.•*¨*•.¸¸♪ Aquele onde Cameron volta ao passado ♪¸¸.•*¨*•.
Crianças são sempre crianças, é o que eles costumam dizer. Crianças erram, os adultos costumavam justificar e com um sorriso de canto, uma voz amena e uma carinha de choro, elas se livram de qualquer problema com a mesma facilidade que uma pluma caí ao chão.
Infelizmente, para algumas crianças, as coisas não funcionavam desse jeito, não era apenas doces, sorrisos e pessoas os parabenizando por qualquer mínimo momento de maturidade. Algumas delas eram jogadas em um lugar escuro e doloroso, onde aos poucos, se esqueciam do mundo que existia lá fora.
Naquele lugar – do qual Cameron se recordava tão bem quanto se era possível –, crianças não eram apenas crianças.
Eram armas, armas que seriam usadas de qualquer forma, armas que no mínimo seriam úteis, já que no fim, ninguém realmente os queria. Sim, ele se lembrava disso com mais nitidez, da sensação. Da certeza.
Seus olhos de esmeralda brilharam na escuridão entre as nuvens que nublavam o céu e por um momento ele pode ver seu próprio reflexo em uma das lâminas que carregava empunhando. Os olhos de um verde esmeralda possuía único e vivo, essa certamente era a parte que ele mais detestava. Porque aqueles olhos, eram iguais os dela.
Da mulher com jaleco branco que sorria antes de envia-los outras vezes para suas torturas diárias.
Ele se lembrou das crianças jogadas nas ruas e esquecidas em becos imundos, todas elas eram levadas para o subsolo, lá, eram esquecidas e usadas para trabalho escravo e aquelas que ela considerava "úteis" eram torturadas e abusadas de tantas formas que esqueciam até mesmo seu próprio nome.
Aquelas crianças, que muitos idiotas diziam que estavam sendo protegidas pela fundação, nada mais eram que ratinhos de laboratório. Os ratinhos dançantes da senhora Elatior, aquela que era vista com tanto primor.
Mas quem adivinharia, que entre todos aqueles órfãos, jogados em seus poços de dor e agonia, estava o filho da fundadora daquele abismo?
Cameron se pegou rindo. Um riso fraco, baixo como o de uma criança assustada.
Ela nunca havia se importado e ele sabia disso. Seu nome, nem mesmo tinha sido escolhido por ela, era apenas mais um "efeito colateral". Ele era literalmente, um dos efeitos colaterais da vida daquela mulher e provavelmente o que ela mais odiou. Cameron não precisava que ela o dissesse isso, não quando se recordava da forma como ela o olhava.
Era escuro, sombrio. Era gelado, mas sempre que a dor vinha mais e mais forte, ele a ouvia rir. Ela ria como se aquilo fosse bom e de tanto a ouvir, ele se viu sorrindo junto a ela quando a dor o atingia.
“Aumente a voltagem” ela dizia, os braços cruzados sobre o peito enquanto seus olhos brilhavam com empolgação.
“Senhora...”
“Aumente” ordenou e como ele esperava, a dor veio ainda mais forte até que sua consciência foi tomada por um momento e a sua frente tudo se desvaneceu.
“Quer ver algo bonito?” Uma voz quase infantil o questionou e para ele, beleza não significava muito, ele nada mais era que uma coisa sem nome, existência ou destino. Para ele beleza era relativo, assim como tudo que rondava sua sela.
“O que é... bonito?” Se viu questionando com a voz embolada demais – muito provavelmente por não falar, nem mesmo quando estava sozinho, afinal... barulho a incomodava.
“É algo que aquece o coração” a voz murmurou “algo como você, algo como seus olhos...”
“Meus olhos... são bonitos?” O rosto de Cameron esquentou e ele nem mesmo sabia o porquê, mas ouvir com tanta ternura que algo nele era mais que “útil” fez uma pequena chama ascender em seu peito.
“Sim... como um lindo par de esmeraldas” ela continuou “então... Cameron, quer ver algo bonito?”
Ele era uma criança sem nome, um nada existente em meio a uma imensidão de nada – mas sua alma gritou ao ouvir aquela voz chamar-lhe de Cameron, como se aquele sempre houvesse sido seu nome, como se estivesse apenas esperando para responde-lo, para envolver-se em seu chamado.
“Sim” ele se viu respondendo sem pensar demais e com um sorriso, sua visão foi tomada outra vez; o teto voltou a ser escuro e gutural. O riso dela ainda ecoava pelo lugar e as vozes dos homens assustados continuavam esbravejando que algo podia estar errado.
Uma lágrima caiu lentamente pelo rosto de Cameron e o sorriso em seus lábios arqueou-se ainda mais.
Os olhos do assassino encheram-se de lágrimas, mas Cameron as espantou lembrando-se do grito de Renriel. Sim, ele não estava mais no subsolo; não era mais uma criança. Seus olhos tornaram-se mais vivos e com um murmurar de palavras antigas, esquecidas até mesmo pelos primeiros – ele se desfez em sombras e surgiu outra vez em frente ao ser que havia apunhalado sua capitã.
“Olá... querido” ele sibilou com os olhos brilhando como os de um felino “acho que temos contas a acertar”
“Não!” Os olhos do outro ser – que assim como ele era um experimento daquele lugar –, arregalaram-se “você...”
Cameron sorriu, um sorriso quase verdadeiro e com um movimento rápido rasgou a garganta do ser a sua frente. O corte era fino, perfeito, limpo como se deveria ser e o sangue manchava agora o ar por tempo o suficiente para que o assassino de olhos de esmeralda pudesse pensar em nuvens manchadas de um sangue sujo e alterado como o seu.
Ele suspirou olhando para baixo com desdém enquanto retornava enfim para o navio. Renriel estava bem – tentou dizer a si mesmo. Ele não se importava tanto assim – tentou se convencer, mas a imagem da capitã caída no chão evoluiu lentamente para uma das cenas que perturbou seus sonhos quando Lucien se foi. O corpo de Renriel estava sendo jogado ao mar com pedras amarradas a ele.
O assassino engoliu em seco e a voz murmurou “você gostaria de ver algo bonito?”
Ele hesitou, como não fazia a muito, muito tempo. Então, ela perguntou outra vez no momento em que ele avistou as velas estreladas de Sírius. “Você gostaria de ver algo... bonito?”
“Sim...” ele respondeu com a voz falha e quase inaudível.
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Duas batidas a porta e o rosto que antes parecia avermelhado se tornou carmim. “Entre” Renriel foi quem disse, rindo enquanto vestia uma nova camisa e Beerin por sua vez guardava de forma desconexa o que havia usado para cuidar dos ferimentos da capitã.
“Disse a Mark que queria me ver” a voz de Lex fez Beerin se surpreender, mas por alguma razão seu peito se sentiu ainda mais leve por não ser Andrea aquele que batia a procura de Renriel.
“Sim, preciso que me faça algo” ela sorriu “mas...” ela virou-se para Beerin e sorriu suavemente outra vez “vou te mostrar, é mais fácil que tentar descrever”
Armas – Beerin soube e se viu rindo baixo. A capitã parecia gostar tanto de armas quanto gostava do mar.
Seus olhos ergueram-se pelo pequeno cômodo onde ficava a caixa de primeiros socorros. Um comodo quase impossível de se perceber caso não se aproximasse o suficiente. Era quase um vão, entre as portas e paredes. Era escondido ali como se preferisse não ser notado e lá, além da caixa verde, havia pequenos frascos com diferentes formatos e tampas. Havia pedras – obviamente mágicas –, e diversos anéis com brilhantes que pareciam tudo, menos joias comuns.
Aquele era um navio pirata – Beerin tentou se recordar. Era comum que houvesse tantas coisas preciosas, mas uma pequena caixa ao fundo, uma caixinha de veludo vermelha chamou sua atenção de forma peculiar.
Distraído com a pequena caixa, o príncipe nem mesmo se deu conta dos passos que vinham em sua direção.
“O que foi?” A voz de Renriel o surpreendeu, mas diferente do esperado, Beerin não teve um sobressalto, apenas a fitou sem jeito, como uma criança que foi pega desejando o brinquedo de outra. “Gostou de algo?” Ela o questionou e antes que ele respondesse, envolveu os braços em torno de seu quadril.
“Não...” Beerin murmurou “apenas... achei aquela caixinha bonita” disse com certo temor. “Tudo aí é mágico?”
Renriel sorriu.
“Grande parte”
Ela estendeu a mão e pegou a pequena caixa de veludo “mas isso aqui... é mais especial”
“Por que?” Ele se viu agora ainda mais curioso, mas a capitã que parecia gostar de tortura-lo, apenas riu aproximando o rosto do dele.
“Quem sabe? Dependendo de suas escolhas, talvez você descubra” ela disse e jogou a pequena caixa para cima.
Beerin tentou alcança-la, mas então Renriel murmurou “Sírius” e a caixa foi engolida por uma nuvem estrelada.
“Maldade...”
Ela sorriu “Eu sou a vilã, docinho, se esqueceu?”
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.•*¨*•.¸¸♪ Sumário♪¸¸.•*¨*•.
Sírius: Um navio pirata lendário – criado pela bruxa, que possuí o céu estrelado em suas velas. Atualmente seu capitão é: Renriel Callan
Elatior: o sobrenome carregado pela família real de Eilir, o terceiro reino do continente de Varandel. A família Elatior foi acusada de experimentos escandalosos após uma tragédia sem precedentes levar a morte de sua filha mais velha e herdeira da família a anos atrás e desde então se especula que muitos desaparecimentos e mortes não explicadas tenha o dedo da família que deveria cuidar e proteger o povo de Eilir.
Eilir: é o terceiro reino do continente de Varandel, banhado pelas águas do 9º mar e 8º mar, portando - assim como Imeril Carmesim -, possuí linhagem de dragões em sua família real. Dragões que governam o mar.
Pedras mágicas: cristais e pedras criados a partir do poder mágico vindo do corpo de um mago, feiticeiro ou bardo. É necessário um grande poder e conhecimento para fabrica-las e um bom domínio de magia para usa-las corretamente ou as pedras serão resumidas a nada após um único uso, sendo útil praticamente como bombas que causam uma imensa explosão.