Martha m*l havia chegado em casa quando se deparou com a neta de joelhos contra o chão, aos berros como se acabado de ver o pior de seus pesadelos bem a frente em carne e osso. Preocupada, a mulher largou as malas e bolsas de lado se aproximando imediatamente da neta, a acolhendo e envolvendo com os braços a medida em que lhe acariciava a pele fria e arrepiada na tentativa de acalma-la um pouco. O simples gesto de carinho e afeto pareceu funcionar de alguma coisa, já que agora luce se encontrava apenas chorosa e soluçando.
── Oh! Querida... o que houve, hm? Está tudo bem, vovó está aqui com você agora. Outro de seus pesadelos? ── Questionava a doce mulher de aparência bem conservada, em parte retoricamente, enquanto ainda permanecia envolvendo a garota em um abraço gentil e caloroso. Não obteve resposta alguma senão um simples aceno de cabeça, o que já era o bastante para compreender a neta que desde muito nova era atormentada com pesadelos horríveis. Isso quando ela ainda os contava para Martha. ── Venha querida, precisa de um banho quente e relaxante. Irei preparar um cházinho' pra que se acalme.
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Quando finalmente Luce se acalmou um pouco, a mulher a deixou deitada sobre a cama enquanto seguia até o andar de baixo para guardar as coisas. Como já era costumeiro da parte da garota já há algum tempo, nada disse a respeito da crise que teve e o porquê de ter chegado até aquele ponto.
Luce tinha pra si mesma que era apenas coisas de sua mente, não havia outra explicação. Era isso, estava ficando louca igual a mãe e agora se questionava se teria o mesmo trágico fim que ela ou se seria internada em alguma espécie de hospício. Não tinha coragem de dizer a avó sobre a brincadeira da noite passada, não depois de tantos avisos e sermões que obteve da mais velha a respeito disso. Muito menos coragem ainda em questionar se algo incomum havia acontecido noite passada onde ela estava, pois ninguém comentava sobre o ocorrido e todos estavam agindo normalmente. Caso perguntasse somente levantaria suspeitas maiores. Teria passado o dia ali, trancafiada e deitada no quarto, rejeitando alimento e bebida enquanto refletia bem sobre o que havia acontecido.
Seus mirantes agora se mantinham fixos na janela aberta que dava vista ao vasto céu que se encontrava numa mistura de cores do laranja ao lilás e carmesim a medida em que o Sol começava a se ocultar no horizonte.
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Khaos ainda se encontrava ao lado de fora da casa, encostado na parede com ambos os braços cruzados a frente do peitoral. Seus olhos se mantinham fechados enquanto que suas memórias lhe arrastavam à mente a primeira visão que teve assim que despertou. Sendo ela a de si mesmo se perdendo gradativamente para sua pior forma, sendo tomado pelas veias negras que pulsavam' pelo corpo, famintas.
Embora ainda estivesse preso naquele maldito receptáculo, podia sentir o poder lhe queimando as veias, sedento como uma fera indomada ao que rugia pra que tão logo fosse liberto. No momento seguinte suas íris iam de encontro para aqueles cujos rostos eram familiares.
── Então resolveu finalmente despertar, Khaos. ── um dos quatro demônios resolveu sibilar as palavras provocativas. O de cabelos negros nada disse, apenas tombou levemente a cabeça para o lado com uma expressão neutra, e tão logo ajeitou a postura fazendo uma reverência formal.
── Não graças a vocês, eu suponho. Mas é um prazer imenso revê-los, meus senhores. Ainda mais quando me encontro tão... ── o ser logo ergueu majestosamente a cabeça ── faminto. ── com um sorriso macabro nos lábios, o qual fizera com que aqueles ali presentes sentissem o frio percorrer-lhes a espinha. Uma obscuridade se apossou de todo o espaço. Khaos se tornando parte dela, os envolvendo e sentindo o pavor transpirar daquelas doces veias. ── Faz quanto tempo? Séculos? Milênios? ── Ele questionava enquanto passeava entre eles inalando aquelas doces sensações, todos ali despreparados se deixando guiar e pelas brechas que eles mesmos abriam, como portais abertos pra que ele pudesse entrar e fazer qualquer estrago.
── O que acha que vai ganhar com tudo isso, Khaos? ── O anjo maior questionou ainda que hesitante dando alguns passos para trás.
── Nada. Mas farei questão de subjugar a todos. Torturar, matar e me alimentar de cada vestígio vivente que possa existir só para...
── Se vingar? ── um dos demônios questionou e por detrás dele Khaos se materializou o envolvendo pelo pescoço com a bela mão pálida enquanto sussurrava aos pés de seus ouvidos:
── Claro. Por que não, Azazel? Vocês não pensaram duas vezes antes de fazer o mesmo comigo. Só não acharam um meio de me matar, ainda. ── soltou um riso escarnecido ao que suas garras agora se cravavam sobre a pele de sua primeira vítima deixando com que seus gritos ressoassem como música aos ouvidos enquanto os demais logo se colocavam em modo de ataque travando uma batalha a qual já sabiam quem venceria mas que não podiam deixá-lo sair esse eram seus deveres e tentariam cumpri-lo a qualquer custo.
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Os olhos negros agora se despertavam não muito distante de onde estava a humana a qual estava acorrentado de alguma forma. Já era tarde da noite faltando apenas algumas horas para o alvorecer. Khaos não havia conseguido pregar os olhos, não que fosse algo realmente necessário já que se manteve adormecido por tempo de mais. Mas se sentia fraco e os gritos da garota durante toda a noite não o permitiam fechar os olhos para descanso.
"Maldição" pensava com os braço cruzados enquanto seus mirantes se mantinham fixos ao outro lado da rua. Onde um casal se despedia com um simples selar de lábios. O homem teria seguido para o seu veículo enquanto que a mulher tratada de um roupão felpudo e pantufas, retornava para dentro de casa.
Nunca chegou a compreender bem os humanos e sua maneira estranha de se relacionarem. Mas invejava o fato de terem poucas preocupações na vida, m*l sabendo o que acontecia no obscuro e secreto além do que realmente podiam ver. Não que de fato ele se preocupasse com eles, pelo contrário, Khaos guardava um imenso rancor de todos aqueles que um dia o traíram e viraram as costas quando mais precisou.
Um novo grito da parte de Luce fez com que o ser retornasse a si e apertasse os próprios braços, cerrando os dentes e se contendo para não surgir naquele maldito quarto e estapear a garota pra que a mesma permanecesse em silêncio.
Ao invés disso surgiu nas sombras a observando de longe, podendo ver o corpo suado com a feição de dor cujas sobrancelhas se franziam ao que as mãos se mantinham agarradas no lençol e os dedos dos pés dobrados. Vez e outra notando-a arquear as costas, fazendo com que a camisola de seda demarcasse ainda mais as curvas da garota.
Khaos se aproximou a passos leves, observando, e quanto mais perto chegava, mais conseguia sentir daquela dor e ver o que tanto atormentava aquela garota, algo que lhe doía a mente e corpo. Ao ponto de se ver forçado a usar de seus dons, entoando palavras antigas e assim fazendo com que a garota caísse em sono profundo.
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