AS ÓRFÃS E O DONO DO MORRO – A INFILTRAÇÃO

1495 Words
Dizem que o morro da Babilônia anda m*l chefiado, que nele está de menos a justiça, e não reparam que ele está como deve estar, com sua venda nos olhos, sua balança e sua espada. E o que mais queriam a justiça para pacificar o morro, se era isso o que faltava? Um homem de pele morena, cabelos grisalhos, vestindo terno e de porte atlético elevado, óculos ray-ban espelhado caminha de um estacionamento até a porta de entrada do 12º DP do Rio de Janeiro. Esse homem demonstrava autoridade em sua imagem, pois todos os policiais que passavam por ele o cumprimentavam, quase batendo continência. Mas só não o faziam porque se tratava de um delegado civil, mas não um delegado qualquer: era o Rocha, Carlos Rocha. Mais conhecido como “testa de ferro”, ele era considerado o capitão do mato das operações de invasão e pacificação dos morros e favelas cariocas. Tanto que era o único delegado de polícia respeitado pelo BOPE, por quase 100% de suas ações terem sucesso. Ele entra no DP, cumprimenta todos os presentes, os meliantes presos baixam a cabeça evitando olhar para ele e o mesmo vai até a sala de reuniões, onde a sargento Alice o espera. - Bom dia sargento Alice... – cumprimenta o delegado estendendo a mão para ela, mas sem esbanjar qualquer tipo de carisma – Como anda o plano de pacificação da favela do morro da Babilônia? - Bom dia delegado. – Cumprimenta Alice com a mesma seriedade – Estamos aguardando a infiltração das órfãs. Assim que elas se infiltrarem no setor financeiro da favela e colocar nossos homens infiltrados lá dentro, vamos invadir de fora pra dentro e dentro pra fora. O delegado presta atenção no que a sargento Alice fala, mas fica sem entender uma coisa: - Como assim as órfãs? Vocês andam dando nomes de filmes para as pessoas? - Não, senhor. Estou falando da Vera e da Paola, nossas melhores investigadoras. Elas têm vinte e oito anos cada uma, mas tem cara, corpo e tamanho de uma adolescente. Então nós as apelidamos de órfãs, por causa do filme. Elas conseguem não só se passar por uma adolescente, como também conseguem chamar a atenção de qualquer chefe de tráfico por causa da aparência de patricinhas. Elas conseguiram 100% de sucesso em todas as investidas policiais aqui no Rio, além de estourarem muitos setores financeiros trazendo prejuízo para muitos traficantes. - Interessante essas abordagens... – Fala o delegado Rocha – Arriscadas, mas interessantes. - E o bom disso é que os traficantes não conseguem decorar o rosto de nenhuma das duas, de tão encantados que ficam com elas. O delegado Rocha pega uma pasta e entrega nas mãos da sargento Alice: - Esses são todos os dados que minha equipe levantou sobre o tráfico no morro da Babilônia. E além de rotas de acesso e fuga, estão nessa pasta a ficha criminal da grande Berta, do Beto e do Jonas, os três cabeças do tráfico dentro da favela da Babilônia. Não parece, por ser um lugar que atrai muitos turistas, mas o tráfico ali é muito forte e o crime organizado, muito maios poderoso e influente do que parece. A sargento Alice recebe a pasta, como quem está recebendo um tesouro nas mãos, pois ao folhear cada página, ela vê que os meses de investigação dentro do morro viraram dias, pois era só levar o material para sua tropa, para poderem organizar melhor o plano de tomada e pacificação da favela. Ela se dirige à porta de saída da 12ª DP, mas antes de sair, o delegado Rocha a intervém: - Cuide bem dessa pasta sargento Alice, porque é por causa dela que você vai caçar e castigar os bandidos e os vilões que corrompem homens, mulheres e crianças, para que não se perca o valor do exemplo. Mas honre acima de tudo, a gente de bem e de bens, para que eles renunciem à vingança e não condenem a ação da polícia com ódio. Faça isso para que vença tarde quem por justiça justa deveria vencer cedo. Por isso está em suas mãos a paz que os moradores da favela do morro da Babilônia tanto almejam. - Certo delegado! A sargento Alice sai de dentro da delegacia e entra em sua viatura, rumo ao quartel da polícia que fica no Leme. E enquanto o motorista da viatura dirige, ela folheia a ficha criminal da grande Berta, do Beto e do Jonas e lê uma incontável quantidade de crimes de diversas naturezas. Mas em uma coisa ela se atenta: os três são torturadores, e**********s e viciados em sexo, quando se tratam de impor respeito ou se vingar de seus desafetos. Eles estão sempre rodeados de homens e mulheres e quando querem sexo, ninguém pode recuar, muito menos recusar. Alice para por um momento sua leitura, quando seu celular toca. Era um número desconhecido, mas esse era o código usado pelos policiais e investigadores para se comunicarem sem serem grampeados. Ela atende e é uma mensagem na caixa postal: - Mamãe é a Dara. Eu e a Pâmela estamos trabalhando na favela da Babilônia. Pelo quanto estamos ganhando aqui, não vamos mais precisar estudar. Por isso cancele a matrícula da gente na escola. Também não posso falar muito, pois além de ter muito trabalho por aqui, o tempo que temos sem sermos vigiadas durante o dia é de apenas dez minutos, quando vamos ao banheiro. Sei que a senhora vai ficar feliz por ter se livrado de mim, mas estou em uma condição melhor. Não sei quando volto para casa, mas se caso queria vir me visitar algum dia, avise com antecedência, para que eu possa liberar a entrada. Aquela mulher que sempre foi motivo para bons exemplos, pois a melhor palavra dela era sempre o melhor jeito de ser; aquela mulher que batalha, pede desculpas quando ofende alguém e perdoa de coração quando se sente ofendida, pois aprendeu que o perdão é o maior gesto de amor que se pode demonstrar, sente naquela ligação que ela e seus homens estão ganhando mais espaço para conseguir o que almejam com aquela operação. A vida de policial ensina para Alice que viver no Rio de Janeiro dá trabalho. Ser feliz sem aquele fardo também e a cabeça da mesma fica cheia de palpites que podem ou não dar certo, muito certo, pois a pasta em mãos é apenas o começo. Isto porque a maturidade que ela adquiriu durante os poucos anos como sargento da polícia militar do Rio, a ensinou que o medo de morrer em ação é tão benéfico quanto a possibilidade de ter sucesso nesse plano de pacificação armada da favela do morro da Babilônia. Alice sabe que precisa dar um passo de cada vez, pois sabe que todos os seus que pisarem naquela favela serão bombardeados como se fossem tão perigosos quanto os traficantes que mandam naquele lugar. Mas a paz só pode acontecer quando a mente estiver em paz. Se a mente está em paz, a faca é apenas uma faca. É a intenção do usuário que determina se algo é destrutivo ou não, não a coisa em si. Então o que Alice e seus homens precisam é de paz de espírito. O que todos os envolvidos nessa operação precisam é de paz de espírito, para poderem tomar as melhores decisões o mais rápido possível, a fim de discernirem quem são os bandidos e quem são as verdadeiras vítimas. Essa pacificação é algo que tinha que acontecer, uma hora ou outra. Alice sabe que entrar num morro carioca, pronto pra matar ou morrer é uma desculpa às vezes esfarrapada para justificar quem manda e desmanda nesse estado, pois muitas pessoas escolhem viver de um jeito torto, livre e espontâneo e isso é problema de cada um. Mas corromper, traficar, estuprar, matar e impor um poder paralelo, isso é problema do estado e a solução é a mais óbvia: ou se entrega, ou morre. O caminho para o paraíso está dentro de nós, não fora. Uma licença médica por motivos de saúde, no Brasil não te faz ser falsificador de atestado, mesmo com o tanto de brasileiros que falsificam atestados para ficarem em casa ganhando dinheiro de seus patrões. Embora nossos pensamentos possam estar preocupados com que fomos ou o que seremos, a nossa respiração está sempre no presente. Alice ficou com medo quando descobriu que estava à frente de mais uma ação policial pela enésima vez. Ela sabe que cair e levantar faz parte do processo enquanto a decisão definitiva dela ir trabalhar fora do Leme não chega. Ela nunca foi de executar um bandido é julgada por seus superiores, que afirmam o tempo inteiro que ela está dando confiança para vagabundo, mas não dessa vez. Dessa vez Alice está decidida a matar ou morrer. E o medo vai embora quando ela desliga o celular e sorri, ao saber que tudo está indo de acordo com o planejado.
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