Capítulo VII - ÍCARUS

1094 Words
Os eventos do dia foram, por si sós, carregados de emoção. Katryn me contou sobre o divórcio logo pela manhã, e a alegria que senti com a notícia fez com que me sentisse o ser mais desprezível que existe, ainda que intimamente também estivesse triste por ela estar sofrendo tanto com isso. Os outros acontecimentos turbulentos do dia nos levaram ao que chamo de momento impulsivo, em que ela acabou me abraçando, e despertando todos os antigos sentimentos e desejos que eu tenho mantido tão firmemente apagados depois que nos reaproximamos. Não sei o que Katryn sentiu nesse abraço, mas no momento em que seus braços se enlaçaram ao redor do meu pescoço, meu corpo inteiro ganhou vida, esquentando nos lugares em que nos tocávamos. Minhas mãos formigaram, meus braços não queriam mais a soltar, seu cheiro de calda de morango me deixou zonzo, tudo em que pude pensar foi o quanto a queria. Esse abraço me faz relembrar quando eu descobri que a amava, e os acontecimentos subsequentes. Eu nunca tinha me dado conta, nos onze anos em que partilhávamos as férias na Itália, de que eu a amava. Não havia percebido que a rivalidade que eu nutria por ela não era fruto de ciúme do comportamento paternal de meu pai em relação a ela, mas sim um disfarce para os meus verdadeiros sentimentos por Katryn. Só quando fiz 16 anos, e as férias compartilhadas deixaram de acontecer, foi que percebi o quanto amava seu sorriso, sua inteligência, sua vivacidade, os olhos cor de chocolate, os cabelos cacheados, as bochechas que coravam facilmente, seu jeito carinhoso, seu cuidado, seu acolhimento. Nossos encontros se tornaram cada vez mais breves, sempre vigiados de perto, por seu pai, ou pelo meu. Os abraços eram restritos, não havia assuntos particulares, não nos sentávamos próximos, não dividíamos mais espaços pequenos. Nossos pais chegaram ao consenso de que a nossa passagem para a adolescência decretava o fim da proximidade que tínhamos na infância. Para eles, qualquer amizade entre nós, era agora, um risco para a virgindade de Katryn, pois os hormônios da puberdade, responsáveis pelo desejo s****l, eram presentes em nós dois. A saudade que passei a sentir, foi um grande indicativo do que eu realmente sentia. Eu almejava tanto vê-la, que sequer me incomodava com o quanto os encontros eram breves, ou com a supervisão dos nossos pais, e nem com a restrição dos toques físicos. Tudo que me importava era tê-la por perto, nem que fosse por breves minutos. Aos 17 anos eu tinha me tornado um bonito jovem, com os músculos começando a ficar aparentes, e características físicas bastante atraentes. Os convites para a cama das mais variadas mulheres, e às vezes até homens, eram incessantes. No entanto, o único corpo que me despertava interesse, a única cama para a qual eu tinha a pretensão de ser convidado um dia, era a de Katryn. Não esperava que fosse logo, pois ela era ainda muito nova. Mas secretamente, desejava, que quando ela tivesse idade, me escolhesse para ser o seu primeiro, assim como eu queria, ardentemente, que ela fosse a minha primeira. Katryn seria a herdeira do pai, líder de um vasto e bem-sucedido império, além de ser, na minha opinião, a mais linda, e inteligente das mulheres. Não existia um único motivo que justificasse ela se apaixonar por mim. Eu era só o filho mais novo do padrinho dela, o garoto sem habilidades aparentes, que era precedido na sucessão dos negócios do pai, não por um, mas por dois irmãos mais velhos. Não alimentava muitas esperanças de que ela corresponderia aos meus sentimentos, mas torcia, esperava, ansiava que algum acontecimento milagroso nos unisse. Aos 19 anos, minhas esperanças foram frustradas, quando ela se apaixonou a primeira vista por Dominicke. Eles engataram em um namoro logo após a festa de aniversário de 16 anos dela, e no aniversário de 17 anos de Katryn, anunciaram o noivado. Fugi após o anúncio, completamente cego pela raiva. Fui parar no bordel de luxo que pertencia à família Kinckaid, onde eu tinha passe livre, garantido por tio Christian. Então, pela primeira vez na vida, eu me embriaguei, e também pela primeira vez, fiz sexo, com uma das prostitutas do estabelecimento. Escolhi a que mais se assemelhava a Katryn, com olhos castanhos, cabelos cacheados e longos, num castanho mel. Mas a garota era alta demais, seus olhos tinham cor de lama, o cabelo era muito claro, a pele era muito pálida, ela não corava e não cheirava a calda de morango como Katryn. Era muito linda, mas não era Katryn, jamais seria Katryn. A primeira vez, com a descarga de raiva e desejo, me proporcionou alívio e prazer. Mas em cada uma das vezes seguintes, só o que eu sentia era culpa, por não estar com a mulher que eu amava. Passei uma semana hospedado no bordel, bebendo e transado com a garota cujo nome nem me lembro, até que o gerente ligasse para Christian Kinckaid e ele ligasse para o meu pai, que foi até lá, e me arrastou de volta para casa sob uma chuva de críticas e sermões. Depois da garota do bordel, veio uma enxurrada de álcool, mulheres e boates, para esquecer os meus sentimentos. Mas os primeiros vislumbres de sobriedade traziam Katryn consigo, e não importava quem estivesse comigo na cama, não tinha o poder de tirá-la dos meus pensamentos. Volto ao presente quando estou acabando de me vestir para o jantar com Stevens, no qual minha presença foi requerida, para dar continuidade a nossa estratégia. Nem o planejamento de como encurralar Stevens conseguiu amenizar o intenso desejo que o abraço de Katryn despertou em mim. Meu cérebro não para de imaginar como seria se eu a tivesse beijado naquele momento. Ela teria correspondido ao beijo? Me permitiria tirar sua roupa? Deixaria que eu beijasse cada parte do seu corpo? Faria amor comigo? Ou repeliria meu toque? Me sinto culpado por pensar nisso quando Katryn precisa da minha ajuda para arrancar de Stevens o que Logan realmente quer. E me sinto um tremendo canalha por pensar em sexo com uma mulher tão fragilizada quanto ela. No entanto, não consigo evitar. Depois daquele abraço, nenhuma das frases que eu repetia constantemente para mim mesmo funcionou mais. Não adianta lembrar que ela ainda é casada, não muda nada lembrar que ela tem uma filha de outro homem, e que ela é mãe da minha afilhada. Nenhum dos fatos, que antes adormeceram o que eu sentia por Katryn, servem mais para apagar o desejo ardente que ela acendeu em mim.

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