Curiosa

1202 Words
Tártaro Narrando A reunião acabou e cada um meteu o pé pra sua quebrada, menos o tio Gaelzinho, que foi direto pra sala dele. Meus filhos voltaram pro escritório e, sem perder tempo, eu dei o papo neles. Claro, sem muita informação. Falei só o que eles precisam saber por enquanto, nada além. Não é que eu não confie nos moleques, longe disso, eles tão comigo no fechamento, fechadão mesmo, mas tem coisa que é papo de sigilo. Tá ligado? Tem que ser assim. Quando o bagulho começar a desenrolar de verdade, eu vou abrindo o bico aos poucos. — Pai, e agora? — perguntou o Breno, sempre querendo saber dos detalhes. O moleque é atividade, fica ligado em tudo, mas nem sempre dá pra soltar a real. — Relaxa, Breno, na moral. Faz o que eu te falei e segue o plano. — respondi, sem muito rodeio. Ele entendeu e ficou na dele. O garoto sabe o que tá fazendo, confio nele. Chamei o Oliver de canto. O cara já sabe o que eu ia pedir, até porque a situação tá esquentando. A Rocinha é nossa base e não pode vacilar com a segurança. — Filho, reforça lá o esquema, sem Vacilo. Não quero nenhum estranho pisando lá sem passar você antes. Você é o de frente, então resolve. — Deixa comigo, Pai. Pode ficar tranquilo que eu já vou organizar o bonde. — garantiu ele, convicto, gosto assim. Ponta firme. Dei um tapinha nas costas dele e mandei voltar logo pra quebrada. Oliver sempre foi desenrolado, mas o momento exige mais ainda. Falei pra ele levar o Breno junto, dono e sub anda lado a lado, os moleques tão a uma cota já na pista, sabe o proceder. Enquanto isso, Bryan saiu na missão com o Buril. Coisa nossa, só eles sabem a rota, e eu nem vou perguntar como vai ser. É aquela coisa, confiança cega. Se eu botei eles nessa, é porque sei que vão dar conta do recado. Assim que os moleques saíram, perguntei pro Bruno se ele tinha algum avanço. Já tava no tempo de me trazer algo concreto, né? Ele logo deu o papo: tava com o resumo da Camila em mãos. — Tá aqui, pai — ele disse, jogando o envelope na mesa. Peguei o troço e comecei a folhear, meio sem paciência, mas curioso. Ficha limpa no submundo, segundo o relatório. Isso já chamou minha atenção. — Camila Muniz... Muniz? — Falei em voz alta, tentando lembrar de onde já tinha ouvido esse nome. Não demorou muito pro Bruno continuar explicando, sem dar muita importância. — Ela tem 34 anos, formada em direito e ainda estudou fora por uns tempos. Trabalhou lá também, mas nada demais. Essas paradas aí dela não são relevantes pro nosso lado — Dei uma risada curta. Sempre direto ao ponto, meu filho. Gosto disso nele. Continuei lendo, mas a parte sobre o ex dela não tinha nada que prestasse. "Só um Otarïo qualquer", pensei. Nada ali que me preocupasse. Bruno, com aquela postura tranquila, concluiu: — Ela tá limpa, pai. Não tem nada de errado com ela — Eu sorri de canto. Essa Camila parece ser só curiosa mesmo, talvez por isso sabe tanto sobre mim. Não é todo dia que alguém surge sabendo mais do que deve, mas sem rabø preso com nenhuma facção. Interessante. Agradeci ao Bruno com um aceno, puxei ele pra perto e dei um beijo rápido na cabeça dele. Esse moleque vai longe, sabe o que tava fazendo. Levantei da cadeira e saí em direção ao quarto onde a Camila tava. Precisava resolver essa parada. Ela tava assistindo alguma coisa com a Bia, as duas pareciam até tranquilas demais pro meu gosto. Quando entrei no quarto, dei aquela olhada de cima a baixo na Camila. Não tinha como negar, a mulher é gata demais. Cê é louco, dessas que faz qualquer um perder a linha. Mas eu não tava ali pra isso. Foco, Tártaro, foco. Olhei pra Bia e mandei: — Filha, dá um tempo pra gente aqui. Preciso trocar umas ideia com a Camila — Ela entendeu na hora, sempre esperta. Beijou meu rosto, deu até tchauzinho pra Camila e saiu sem fazer cena. Um alívio, porque a última coisa que eu queria era complicar as coisas mais do que já tão. Quando a porta se fechou, me aproximei da Camila. Ela continuava ali, sentada, olhando pra mim com aqueles olhos que não entregavam nada. Fiquei de pé, de frente pra ela, mantendo a distância por enquanto. — Então, Camila... — comecei, cruzando os braços. — Você sabe quem eu sou e o que eu faço. Mas eu quero saber de você. Por que tanto interesse em mim? Cê tá no meu radar agora, e isso não acontece por acaso. Ela deu um sorriso pequeno, quase debochado, mas manteve a calma. Não é qualquer um que fica tranquilo na minha frente. — Não tenho medo de você, Tártaro — disse, com uma confiança que me fez arquear uma sobrancelha. — Eu só queria entender como você chegou onde chegou. Seu nome tá em todo lugar, suas ações, tudo. Eu só queria saber mais. Não tem nada além disso. Eu já falei. Eu ri. Uma risada curta e seca. A mulher tinha coragem de se meter onde não devia e ainda achava que dava pra sair ilesa. — Curiosidade mata, sabia? — retruquei, me aproximando mais um pouco. Ela não recuou. Fico de cara com a coragem dessa mina. — Não se eu souber onde pisar — rebateu, sem pestanejar. — E você acha que sabe onde tá pisando agora? — A pergunta saiu afiada. Eu queria ver até onde ia a confiança dela. Era isso que me interessava. Ela respirou fundo, cruzando as pernas e apoiando os cotovelos nos joelhos. Tava se ajeitando, ficando mais confortável. Aquilo me irritou um pouco, mas ao mesmo tempo, me despertava um certo respeito. Ela joga bem. — Eu sei que você tem mais a perder do que eu, Tártaro — disse, e a frase pesou. — E sei que não vai me fazer mäl se eu não for uma ameaça pra você. E não sou. Nunca fui. Fiquei em silêncio por um instante. Era verdade. Até onde tudo indicava, ela não era uma ameaça. Só uma mulher curiosa. Mas a curiosidade dela já tinha ido longe demais. E isso, no meu mundo, nunca foi um bom sinal. — Tá, Camila, vamos ver até onde vai essa tua curiosidade. — Me aproximei ainda mais, ficando a centímetros dela. — Mas vou te avisar uma vez só. Se passar dos limites, eu não vou pensar duas vezes antes de cortar teu barato. Sacou? Ela segurou meu olhar, sem se abalar. — Entendido — respondeu, simples assim. Fiquei ali mais alguns segundos, só estudando a reação dela. Nada mudou. Essa mulher é fria, calculista. Mais uma coisa pra eu ficar de olho. — Você vai me manter aqui até quando? — Ela perguntou. — A noite vamos sair, agora tenho umas paradas para resolver — Dei o papo sem curva. — Eu vou voltar para casa? — Camila, perguntou, me encarando. — Não! Você vai comigo pra Rocinha.
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