Cap 2

1671 Words
Fernanda Eu cresci no Vidigal, tendo como companhia, só o meu pai mesmo, o homem que dava praticamente a vida para que eu pudesse ter de tudo Não digo que era o melhor, mas sempre foi o suficiente. O nome dele é Samuel, mas todos o conhecem como Samuca, o faz tudo aqui do morro, homem respeitado, de confiança até mesmo para o dono do morro Meu nome é Fernanda e vivo aqui, tendo orgulho do meu lugar. Fui criada só pelo menu pai, minha mãe mesmo, morreu quando eu era bem pequena, não tenho nem lembrança dela Por isso sempre tive muito respeito pelo o que meu pai fez por mim todos esses ano, não que não fosse obrigação, mas eu ao via os pais tratarem seus filhos do jeito que o meu me tratava Ele se doou por completo e isso era o que eu mais amava, eu amava muito o meu Samuca Homem de princípios, que nunca deixava uma desculpa o convencer de que o erro compensava, tanto que foi até por causa disso que eu acabei me afastando do Léo meu pão me ensinou que o crime não compensa, então eu não queria ficar perto daqueles que pensavam o contrário Eu ficava muito tempo com ele, apesar da nossa diferença de idade, na verdade, era uma criança cuidando da outra, mas a gente nunca viu problema nisso, sempre nos demos muito bem O Léo sempre foi muito atencioso e se preocupava em não me sentir deslocada quando aqueles amigos bestas dele vinham conversar Só que, conforme nós fomos crescendo, também escolhemos nossas prioridades. O Léo era filho do Pesadelo, um dono de morro carrasco pra caramba, mas que eu não podia reclamar quanto ao que ele fazia para a comunidade Eu sempre via notícias dele na televisão, e todas elas se afastavam horrores do tio alegre que eu conhecia nos churrascos que ele fazia na sua laje Foi ele quem incentivou o Léo a ser como ele é hoje, as vezes, quando encontro ele em algum lugar do morro e olho de relance, consigo ver o Pesadelo ali, sei lá, parece sabe O fim dele não foi muito legal, aliás, a iniciação do Léo também não, apesar de ele saber que herdaria o morro, nunca espetou que acontecesse daquele jeito Foi numa madrugada qualquer, eh não me lembro direito, mas sei que o morro sofreu uma invasão. Era coisa comum sabe, o Vidigal sempre foi muito visado, só que o dono do morro sempre soube o que fazer para proteger a gente Naquela noite não, naquela foi muito diferente. Enquanto eu estava debaixo da minha cama, com o corpo do meu pai fazendo peso em mim, como proteção, o Pesadelo estava levando um tiro a queima roupa, ele e a sua esposa, a Elis O Léo só não foi morto naquele dia porque o pai tinha dado um jeito de tirar o menino dali Imagina sair da sua casa, deixando sua família e quando volta, não encontra ninguém Era sorte dele estar vivo, mais sorte ainda os aliados terem chegado naquela hora para vingar a morte do dono do morro e garantir que o morro não fosse entregue nas mãos de inimigo, só que ao mesmo tempo, um p**a azar Naquele dia eu senti que perdi mais um pedaço do meu coração, aquele que eu ainda tinha esperança de encontrar o Leonardo o menino que me protegia dos amigos retardados Ele virou dono do morro e assumiu a vida que o esperava desde o nascimento e eu, segui a minha, separado dele, correndo atrás dos meus sonhos Uma vez ou outra, eu sentia os seus olhos em mim enquanto eu passava pelas ruas do morro, ouvia o barulho do motor da sua moto simplesmente parar, enquanto eu passava Mas não olhava para trás, eu só seguia. Não posso negar que o meu coração acelerava quando eu tentava disfarçar a minha olhada de r**o de olho, mas aquela vida não era pra mim Eu tinha uma rotina sabe, para ajudar o meu pão com as despesas da casa. Sempre fiz trabalho manual para essas fábricas de calçado, enfeites dessas sandálias infantis, então, dá minha casa mesmo, eu bordava e depois ia lá na casa da Margareth para receber meu ordenado Aos finais de semana, trabalhava ali na lojinha do morro mesmo, e gostava muito da minha vida, tinha orgulho de bater no peito e dizer que estava seguindo os conselhos do meu pai Depois, quando eu estava em.idade para encontrar um emprego fixo, sem que as pessoas ficassem preocupadas de estarem contratando uma criança para trabalhar, aceitei um emprego lá no mercadinho do seu Itamar, a minha vida estava muito boa Aquela sensação de que eu estava sendo observada, mesmo quando não via o Léo por perto, sempre esteve ali Por vezes eu achei que fosse coisa da minha cabeça, mas de tanto acontecer, de tanto eu sentir aquela sensação de ansiedade no meu estômago, eu comecei a acreditar e a procurar quem quer que fosse Nunca encontrei, mas sabia que estava sendo observada por alguém, por isso, o medo sempre estava ali, do meu lado Meu pai trabalhava mais fora do morro do que nele mesmo, fazendo serviços pros granfinos da zona sul, porque ele faz tudo mesmo e o serviço é de qualidade Ir buscar ele no ponto de ônibus... essa também era a minha rotina. Todos os dias quando batia oito da noite, eu descia o morro e ia de encontro ao meu Samuca e sempre me sentindo observada, mas aquilo não me impedia de ir Eu sabia que ali no morro nada ia acontecer comigo, por causa das leis sabe, daquele código, isso pelo menos funcionava e muito melhor do que as leis do resto do mundo Naquele dia eu fiz essa rotina, desci o morro, sai dele e fui lá no ponto de ônibus, na verdade, eu encontrava o meu pai no meio do caminho sempre Eu dei um abraço apertado e agradeci, como sempre fazia, na minha mente, por encontrar o meu pai bem, mas a noite me reservava uma surpresa Policial - Encosta na parede e abre as pernas por favor Nos nunca tínhamos passado por isso, jamais meu pai tinha sido revistado, eu estava com o coração na mão e ele, o meu Samuca, estava com os olhos desesperados e envergonhados Fernanda - Calma pai, não é nada, isso é de praxe Policial - Isso, não é nada A risada daquele homem me colocou medo, eu vi o jeito que ele falou e não teve como não desconfiar Ele foi subindo com a mão e quando chegou no rumo dos bolsos da jaqueta do meu pai, pegou algo e trouxe para perto de si Meu coração já estava saindo pela boca, mas eu nunca esperei por aquilo Policial - Bom, não seria nada se eu não tivesse encontrado isso aqui né tio Nas mãos dele, estava um pacote todo amassado que ele abriu, na nossa frente, revelando alguns pinos de cocaína. Eu conhecia aquilo, não tem como uma cria de morro não reconhecer Fernanda - Não, pelo amor de Deus, isso é um engano, eu tenho certeza que meu pai não faria isso Policial - E como o pacote dói parar no bolso do senhor aí? Esta querendo dizer que fui eu que fiz isso? Fernanda - Não, quer dizer, pelo amor de Deus, ele é meu pai eu o conheço, jamais ele faria isso Eu nem sabia se estava falando alto ou baixo, se estava calma ou desesperada, acho que mais para o lado de desesperada. Eu acreditava no meu pai, o senhor com o semblante mais branco do que uma folha de papel e que se tremia todo ali, sem dizer uma só palavra Eu sabia o que se passava na sua mente, aquele homem sempre me disse que a pior vergonha que ele poderia passar na vida era ser vítima de uma revista ou ir para a delegacia. Tudo o que ele menos deseja, estava acontecendo Policial - Se acalme menina, a gente vai ter que levar ele para delegacia e pronto, lá o delegado decide o que vai acontecer com ele Fernanda - Não, por favor Enquanto eu estava ali, completamente desesperada, implorando para que o policial tivesse piedade da gente, ouvi o seu parceiro o chamando para mais perto da viatura e falando alguma coisa Eu segurei a mão do meu pai, tentei passar confiança sabe, mas se eu mesmo não acreditava... ele estava desacreditado e desesperado, seus olhos estavam.sem expressão, como um cinza claro, mas eu ainda fiquei ali, tentando animar ele Depois de alguns minutos, o policial voltou e como que num milagre, nos dispensou e pediu para que não fizéssemos nenhuma pergunta e simplesmente mandou a gente embora Eu não pensei duas vezes e acho que se não fosse por mim, meu pai ainda estaria ali, perto do paredão, com as penas abertas. Fui eu te tomei a iniciativa, peguei na sua mão e daí dali o mais rápido possível Eu agradeci a Deus, de verdade, vi ele agindo pela gente, porque, que explicação teria para um policial, pronto para levar o meu pai preso, simplesmente desistisse desse feito? Nenhuma, só Deus mesmo Tentei andar o mais rápido possível, a não olhar para trás, mas como a mulher de Ló, a que virou uma estátua de sal - se eu me lembro bem, essa é a história que meu pai contava - não me aguentei e olhei De relance, ao longe porque, com a aperto do passo por causa do desespero, já estávamos longe, mas vi de relance ele do lado dos policiais, acho até que estavam colocando algemas nele Era o Léo, ele tinha sido preso, mas eu não me importei, não Naquele momento, eu tinha que cuidar do meu pai e me preocupar somente com ele O Léo que se virasse, era isso que ele sabia fazer de melhor, não era? Fugir da polícia? A vida bandida sempre tem consequências
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