(Pither)
Quando eu tinha três anos, minha mãe me pegou emburrado no quarto. Ela perguntou o que eu tinha e eu respondi com a maior naturalidade..." -Eu estou bravo mãe!". Ela questionou o motivo e eu respondi "- Por que você tem um filho e eu não tenho nenhum". Lembro me que ela gargalhou de minha inocência. E me explicou que ela esperou vinte e cinco anos para poder ser mãe! E no tempo certo isso aconteceria comigo, e eu ia me sentir tão feliz a ponto de não conseguir mais parar de sorrir!... "Desculpe mãe mas na minha vez, essa notícia não me contagiou tanto assim..."
Eu não estou fugindo da minha responsabilidade! Só creio que não preciso tolerar a Deborah só porque sou o pai do filho que ela espera! Estamos em outros tempos, não sou obrigado a me casar e nem ser a babá dela! Eu vou assumir o meu filho! Vou dar tudo o que ele precisa, e ela também terá todo o meu apoio... Mas é com a Esther que eu quero ficar pelo resto da minha vida! Uma vez eu disse que se um dia rolasse algo entre nós, eu seria diferente, ela me fez uma pessoa melhor! Por isso que estamos indo embora, não vou olhar pro meu pai, nem pelas ameaças de Lúcia e muito menos pela Déborah... Vamos para um lugar em que ninguém nos encontre! Vamos ter uma vida só nossa! Ser feliz a nossa maneira! Onde ninguém nos impeça de sorrir!
- Quando? Foi a pergunta que ela me fez. Esther topou na mesma hora, ela me ama disso eu não tenho dúvidas.
- Depois da exposição de fotos da mamãe... Até lá a gente vai ajeitando as nossas coisas! Eu tenho o dinheiro que ela deixou pra mim, podemos ir se virando enquanto isso.
- Eu posso trabalhar Neto! Ela disse sorrindo. - Não vejo problemas nisso! Eu vou pra qualquer lugar, se você for comigo! Me abraçou em seguida. Coloquei o topo de sua cabeça embaixo do meu queixo.
- A gente vai dar um jeito, você vai ver! No final seremos você e eu contra o mundo! Falei.
Esther levantou sua cabeça me olhando nos olhos depois me beijou em seguida. Eu estava com tanta saudades dela que não acelerei nada. A beijei delicadamente tocando seu rosto, eu queria que ela sentisse como eu sofri com sua ausência.
- Eu senti saudades... Falei encarando o seus olhos.
- Eu também! Ela acariciou o meu rosto. -Néto! Você não precisa abandonar o seu filho para ir embora comigo! Seu jeito era preocupado.
- Não vou abandona-lo! Só não preciso ficar aqui com a Déborah o tempo todo! Ela assentiu com a cabeça. - É com você que eu quero ficar Esther!
(...)
Naquela noite dei uma passada no quarto de Deborah para saber como ela estava. Antes de bater ouvi que ela conversava com alguém, como se estivesse alterada. Não consegui ouvir muito bem mas pude entender claramente quando ela disse " Ele não sabe". Apertei os olhos imaginando que ela poderia estar falando sobre mim. Déborah parecia estar conversando no telefone, pensei em entrar e fazer um escândalo! Mas decidi ser mais esperto e esperar a hora certa! Ela com certeza ia deixar mais pontas soltas e eu precisava agir com a cabeça, e não com o coração.
Bati na porta e entrei, ela agiu como se nada tivesse acontecido.
- E aí! Como você está? Falei fechando a porta. Déborah me olhou como se realmente estivesse se sentindo m*l (Vai nessa!) pensei.
- Estou péssima Pither! Ela disse fazendo o maior drama.
- Aéh? Falei simulando compaixão. - O que você está sentindo?
- Dores... Por todo o corpo! Estou enjoada... Está tudo girando!
- Amanhã você não vai na agência! Falei sério.
- Por que não? Ela perguntou assustada.
- Por que vamos ao médico! Quero que ele faça um ultrassom em você... Preciso saber quantos meses você está?! E se o bebê está bem, e por quê você está sentindo tantas dores?
- Pither! Amanhã eu tenho algo muito importante na agência e...
- Desmarque! Falei sério. - A partir de hoje vai ser o bebê em primeiro lugar! Você não vai mais trabalhar, e nem ficar andando por aí à toa...
- Eu não vou ficar presa o dia todo! Déborah bateu de frente se sentando na cama, como se eu realmente estivesse pegado seu ponto fraco.
- Esperai... Você vive dizendo que está passando muito m*l! E como pra fazer o que você gosta... Como passear, comprar suas roupas e modelar, sua enxaqueca desaparece?
Déborah ficou sem chão, percebeu que eu tinha pegado suas artimanhas.
- Você está insinuando que eu estou fingindo? Déborah disse já estérica.
- Não estou insinuando nada, Déborah! Você está levando consigo o meu filho, está na minha casa! Então serão as minhas regras!
- Mas eu... Ela começou.
- Você estará prontinha amanhã às duas da tarde, para irmos juntos a sua primeira consulta! Déborah deixou cair o queixo como se não esperasse minha reação. - Boa noite Deborah! Descanse querida!
E saí daquele quarto me sentindo satisfeito.
(Esther)
Depois que Pither saiu do quarto, fui tomar banho. Fiquei pensando em tudo o que conversamos... Sobre nossa fuga, e todas as consequências que viriam depois dela. Mas era a nossa única saída! Se não fossemos embora daqui nós dois não aguentaria a tantas pressões.
Pither vive pressionado pelo pai em relação a gravidez de Deborah. Sem contar a visita desagradável da bruxa da Lúcia, e todos os trâmites sobre a adoção estavam nas mãos dela. Mas de uma coisa eu sei, apesar dela estar esperando um filho dele, Pither não mudou comigo, ele me procurou e demonstrou interesse! Isso que me marcava.
Mas uma prova de que tudo o que aquela Lúcia falou, eram tudo mentiras.
Coloquei meu pijama estava frio demais, escovei meus dentes e voltei pro quarto. Pither estava sentado no meio da cama, com suas costas sobre a cabeceira.
- Você voltou? Falei tirando a minha toalha da cabeça.
- Se importa se eu dormir aqui hoje? Ele disse manhoso. - Juro que não é safadeza! Só está muito frio essa noite para nos dois dormirmos separados!
Sorri pegando meu pente e me sentando ao seu lado.
- Você só tem que tomar cuidado para sair pela amanhã! Pither sorriu com o canto da boca, e depois ficou sério encarando o teto. Estava pensativo.
- Você acha que tem alguma possibilidade do filho que Déborah espera não ser meu? Ele perguntou se virando para me olhar nos olhos.
Nessa hora minha cabeça deu um giro completo e me fez lembrar do sonho que tive com ela e um rapaz misterioso. Essa também era uma suspeita minha, porém eu não tinha provas que a condenasse.
- Por que está me perguntando isso?
- Déborah é misteriosa! Ele disse mexendo no meu ursinho. - Eu tenho uma leve impressão que ela me esconde coisas!
- Neto eu não sei... Você conhece Déborah melhor do que eu! Falei. Já estou me odiando por não dizer minhas suspeitas a Pither. Mas eu não sou assim! Não uso de minha influência para manipular os outros! Isso é o trabalho da Deborah!
Puxei o meu edredom e entramos embaixo dele, Pither deitou sua cabeça sobre o travesseiro olhando pra mim. Eu mexia nos seus cabelos ainda calada, ele também estava quieto por fora, mas por dentro se passava um turbilhão de emoções.
- Esther! Ele quebrou o silêncio. - Por que a Lúcia te odeia tanto?
Me deitei na cama ficando frente a frente com ele. Porque sabia que pra revirar o passado de alguém como o meu, ele precisava estar totalmente disposto a ouvir, e principalmente compreender.
- Aaaah... Respirei fundo. - Quando Miriam me encontrou na porta do orfanato, ela se apegou a mim. Me deu um nome, carinho, e não me deixou apta a adoção... E então apareceu Lúcia! Revirei os olhos. - No início ela era somente uma cuidadora, mas logo cresceu os olhos no cargo de diretora!
- Mas porque Miriam não deixou que te adotassem? Pither perguntou incrédulo.
- Por que o plano dela, sempre foi ficar comigo! Ela me amava Neto! Combinamos que naquele ano do incêndio, ela se aposentaria e iríamos pra bem longe dali!
- Eu sinto muito Esther! Você gostava muito dela né? Pither se mostrou solidário.
- Muito! Perder ela naquele incêndio foi aterrorizante.... Falei me lembrando do dia.
- E você sabe o que causou o incêndio? Pither se aproximou de mim, pegando em minha mão.
- Lúcia! Foi ela quem explodiu a cozinha... Falei entristecida.
- Esther mas porque você não a denunciou? Seus olhos corriam pelo meu rosto.
- Por que ela me acusou primeiro! Eu era sonâmbula e uma das meninas me viu sair da cozinha por último naquela noite! Eu estava com uma vela nas mãos, mas eu juro que não fui eu! Falei angustiada.
- Os bombeiros não deram nenhuma conclusão? Ele perguntou atônito.
- Disseram que foi uma vazamento de gás! Abaixei meu olhar me lembrando da fumaça e das crianças mortas daquele dia.
- Esther, então você e sua vela não tinham nada a ver com isso! Pither falou preocupado.
- Mas quem acreditaria em mim?! Dei de ombros. - Sem contar que Lúcia me colocou na lista das crianças desaparecidas. Com isso conseguiu me trancar por anos naquele porão, sem ninguém sentir falta...
- Aquela suicida te fez como morta todos esses anos? Pither perguntou assustado. -Agora tudo faz sentido, por isso ninguém nunca deu fé do seu desaparecimento. Ela tinha tudo planejado desde o início!
- Neto! Morávamos em outro orfanato. Miriam contratou um casal para serem caseiros daquele lugar. Meses depois eu descobri que Lúcia tinha um caso com o marido daquela senhora...
- Meu Deus Esther! Que mulher diabólica! Pither parecia não acreditar.
- Eu os vi se beijando, e levei Miriam até o lugar escolhido por eles para os encontros a escondidas... Pither prestava atenção sem piscar. - Era uma biblioteca desativada! Eles não estavam, mas havia embalagens de preservativos por toda a parte. E foi aí que Miriam me explicou muitas coisas...
- E depois? Pither perguntou ansioso.
- Lúcia era esperta, suspeitou que estava sendo investigada por Miriam e armou uma emboscada pra ela! Só que a Lúcia não sabia era que eu ia sobreviver! Eu vi quando ela dopou a diretora e trancou a porta da direção por fora!
- Esther por quê você não a impediu? Pither me disse eufórico.
Mas eu não podia contar que tudo o que aconteceu naquele dia eu vi em sonho. Não era tempo dele saber sobre isso também. Abaixei minha cabeça e decidi me calar.
- Me desculpa você era só uma criança! Pither veio até a mim e me abraçou forte, como se quisesse me fazer esquecer todo o meu sofrimento de uma só vez.
- Eu juro pra você, que a Lúcia vai pagar por tudo o que ela fez! Ele disse beijando o topo da minha cabeça.