Marcela
Passei a maior parte da minha vida nas ruas, em um mundo imerso em escuridão e desespero. Quando fui capturada e forçada a me tornar prostituta, não tive escolha a não ser me adaptar. E, na adaptação, aprendi a arte de enganar e mentir, tornando-me uma mestre no jogo. Cada mentira, cada sorriso falso, era uma moeda no meu bolso, uma oportunidade de sair da merda em que vivi por tanto tempo.
Enganava os homens com um olhar suave, com palavras doces e promessas vazias, e em troca, eles me davam dinheiro. Muito dinheiro. O suficiente para adquirir as roupas que me faziam parecer alguém de importância, e para aproveitar os excessos das festas em que estava sempre presente. Cada noite era uma maratona de álcool, música alta e corpos suados, e ao meu redor, o caos se desenrolava.
Via mulheres sendo consumidas por overdoses, outras se entregando ao choro e à desesperança, suas lágrimas se misturando com o suor e a dor. Mas eu não me comovia. Ordenava que engolissem as lágrimas e voltassem para o trabalho, com um tom seco, sem espaço para piedade. Não havia lugar para fragilidade naquele mundo — nem para elas, nem para mim.
Um bando de ingratas, isso sim…
Muitas delas me perguntavam se eu algum dia queria deixar esse estilo de vida para trás, e minha resposta era sempre a mesma: não. Eu me sentia estimulada pelo abuso, pelo controle, e mais curioso ainda era perceber que, em certos aspectos, era como Samuel.
Com o tempo, fui promovida, e hoje sou uma especialista em minha arte: enganar as pessoas. Ou, mais precisamente, enganar mulheres sedentas por conquistar grandes fortunas. Uso sua ambição contra elas, sempre exibindo o sorriso encantador que esconde minha verdadeira intenção.
Meu namorado costuma dizer que eu não tenho coração, mas ele é bem pior do que eu. Ele tira vidas sem um mínimo de remorso, sem sequer pensar nas consequências. Mas quem precisa de moral, não é? O que importa é o que conseguimos tirar dessa vida.
Eu tenho coração, sim. Só que o dinheiro sempre fala mais alto. E o que mais importa senão isso?
Mas voltando àquela desgraçada… Sinto que logo a encontrarei. E quando isso acontecer, finalmente vou receber a grana que me deve. Samuel disse que só me pagaria quando a morena estivesse em seu poder, e ele seria o primeiro a dormir com ela. Ele ficou obcecado por ela só de ver uma foto, e isso me encheu de ódio.
O maldito foi encantado por uma imagem, enquanto eu estava lá, lidando com tudo pessoalmente, e ele ainda estava babando por aquela vagabunda.
O pior é que o i****a quase me matou. Não consumava as relações sexuais e passava o tempo todo apenas observando, nos deixando afligidos com seu comportamento inútil.
Agora, ele vem até mim e me diz que deseja ver a morena dançando sensual em sua frente? Isso me deixou completamente fora de mim.
Eu sei que estou em um relacionamento, mas, no fundo, o que sinto por aquele i****a que me desrespeitou, elogiando a maldita mulher, é algo difícil de compreender. Meu namorado me proporciona momentos de prazer, mas o homem misterioso, cuja afeição inexplicável por ele só me causa dor, exerce uma atração que não consigo ignorar. Sua aparência encantadora e a aura de poder e temor ao seu redor são o que me atraem, uma mistura de medo e fascínio que me consome.
Em meu íntimo, me vejo como uma benfeitora. Encontro meninas nas ruas, perdidas no vício e na miséria, como eu já estive um dia. Levo-as a um lugar onde terão comida e abrigo, mas, em vez de gratidão, o que encontro é raiva e ingratidão. Elas não entendem o que é necessário para sobreviver nesse mundo — para enganar os poderosos e sair com o dinheiro que lhes pertence.
Quando estava no mesmo lugar que elas, lembro-me de como escapava, mas o fazia com o cuidado de não ser vista. Eu sabia que, na primeira tentativa de escapar ou pedir ajuda, seria morta. Mas, ao não agir, sobrevivi e fui promovida. Sei que havia olhos sobre mim, homens vigiando cada movimento, enquanto garotas desapareciam, e eu sabia que elas jamais retornariam. As matavam. Era assim que esse mundo funcionava.
Mal posso esperar para que meu celular toque, anunciando que finalmente encontraram a desgraçada. Quando isso acontecer, vou poder ver aquele homem imponente pessoalmente e permitir que ele tenha o que deseja da morena. Tenho todos os documentos dela, só esperando a chance de confrontá-la.
Está demorando demais. Onde será que ela foi?
Enquanto isso, meu namorado chega, mais agitado do que o normal. Ele se aproxima de mim com uma intensidade que eu não posso ignorar, seus olhos fixos nos meus, sua presença impossível de ser afastada.
— Poxa, ainda está atrás daquela gostosa? Você sabe que já procuramos em todos os lugares e nada de encontrá-la. Acho melhor você desistir. — Ele disse, com um tom de desânimo, enquanto me observava.
Eu parei de me mover, olhei para ele com um sorriso frio e disse, sem hesitar:
— Nunca vou parar de procurá-la. Vou entregá-la de bandeja para Samuel e vou ganhar uma fortuna. Quero comprar um carro importado, aquele que sempre quis. O que tenho agora já me cansou, e eu mereço o melhor, sempre.
Dizia isso enquanto beijava o marginal ao meu lado, seu beijo sem emoção, só uma troca de interesses. Ele é um burro, não entende o jogo como eu. Mata por tão pouco, já deveria estar nadando em dinheiro, com tantas vidas que ele tirou. Mas, fazer o quê? Não é tão esperto quanto eu.
É necessário me afastar desse homem, porque ele nunca vai me dar o que realmente desejo, como aquela joia preciosa que tanto admiro. Mesmo nunca usando joias reais, sempre guardo algumas imitações em um cofre. Nunca se sabe quando você pode ser o alvo de um assalto, e a vida não permite distrações.
Estamos comemorando cinco meses juntos, mas sei que recebo muito mais dinheiro do que ele. Não entendo por que, sendo uma mulher tão inteligente, estou ao lado de alguém tão sem ambição, tão sem visão do futuro. Ele não tem nada — nem mesmo a casa onde moramos. Aquela casa é minha.
Helena, prepare-se. Em breve, você vai ocupar o seu devido lugar...
Sinto que logo nos cruzaremos, maldita fugitiva. E quando Marcela tem um sentimento...
Acontece.