Entro na floresta, e como havia imaginado noto um pequeno calor nos meus o olhos, indicando que os mesmos estavam mudando de cor, avisando que eu iria me transformar.
Começo a sentir um pinguinho de chuva cair em meu focinho. Após a transformação completa, corro pela floresta sentindo o vento misturado com as gotas de chuva, baterem em meu pelo, e escuto os galhos se partindo quando eu os pisoteio, o canto dos pássaros em seus ninhos... Ser lobisomem não é só se transformar em um lobo enorme, é desfrutar de uma ligação única com a natureza, é poder sentir a vida mais intensamente ao seu redor.
Paro de frente para uma cachoeira, observo a os peixinhos coloridos se esconderem nas pedras, e o meu reflexo na água transparente, minha forma lupina.
Ouço um pequeno grunido vindo na minha barriga, logo começo a procurar alguma coisa para comer. Vejo dois coelhos indefesos e despreocupados, ando lentamente e cautelosamente até os mesmos, e quando vou atacar, um lobo com duas vezes o meu tamanho, pula os atacando primeiro.
Travo vendo o grande lobo preto se alimentar, sem ao menos notar a minha presença.
Saio de fininho, não queria atrapalhar o "senhor lobo" com duas vezes o meu tamanho, e caninos mortais.
Estava me afastando do animal, porém o lobo pula na minha frente e começa a mostrar seus grandes caninos para mim.
- esse território não é seu! - diz com uma voz de b***a.
- eu só vim caçar, não queria te atrapalhar alfa... - digo num fio de voz.
Ele chega perto de mim e me cheira, então para diante de mim e começa a me analisar com um semblante curioso, então arregala os olhos e sai floresta a dentro. Bizarro!.
(...)
Depois de conseguir caçar outros dois coelhos, vou para a minha casa. Lúcia tinha me dado cobertura e por pouco não escuto sermão de dona Lil.
Vou para os fundos da casa, ao lado da garagem, há uma pequena cabaninha, onde eu guardo algumas caixas e algumas armas.
Antes de entrar, vejo uma grande marca de garras na porta, coberta por algumas camadas de tinta branca, mas ainda sim, perceptível.
- o que aconteceu aqui?- pergunto para mim mesma, contornando o grande e profundo arranhão com os dedos.
Paro meu raciocínio quando escuto meu celular tocar.
_________________ Ligação _________________
- minha filha, quase que você é despedida! - diz Lúcia quase tendo um treco - você é a única vida alma nesse bar empoeirado que conversa comigo! tem noção do que seria minha vida sem você?!.
- obrigada pela ajuda, Lu - digo rindo - ah... e obrigada por colocar o meu ego lá em cima!
- não foi nada. Mas escuta, o gostosão perguntou se eu tinha o seu número, mulher!- ela diz entusiasmada - fala sério, você conseguiu atiçar o homem mais gato dessa cidadezinha apenas dando um pé na b***a dele! - ela gargalha.
- ah... Lu fala sério! Eu quero é distância daquele brutamontes filhote de cruz credo - digo lembrando - falo com franqueza quando digo que não me interesso por homens como ele.
- aham, sei! Enfim, vou desligar, tenho coisas a fazer - ela diz com ar de tédio - hoje é dia de limpar o estoque de bebidas.
- haha, ok beijos - digo sorrindo do outro lado da linha.
- beijos - ela se despede e logo após desliga.
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Lúcia tinha sim, um jeito único de ser, e com isso eu quero dizer completamente extrovertida e emocionada, talvez fosse este o motivo de sermos amigas. Ela era seletiva com amizades assim como eu fui a minha vida toda, mas convenhamos que nessa cidade não há muito o que te anime a socializar, quer dizer... a maioria dessas meninas são como a Tânia.
Coloco o meu celular no bolso e entro na cabana, pego algumas ferramentas para jardinagem e saio.
As deixo na varanda, e entro pela porta da cozinha para preparar algo com mais substância para comer. Praticamente devoro o sanduíche de peito de peru e queijo, e logo volto para a varanda e começo a trabalhar no meu quintal, que em breve, se tornaria um belo jardim.
Sempre observei os jardins nas casas da minha antiga rua, tão perfeitos e floridos, sem falar do perfume das flores. A vida dessas pessoas pareciam ser tão perfeitas quantos seus jardins, já a minha, antigamente poderia ser facilmente comparada a flores murchas de um cemitério.
(...)
Quando anoiteceu, voltei para casa e tomei outro banho para tirar toda a terra e lama de mim.
Me preparei para dormir, e fui para a cama. Eu estava exausta.
__________________ Sonho __________________
- olha só o que você fez garota! - diz tia Rose furiosa por eu ter quebrado um de seus vasos.
- desculpe, tia! - digo chorando pela mesma ter me pegado pelos cabelos.
- aí de mim por ter que aturar um fardo que nem você! Sua praga! Nem seus pais te quiseram, não sei por que pensavam que comigo seria diferente! - ela grita me jogando no chão.
- por favor, não fala isso! - digo chorando.
- sua v********a! Imprestável! - ela aponta o dedo no meu rosto - você só sabe quebrar as coisas!
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- não!- grito sentando na cama. Quando recupero a noção, percebo que tudo foi apenas um pesadelo, mais um deles.
Passo a mão pelo meu rosto, e noto que o mesmo está ensopado pelas lágrimas, e meus cabelos estavam bagunçados.
Vou até o banheiro, lavo meu rosto, arrumo meus cabelos e vou até a varanda.
O vento frio da noite em contato com a minha pele, me causava arrepios. Queria que por um momento, eu pudesse enviar os meus pesadelos junto com as correntes de vento, e eles irem para o mais longe de mim, em vez de continuarem a permanecer nas profundezas da minha mente.
Começo a observar a floresta, em suas cores noturnas, ainda parecia cheia de vida.Até que vejo uma figura preta enorme sair de trás das folhas...
Era ele, o lobo.
- ah não... de novo não...- digo me afastando da sacada, sentindo meu coração aumentar as batidas.
A figura apenas dá meia volta, e retorna para a floresta, fazendo o mistério pairar no ar. Aos poucos, recupero-me e decido me afastar também. Tranco a porta da sacada, e volto para a minha cama, adormecendo novamente.