1º Capítulo - Surpresas
Brian
Seus doces lábios tocaram os meus com delicadeza fazendo-me despertar de um sono profundo. Seus grandes olhos me analisavam junto a um sorriso largo e branco, ela tinha um controle absurdo sobre mim, acho que a amo.
— Bom dia, amor.
— Dormiu bem?
Assenti com a cabeça e me sentei na cama, ela se levantou e abriu a janela enquanto cantarolava uma música qualquer dos Beatles, enchendo o cômodo com sua graça e doçura. Ashley era uma garota maravilhosa, a conheci no meu primeiro dia de vida, foi assim que decidi chamar o dia em que acordei naquela cama de hospital, afinal era como se fosse realmente meu primeiro dia, não me lembrava absolutamente de nada que tenha ocorrido antes. Mas não fazia questão de saber, Deus havia me presenteado com aquela mulher excepcional, e aquilo para mim bastava.
Tenho dois melhores amigos também, Carter e Sara, são um casal lindo, apesar de que quando os "conheci" eles diziam ser apenas amigos, os dois são do Brasil, e eu também, para minha sorte Ashley fala minha língua fluentemente. O que mais me intriga, é porque eu estava aqui, se moro ou morava — não sei o que acontecerá daqui para frente — no Brasil!
Esses últimos meses foram ótimos, nas primeiras semanas, em que fiquei no hospital, Ashley me visitou todos os dias, vez ou outra levava flores ou algum livro, e me contava a história. Seu irmão havia feito uma cirurgia e estava internado também.
[...] Ela tinha preparado um café maravilhoso, frutas, bolos, sucos... nos sentamos juntos para apreciar aquele banquete.
— Amor, esses meses foram realmente ótimos. — Ela disse, enquanto tomava um gole de suco.
— Mas?
— Você já pensou no que vai fazer? Você não pode morar aqui, quero dizer... você sabe.
— Ainda não pensei nisso. — Bebi um pouco do meu café. — Mas eu estava com uma coisa em mente.
— No que? Você pretende voltar ao Brasil?
— Ashley, quer casar comigo?
Matheus
— Retirada! Retirada! — Gritei em meu walkie-talkie, bombas explodiam e quase nos atiravam longe. Tiros e mais tiros acertavam tudo e qualquer um que se atrevesse a espiar pela greta da janela, é de partir o coração, mas bala perdida não tem dono.
Mais tarde, na televisão, haviam contado pouco mais de quarenta mortes. Havia dois meses e meio que estávamos invadindo e lutando para recuperar o morro, Mia estava cada vez mais desgastada, conseguimos unir cerca de trinta pessoas para lutarem conosco, e doze haviam morrido nessas invasões.
Carter ligava duas, três vezes no mês, mas não podíamos nos preocupar com o que acontecia lá, principalmente Mia, ela ainda nem sabia que Brian estava vivo, talvez fosse melhor nem saber, o que Carter me contou a deixaria desolada.
— Não sei mais o que fazer, nunca vou conseguir recuperar a honra de meus pais. Eles morreram em vão.
— Nunca repita isso! Nunca! — Diega disse. — Se acalma, tudo vai melhorar, eu prometo. — Elas se abraçaram.
O cansaço estava estampado no corpo curvado e nas olheiras de Mia, não havíamos tido paz, primeiro nossos pais morrem, nossos avós são sequestrados e mortos, Brian entra em coma, e quando matamos Turner nosso tio fica entre a vida e a morte e o morro é invadido.
Nesses últimos três meses que se passaram, muita coisa mudou, não posso reclamar de tudo, Diega e eu estamos tentando nos relacionar, foi até bom sair rápido de Las Vegas, ela cortou o contato com aquele Michael.
Carter e Sara estão namorando, sempre soube que eles iriam acabar se envolvendo, dava para ver nos olhos dos dois, quando se entreolhavam.
Nosso tio veio a falecer e Guilherme continuava o mesmo, despreocupado, sempre disposto a ajudar, o que mudou agora era que havia conhecido alguém; seu nome era Ana, tinha cabelos escuros e longos, era filha de uma vizinha da Mia, e estava disposta a nos ajudar, manuseava bem uma arma e era paulista, tinha um sotaque bacana.
Carter
Esses últimos três meses foram terrivelmente difíceis, não tinha como contarmos pro Brian que ele tinha alguém disposta a fazer tudo por ele, e que ele levava uma vida desonesta. Também não seria justo com ele, estava apaixonado por uma ruiva que conheceu no hospital, e era ela que estava lá quando ele acordou né.
Sara e eu não tínhamos ideia de como conciliar tudo aquilo, o máximo que podíamos fazer é torcer para ele não se enrolar mais com ela.
Sobre a parte boa desses três meses, foi apenas uma, tinha nome e longos cabelos vermelhos, Sara soube fazer-me mais do que feliz, ela era decidida, tinha o nariz empinado, era marrenta mas totalmente carinhosa comigo. Quando contamos, todos ficaram felizes por nós, eles já deviam imaginar que rolava uma química.
Mia
Entrei em meu carro e parti para o asfalto, não sabia o que aconteceria daqui pra frente, faz tanto tempo que estamos trocando bala que isso afeta tudo que faço, como pilotar uma moto ou abrir a geladeira, é como se apertar o gatilho estivesse virando rotina, ou um tique nervoso.
Começou a chover, estacionei o carro em frente a praia e caminhei descalça pela areia, fiquei olhando o mar no escuro, tão imponente, assustador. Sempre tive medo da água... um rio, uma lagoa, quem dirá o mar. Tento superar meus medos, mas ali, vendo aquela imensidão escura sob nuvens carregadas em um céu esmorecido, meus medos se tornaram frágeis e insignificantes. Afinal, por quê eu estava lutando tanto? Por uma favela entupida de drogas? Eu sempre desejei mais pra mim, mas infelizmente foi o destino que decidiu quem eu seria; eu jamais deixaria o reinado dos meus pais terminar assim, nas mãos de um desgraçado. Eu recuperaria o que tanto amo, nem que seja a última coisa que eu faça.
E então, me joguei no mar n***o!
Carter
— Como assim se casar? Brian, ficou maluco?
— Eu a amo. Não quero voltar pro Brasil, meu lugar é aqui.
— Carter, acho que chegou a hora. — Sara mordeu o lábio inferior um pouco nervosa.
— Sim, eu acho que chegou...
— Como assim? Chegou a hora do quê?
— Brian, você precisa saber porque veio parar aqui.
— Mas vocês nunca quiseram me contar! Por que logo agora que estou tão feliz?
— Porque você não estava sozinho.
— O quê? Como assim? Eu sou casado?
— Não! Não é isso. Vocês nem assumiam o que sentiam um pelo outro; mas ela te visitou todos os dias em que você esteve em coma.
— E porque ela não estava lá quando eu acordei?
Sara soltou um gemido.
— Brian, é melhor se sentar.
— Eu não quero me sentar, eu só quero a verdade.
Respirei fundo e me sentei, comecei a relatar pequenos fatos e aos poucos, de como a Mia perdeu os pais e os avós, como foi descobrir que tinha um irmão, quando todos nós nos juntamos para assaltar aquele carro forte, nossos dias juntos naquela casa, quando chegamos a Las Vegas, como ele tomou um tiro mais ou menos salvando a Mia. E por fim, depois de nos vingarmos de Adam Turner, relato a invasão do morro e o retorno de todos para o Brasil. Ele escutava de cabeça baixa, tentando absorver tudo aquilo, mas eu sabia o quanto seria complicado.
— Eu sou um bandido?
— Todos somos Brian.
— Não consigo me lembrar dessa tal Mia e toda vez que penso na Ashley sinto como se meu coração fosse saltar pela boca.
— Eu sei o quanto é complicado. Mas ela queria estar ao seu lado.
— Não posso abandonar a mulher que eu amo.
— Precisamos contar pra Mia.
— Sinto muito Carter.