Eu e o Ricardo ficamos juntos durante quase todo o evento. Era uma festa imensa, com quase duzentas pessoas, então conseguimos nos misturar com facilidade. Eu desconfiava que a Julie tinha visto um de nós, mas não fez alarde com a nossa presença, o que nos provou que ela não tinha poder ali.
Em dado momento, os presentes se reuniram no salão maior, onde aparentemente o José iria discursar.
Os presentes se organizaram e nós ficamos um pouco mais para trás, para não chamar atenção.
A família Camorra se colocou nas escadarias e viraram para o público. O José era um homem visivelmente cru3l, daqueles que você sabe que se cruzar o caminho, provavelmente não continuará respirando.
- Buona notte. - Ele começou. A voz dele era rouca e forte. - Ringrazio tutti per essere venuti e vi auguro di mangiare e bere bene. Per raccolti sempre migliori! [Agradeço a todos pela presença e espero que comam e bebam bem. Por safras cada vez melhores!] Soube que têm americanos no nosso evento. - Ele finalizou em inglês. E eu senti a minha espinha gelar. Ele tinha uma expressão calma e controlada. - Sejam bem vindos, e espero que se inebriem com as nossas uvas! - Ele levantou a taça na nossa direção e senti todos os olhares se virarem para nós. Passar despercebido no evento tinha ido por água abaixo. De todos os olhares o que mais me preocupou foi o de Julie em nós. Imaginei que ela já tinha nos visto antes, mas pela forma dura dos olhos dela na máscara eu soube que não. Encarei ela, segurando o braço do Ricardo possessivamente, e ela sustentou o meu olhar. Ela sabia que eu tinha vindo atrás dela e que eu poderia acabar com tudo agora mesmo. Talvez ela não tenha pesado o quanto de disposição eu teria para acabar com ela. Ela talvez nem imaginava o quanto o Cosmo, o seu cúmplice e amante tenha me contado. Mas, ali, no meio de uma das famílias mais poderosas da Itália, eu a desafiei e ela sabia o que a esperava.
O Ricardo manteve a pose, levantando a taça para o Dom e eu fiz o mesmo, um pouco atrasada. Consegui sorrir para ele antes que a atenção dele finalmente voltasse para outra coisa.
- Acho que para nós, a festa acabou. - O Ricardo falou e eu concordei. Era o momento de irmos embora, antes que ela provocasse alguma coisa que nos colocasse no olho do furacão.
Saímos discretamente, logo atrás do Dego e da Malu que já estavam em movimento.
No caminho para o valet, passei no toalete com a Malu. Tomamos o cuidado de não comentarmos sobre nada ali, afinal não tínhamos certeza se poderíamos ser ouvidas.
Eu estava lavando as mãos quando a Julie entrou, algo que eu imaginei que ela faria.
- Então vocês vieram atrás de mim. - Ela falou, olhando as cabines, eram três, uma delas ocupadas pela Malu, as outras duas vazias.
- Eu não sei do que você está falando. Estou aqui para negociar uma expansão e conto com os Camorres para isso. - Ela deu um sorriso amargo, que não chegou aos olhos.
- Você não faz ideia do que está fazendo. Eu, se fosse você, iria embora agora. - Me aproximei dela, o suficiente para sustentar o seu olhar, sem parecer ameaçadora.
- Julie, minha querida… Eu não respondo a ameaças. - Ela não se moveu, mantendo o sorriso amargo.
- Isso é um aviso. Aqui não é Nova York, eu realmente voltaria se pudesse. - Eu dei uma risada na cara dela.
- Você sabe que não tem poder de fogo para nos derrubar, precisa deles…
- Essa não é a minha prioridade. Eu só estou aqui, porque não tenho outra escolha.
- Eu vou te tirar daqui minha querida, e vou te colocar ao lado dos seus… Em baixo da terra! - Sussurrei. A Malu saiu da cabine enquanto nos encaramos.
- Senhoritas. - Ela falou, enquanto lavava a mão.
- Clara, depois não diga que eu não te avisei, isso é um caminho sem volta. - Considerei as minhas possibilidades. Eu poderia matá-la ali, no banheiro perto do valet, visto que fazia quase 5 minutos que estávamos ali e ninguém entrou, iriam demorar muito para achá-la. Apoiei a mão na adaga, sentindo a raiva tomar conta do meu corpo e ferver o meu sangue.
- O Diospiro sabe que eu estou aqui com você, ele me deu 3 minutos, se eu não sair ele virá com tudo! - Pisquei para ela, avaliando aquela informação. Eu sabia que o Ricardo tinha visto ela entrar, ele estava bem perto da porta quando entramos. Ele também não demoraria a vir se ela saísse primeiro que eu.
- Essa noite eu não quero confusão, e essa é a sua única sorte. - Eu falei e caminhei para a porta com a Malu perto de mim. Senti a Julie nas minhas costas e tive o impulso de atacar, mas com muito esforço eu consegui me refrear. O Caqui estava realmente perto da porta, e o Ricardo observava também. Seguimos cada uma para um lado e não olhei para trás quando cheguei até o Ricardo.
- Você teve uma oportunidade e tanto agora. - Ele falou baixo.
- Era uma armadilha, ela me provocou para eu reagir… - Ele abriu a porta do carro e eu entrei. Em seguida ele entrou do lado do motorista.
- Eu imaginei quando vi o Caqui. O que falaram? - Ele perguntou curioso.
- Algumas ameaças e ela queria me dar um alerta que eu ainda estou avaliando se acredito. - Falei honestamente. Por que ela chegaria tão perto de mim, correndo o risco de morrer, para falar que não tinha escolha e que iria embora se pudesse?
- Alerta? - Ele perguntou, ligando o carro.
- Sim. Ela disse que isso tudo é um caminho sem volta.