Mistério do Amanhecer

Rebecca acordou em um sobressalto, acabara de ter um pesadelo. Vira fogo, gritos, emoções confusas, o medo que ela sentira, sendo levada para dentro do mar, mulheres com caudas pareciam cercá-la e, repentinamente, uma luz verde brilhou na sua frente, fazendo-a acordar assustada. - Rebecca, pelo amor de Deus, ser trancafiada junto de sereias? Foi só um sonho! Olhando pela janela fechada não se via nenhuma luz. "Ainda deve ser noite, melhor é voltar a dormir" pensou consigo mesma. Deitou no travesseiro e se cobriu, mantinha os olhos fechados tentando pegar no sono, mas o pesadelo lhe vinha à mente a todo instante. "Rebecca, vê se esquece isso! Foi só um sonho bobo, dá para voltar a dormir?!" , ordenou a si mesma. Assim a noite foi passando e ela foi acordada por batidas na porta. - Rebecca? É a Madame Darion. Você está acordada? Poderia abrir a porta? - Só um minuto, Madame. Levantando da cama ainda um pouco sonolenta, foi até a cadeira da escrivaninha e pegou seu xale rosa claro. Um pouco cambaleante se dirigiu à porta e a abriu. - O que foi Madame? Aconteceu algo? - Não minha querida, é que já são dez horas e você havia comentado de um compromisso às onze? - Ah, claro! Muito obrigada! - arregalou os olhos com a surpresa, não poderia se atrasar. Madame Darion deu um último sorriso e desapareceu descendo as escadas. Rebecca fechou a porta e se virou com um ar preocupado. Como poderia ter se esquecido? Era hoje que Johnny chegava! Nossa, há quanto tempo que eles não se viam! Desde crianças brincavam juntos, foram crescendo, mais aos quatorze anos ele se resolveu pela vida de aventuras no mar. Embarcara em um navio mercante fazia três anos e os únicos vestígios de tão grande amizade ficou no coração, memória e cartas de ambos. - Cadê aquele meu conjunto azul? Eu tinha posto aqui dentro! - Falou em voz alta enquanto mexia no velho armário. - Ah, achei! Vamos Rebecca, você não tem muito tempo! Ela se vestira com um vestido branco que deixava os ombros levemente à mostra como a moda ditava e caia até o tornozelo. Dando sustentação, um corpete azul clarinho, amarado na cintura e terminando solto por cima da saia. - Esse vestido não é novo, mas é muito elegante! Era uma de suas melhores vestes, que ela ganhara de Madame Darion e, como não possuía muito dinheiro, não poderia comprar um novo. Fez um meio coque, deixando seus cabelos castanhos claros lhe cobrirem os ombro, pintou d eleve os lábios com rouge, dando um ar rosado, e pegou seu leque branco, que era muito prático pois combinava com tudo, afinal, não poderia se dar ao luxo de comprar mais leques. - Está ótimo! - Exclamou enquanto aprovava o resultado refletido no espelho. Sorrindo, se dirigiu à porta e antes de sair deu uma olhada em seu quarto. Ele era simples, mas aconchegante. Havia uma cama no centro, uma mesinha de canto com lâmpada e flores, uma escrivaninha de frente para a janela com alguns pertences, um guarda-roupa com espelho embutido e no outro canto uma divisória, para que ela pudesse trocar de roupa. Rebecca suspirou "O Johnny há de gostar daqui" e abriu mais o sorriso ao lembrar de como fora parar naquela pensão. Tudo começara nos seus 6 anos de idade. Órfã de mãe, ela e seu pai passaram por muitos apertos, até que por um convite de uma tia, foram para a pequena cidade de Turniffe. Eles passaram um tempo lá, a casa de sua tia era em frente a uma pensão, da Madame Darion, fora lá que conhecera Johnny, sempre tão amigos! Brincavam toda a tarde juntos, até que um dia de chuva forte mudou seu destino. Estavam refugiados no forte e por isso só souberam depois que a tempestade trouxera com ela a desgraça. Um navio de piratas atracou no porto de Turniffe e saquearam toda a cidade. Fora naquela noite que Rebecca perdeu tudo. Seu pai foi morto em batalha, tentando defender sua casa, e sua tia fora levada como prisioneira. Saquearam toda a casa, deixando Rebecca totalmente sozinha no mundo e sem nada. Madame Darion a acolhera em sua pensão, tornando-se uma nova mãe para Becca e a pensão, sua nova casa. - Rebecca, querida, você está pronta? Já está na hora! Essa voz a fez sair do transe em que estava. Trancando a porta do quarto, correu pela escada, passando como um raio. - Não vai comer nada? - Na volta, Madame. Até mais! Respondeu e saiu para a luz do dia, que estava muito bonito. Nuvens brancas brincavam no céu azul, sendo levadas pela leve brisa que soprava. Foi andando rápido que Rebecca se dirigia ao porto. Finalmente iria rever o amigo de tanto tempo! Ela lembrava do dia em que soube que Johnny iria partir. Estava frio e nublado, ele a chamou para conversar e explicou que iria sair de Turniffe. - Não posso mais ficar aqui, vou atrás de dinheiro, sairei com o navio mercante e não sei quando voltarei, mas sempre seremos amigos e eu escreverei! - Ah, John, quanto tempo!  - Falou para si mesma em um suspiro. Agora já podia ver os barcos ancorados, apertou o passo e chegou ao deque. Quantos navios e barcos! Como ela acharia o John ali, no meio daquela confusão? Resolveu perguntar ao senhor que estava circulando com um bloco de papel nas mãos: - Com licença... - Sim, senhorita? - Eu estou esperando um navio chegar, o Madlook. - Ah, sim, é aquele ali. Ele acabou de desembarcar. - Obrigada. Foi na direção indicada e viu os navegantes desembarcando cargas, ao passar por eles ouviu alguns assobios, que ignorou, tinha coisas mais importantes a fazer. Ela olhou em volta, mais nem sinal do Johnny. Nesse momento sentiu alguém atrás de si cobrir-lhe os olhos com as mãos e uma voz conhecida, porém um pouco diferente, falar: - Adivinhe quem é? Não houve tempo para resposta, Rebecca tirou as mãos estranhamente conhecidas de seu rosto e virou-se com um sorriso de felicidade nos lábios. - John! Mesmo sabendo que era muito estranho naqueles tempos uma garota de sua idade abraçar um rapaz tão abertamente, jogou-se em cima dele e lhe deu um grande abraço, cheio de saudade e alegria. - Quanto tempo! –Ela disse e se separaram. - Nossa, minha amiguinha virou uma lady da sociedade! - Mesmo assim, posso vencê-lo a qualquer momento! John cerrou os olhos, como fazia quando criança, no que Rebecca levantou as sobrancelhas e saiu correndo. Johnny começou a correr em seu alcanço, cada vez mais perto até que se encontraram e ele a levantou nos braços. - O que você estava dizendo? - Ah...Bem, são os sapatos, tente correr com eles! Ele a devolveu ao chão enquanto ambos riam. -Vou te levar pra casa, venha! Os dois jovens foram conversando a caminho da pensão, chegaram lá no horário do almoço e Johnny foi recebido com um forte abraço da Madame Darion. -Ah, Johnny! Que saudades! Como você cresceu, está tão bem! Vamos almoçar, sim? - Que saudades senti da sua comida... Todos se sentaram, e Johnny foi contando suas aventuras durante todo o almoço. - Quanto tempo você vai ficar aqui, querido? - Somente três dias, Madame... - Três? Mas só isso? Não ia ser uma semana? - Pois é, o capitão recebeu uma mensagem de um amigo e só viemos reabastecer e descansar um pouco, depois rumaremos para Tortuga, acho... - Tortuga? Você sabe que aquela é uma maldita cidade infestada de piratas, não sabe? Era óbvio em cada palavra de Rebecca que ela desprezava os piratas mais do que tudo. - Sei, mas é um bom lugar para o comércio. Os dias passaram com Rebecca e Johnny sem se desgrudar, como nos velhos tempos. Cedo demais, como ambos achavam, chegou o dia da partida. Rebecca o acompanhou até o Madlook, cabisbaixa. - Becca, pra você. Johnny lhe entregou um embrulho, que rapidamente fora aberto e deu lugar a uma linda caixa de madeira talhada, com pedras brilhantes e forrada por dentro com veludo. - John, é lindo! Não era necessário, eu nem trouxe nada para você! -Não precisa, só te reencontrar foi um presente. Essa caixa é para você guardar suas melhores lembranças, o que lhe é importante, sabe? - Eu amei, com certeza vou guardar! O imediato chamou todos os navegantes do navio que estava prestes a desembarcas e Johnny e Rebecca se despediram com um longo abraço. Ela podia sentir as lágrimas lhe escorrendo pelos olhos, e ficou ali, vendo o navio partir até desaparecer no horizonte.