Capítulo III

1984 Words
Daniel mantinha sua expressão neutra, enquanto observava os outros homens ali, mas por dentro seu coração estava acelerado e suas mãos que se mantinham entrelaçadas uma à outra em seu colo, estavam frias e suadas. -Já que é você quem está indicando, acho que ele pode trabalhar aqui, mas primeiro vamos ter que checar, sabe como é-O de cabelos vermelhos falou dando de ombros-Mas seu nome é realmente Dan ou é só um apelido?-Perguntou diretamente para si. -É só um apelido-Falou tentando manter a expressão neutra no rosto. -E qual o seu nome de verdade? -Daniel Neri-Daniel foi autorizado a revelar seu verdadeiro nome, como Bernardo lhe disse no dia que lhe conheceu, todos os seus dados foram apagados do sistema do departamento de polícia. Não havia riscos de dar seu nome verdadeiro, pois quando tudo aquilo acabasse ele seria mudado e com sorte Daniel estaria bem longe dali. Sabia que assim que desse seu nome logo iriam pesquisar sobre si, assim como fez com eles, porém o máximo que encontrariam sobre Daniel é que ele havia se formado em ciências sociais, mas não seguiu nenhuma carreira relacionada a isso, informação que foi alterada em sua "ficha" pela polícia, encontrariam também que já foi preso por alguns roubos, outra mentira, nunca foi preso, além é claro de uma verdade que poderia lhe ajudar a ganhar a confiança lá dentro, ou não, de que era filho de um líder de uma gangue "extinta". As informações sobre si que importavam de verdade, informações que nenhum m****o daquela gangue poderia saber, estavam seguras. Também haviam algumas informações que nem a própria polícia poderia saber e essas Daniel faria questão de guardá-las ele mesmo a sete chaves. -Belo nome, mas de onde vem Dan?-Aquele cara parecia realmente interessado em si, isso era uma vantagem certo? -Não é nada especial, minha mãe sempre me chamou assim então resolvi manter-Deu de ombros como se não fosse nada demais, aquela era outra verdade, sua mãe realmente havia lhe dado aquele apelido. -Que fofinho-O mais alto entre os três falou em um tom claro de sarcasmo-Temos um filhinho da mamãe aqui, mas então Dan, a quanto tempo conhece o Miguel? -Nós nos conhecemos ano passado em um bar, eu trabalhava como garçom em uma boate em outra cidade, ele foi lá curtir e nós acabamos curtindo juntos sabe?-Daniel falou dando de ombros, poderia ser constrangedor para alguém falar aquilo, mas ele realmente não se importava muito com esse tipo de coisa, estava trabalhando. -Sei, mas vocês são só amigos agora ou… -Só amigos cara, você sabe que não me apego a ninguém, mas de vez em quando temos umas recaídas, não é Dan?-Miguel falou piscando para Daniel que apenas riu-A bundinha desse cara é bonita demais pra se ver apenas uma vez. Certo. Talvez fosse um pouco constrangedor sim. Miguel havia lhe dito que ninguém ali se importava muito com a sexualidade de quem quer que fosse e isso deixou Daniel um pouco mais aliviado, pelo menos não teria que lidar com aquele tipo de problema. Quando descobriram, na gangue de seu pai, que era gay, não foi muito… agradável, para dizer o mínimo. -Interessante-O mais alto entre os três falou-Mas escuta garoto, não pense que só porque é amigo do Miguel vamos te dar moleza se realmente te aceitarmos aqui entendeu?-Preferiu apenas assentir sobre o olhar sério do outro-Ótimo, meu nome é Ian, esses outros dois aqui são o Pietro e o Levi. Pietro, era o homem que estava calado desde que ele e Miguel se aproximaram, o homem tinha olhos castanhos assim como seus cabelos e também era quem mais estava lhe incomodando ali. Aquele cara não parava de lhe encarar, parecia até que estava desconfiado de algo, não, ele não podia desconfiar, Daniel deu um pequeno sorriso em direção a Pietro e este apenas desviou o olhar de si sem devolver o gesto ou demonstrar qualquer coisa, apenas voltou a beber sua bebida como se não desse a mínima para o que estava acontecendo ao seu redor, bom… pelo menos ele não estava mais lhe encarando. -E aquele ali é o Lorenzo-Ian apontou para um outro homem que havia acabado de chegar e estava se aproximando deles, Lorenzo tinha uma certa semelhança com Pietro que não poderia passar despercebida, os mesmos olhos castanhos só que seu cabelo era um pouco mais claro em um tom quase acobreado, essa semelhança não era para menos, afinal ambos eram irmãos. -Nós somos os líderes aqui-Levi falou com um sorrisinho convencido. "Eu sei, por isso vou ter que mentir para vocês" Daniel pensou enquanto encarava os outros três. Estava difícil para o Neri manter o foco, aquele lugar lhe trazia lembranças, era tão familiar, Daniel odiava se sentir vulnerável, porém era dessa forma que se sentia naquele lugar, sempre soube fingir muito bem todos os dias, sempre soube ocultar o que realmente sentia, tinha uma espécie de escudo, se não se lembrava, não lhe afetava, mas estava se lembrando e aquilo estava lhe afetando, era algo que não podia acontecer, Daniel sabia muito bem fingir até para si mesmo e era isso que precisava fazer agora, fingir. Daniel ficou mais um tempo ali conversando com aqueles homens enquanto contava mais algumas mentiras sobre sua vida, Pietro não abriu a boca em nenhum momento, apenas observava tudo calado, já Lorenzo lhe dirigiu algumas poucas palavras e não demorou muito para ir embora dali. Foi bom Miguel ter lhe dito um pouco sobre si antes de chegarem ali, eles realmente perguntaram algumas coisas para confirmar que os dois se conheciam, afinal não podiam abaixar a guarda, haviam muitas pessoas que adorariam derrubar aquela gangue, Daniel era uma delas, mas eles não precisavam saber disso. O pequeno "interrogatório" pareceu ter terminado quando Ian recebeu uma ligação, o homem se afastou do grupo e falou por alguns minutos no telefone e depois que a chamada se encerrou Ian disse apenas um "Ok" e eles finalmente aceitaram de fato lhe contratar, provavelmente depois que deu seu nome a eles logo mandaram procurar informações a seu respeito para ver se era alguém realmente confiável, bom, não era, mas era ótimo que pensassem que sim. -Certo, pode começar amanhã a noite, não se atrase-Ian falou para si assim que guardou o celular. -Tudo bem, obrigado-Daniel sorriu tentando parecer o mais contente possível com aquilo. -Bom, se já acabou de interrogá-lo, acho que já posso levá-lo pra casa-Miguel falou se levantando e vendo o Neri fazer o mesmo logo em seguida. -Deixa de ser chato Miguel-Levi falou indo na direção deles e passando um de seus braços ao redor do ombro de Daniel-Aposto que o Dan adoraria se divertir um pouquinho com a gente-Falou sustentando aquele lindo sorriso no rosto e por um momento Daniel se pegou distraído enquanto olhava para o outro, mas logo tratou de deixar isso de lado, Levi era lindo, mas tinha que ter foco. -Na verdade eu estou um pouco cansado-O Neri mentiu enquanto olhava um pouco sem graça para o homem ao seu lado. -Que pena, quem sabe na próxima então-O outro falou depositando um beijo na bochecha do Neri o deixando completamente envergonhado. Aparentemente, Levi era muito espontâneo. E então algo que não estava esperando aconteceu, Pietro levantou e veio em sua direção em passos lentos e com uma expressão calma em seu rosto, parecia que ele iria apenas lhe dar tchau, mas de repente o mesmo puxou uma arma e apontou para sua testa. -Eu não confio nenhum pouco em estranhos-Falou deixando o cano da arma rente ao rosto de Daniel. -Ei Pietro, pega leve cara-Miguel falou um pouco nervoso, sabia que deveriam ter um cuidado maior com Pietro, ele era o mais difícil de se lidar ali-O Dan é meu amigo, não um estranho qualquer. Daniel não se moveu, continuou encarando os olhos castanhos do mais alto, ele não esboçava nenhuma reação, não é como se já não tivessem apontado uma arma para si. Aquilo já havia acontecido mais vezes do que gostaria. Então ele apenas ficou ali, sem demonstrar nenhum sentimento sequer por fora enquanto por dentro estava a ponto de surtar, sua mente o bombardeava de lembranças ruins e isso nunca o levava a um bom lugar. -Quem me garante que ele não é mais um infiltrado da polícia?-Pietro falou sustentado o olhar do Neri. -Você acha mesmo que eu traria um infiltrado pra cá?-Miguel falou em um tom sério tentando passar confiança em suas palavras-Pensei que confiassem em mim-Fingiu estar ofendido enquanto tentava contornar a situação. -Quer mesmo que eu te responda Miguel? Algumas pessoas ao redor começaram a reparar na cena, a cada segundo que se passava Miguel ficava ainda mais nervoso, sabia que ninguém iria intervir, ninguém se atrevia a enfrentar Pietro. Então sem que ninguém esperasse, Daniel segurou o cano da arma com força e encostou sua testa na ponta do mesmo. -Não posso fazer nada se não confia em mim, mas posso garantir que não vai conseguir nada só apontando uma arma para minha cabeça, então se quiser apenas atire de uma vez-O Neri falou friamente sem desviar seu olhar dos olhos do mais alto. Daniel manteve a expressão séria no rosto mesmo estando nervoso, sabia que não deveria desafiar alguém que estava com uma arma apontada para si a atirar, mas acabou agindo por impulso, algo que sabia que não deveria fazer naquele trabalho e depois de alguns segundos Pietro abaixou a arma guardando-a novamente. -Posso não conseguir nada apontando uma arma para você, mas cometa qualquer deslize e posso garantir que não exitarei em atirar-Pietro falou mantendo o tom sério que usou durante toda a situação. -Chega de assustar o garoto Pietro-Levi falou puxando o outro de volta para o sofá, ele continuava sorrindo como se tentasse amenizar a situação. -Desculpe por isso Daniel, o Pietro é um pouco exagerado, enfim, até amanhã-Ian falou acenando em sua direção. -Tudo bem, eu entendo, até amanhã. Depois daquela cena, Miguel o levou de volta para o apartamento e assim que chegou Daniel ligou para um dos policiais que Bernardo disse que lhe daria todas as informações que precisasse durante aquele trabalho e pediu a ficha de Miguel, queria saber o tipo de influência que ele tinha naquele lugar. Depois disso o Neri foi tomar um banho, uma das coisas que mais gostou naquele apartamento novo foi a banheira, sim tinha uma banheira, a preparou com sais de banho de aromas agradáveis, queria relaxar, mas a única coisa que conseguiu fazer quando entrou dentro daquela banheira foi abraçar suas pernas e chorar como uma criança. Suas mãos tremiam e sua respiração se tornava mais pesada a cada instante, seus soluços eram altos e o frio que sentia tornava tudo ainda mais familiar, era como se fosse o mesmo Daniel de anos atrás encolhido em algum canto do seu quarto enquanto chorava sozinho e isso era uma merda, pois odiava aquele Daniel. Achava uma merda ser tão frágil, odiava aquilo, às vezes conseguia acreditar no personagem que inventou para tornar sua vida mais fácil, mas às vezes não, às vezes não conseguia ser o Daniel Neri que não se lembrava do passado r**m, o Daniel Neri que apenas tinha pesadelos e não lembranças, o Daniel Neri que saia para beber todos os finais de semana para esfriar a cabeça, o Daniel Neri que era forte o suficiente para afastar todos ao seu redor sem se sentir sozinho, sem se sentir vazio. As vezes ele voltava a ser o Daniel Neri fraco, que sempre chorava quando estava sozinho, que abaixava suas barreiras e perdia sua pose que antes era capaz de fazer qualquer um acreditar que realmente não se importava com nada, mas se importava, se importava muito, às vezes ele só precisava que alguém lhe abraçasse e dissesse que ficaria tudo bem, dissesse que nada do que tinha acontecido foi sua culpa. Alguém que o fizesse esquecer.
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