A Rainha que Brincava com Fogo

Noite na Taverna

Ponto de Vista: Saga

Saí do escritório carregando o pacote, passei no salão onde era servido as refeições apenas para os moradores do palácio. Precisava beliscar algo antes de subir e me vestir.

Peguei um pratinho e coloquei alguns pedaços de queijo e pão. Olhei ao redor e como não vi sinal de Halan, sentei-me para fazer uma refeição rápida. Um servo de prontidão encheu minha taça de vinho e perguntou se desejava algo mais, dispensei-o.

Quando coloquei o primeiro pedaço de queijo na boca, Halan apareceu sorridente vindo de um dos corredores. Fez uma reverência para mim e pegou um prato para jantar também.

_ Bonito colar. _ elogiou de forma brincalhona percebendo que estava usando o seu presente.

_ Quem me deu tem bom gosto. _ retruquei um pouco tímida.

_ Tem um gosto excelente mesmo. _ concordou o príncipe encarando-me.

_ Como foi seu dia? _ perguntei lembrando que corri dele o dia todo.

_ Solitário. _ respondeu ele. _ Senti que tem pessoas nesse palácio me evitando

_ Deve ser pessoas que trabalham demais. _ completei.

_ Vai comer apenas isso? _ perguntou Halan olhando para meu prato.

_ Vou comer direito mais tarde com Lara. _pontuei.

_ Programa de meninas? _ perguntou ele sondando-me.

_ Sim! Na cidade. _ respondi mastigando mais rápido.

_ Um pouco tarde para ir a cidade, não? _perguntou o príncipe com preocupação.

_ É esse horário mesmo que desejamos. _ respondi tentando encerrar o assunto.

_ Se eu aparecer com um amigo vira programa de casal? _perguntou ele sarcasticamente.

_ Não! _ respondi energicamente.

_ Onde vocês vão? _ perguntou Halan.

_ Programa de meninas. _ falei já me levantando e saindo da sala.

Encontrei Nicholas, vestido para o turno da noite, entrando no salão. Ordenei que vestisse roupas livres de tempo de folga, que usa fora do palácio, e me encontrasse na praça de saída, apenas ele.

Halan não conseguiria ouvir nossa conversa, mesmo se tentasse, porque falei baixo e estávamos um pouco longe. Subi as escadas em direção ao meu quarto com guardas me cumprimentando no caminho.

Abri o pacote e o vestido dentro era bem simples, um vestido marrom de mangas, com um cordão para amarrar na cintura. A parte do bu$to tinha botões de sementes redondas. Suas mangas tinham a borda virada para cima e uma capa completava o visual. Dentro também tinha uma sapatilha, que parecia ter sido feita por uma pessoa de baixa visão.

O tecido era grosso e m@l acabado, desconfortável na pele. Mas o mais desconfortável era andar sem roupas íntimas. Não entendia o motivo de não poder usar, já que as peças não seriam vistas com esse vestido.

O vestido ia até os joelhos, mas esses ficavam de fora quando eu sentava, como minhas pernas eram grossas, não daria para ver minhas partes íntimas. Mas só o medo de ser vista sem a peça, já me causava uma ansiedade incomum.

Coloquei uma liga na perna e sustentei um punhal, não poderia levar minha espada, mas de alguma forma teria que me defender caso fosse necessário.

Saí do quarto e os soldados me olharam com curiosidade, mas não comentaram nada na minha frente. Desci as escadas cumprimentando outros guardas até chegar na praça principal onde Nicholas já estava esperando.

_ Onde iremos, majestade? _perguntou Nicholas observando minhas roupas.

_ A cidade. _ respondi com receio que ele alertasse alguém.

_ Não acho prudente fazer sua escolta sozinho. _ disse Nico em alerta.

_ Hoje não estou indo de rainha, apenas de súdita. _ falei levantando curiosidade.

_ Vão te reconhecer, minha senhora. _ avisou Nico.

_ É só você não me chamar nem de senhora e nem de majestade. _ orientei.

_ Certo, majestade. _ concordou com deboche.

Olhei pelo canto do olho para Nicholas, ele estava usando calças grossas, o tecido parecido com o do meu vestido. Camisa branca de botões de sementes e uma bota desgastada. Sua espada ia em um suporte ao lado da perna, pendurada em sua cintura e não nas costas como era seu costume.

_ Estamos esperando o que? _perguntou ele olhando para a grandiosa porta.

_ Uma amiga. _ respondi e vi Nicholas engolir seco.

Lara estava na porta olhando para ele, parecia chocada, mas logo se recuperou. Ela estava vestindo um vestido cinza que cobria até seus joelhos, mas os tornozelos estavam de fora. Meias grossas com sapatilhas de costura irregular iguais as minhas.

_ O cocheiro está esperando, vamos. _ disse ela se aproximando da gente.

_ Nada de reverências nem pronomes. _ reforcei minha ordem.

_ Certo! _ concordou Lara, mas Nicholas apenas assentiu com a cabeça.

O cocheiro era um homem velho, estava do lado de fora com uma carroça aberta e dois cavalos. Lara entregou a ele algo embrulhado em um pano velho, o homem desembrulhou conferindo o pão redondo, logo depois fechou colocando em sua sacola.

_ Deve ser bom trabalhar no palácio, ter acesso a comidas de luxo. _ comentou o senhor rindo.

_ Sempre sobra comida, os ricos não comem muito. _ revelou Lara rindo e fazendo o homem gargalhar

_ Minha filha caçula ia amar trabalhar na cozinha, ela gosta de comida bonita, sabe. _ continuou o homem. _ Meu filho mais velho gastou muitas moedas para comprar um bolinho confeitado, até hoje ela lembra.

_ Quantos anos ela tem? _ perguntou Lara.

_ Ela tem dez anos, é uma menina muito inteligente. _ respondeu o senhor com carinho.

_ Eu creio que tem uma vaga na cozinha, ouvi uma empregada comentando, mande sua filha na segunda pela manhã. _ falei com o senhor.

_ Tem mesmo, moça? _ perguntou o homem pra mim.

_ Tem, só não sei o horário de trabalho. _ respondi.

_ Ela trabalha qualquer hora, moça. Segunda ela vai estar na porta do palácio para tentar essa vaga. _ disse o homem feliz, fazendo Lara olhar para mim rindo.

_ Vá mais rápido. Temos que voltar antes do café da manhã. _ ordenou Lara.

O homem atiçou os cavalos e eu quase caí da carroça, mas Nicholas segurou meu braço. Já tinha montado em cavalos durante batalhas, mas nunca tinha andado em um objeto estranho como esse. Por isso levavam comidas e mudanças.

_ Parece até que nunca andou de carroça, Sara. _ brincou Lara inventando um nome para mim, mas não foi muito criativa.

O senhor deixou a gente na primeira praça da cidade, próximo do convento e do templo do Deus dragão. Senti que ele estava me julgando quando passei pela frente das construções.

_ As plebeias não usam calcinha? _ perguntei sussurrando para Lara, mas pelo rubor de Nico era provável que ele tivesse ouvido.

_ Algumas sim, mas para a experiência ser completa, é melhor não usar. _ respondeu Lara rindo.

Nicholas se mexia incomodado atrás da gente, provavelmente estava pensando que era uma péssima ideia. Caminhamos em direção a uma taverna conhecida por Lara e Nico, com o barulho nos guiando por uma parte do caminho.

Por fora tinha janelas altas e estreitas, era feita de alvenaria com um telhado de madeira. Os gritos, risadas e cantoria eram escutados de longe.

Entramos e vimos duas lareiras grandes iluminando o ambiente, além de velas e pó de fadas engarrafados. Homens e mulheres, mas muito mais homens, se divertiam e brigavam no lugar.

Escolhemos uma mesa e sentamos. Eu nunca pude observar uma cena como aquela, nem em acampamentos de batalhas era dessa forma. Era uma bagunça de suor e barulho, por vezes uma taverneira musculosa entrava e fazia alguns homens se acalmarem. Eu estava me divertindo analisando o comportamento das pessoas.

_ Vão querer o que? _ perguntou outra taverneira mais arrumada.

_ Vodka de fada. _ respondeu Lara rindo fazendo Nicholas encarrancar.

_ Para todos? _ perguntou a mulher.

_ Não vou beber essa noite. _ respondeu Nicholas m@l humorado.

_ Beberemos por ele, pode trazer quatro. _ ordenou Lara para a mulher já saíndo.

Um homem esmurrou outro que foi parar perto do meu pé, o homem caído levantou-se rapidamente e se jogou em cima do outro quebrando uma mesa.

_ Esses são seus súditos quando você não está olhando. _ disse Lara para mim gargalhando. _ Bem-vinda a plebe.

As vodkas chegaram e Lara virou uma me incentivando a virar também, mas ainda estava analisando o pó verde brilhante que flutuava na bebida.

Uma mão grande arrebatou a bebida de mim e virou em sua boca. Halan sentou-se do meu lado com roupas parecidas com a que Nicholas estava usando. Ele nos entregou.