Capítulo 2

967 Words
Maria Eduarda Há dois anos eu não sei o que é ter paz. E aqui estou, me olhando no espelho do banheiro, tentando esquecer o meu pior pesadelo. Desde aquela noite eu não comemoro mais o meu aniversário. Não tenho razão para festejar. Como eu gostaria de ter morrido! É errado eu ainda ter esses tipos de pensamentos? É errado eu ainda me sentir suja? São tantos sentimentos contraditórios que eu ando sentindo! No início, eu não conseguia dormir devido aos acontecimentos. Eu era sedada e também era restringida no leito do hospital. A dor que eu sinto na alma é tão grande, que acabei tirando o soro da veia que estava me hidratando e machucando-me mais ainda, só via o sangue saindo novamente, e sorria entre as lágrimas que já estavam escorrendo. Para mim era tão bom, porque a morte viria e me levaria do meu sofrimento. De uma coisa eu tinha certeza: eu não saberia como viver com aquilo. Só que eu não contava que as enfermeiras fossem entrar tão rápido e gritando. E apaguei novamente. E aqui estou eu novamente posicionada no mesmo lugar, onde eu tentei me matar da primeira vez. E mais uma vez não funcionou. Minha irmã foi avisada que eu tinha tentado novamente me matar. Agora ela me olha chocada. — O que você fez, Duda? — ela me questiona, com lágrimas nos olhos. — Você não entende! — sussurro. — Então me faça entender! — ela diz, séria. Tento me mexer, e não consigo. Vendo o que eu estava fazendo, ela explica: — Eles tiveram que te amarrar. — Deu para perceber — resmungo. — Então, vai ou não me fazer entender o que está acontecendo com você? — Há quanto tempo eu estou aqui? — Há quase dois dias. Você se lembra daquela noite? — Sim… — sussurro. — Então é verdade? — ela me questiona, e sinto meu sangue fugir completamente do meu rosto. — Sim… — volto a sussurrar, com vergonha de mim mesma. — Duda, você não quer saber o que aconteceu com você? — Sinceramente, acho que você não precisa me lembrar do que aconteceu exatamente comigo! — sem querer, sou grossa, e logo estou me desculpando: — Me perdoa, não queria ser grosseira. — Eu sei que não! Você não sabe o que eu senti quando te vi no chão do banheiro toda ensanguentada. Minha irmã linda… Ela não tinha ideia de como eu a admirava, me criou desde pequena, a nossa diferença é de dez anos. — Me perdoa! — peço novamente, e ela me abraça, colocando a cabeça em meu colo. Começa a chorar. Muito. — Eu pensei que você estava morta! — ela sussurra. — Era o que eu queria naquele momento — confesso, sentindo as lágrimas dela em minha barriga. — Não, eu não quero que você atente mais contra a sua vida! — ela diz, brava, e se levanta. Assim pude reparar em como ela estava abatida. — Eu preciso morrer! Ela me olha chocada. — Nunca mais fale uma merda dessas! — Você acha que é fácil? — Eu imagino que não deva ser fácil. — Não, você não imagina! — praticamente grito, e tento me controlar: — No dia do meu aniversário eu fui estuprada! — Duda, fica calma — ela pede, ao ver como estava agitada. — Eu não posso ficar calma! — olho firme para ela. — Além de ter sido violentada, posso estar grávida e ainda correr o risco de ter pegado uma DST. — Eles fizeram o teste de gravidez e DST. — E qual foi o resultado? — pergunto, com medo. — O resultado mostra que você, Senhorita Sanches, não está grávida e também não contraiu o vírus — ouço uma voz de um homem e fico tentando saber quem é. Não preciso muito, pelo jeito da minha irmã, que ficou muito vermelha. — Oi, doutor Leão — minha irmã diz, ainda corada. Ele abre um sorriso que acho sensual e nos cumprimenta. — Então eu não estou grávida? — Não senhorita! Mas isso não significa que a senhorita não tenha que tomar a pílula do dia seguinte e muito menos o coquetel, pois vai tomar como prevenção. — Mas o senhor não disse que eu não estou grávida e também não contraí DST? Por que eu tenho que tomar? — questiono, já ficando nervosa. — Senhorita, como eu estava dizendo, a senhorita tem que tomar, e vamos fazer mais exames. Você também vai ser acompanhada por um psicólogo. — Eu não preciso de nenhum psicólogo — respondo, grossa, e a minha irmã me olha feio. — Ela vai, sim, doutor Leão! — Ótimo, a enfermeira já vai trazer as medicações, e vamos fazer logo mais exames. — Eu estou bem! — resmungo. — A senhorita passou por um grande trauma, e sei que está abalada, mas precisa fazer mais exames e também começar a tomar a medicação, tudo bem? — aceno a cabeça em concordância. Não demora muito, ele sai, e vem uma enfermeira, e sou tirada da restrição. Foi assim que comecei a minha longa jornada para esquecer o meu pesadelo. — Dudaaaaaa! — ouço a minha irmã me chamar e sou tirada do passado. Logo desço as escadas e vejo-a toda arrumada. — Aonde você vai? — pergunto, curiosa. — Eu vou trabalhar, esqueceu? — ela brinca. — E a senhorita tem que ir para a aula, e não se esqueça de vir logo para casa. Ela me dá um beijo e sai correndo como louca. Minha irmã ama e ao mesmo tempo odeia o trabalho como secretária do Senhor Leon Vitorino. Sinceramente, eu ainda não o conheci, e nem quero. Minha irmã diz que o homem é um gato e que eu deveria arrumar um namorado. Decidi que nunca vou me relacionar com ninguém. O medo ainda bate em mim quando algum homem se aproxima. Mesmo sabendo que não pode me fazer nada de m*l, eu ainda fico com um pé atrás. Pego a mochila e sigo para o curso, pedindo mais uma vez a Deus para me fazer esquecer de tudo que me aconteceu. Será que é pedir muito? Solto um longo suspiro triste.
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