Aliados improváveis

954 Words
Depois que finalmente venci a frustração de estar presa, eu tomei um banho rápido e comi um pequeno lanche que eles trouxeram. O plano deles se resumia em me manter viva, e isso implicava em me alimentar. Limpa, alimentada e com uma roupa confortável os meus pensamentos parecem se organizar. Eles estariam alertas nos primeiros dias, para uma possível fuga minha. Eu precisava mudar isso. Mostrar o mínimo de cooperação para ganhar um pouco de confiança, para que eu pudesse ter um pouco de liberdade para ir e vir. Teria que manter certa resistência, para não criar suspeitas. E eu poderia usar a compaixão velada do Davi a meu favor. Sem dúvidas seria um facilitador. Mesmo que eu estivesse com muita raiva dele, era impossível não ver o desconforto dele com essa situação toda. Ele não deve ter tido escolha nenhuma durante a vida. Serei mais educada com ele. Eu precisava conhecer a propriedade. Estudar os caminhos mais rápidos e discretos para a rua. E eu precisava encontrar o Nicolas. Eu sabia que ele trabalhava para o Dom, para seguir com o plano dos Bambinos, então ele estava aqui em algum lugar. Ele poderia falar com o Ricardo, para mantê-lo afastado até que fosse o momento certo para me tirar daqui. E principalmente, evitar que ele formule uma missão suicida tentando me resgatar. Consigo imaginar ele tentando organizar uma operação para me tirar daqui nesse momento. E isso não daria certo. Espero que os outros consigam convence-lo de esperar. Eu preciso dele vivo, mesmo que eu não viva. Ele não deve pagar pelos meus erros. Bem, parecia no mínimo um plano. Estudei com mais calma o quarto agora. Realmente não tinha armas, mas tinha uma coleção de espelhos com vários formatos em uma das paredes. Quebrar dois ou três poderiam me gerar lâminas. O que era melhor que nada. A porta seguiria trancada, pelo tempo que eles achassem que eu poderia fugir. E isso só mudaria de uma forma. Se eu pudesse convencer o Dom que eu estava conformada com o plano. E para isso eu tinha que agir de forma comportada para os padrões deles. E isso ainda era um mistério. Eu não fazia ideia de como eu deveria agir. A porta destrancou e eu levantei em um salto, esperando pelo Davi. Uma mulher com cara de nojo entrou. Ela era alta, magra e tinha feição de madrasta da Cinderela. - Senhorita. - Ela caminhou com passos firmes na minha direção. - Sou a Gertrudes, governanta da Família Camorra. - Avaliei a mulher, um ar assombroso a rodeava. - Fui designada para cuidar do que você precisar. - Ela olhou para o prato vazio em cima da mesa. - Vejo que se alimentou e se limpou. Ótimo. - Por alguns segundos eu me senti na escola de novo. - A casa dorme às 23 horas em dias comuns. Esteja a postos para isso no horário. A porta seguirá trancada até o dia amanhecer, às 07 o Senhor Camorra aguarda que tome café da manhã com a sua família, para poder te apresentar formalmente para os demais. - O tom dela era firme e autoritário. E ela parecia uma cobra pronta para dar o bote. - Se precisar de orientação para se vestir, estarei a disposição. - E como chamo você? - Ela me deu um sorriso de boca fechada e eu temi pela minha integridade física por aquela pergunta. - Eu estarei aqui, do momento que acordar até o momento que descer para o café da manhã. - Uma babá, ótimo. - Quais são as suas preferências de vestimenta? - Desculpe? - Ela sorriu, ainda escondendo os dentes. Ela caminhou até o guarda-roupa e o abriu. - As mulheres da família Camorra usam tons pastéis e claros. Cores alegres e vivas. - Pisquei para ver se estava acordada. - Aconselho que escolha um vestido leve, por conta da temperatura. - Ela pegou um vestido bege no armário e me mostrou. - Esse será perfeito. É um vestido que mostra respeito e pureza. - Gertrudes. - Eu falei, me levantando. - Eu não quero mostrar respeito e estou bem longe de ser pura. - Nunca mais diga algo assim. - A voz dela me atingiu como uma faca. - Uma mulher deve se colocar no seu lugar, obediente e respeitosa. A voz deve ser controlada também. - Isso é brincadeira né? - Eu virei os olhos e ela caminhou calmamente até mim. - Senhorita. Devo avisá-la que todas as damas que eu doutrinei foram resistentes no começo. Muito mais do que você pode ser. Então você tem duas opções. Pode fazer isso de forma confortável para você ou confortável para mim. - Era impossível ignorar a ameaça na voz dela. - Depois do café amanhã, você se reunirá com a Senhora Perlla, que irá te passar as suas responsabilidades sociais, visto que agora, irá casar com o Senhor Davi. - Eu guardei essa informação. Era de conhecimento geral o acordo, ou seja, o Dominique e a Perlla perderiam os seus lugares na linha de sucessão. Eu poderia usar isso a meu favor de alguma forma. - E na parte da tarde, você terá aulas de etiqueta comigo e a menina Anna, para aperfeiçoar a suas responsabilidades como esposas. No dia seguinte eu teria uma forma de mandar um recado ao Nicolas. Através da Anna. Um peso que não percebi que estava no meu peit0 foi aliviado conforme a minha ideia anterior ia se formando. Eles não me manteriam presa nesse quarto, eu teria comunicação com outras pessoas e isso tornava uma fuga minimamente possível. - Faremos de forma confortável para as duas. - Eu respondi à mulher que finalmente sorriu, me mostrando os dentes.
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