Quem é você?

1257 Words
Eu estava brincando com a adaga em cima da mesa à minha frente, que ficava no centro do salão, quando o Ricardo entrou, com uma expressão que me dizia que eu iria pagar por aquilo mais tarde. Ele parou ao meu lado, mas não sentou. Imaginei que estava ansioso demais para ficar parado. Ao meu redor todos estavam completamente armados e eu sabia que os homens que escoltavam o homem para dentro também estariam. Arrumei o colete no corpo, torcendo de todo o meu coração que aquilo não fosse uma tentativa maluca de machucar algum de nós. No fundo eu imaginei que mais cedo ou mais tarde eles viriam atrás de mim. De alguma forma a nossa presença na Itália ia mobilizar as notícias. Inclusive a notícia de que eu sabia reproduzir a droga deles. Dois dos homens do Cobra entraram primeiro seguidos por um rapaz que parecia tudo, menos mafioso. Ele usava um boné e óculos escuros, mesmo tarde da noite, imaginei que para não ser reconhecido. A forma de andar dele me era muito familiar e pensei no Russo quase imediatamente, sentindo uma dor forte no meu coração. Ele era inegavelmente meu parente. Ele parou de frente para mim e vi pela lateral da visão o Ricardo apoiar a mão no gatilho da arma que estava presa no cós da calça dele. Em seguida ele apoiou a mão sob o coração e inclinou um pouco da cabeça. - Diga quem é você e o que quer. - Eu não queria aquela firula toda. - Confesso que você não é nada como eu imaginei. - A voz dele me assustou. A familiaridade me pegou desprevenida e parei de girar a faca de cima da mesa. Ele tirou o boné e arrumou um cabelo tom de chocolate e liso com a mão e depois tirou os óculos e eu fiquei boquiaberta. Ele tinha o nariz fino e firme, a boca desenhada em formato de coração no meio de bochechas salientes e o maxilar forte. Só que o que mais me confundiu foram os olhos, de um tom de verde que pareciam duas esmeraldas. E ele era praticamente idêntico ao Russo. - Put4 merda! - O Dego falou e percebi o Cobra se aproximando, para confirmar que estava vendo mesmo o que estava vendo. - Você não me conhece… Sou Nicolas Bambino. - Eu não conseguia encontrar as palavras. - E como deve ter percebido, somos primos. - O Russo com os seus vinte e poucos anos deveria ter exatamente essa cara, tirando os olhos. Os olhos do meu padrinho eram castanhos claros, mas a promessa de bondade dos olhos de Nicolas era a mesma dele. - Como isso é possível? - Vasculhei a memória e o Russo nunca comentou sobre um filho. Principalmente um filho da minha idade. - Como todas as pessoas que estão aqui. - Ele deu de ombros. - Não, não… O Russo não me esconderia algo assim. - Falei incrédula, perdendo completamente o equilíbrio. O chão pareceu girar sob os meus pés. - Ele não sabe da minha existência, e peço que continue assim… - A forma que ele falou, com rancor, fez o meu coração doer. Ele não sabia que o Russo tinha sido assassinado? - Nicolaa-as. - Gaguejei e o Ricardo tomou a frente, percebendo que eu estava sem condições de falar. A minha mente era uma tela em branco que assumia formas diversas. O Russo tinha um filho, durante a minha vida inteira ele foi um pai para mim, mas nunca foi para ele. - Nicolas. Percebe que é um choque para todos nós - Ele deu um sorriso de lado e eu me obriguei a fechar os olhos, e apoiei o rosto nas mãos. - Comece pelo começo… O que o trás aqui? - Eu vim falar com o Chefe dos Trucks, que por acaso, é a minha prima. - Ele usou um tom descontraído, quase despreocupado. - Você pode falar comigo, sou o Chefe dos Trucks. - Senti ele se movendo para frente. - Não. Você não é. - O tom dele não mudou, ele manteve a despreocupação. - Ela é. O sangue Bambino corre nas veias dela. - Levantei o olhar para ele, me obrigando a assumir o controle dos meus pensamentos. - Nicolas. Dividimos a chefia, os dois. - Esclareci e ele ergueu a sobrancelha na minha direção pensativo, exatamente como eu fazia. - Me explique, sua visita… ? - Perguntei, mantendo os olhos fixos nele. - Soube da visita de vocês aos Camorras. - Ele falou, tornando a voz um pouco mais cuidadosa. - Preciso de ajuda. - Você vai precisar ser mais detalhista. - O Ricardo estava começando a ficar impaciente, acredito eu que pelo abalo que me atingiu vendo a imagem do Russo na minha frente. Respirei fundo. - Antes de tudo. Preciso saber se posso confiar em vocês. - Ele falou. - Estamos falando de vida ou morte. Da minha vida ou da minha morte. - Ele foi específico. - Se você entrou na minha casa, pedindo ajuda, o mínimo que eu esperava era que a confiança não fosse uma questão. - O Ricardo estava completamente irritado agora. - Chefe Truck. - Ele falou, mantendo uma cautela nas expressões. - Vocês foram até os Camorra, isso é no mínimo complicado, para não dizer comprometedor. - Eu não estou entendendo moleque! - Eu interrompi, antes que uma merd4 acontecesse. - Truck, calma. Ele tem razão. Eles são inimigos e se ele veio até aqui, não deve ter outra alternativa. - O Ricardo virou lentamente na minha direção, lutando com as palavras. - Vamos ouvir o que ele tem a dizer. - Fiz uma pausa. - Por favor… - Eu sabia que aquilo era injusto com ele. O Russo foi a única família que eu conheci até… Que o Ricardo entrou com os Trucks na minha vida. Ele era uma parte da minha família, meu primo… Era motivo suficiente para que eu desse voz ao rapaz. O Ricardo bufou e ficou de frente para ele, ainda pronto para acabar com aquilo com uma munição entre os olhos do menino. - Nicolas, você tem algo a dizer, certo? - Por pouco eu não comecei a rezar quando perguntei. - Tenho. Clara, é simples. Bambinos e Camorras não convivem, não se aproximam, não fazem parte do mesmo todo… - Eu sabia disso. - No entanto, quero evitar um ataque. - Ele fez uma pausa. - Contra os Camorras. - Parecia que ele estava decidindo o quanto me daria de informações. - Você também é um Camorra. - Falei, entendendo os motivos dele. Ele respirou fundo. - Assim como eu, tem direitos e se sente responsável… - Ele negou com a cabeça. - As coisas não funcionam assim para mim. - A sombra que o olhar dele assumiu fez o meu corpo arrepiar. - Talvez para você, que cresceu longe daqui. Eu, nessa terra, sou apenas um Bambino. - Cruzei os braços e o encarei, ele sustentou o meu olhar e ignorei a sensação de dejavu que me atingiu. O Dego deu um passo a frente, antes de falar. - Eles são seus inimigos, nessa terra, como você disse… Então, qual a sua motivação para vir até aqui, pedir a nossa ajuda, para evitar um ataque contra ele? Ele parecia inseguro, com medo quase, enquanto refletia se respondia a pergunta do Dego. Esperamos, curiosos e impacientes. O Ricardo ainda pronto para acabar com ele. - O meu motivo… - Ele respirou fundo. - É a Anna Camorra.
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