Naquela manhã nublada de uma sexta-feira, a aurora despertou Sandrine em meio a um turbilhão de emoções. Seu coração, qual um tambor da libertação que ecoa na solidão dos bosques, batia com uma urgência desconhecida, como se estivesse ansioso por algo que não podia definir. Os primeiros raios do sol, invasores indesejados em sua alcova de sombras, tingiram o quarto com uma luz dourada que parecia cruelmente contrastar com a inquietude que a dominava. O aroma do banho, um elixir morno tingido com o sussurro de flores negras, envolveu-a não em conforto, mas em um abraço gélido que arrepiou sua pele.
Cada gesto do seu ritual matinal foi executado com uma precisão obsessiva, como se estivesse se preparando para um sacrifício macabro. Ao se vestir, escolheu suas roupas com uma meticulosidade doentia, combinando tons sombrios que refletiam a profundeza de sua alma torturada. Seus passos, antes leves como os de um espectro, ecoaram pelo corredor vazio, até alcançar a biblioteca, o santuário de segredos que ela e sua mãe haviam erguido como um mausoléu à sabedoria.
A biblioteca, embora pequena em dimensão, era uma câmara de horrores e enigmas. As prateleiras, alinhadas como fileiras de túmulos antigos, eram repletas de volumes amarelados pelo tempo, cujas páginas carregavam o sussurro de almas aflitas. Estatuetas de orangotangos presos em correntes invisíveis como os tormentos que assombravam seus sonhos, adornavam os cantos sombrios do cômodo, lançando sombras dançantes que pareciam se contorcer em agonia.
Com um olhar penetrante, Sandrine inspecionou cada detalhe, certificando-se de que cada elemento contribuísse para a atmosfera de desespero que ela desejava evocar. Ela passou a flanela com um toque quase reverencial sobre as lombadas dos livros, como se estivesse acariciando os cadáveres de amigos queridos, e borrifou o desodorante de ambiente não para acolher, mas para afogar em um aroma sufocante que lembrava os perfumes de uma sepultura fresca. O arranjo de flores na mesa de leitura foi reorganizado com uma precisão mórbida, cada flor disposta como oferenda a entidades ocultas que aguardavam nos recessos do além.
A mesa de leitura, com sua superfície imaculadamente limpa, parecia convidar Sandrine a mergulhar nos obscuros abismos da imaginação, onde sombras dançavam e segredos sussurravam entre as páginas de livros antigos e misteriosos. As cadeiras giratórias, grandes e confortáveis, aguardavam ansiosamente para abrigar os corpos fatigados dos estudantes ávidos por conhecimento, mas suas sombras projetadas nas paredes pareciam ganhar vida própria, dançando macabramente em um balé sinistro. Os bancos acolchoados, estrategicamente posicionados ao redor da mesa, testemunhariam não apenas momentos de colaboração e camaradagem, mas também os suspiros de almas atormentadas pela busca incansável por respostas no labirinto do desconhecido. Com tudo preparado e organizado com primor, Sandrine entregou-se à expectativa, aguardando ansiosamente pelo que a sexta-feira reservava para ela, sem saber que seus desejos seriam atendidos por forças além da compreensão humana.
A espera arrastava-se como um rio preguiçoso sob um céu sem estrelas, envolvendo Sandrine em um manto de trevas e agonia. Cada minuto que passava parecia esticar-se em uma eternidade torturante, como se o tempo tivesse se aliado aos espíritos sombrios que habitavam aquele lugar, brincando com os nervos frágeis da jovem. Os ponteiros do relógio, tingidos de um n***o profundo, pareciam zombar dela, marcando dez, onze, doze horas, mas relutavam em alcançar a tão esperada marca das duas da tarde. Era como se o tempo estivesse preso em um jogo de esconde-esconde macabro, esquivando-se de sua captura enquanto risos demoníacos ecoavam nos corredores vazios da biblioteca, enchendo o ar com um presságio sombrio. E quando finalmente o relógio anunciou a chegada da hora marcada, um calafrio percorreu a espinha de Sandrine, pois ela sabia que algo sinistro estava prestes a acontecer, algo que mudaria para sempre o curso de sua vida.
Dentro da mansão sombria, os suspiros angustiantes de Sandrine ecoavam como gemidos de almas atormentadas pelos corredores desolados. Sua mãe, enclausurada no ateliê dos fundos, absorta em seus devaneios artísticos, parecia alheia à agonia palpável de sua filha. O silêncio, sinistro e opressivo, pairava como uma maldição sobre o ambiente, sendo rompido apenas pelo tic-tac insistente do relógio na parede, como o som dos passos de um espectro descontente vagando eternamente pelos corredores da casa.
Sandrine se via imersa em um mar de desespero, tentando desesperadamente encontrar alguma forma de preencher o vazio aterrorizante do tempo. Ela percorria cada canto da residência decadente, em uma busca frenética por distrações fugazes. Livros eram folheados com mãos trêmulas, mas as palavras pareciam desvanecer em meio à névoa de sua aflição. Objetos eram rearranjados meticulosamente, como se ela tentasse desesperadamente montar um quebra-cabeça cujas peças haviam sido perdidas há muito tempo. Até mesmo uma tentativa desajeitada de cozinhar foi feita, resultando em uma atmosfera de caos na cozinha, onde os utensílios pareciam se contorcer de agonia diante da incompetência da jovem.
Quando, enfim, a campainha vespertina ecoou através dos corredores sombrios, foi como se um raio de esperança tivesse rompido as nuvens carregadas de desespero. Sandrine, com o coração martelando no peito, correu desesperadamente em direção à porta, suas passadas ressoando como um tambor funesto anunciando a chegada da tragédia. Ela ansiava encontrar Larry do outro lado, como uma náufraga ansiosa por um vislumbre de terra firme em meio ao oceano tempestuoso de sua solidão. No entanto, a decepção a atingiu como um golpe c***l quando se deparou com o carteiro segurando uma caixa de acessórios, encomendada por Adrienne, como um lembrete c***l do mundo exterior, indiferente à sua dor.
Recebendo a caixa com um suspiro resignado, ela assinou o papel do recibo com mãos trêmulas, como se estivesse assinando sua própria sentença de morte. Então, com passos pesados e arrastados, como se carregasse o peso de sua própria melancolia, ela caminhou de volta para os fundos da casa, onde sua mãe, envolta em seu próprio mundo de ilusões, continuava a criar suas obras macabras. A entrega foi feita, mas o vazio, o desespero, a espera insuportável continuavam, como uma maldição eterna lançada sobre a casa dos aflitos.
E assim, como se os fios do destino fossem tecidos por mãos cruéis, o som da campainha ecoou novamente pelos corredores sombrios da velha mansão, como um lamento sobrenatural que ecoava as esperanças frustradas de Sandrine. Seu coração, outrora pleno de antecipação, agora era um tambor descompassado, batendo um ritmo de agonia em seu peito, enquanto ela se lançava mais uma vez em direção à porta, como uma alma perdida em busca de redenção. Oh, como ela ansiava pelo rosto familiar de Larry, uma âncora em meio ao mar de incertezas que era sua vida. No entanto, as sombras da mansão pareciam conspirar contra ela, revelando não a salvação esperada, mas sim a figura sinistra de Hector, seu namorado distante, cujo interesse há muito se desvanecera como uma vela consumida pelo tempo.
Não houve alegria em seu coração ao vê-lo ali parado, apenas um aperto de angústia que ameaçava sufocá-la. Ela tentou, em vão, pintar um sorriso nos lábios, tentou esconder a tempestade que rugia dentro de sua alma torturada. No entanto, as palavras ácidas escaparam de seus lábios como veneno destilado pela dor. Uma desculpa foi oferecida, uma briga inventada, e Hector foi expulso com uma promessa vazia de retorno. Mas a espera se tornou um fardo insuportável, pesando sobre os ombros frágeis de Sandrine, como correntes que a prendiam em um abismo de solidão e desespero.
Enquanto isso, Hector, envolto em um manto de desilusão, vagueava pelos corredores sombrios da tarde, com seus passos ressoando como os ecos de sua própria amargura. As labaredas de sua raiva crepitavam sob o manto azulado do céu, suas palavras impregnadas de ressentimento ecoando pelos becos vazios como um lamento fantasmagórico. Seus olhos, cavernosos de desespero, refletiam a sombra da dor que consumia sua alma, enquanto ele proferia suas acusações ao vento, insinuando que Sandrine não passava de uma entre tantas mulheres que ansiavam por um lugar em seu coração gélido. Um suspiro amargo se misturava ao ar vespertino, como o gemido de um espírito atormentado, enquanto ele se afastava, perdido nas sombras que engoliam a cidade como um mar de escuridão sem fim.