No dia seguinte, a mãe de Ronaldo, tomou uma resolução. Iria na casa de Rosângela e conversaria com ela. Ronaldo tinha errado muito com a família, mas estava enfeitiçado e não sabia o que estava fazendo.
Não falou nada ao filho e só avisou:
- Vou dar uma saída. Se eu demorar, tem comida pronta na geladeira e você pode esquentar e comer.
- Quer que eu vá com a senhora?
- Não. Vou visitar uma amiga e pode ser maçante pra você.
Saiu de casa e tomou um táxi. Há muito tempo não ia naquela casa. Nem os netos conhecia. Somente tinha visto Rogério na maternidade logo que nasceu. Não era muito apegada a família. Até Ronaldo, tinha deixado de ver por muitos anos.
Por todos acharem que levava uma vida fora dos padrões considerados normais, tinha se afastado de todo mundo, vivendo solitária, depois da morte do marido.
No portão da casa de Rosângela, tocou a campainha.
Rosângela nem reconheceu a sogra.
Chegou perto do portão e perguntou:
- Quer falar com alguém daqui?
- Com você, Rosângela. Não está me reconhecendo? Sou a mãe do Ronaldo e tua sogra, Helena.
- Dona Helena! Desculpa, mas há muito tempo que eu não lhe via.
- Eu sei. Talvez se fosse ao contrário, eu também não te reconhecesse. Posso entrar para conversar com você?
- Estou dando aula agora. A senhora pode esperar a aula acabar?
- Claro. Posso ver meus netos?
- Conhecer, seria o termo mais correto. A senhora não conhece eles. Mas, entra.
Rosângela abriu o portão e Helena entrou.
Rosângela pediu desculpas aos alunos e foi levar a sogra só quarto das crianças. Apresentou:
- Essa é a avó de vocês, mãe do seu pai. Ela vai ficar aqui com vocês até eu terminar de dar a aula.
Rogério convidou:
- Senta aqui na minha cama. Nós estávamos brincando.
- Vou brincar também, então.
Rosângela voltou para a sala e deu o restante da aula, deixando passar um pouco de tempo para compensar a interrupção. Quando os alunos foram embora, voltou ao quarto das crianças e avisou:
- Posso lhe atender agora. Quer vir até a cozinha comigo? Tenho que preparar o almoço das crianças.
Helena deu um beijo em cada neto, colocou Regina de volta ao berço e seguiu Rosângela.
- A senhora está aqui para dizer que vai me tirar as crianças?
- De onde você tirou essa idéia?
- O Ronaldo falou que ia pedir a guarda e entregar pra senhora cuidar deles, pra não ter que pagar pensão.
- Isso nem me passou pela cabeça. Nunca fui apegada a crianças, tanto que só tenho um filho. As crianças estão muito bem com você.
- Mas, ele não disse que eles estavam maus comigo. Disse que ia pedir a guarda e dar para a senhora criar pra acabar com a história da pensão. Que a mulher que vive com ele, gosta de luxo e ele não estava podendo dar o luxo que ela queria, só com a metade do salário.
- Só para esclarecer, a mulher que vive com ele, sou eu. O Ronaldo está morando comigo. Ele separou da outra e foi lá pra casa.
- Ele separou?
- Separou. E eu estou desconfiada que ela andou fazendo feitiços pra ele.
- Isso, andou mesmo. Eu tenho uma vizinha, que frequenta um centro desses de linha branca. Ela levou o nome dele e perguntou. Aí disseram que ele tinha trabalho de amarração e que a gente orasse muito para desfazer.
- Então foi isso? Se você sabe que ele saiu de casa enfeitiçado, não era capaz de deixar ele voltar?
- Não. De qualquer maneira, ele me traiu. E andava maltratando muito as crianças ultimamente. Eles não podiam nem falar, que ele se irritava.
- Mas isso foi por causa do feitiço. Ele deu uma escorregada quando você estava de resguardo da Regina e essa mulher apareceu se oferecendo, daí que começou essa história.
- Eu imaginava isso mesmo. Mas perdoar a escorregada é muito difícil.
- Rosângela, você sabe que o homem dá muito mais importância ao s**o do que nós. Você estava de resguardo, aí aparece uma mulher bonita se oferecendo, qual o homem que deixaria passar?
- Aquele que respeita a família.
- Ele não pensou em te desrespeitar, apenas em ter uns momentos de prazer, que você não estava podendo dar. Se não tivesse tido o trabalho, já teria acabado e você nem ficaria sabendo.
- Mas acontece que eu soube, aliás por ele mesmo. Eu estava na cozinha preparando o café da manhã enquanto ele fazia as malas no quarto, escondido. Depois de tudo pronto, veio me avisar que estava indo morar com a mulher que ele amava e eu que ficasse com meus filhos e se eu pedisse pensão pediria demissão, como fez. Na certa, ela que largou ele por estar desempregado.
- Não foi, não. Ele antes passou lá em casa, e perguntou se podia ficar comigo por uns tempos, até arranjar um emprego e poder alugar um cantinho pra ele. Me contou todas as coisas horríveis que fez a você e as crianças, achando que estava ficando louco. Eu disse que ele podia ficar e ele foi ao apartamento e retirou as coisas dele. Ele mora comigo agora. Está muito arrependido do que fez a vocês.
- Desde que ele foi embora, não veio ver os filhos. O Rogério me perguntou porque ele não gostava mais da gente.
- Isso é terrível na cabeça de uma criança. Se ele quiser ver as crianças, você vai concordar?
- Claro! Ele tem todo o direito de ver os filhos.
- E pensar numa volta?
- Por enquanto, a minha resposta é não. Mas ele pode ver os filhos sim. Foi ele que mandou a senhora aqui?
- Não. Ele nem sabe que eu vim. Disse que ia visitar uma amiga.
- Por enquanto, estou muito magoada ainda. Não sei se no futuro, eu mudaria de idéia, porque além da traição, houveram outras coisas. Vamos deixar passar o tempo e ver o quê que acontece.
- Concordo com você. Estão precisando de alguma coisa?
- Não. Ele depositou o dinheiro da pensão esse mês. Aliás como? Ele ainda está desempregado.
- Isso eu não sei te informar. Deve ter pego dinheiro emprestado com alguém para pagar.
- Dona Helena, eu estou ganhando bem com as minhas aulas, mas o Ronaldo tem que cumprir a parte dele. Eu não vou abrir mão dos direitos das crianças.
- Você está certa. Os filhos são dele também. Enquanto ele não estiver trabalhando, eu vou pagar a pensão no lugar dele.
- Aí, eu não acho justo. Enquanto ele não estiver trabalhando, eu abro mão do dinheiro, mas assim que estiver empregado de novo, eu quero o que é de direito dos meus filhos.
- Eu agradeço a tua compreensão. Quando eu chegar em casa, vou falar a verdade. Que estive aqui e conversamos. Que você não quer ele de volta, mas concorda que ele visite os filhos.
- Pode dizer, é um direito que ele tem.
- Agora, eu vou me despedir das crianças e voltar pra casa pra conversar com ele. Ele está ciente que errou muito contigo e está arrependido.
Depois de se despedir dos netos, Helena voltou para casa.