Charlotte Dawson
Como não precisava preparar o jantar naquela noite aproveitei para visitar o orfanato, sentia falta de fazer algo realmente útil e, ajudar aqueles seres indefesos era algo que enchia o meu coração de alegria e satisfação. Desde que fui pega pelo meu pai entregando marmitas para as crianças não consegui retornar ao lugar.
Todos pensavam que o alfa tinha um grande coração e enviava as refeições para os pequenos, mas a verdade é que comecei a fazer e entregar esses alimentos escondida dele, mas em uma das minhas entregas fui pega em flagrante. Ele fingiu não me ver, mas quando cheguei em casa tive como punição alguns ossos quebrados pela surra e fiquei trancada no quarto sem comida por 3 dias, bebendo apenas água da torneira do banheiro.
Nos dias seguintes houve grande repercussão positiva com o gesto do alfa, pois seus lacaios espalharam a notícia de que ele estava muito preocupado com a situação dos órfãos e por isso cuidaria de todas as necessidades deles. Essa foi a oportunidade perfeita para enganar ainda mais a comunidade e os anciãos que detém grande influência dentro e fora do nosso bando. Por esse motivo o bondoso alfa fingiu que a iniciativa partiu dele e permaneceu com a impecável imagem de ser um benfeitor.
Estava muito feliz em poder oferecer algo bom para quem já tinha perdido tanto, mesmo que a intenção do meu pai não fosse verdadeira, ver a felicidade estampada naqueles rostinhos era gratificante. Havia oito internos no orfanato sendo um bebê de três meses e os demais estavam na faixa etária entre 5 e 8 anos, nenhum deles tinha parentes vivos, pelo menos essa era a informação oficial.
Observei os pequeninos por um tempo, seis deles estavam sentados, divididos em dois bancos compridos que tinham o mesmo comprimento da mesa que ficava no centro. Conversavam e riam enquanto esperavam seus pratos serem servidos. Estava ali parada fazia alguns minutos e decidi que já era hora de me retirar, pois tinha que me preparar para ir à casa de dona Glória.
Caminhando em direção aos portões, notei que havia um menino sentado em um banco no jardim da propriedade, estranhei sua presença ali, pois estávamos no outono e a temperatura havia caído consideravelmente. Olhei ao redor a procura de algum responsável, mas não vi ninguém, ele estava sentado num banco de carvalho e olhava para o céu. Me aproximei e percebi que estava com uma expressão triste e distante, parecia que a sua mente estava em outro lugar e ao perceber minha aproximação logo abaixou a cabeça. Não sabia ao certo o que fazer, mas senti que deveria tentar me conectar àquele garoto.
- Posso sentar aqui? – Perguntei apontando para o espaço vazio no banco.
- Sim senhora. – Respondeu cabisbaixo e percebi que ficou muito apreensivo com a minha presença.
- Qual é o seu nome? – Perguntei já ansiosa e, ao mesmo tempo nervosa, temendo que ele me repelisse.
- Adrian, senhora. – Ele permaneceu quieto.
- Que nome lindo! O meu é Charlotte, é um prazer conhecê-lo, Adrian. – Eu disse toda animada e estendi minha mão para cumprimentá-lo, mas meu gesto fez o oposto e o assustou ainda mais.
- O... O... Obrigado, senhora. – Ele respondeu gaguejando e com a respiração acelerada pelo medo, conhecia bem essa sensação.
Fiquei alguns minutos pensando no que dizer e não encontrei nada que pudesse diminuir o seu desconforto, entendia bem o temor que ele estava sentindo e lembrei-me de quando tinha a mesma idade, pensei no que eu gostaria de ter ouvido naquela época e foi aí que mudei a abordagem.
- Sabe Adrian, eu gostaria de ser sua amiga, se você quiser, é claro. Não tenho nenhum amigo e a minha vida tem sido bem difícil. – Esperei ansiosamente por uma resposta, mas ela não veio. Ao invés disso, o menino levantou a cabeça e me encarou com os olhinhos rasos d’água.
- A senhora tem certeza disso? Eu não sou nada e tem tanta gente mais legal que eu, pode escolher outra criança se preferir, eu vou entender. – Ele suspirou com os lábios trêmulos e continuou me olhando.
Aquela resposta me feriu profundamente e senti uma dor aguda atravessar o meu peito, imediatamente e sem pedir permissão eu o agarrei e dei a ele o abraço que tanto desejei receber. Cachoeiras correm soltas pelos meus olhos e percebo que ele não está diferente de mim, pois sinto minha blusa molhada por suas lágrimas, permanecemos abraçados por um longo tempo e quando nos separamos ouço atentamente a sua história. Ele e o irmão ficaram órfãos depois de um ataque dos Bloody Wolves, uma alcateia inimiga que busca poder a todo custo.
Antony tem 8 anos e Thomas, seu irmão, está com 2 meses, Sebastian é o tio que ficou com a tutela das crianças, mas sua esposa Grace não aceitou a presença delas em casa, então mandou-os para viver aqui. Como o tio é o diretor do orfanato ninguém ousa dizer nada a respeito, eles estão há dez dias neste lugar e ele ajuda com os cuidados do irmão.
Voltamos para o interior do prédio porque a temperatura caiu ainda mais, aproveitei para conhecer o bebê mais fofo do mundo e me apaixonei por suas covinhas nas bochechas rechonchudas. Conversamos sobre várias coisas e nem vimos o tempo passar, por fim prometi visitá-los todos os dias e disse que iria ajudá-los, mesmo sem ter ideia de como fazer isso. O horário de se recolher é anunciado e assisto meus novos amigos seguirem em direção ao quartinho designado a eles, deixá-los dessa forma é desesperador e minha loba assim como eu está angustiada.
Sigo a passos largos em direção a floresta, após alguns minutos de caminhada e já dentro da mata, verifico estar completamente sozinha, começo a correr ao mesmo tempo em que encho meus pulmões de ar, em seguida me transformo e deixo minha loba correr livremente.