12 - Tragédia

1058 Words
No dia seguinte, mais uma vez, tive um delicioso café da manhã. É claro que eu ainda não acreditava em nada daquilo. Pensava que eu só poderia estar presa em um desses sonhos intermináveis. E, cada vez que pensava assim, a criança em meu ventre se mexia. Me mostrando que ela realmente estava ali. Rapidamente a manhã passou e o almoço chegou. Enquanto esperava, ajudei Conceição nos afazeres domésticos. Ela dizia que limpar a casa era como limpar a alma. Quanto mais a gente caprichava, mais limpa ficaria nossa casa interior. Enquanto isso, eu ia ouvindo as histórias que Conceição me contava. De anos atrás. Histórias sobre Jesus Cristo e sobre Deus. Eu sempre tive fé, mas nunca havia ouvido histórias que me dessem tanta paz assim. Apenas por saber que eles existiam. Uma dessas histórias era a respeito da ressurreição de Jesus. Conceição dizia que Jesus sempre anda entre os homens. É claro que ninguém nunca o vê ou reconhece. _ Mentira! - Ela disse. - Nunca não. Pois, às vezes, algumas crianças o percebem. _ Isso por causa de sua pureza? _ Não! A alma que está ali, tem muitas vidas. Então ela não é pura. É por causa da inocência delas. A criança, independente do espírito que habita nela, é inocente. Ela não entende o que faz ou o que já fez. E seus olhos ainda são inocentes para o mundo. Não é atoa que Jesus nos pede para sermos pequeninos. Pois, os pequeninos possuem uma inocência única. Eu ouvia suas palavras e sentia uma imensa paz. Era tão bom saber que sempre tem alguém que nos ama e cuida de nós. Não me sentia mais tão sozinha. Mas tão rápido a manhã se passou, que não percebi que Conceição estava me enrolando ali. Eu ainda não havia ido até a floresta depois do que vi. Não sei porque, afinal, ela já havia me explicado que eu precisava aprender a perdoar. E o que eu veria ali me ensinaria isso. Então resolvi ir até a floresta sozinha. Eu precisava terminar logo essa lição. Queria voltar para casa, para junto do meu marido. A impaciência quando se trata de algo para mim, era uma característica forte em minha personalidade. Eu nunca costumava ter muita paciência quando era comigo. Para com meus pacientes ou outras pessoas, eu tinha até sobrando. O que sempre achei estranho. Mas, como dizem, eu era aquele tipo de pessoa que todos chamam de "imediatista". Ou faz tudo agora e de uma vez, ou é melhor nem fazer. Quando estava quase no lugar que eu costumava ir e ver a menina, Conceição me puxou pela mão. _ O que vai ver aqui, vai precisar de mim ao seu lado! Tente manter sua mente calma e apenas observar. _ Por que estava me enrolando para vir? É tão grave assim o que eu vou ver? _ Você ainda não entendeu o que está vendo? São cenas de uma outra vida sua. De alguma forma, Deus permitiu que você soubesse que existiu uma outra vida e que as pessoas que hoje estão com você, também fizeram parte dela. Eu não queria deixar você vir até aqui por isso. Não queria que descobrisse tão rapidamente quem são as pessoas que convivem com você. Não sem antes aprender lições que irá precisar para continuar sua convivência com elas. _ Mas eu não entendo! Por que Deus está me deixando ver isso se vai me fazer tão m*l? _ Pelo contrário, menina! Isso já te faz m*l! Aprender e conhecer o que está por trás vai te ajudar nessa vida a passar por tudo que precisa para ser feliz. Conceição tinha razão. Mais uma vez ela estava certa sobre tudo. Eu nunca entendi a birra dos meus sogros comigo. Muito menos a da minha mãe com Pedro. No centro de tudo isso, estavam os meus sonhos atrapalhando o meu casamento. E, se Conceição estiver certa sobre o fato da minha vida passada, então Pedro foi meu pai. Por isso eu tinha tanta aversão a ter relação com ele. Mas eu o amo demais. Assim como a menina ama o pai. _ Vá! Eu não posso impedir você. Apenas me dê sua mão para saber que eu estou lá com você. Eu peguei a mão de Conceição e dei mais um passo. Nesse único passo eu consegui ouvir um grito. Procurei de onde estava vindo, mas não encontrei nada. Ouvi mais gritos. Pareciam a voz da menina dos meus sonhos. Corri na direção da casa dela. Mas esses gritos vinham da casa atrás do córrego. A casa amarela. Segui até ela. Um sentimento de aperto no peito me dava uma sensação de peso. Quanto mais próxima eu chegava, pior era o sentimento. Andei por detrás da casinha me apoiando nas paredes. Água corriam entre a casinha e uma espécie de garagem velha de madeira. Escura e fria. Quando me aproximei da porta, vi sangue escorrendo pelo chão. Coloquei minha mão esquerda nela para abrir. Mas não tinha forças para isso. Alguns minutos se passaram até que eu finalmente criei forças mentais e empurrei a porta de madeira. E lá estava a menina. Deitada no chão sujo daquele lugar. O cheiro forte de sangue. A sombra que eu vi estava parada do outro lado. Parecia ser um homem. Ele estava vestindo suas calças. O vestido que antes era azul claro, estava manchado. A menina mais parecia morta que viva. Ela permaneceu ali no chão por mais algum tempo. O homem não ficou ali. Ele pegou suas coisas e sumiu levando seu cavalo. A menina se levantou, quase sem forças. O sangue ainda escorrendo por suas pernas. Ela não devia ter mais que dez anos agora. Nem sei como ela estava viva. Pela quantidade de sangue, ele devia estar com ela por um bom tempo. Ela cambaleou de volta até sua casa. m*l conseguiu chegar até a porta e caiu no chão. Sem entrar. O barulho chamou a atenção de seu pai, que já havia chegado. A expressão de horror no rosto do homem ao ver a filha naquele estado ficou em minha mente. Eu só conseguia imaginar seu sentimento de raiva. Estava tão fortemente perdida nessas cenas até que senti o aperto forte das mãos de Conceição. Ela me trouxe de volta. Eu só consegui sentar no chão da floresta.
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