Capítulo 1
Salvio
Nascido e criado no interior, aprendi desde menino o meu verdadeiro lugar nesse imenso mundão de Deus, ora bolas, quem tem o privilégio de se sentir assim hoje em dia? Poucos, com certeza.
Sou abençoado ao despertar todos os dias no calor da alvorada, ao respirar o ar dessa terra sagrada.
Sou apaixonado pela vida que tenho, mesmo seguindo essa longa estrada de certa forma sozinho, pois sou companheiro de um amigo de quatro patas, usa ferradura, mas não me dá coice, ele é calminho, diferente do seu amigo aqui. Sou esquentado por natureza.
Agora estou a contemplar um dos meus grandes e eternos momentos mágicos, sei que dessa vez será brabeira, o cavalo trovão quase aleijou um colega meu da arena.
Mesmo com essa fama de arisco, brabo, indomável, nós os peões não desistimos de conquistar o cinturão de ouro, o embrema é cravado, lapidado com a imagem do próprio trovão. Será uma honra tê-lo.
A multidão das arquibancadas vão a loucura vendo esses homens tentarem ficar pelo menos 2 minutos montados numa variedade de diversos e estilosos cavalos. Nenhum destes era o meu trovão, ele foi reservado somente pra mim nessa noite, por isso que digo que hoje é o meu dia, sinto o gosto delicioso da vitória.
Tenho que ficar sobre essa fera casca grossa por pelo menos 5 minutos. Seu tempo foi alargado devido sua fama, o danado é mais famoso que eu nessa arena.
Enquanto espero na fila junto com os demais do ramo dou uma boa olhada no povo agitado da frente, do outro lado. Nós estamos localizado entre uma das arquibancadas de madeira, e longas tábuas nos separa deles, mas na parte de cima é descoberta, então algumas crianças dão tchauzinho, damas ousadas jogam beijinhos, é uma loucura inacreditável.
Sou bastante paquerado antes de entrar, dá o meu show, na saída umas até me esperam ansiosas pra sair comigo, no entanto não gosto de usar a fama no intuito de conseguir uma mulher. Detalhe, nunca fui mulherengo, por coincidência ou não jamais me interessei o suficiente para querer enlaçar uma potranca selvagem na cama e fazê-la... hum... minha pra sempre.
O companheiro de arena foi convocado pelo locutor, sua voz estridente, potente, chegava a quilômetros de distância, sua emoção era contagiante.
Seu cavalo foi selecionado mais adiante, longe das pessoas por ser arriscado.
Damos um salvo de palmas pela sua coragem enquanto o mesmo agradece seguindo seu destino.
Sou o próximo da fila, ansioso, esperei um ano por essa oportunidade. Trovão tem a agenda cheia. Hahaha... é mole!
Lá vai ele...monta, galopa, trota e quando vai finalizar andando em volta, em círculos, o cavalo tenta derrubá-lo, faz carinho no amigo criando algum tipo de laço, mesmo que provisório e então o peão consegue executar completando os minutos do seu desafio.
Agora sou eu!
__ Agora daremos um salvo de palmas, pra ele, todos vocês conhecem sua fama nas arenas de Sant' Rause eu falo dele! Vamos entoar seu nome povo lindo!
__ Sálvioooooooo!!!!!!
Em meio a essa comoção corro em direção ao meu destino...
No caminho recebo além das palmas, sou aclamado de pé, com rosas vermelhas jogadas sobre a minha pessoa. Sou ou não sou importante?
Ao passar pelas arquibancadas, paro num lugar estratégico, vendo a equipe preparar o trovão que relincha sem parar, isso é rabugice? Estresse ou simplesmente agitação afim de querer quebrar o meu pescoço?
No entanto, só conseguia ver a sua beleza animal selvagem.
Ele é um lindo cavalo. Sua clina n***a brilhosa irradiava um tom espelhado, os pulsos das suas pastas eram cobertas por uma penugem branca feito algodão. Estou fascinado. Sua beleza é majestosa e gritante. Num segundo seus olhos igualmente negros da cor do seu corpo macio cravou-se nos meus, o encarei sem medo, pedindo, rezando mentalmente para aceitar sem resistência em deixar montá-lo... aos poucos foi se acalmando, facilitando o trabalho dos rapazes em prepará-lo.
Em fim, já no posto, subi na escadinha, antes de sentar nele me agachei tocando a grade, nessa posição fiquei na altura das suas orelhas, cochichei em seu ouvido uma palavra em latim. Em seguida o montei.
Conferi a cela, as rédeas, os estribos, e todos os apetrechos de segurança. Dei o meu ok.
A portinha foi aberta... caminhamos juntos como se fossemos um só, ele trotando elegantemente fazendo o público se desmanchar em alegria.
__ Isso garoto... todas ti amam trovão. _ Disse alisando sua clina.
Transmitindo confiança, mansidão. O animal sentia todas as emoções de quem o domava, portanto permaneci calmo. Fazemos a nossa apresentação, dei um olá ao público, nesse instante ao ouvi a gritaria, moças jogando objetos, cartas, flores, dentro da arena, ele se empinou todo, exibindo as patas dianteiras.
O locutor relatou que o Trovão dizia o seu "Olá" a eles.
Segurei firme nas rédias, enquanto fazia a sua entrada... roubando minha cena!
__ Exibido... _ Sou respondido num som parecido com uma risadinha.
Fiquei impressionado. Nós nos entendemos muito bem. Somos um só corpo agora, fazíamos parte um do outro, isso duraria exatamente 5 minutos, contudo, senti um afeto gigantesco por ele. Talvez fosse impressão minha, e fosse apenas parte do show, agrada o mesmo alvo; o público.
Depois disso se abaixou, dei dois toques sutis nele indicando as voltas, fizemos a primeira calmamente... meus olhos até então estavam cravados nele, mas eu desvie eles querendo mirar o povo saudoso, foi nessas voltas em círculos que há vi; a estonteante morena sorridente, a única sentada em meio a multidão fitando-me intensamente. Entre os percursos giratórios a perdi de vista, busquei desesperadamente esse específico par de olhos negros em meio a toda essa gente, não achei, ficando nervoso, meus olhos buscavam ansiosamente pela dama da jaqueta preta. Em meio a esse tumulto que persistia batendo freneticamente em meu peito, trovão terminou a façanha sem me derrubar, entretanto havia despejado nele todo o meu nervosismo no processo final, fazendo-o freia bruscamente, relinchou bruto, empinando, jogando fortemente seu pesado corpo pra trás... por causa das mãos suadas escorreguei das rédeas, fazendo-me cair de cabeça no chão de areia. Senti a pancada, trovão agitado quase me pisoteando, os homens da arena invadiram correndo tentando tirá-lo as pressas de perto, antes de admitir que a pancada foi feia e perder os sentidos vejo-a do nada pairando o seu belo rosto sobre o meu, encontro forças para falar:
__ Sua culpa... _ Ela arqueia a sobrancelha sem entender nada.
Desmaio sonhando com a Deusa morena dos lábios carnudos.