Como eu já imaginava foi um verdadeiro inferno. Todos olhando pra mim, uns com raiva, outros com nojo, mas nenhum deles estava feliz com minha presença ali. Eles deram os pêsames para minha mãe, que estava do meu lado, mas ninguém se importou com a minha dor. O ar estava pesado naquele lugar, eu já estava me sentindo sufocada ali, eu só queria sair o mais longe possível de todas aquelas pessoas.
Eu fiquei realmente impressionada, tudo na cidade está muito bom, tem tudo aqui. Antes m*l tinha supermercados e mesmo assim estava caindo aos pedaços, hoje não, hoje tem tudo que uma cidade grande tem, tem prédios de escritórios, auto escolas, agência bancária, até uma agência de modelos tem aqui, quando eu estou passando na porta de um prédio uma garota, uma menina muito bonita esbarra em mim.
—Me desculpa moça —ela olha pra mim e seus olhinhos verdes brilham, ela é realmente linda —Nossa, moça você é tão bonita! —Ela fala olhando pra mim.
—Muito obrigada, princesa, você também é muito linda. —falo enquanto acaricio a cabeça dela.
—Amanda, deixa a moça seguir o caminho dela, meu amor. —Meu coração quase sai pela boca quando ouço a voz da Nora atrás de mim. Se essa garotinha é filha dela então também e filha do Bruno.
—Oi Nora, quanto tempo. —Eu me viro pra ela, que me olha com um certo nojo. Ela também ficou com raiva de mim? Deveria me agradecer, foi só porque eu fui embora que ela pôde ficar com o Bruno.
—Oi Mikaela, meus sentimentos. —Fala seca.
—Você conhece a moça bonita mamãe? —A pequena fala olhando pra mim.
—Sim, a mamãe conhece ela, meu amor.—Ela pega a mão da menina e tira ela de perto de mim, ela age como se eu tivesse uma doença contagiosa. — Diz tchau para a moça, pra gente ir pra casa.
—Tchau moça bonita, você parece uma princesa da tv. —Ela fala sorrindo.
—Obrigada, você é uma linda princesinha. —Digo acenando pra ela.
Assim que eu falo a Nora leva a menina embora. Eu fico olhando ela entrar no carro, é um belo carro, uma BMW último modelo rsrs, a Nora nunca foi exibicionista, até hoje ela ainda mantém a pose. Ela está tão bonita, tão confiante, nem parece a Nora de autoestima baixa de anos atrás.
Eu continuo andando e cada esquina que eu viro é uma surpresa nova, essa cidade tá demais, tudo é muito novo, os carros nas ruas são todos de anos mais recentes, aquelas latas velhas, pessoas m*l vestidas, casas caindo aos pedaços nada disso existe mais.
Eu andei por horas pela cidade, as pessoas que não me reconheceram ou que chegaram aqui depois da minha confusão até que sorriram pra mim, mas os que sabiam quem eu sou me fuzilaram com os olhos. Eu perdi completamente a noção do tempo, quando dei por mim eu já estava no lugar onde o circo que vinha de vez em quando na cidade era montado. Agora é uma bela praça, tem um chafariz, várias mesas com bancos, balanços, e o mais bonito são os ipês, tem branco, roxo, amarelo, deixam tudo lindo e colorido. Eu me sentei no balanço perto de um deles e fiquei olhando as flores voando com o vento, acho que essa é a lembrança que eu quero guardar daqui.
—Aqui ficou bonito, né! —Ouço uma pessoa falando atrás de mim.
—Oi? —Eu falo e olho a pessoa tentando saber quem é.
—Eu sou o Charles, lembra de mim? Charles Louis, um nerde de óculos fundo de garrafa da escola?
—Eu não acredito, caramba! Você está um gato, cara, o tempo foi muito generoso com você. —Falo enquanto olho pra ele de cima a baixo.
O Charles era meu amigo, na verdade ele sempre me ajudava nos trabalhos da escola, todos diziam que ele gostava de mim porque sempre fazia meus trabalhos e também me ajudava nas provas. Ele se mudou da cidade quando conseguiu passar em primeiro lugar para cursar biologia molecular na Universidade de São Paulo. Ele era um nerde de óculos, era, porque agora ele é um cara muito bonito, está forte e muito bem arrumado.
—Já você, não mudou muito, só está mais magra e com os cabelos mais curtos, eu nunca pensei que você, que adorava aquele cabelão iria cortar algum dia, mas mesmo assim você continua muito linda, ou melhor está ainda mais linda hoje. —Diz com um belo sorriso.
—É, eu resolvi mudar um pouco —dou um sorriso. Ele se senta no balanço ao lado do meu e nós ficamos conversando um tempo.
Eu fiquei feliz de ter encontrado alguém que não seja minha mãe para conversar.
—Sua volta agitou a cidade. —Ele fala com um sorriso.
—Agitou é? Isso quer dizer que eu sou famosa por aqui ainda? —Faço uma careta divertida.
—É, você é a mais famosa por aqui ainda. Ninguém fugiu do casamento deixando o noivo com cara de i****a depois de você. — Ele fala rindo.
—Foi uma escolha muito i****a, eu não deveria ter feito aquilo. Se eu tivesse me casado teria evitado tanto sofrimento.
—Seu e dele, né! As pessoas aqui acham que apenas o Bruno e seus pais sofreram, mas eu tenho certeza que você sofreu muito também. —Eu olho no rosto dele e dá pra vê até um pouco de pena nos seus olhos.
—Você não imagina o tanto. Eu sei que a maioria, ou melhor todos aqui, principalmente o Bruno não acredtam, mas eu sofri muito com toda essa história.
—Você ainda ama ele né, Mika?
—Sim, em todos esses anos, Charles, não teve um único dia que eu não senti saudades dele. Eu sofri tanto quando fiquei sabendo do casamento.
—Se você tivesse uma chance, você lutaria por ele?
—Não.
—Por que? —Pergunta confuso.
—Porque eles estão felizes, eu jamais teria coragem de estragar a vida deles de novo, além do mais eu vou embora no próximo mês.
—Você não veio pra ficar?
—Não. Essa cidade nunca foi o meu lugar, eu também não conseguiria viver bem aqui, já que todos me odeiam. —Ele ri quando eu falo.
Conversar com o Charles foi muito bom, ele foi o único que me deu os pêsames pela morte do meu pai. Ele trabalha com o Bruno, olha só que ironia, até o garoto que era o mais rico da cidade, o pai do Charles é fazendeiro, até ele é funcionário do Bruno. Ele trabalha no centro de pesquisas, ele me falou um pouco sobre seu trabalho e tudo que fazem lá, é muito legal, o Bruno é realmente um cara incrível.
Quando eu voltei pra casa não vi minha mãe, ela ainda não havia voltado, eu preparei o jantar e limpei a cozinha. Eu dei uma olhada pela casa e os móveis estão bem acabados, amanhã vou dá uma modificada por aqui, acho que é o mínimo que posso fazer. Eu nem vi a hora que minha mãe voltou, eu tomei meu remédio e apaguei, não tive uma boa noite de sono, mas isso já é normal pra mim, tem quinze anos que minhas noites de sono são ruins.
Eu comprei móveis novos e também algumas ferramentas para limpar o quintal, minha mãe gostou dos móveis que comprei, ela até sorriu quando me viu com a enxada para limpar os matos do quintal.
—Você está muito mudada, Mikaela. —Ela fala enquanto almoçamos.
—É, eu mudei muito sim, mãe.
—Você não foi feliz lá, não é mesmo? —Ela pergunta com tristeza.
—É, eu não fui mãe. Eu não deveria ter ido embora, hoje eu daria tudo para voltar no tempo, no momento em que aquele maldito me entregou as passagens, rasgar elas e mandar ele para o inferno.
—O que aconteceu com você lá, Mikaela? —Ela pergunta me olhando ansiosa.
— Nada demais mãe —minto —eu só queria poder casar com o Bruno e ser feliz.
Minha mãe não acreditou na minha resposta, mas eu jamais vou falar com ela tudo que eu passei lá, ela não merece ouvir tanta barbaridade. Eu também não vou falar sobre o porquê da minha volta, eu não quero vê minha mãe triste outra vez.
...
Fazem duas semanas que voltei, as pessoas daqui estão muito hostis comigo, na igreja, no supermercado, no shopping, em todos os lugares tem gente fofocando e me olhando torto. Minha mãe me pediu pra levá-la no prédio onde fica o escritório do advogado que está cuidando do inventário do meu pai, felizmente ele tem um seguro de vida e vai deixar minha mãe de boa por um longo tempo.
—Nossa, que lugar elegante! —Falo olhando os quadros nas paredes, são pinturas bem caras.
Depois que minha mãe entrou no escritório, eu decidi ficar esperando do lado de fora, eu senti um mau estar, eu tenho isso às vezes mesmo tomando os remédios certinho, eu me levantei para ir ao banheiro, estava indo bem até eu perder o equilíbrio e derrubar uma estátua que fica em frente a recepção.
—Eu sinto muito, me desculpe. —falo quando o segurança se aproxima. —Olha foi sem querer, eu passei mau e esbarrei sem querer, mas eu p**o o prejuízo.
—Desculpa, mas a senhora terá que nos acompanhar. —Ele fala e me olha com pena, eu com certeza estou pálida —Essa obra de arte pertence ao chefe, então terá que esperar para vê a decisão dele.
Agora só resta saber o que esse chefe, que com certeza deve ser o advogado vai resolver, mas não deve ser nada demais, isso não deve ser tão caro, pelo menos foi o que pensei, mas eu não estou no meu melhor dia e prova disso é que esse escritório, esse prédio e tudo tudo o que tem nele pertence ao Bruno.
Continua...