De: Érica Isabel Langa
Assunto: Com certeza, somos uma versão de novembro 9 da Shopee
Para: Alonso Haru Cassano
— Caro senhor Cassano, espero que esteja tudo bem com o senhor. Caro amante já conhecido, só o simples facto de ter a sua amizade me basta, não só, o simples facto de saber que tu és real é o suficiente para mim, não que eu tenha deixado a minha paixão platónica por você de lado, mas eu sei que não é fácil apaixonar-se por alguém, ainda mais alguém desconhecido não é mesmo? Eu sei que apaixonar-se por alguém, não é aquela baboseira das telenovelas, eu também não me apaixonei por você em um sonho, foram vários e vários sonhos para tal, acredite em outros eu pensei que fosses um espírito vingativo que me atormentava ou um marido espíritual, a primeira opção descartei com o conteúdo dos sonhos, a segunda só descartei quando recebi o teu e-mail, com o e-mail, eu tive certeza de que não eras um marido espíritual. Caro Haru, comparar a nossa história com Novembro9, foi muito criativo da sua parte, eu lí o livro e sinto muito em lhe dizer isso, mas o Ben, agora é o mais novo amor da minha. «um corpo é simplesmente uma embalagem que guarda os verdadeiros dons. A juventude e a beleza passam. A decência humana, não» Tem como não amar o Ben? Eu acho que não, ao ler a obra novembro9, dei-me conta que mesmo nós dois sendo uma versão mais barata de novembro nove, continuamos em desvantagem, pois, Ben e Fallon ao menos conheciam um ao outro, e nós dois não, mas quem sabe não criamos nosso próprio 9 de novembro.
Terminei o e-mail, bastante ansiosa, eu não via a hora de receber a resposta dele, meu peito pulava a cada notificação que entrava em meu celular. Outra parte ruím de ser ansioso, é que, você coloca muita expectativa em coisas pequenas, você pensa demais, imagina demais, você sente demais. Sua mente fica criando vários cenários de essa coisa não dar certo, sua mente fica criando vários “ses” e isso cria um reboliço dentro de você que, a única coisa que você quer é gritar para que sua mente fique quieta.
— Érica! A doutora Gleice, quer falar com você — meu pai estava do outro lado da casa, mas gritou por mim. Eu não sabia o que estava acontecendo com ele, mas de repente, ele inventou de ser pai presente, não que eu estivesse reclamando, mas que foi estranho, foi.
— Claro papá, já vou — retruquei um pouco animada, saí do quarto já pronta.
As minhas roupas, desde pequena, são escolhidas de acordo com o meu humor, se o meu humor estivesse péssimo, as roupas seriam basicamente calça jeans larga e um moletom também largo, se estivesse de humor, as roupas seriam boas. Para a consulta na doutora Gleice, vesti um vestido até o tornozelo, floriado e fofo. Para prender os meus míseros cachos que passei a manhã inteira definindo, um lacinho branco da Shein, inclusive o vestido também da Shein.
Saímos de casa para o consultório da doutora Gleice, estava muito nervosa, pois, não podia contar para a doutora Gleice que Haru era real, ela podia de alguma forma pensar que eu estava louca e fantasiando com Haru novamente, ela provavelmente seria obrigada a informar ao meu pai e eu terminaria numa camisa de força. Assim que chegamos ao consultório, desci com o coração palpitando feito um tambor de xigubo²⁰.
— Érica querida, como está? Você parece feliz. — me encheu de questões assim que entrei em sua sala. Ela como sempre, na postura séria e de detetive da série Engane-me se puder.
— Doutora, estou bem obrigada e feliz — retruquei um pouco nervosa.
Eu não podia deixar transparecer a minha felicidade, se eu demostrasse que estava muito feliz ela podia desconfiar de algo. Eu tive que fazer um esforço enorme para parecer normal, mas a doutora Gleice parecia uma versão feminina do doutor Lightman.
— Então, como tem passado? Voltou a sonhar com ele? — questionou o que eu mais temia, ela ergueu os olhos e focou eles em mim.
— Uhm! Um dia de cada vez né? E sobre os sonhos, desde a semana passada que não os tenho — respondi um pouco nervosa, mas fiz todo o possível para não transparecer o meu nervosismo.
— Voltou a escrever para Haru? — arqueiou uma sombracelha. Ela sabia que algo não estava normal, é claro que sabia, ela foi minha psicóloga por toda a minha adolescência e juventude.
— Sim, uma semana depois que passei o prazo — fui sincera. Não ía adiantar em nada mentir, preferi contar sobre a carta da abstinência, só para desviar o assunto da minha até então felicidade, para alguém que não sorria há dois anos, surgir do nada sorrindo que nem um louco, era de se estranhar.
— Oh! Ele respondeu? — questionou nem um pouco abalada. O deboche dela foi tanto que senti vontade de rir, ela sabia que não existia uma possibilidade de Haru ser real. Inspirei e expirei, fiz a minha melhor cara de decepção e choro.
— Não, ele não respondeu, acho que isso foi o basta — minha voz saiu vacilante, como se eu estivesse realmente decepcionada, fiz minha melhor cara de choro, mas não tão exagerada, para que não parecesse forçado demais.
— Tem certeza? Desistiu dele? — ela ajustou a postura no sofá e me encarou com mais profundidade, ela aparentava estar extremamente cética.
Ela tinha razão por estar cética, como alguém que até dois meses atrás jurava de pés juntos que Haru era real, podia agora dizer que seguiu em frente? Como alguém consegue seguir em frente tão rápido assim? Nem mesmo a maior das piranhas do mundo, conseguia trocar de crush tão rápido assim.
— Não, mas cansei de esperar — fiz todo o possível para parecer que tinha convicção em minhas palavras.
— Pensa em seguir em frente? — questionou anotando algo em seu caderno.
— Sim — retruquei incerta, a minha boca disse sim, mas o meu corpo disse não.
— Tem certeza? Você não parece convicta disso — insistiu cética novamente. Se ela continuasse insistindo tanto no assunto, provavelmente diria a verdade.
— Não estou certa, mas farei tudo que estiver ao meu alcance para esquecer de Haru — tentei passar confiança em minhas palavras e parece que funcionou, Porque a consulta terminou com a minha psicóloga me parabenizando por estar no caminho certo. Se ela soubesse um terço das loucuras que passavam na minha mente naquele dia, ela com certeza me internaria.
Após a consulta na doutora Gleice, saímos de lá e almoçamos juntos num restaurante na baixa da cidade de Maputo. Naquele dia, eu e o meu pai conversamos muito, era bom voltar a ter aqueles momentos com ele. Naquele dia eu percebi que, se eu não tivesse começado com as minhas loucuras, nós não voltaríamos a ter aqueles momentos.
Assim que cheguei à casa, tomei um banho frio, acessei o meu e-mail para ver se tinha alguma resposta da parte de Haru ou não, fui surpreendida por seu e-mail.
De: Alonso Haru Cassano
Assunto: O corpo é só uma embalagem que guarda os verdadeiros dons
Para: Érica Isabel Langa
— Cara senhorita Langa, eu, graças a alguma divindade bondosa, g**o de boa saúde.
Cara senhorita Érica, fico lisonjeado por saber que a senhora seguiu a minha referência sobre o livro, como a senhorita bem disse, somos uma versão mais barata da obra, porém, algo me inquietou em seu e-mail, a senhorita dizer que estamos em desvantagem por não conhecermos o rosto um do outro, com todo respeito é um disparate. O facto de não conhecermos o rosto um do outro, não faz de nós desconhecidos e muito menos nos coloca em desvantagem, você mesma disse no seu e-mail anterior, citando as palavras da Colleen Hoover. " O corpo é uma embalagem, que guarda as verdadeiras virtudes" cara senhorita Érica, eu não preciso conhecer o seu rosto para saber como a senhorita realmente é, suas cartas falam muito de sua personalidade. Então, senhorita Érica, eu não vejo a necessidade de revelarmos nossas identidades agora ou a senhorita se importa com a beleza física, tanto para não suportar ficar no anonimato até lá?
Após ler o e-mail, fiquei abismada, eu não queria que ele tivesse uma má impressão de mim, ao dizer aquilo, eu não me referia a quebrarmos o mistério por detrás de nossas identidades, foi só um comentário m*l interpretado, eu não queria que ele pensasse que sou uma pessoa fútil. Naquele dia, nós dois tivemos nossa primeira discussão de casal, não nos tínhamos visto ainda e já tivemos nossa primeira discussão.
Naquele dia, eu não dormi, fiquei a noite e a madrugada inteira rebolando na cama, diversos cenários passaram na minha cabeça, vários cenários de possíveis problemas a acontecerem no nosso possível futuro relacionamento. Às três da manhã, acordei com a minha mente gritando, ela estava extremamente barulhenta, gritando para que eu acordasse e procurasse uma solução para aquilo. Eu sei que não foi nada demais o e-mail dele, mas eu consegui ver diferentes cenários de aquele simples e-mail fazer ele desistir de nós. Foram tantos “ses” que não consegui mais dormir.