha decisão já estava tomada, ainda não lhe tinha era sido comunicado.
— Mia, porque não atendes nem respondes às minhas mensagens? Afinal o que se passa? — ele pergunta admirado.
Eu não digo que ele vive em outro mundo?
Mas ele acha que tudo é normal e que tudo fica bem, porque eu sempre perdoo, mas agora não mais, estou cansada, saturada, farta das merdas dele.
— Damien, eu não quero mais.
Ele olha para mim confuso.
— Não queres mais o quê, amor?
Respiro fundo.
— A nossa relação já não está a resultar.
Ele estreita o seu olhar para mim.
— Não percebo, o que estás para aí a dizer? — ele exclama.
— Ai, Damien, o que tu acabaste de ouvir, não falei chinês! Eu estou a acabar a nossa relação, ponto final, não quero mais, para mim chega desta relação doente. — Digo já irritada.
Ele está surpreso.
— Mas Mia tu não podes acabar a nossa relação!
— Posso e já acabei. — Falo decidida.
— Não, não podes. — Ele fala ríspido.
— E porquê? — pergunto espantada.
— Ora porquê! Porque eu amo-te.
— Pois, Damien, mas eu já não te amo mais, as merdas foram tantas, que o amor acabou. Eu não aguento mais as tuas cenas. — Falo cortante.
Claro que ele prometeu que ia mudar, que não ia voltar a fazer nada daquilo, que me amava, que blá, blá, blá. O normal que os homens cheios de bosta dizem.
A única coisa que ele não fez numa relação que já era abusiva, foi bater-me, isso ele nunca fez, mas depois acabou por perder até esse bocado do seu lado bom, quando me agarrou com aquela força excessiva no café.