Irritado, nervoso e angustiado. Por mais que soubesse que Phillipe nada tinha a ver com sua esposa, ainda assim ele se sentia desconfortável na presença dele. Ciúme. Muito ciúme da empatia entre os dois, da forma como Jane sorria para o amigo e de como ela parecia realmente à vontade ao lado dele. Uma amizade bonita os unia e isso era uma das tantas coisas que Ethan desejava ter com Jane e sabia que não teria. Principalmente amizade. Primeiro porque ele não conseguiria ser apenas amigo amando-a daquele jeito. E depois porque Jane não confiava nele. Ele não se mostrou digno dessa confiança e duvidava que pudesse mostrar a ela seu lado mais verdadeiro.
Sempre que se aproximava de Jane, seu sorriso verdadeiro sumia e dava lugar a um sorriso visivelmente falso. E quando estavam afastados... os olhos dela brilhavam de contentamento ao conversar com familiares e amigos. A dor no peito de Ethan aumentava e foi então que ele percebeu que realmente meteu os pés pelas mãos. Em vez de atrair Jane para mais perto, ele a estava repelindo.
E Jane tinha noção do quanto o estava machucando. No entanto ela não estava fazendo nada de caso pensado, agindo deliberadamente para causar sofrimento. A verdade é que ela não conseguia ser ela mesma ao lado dele. Não conseguia gostar daquele Ethan que manipulou, mentiu e coagiu as pessoas a sua volta para que esse casamento acontecesse. Se era o perdão que ele queria... já o tinha. Mas ela não conseguia ver a possibilidade de uma amizade ou qualquer outro envolvimento entre os dois.
Tudo agora pertencia ao passado. Reabrir velhas feridas como ele estava tentando fazer só os afastaria ainda mais.
— Posso ser sincero?
Phillipe perguntou olhando atentamente para Jane, que até então estava com o olhar fixo em sua taça de champanhe. Ela ergueu os olhos para o amigo e deu um sorriso que não alcançou seus olhos.
— Sempre.
— Ele está sofrendo. Vocês realmente conversaram? Colocaram para fora toda as mágoas? Pratos limpos... olho no olho?
— Não. Ele realmente tentou entrar no assunto, mas eu já disse que o perdoei.
— E perdoou?
— Eu... acho que sim.
— Jane... vocês se gostavam demais. O que aconteceu foi c***l, doloroso e guardar isso so vai prolongar o sofrimento. Poxa... já se passaram tantos anos. Vocês amadureceram. Pense nisso, minha linda. Talvez deixá-lo falar vai tirar um pouco o peso dos ombros dele... e dos seus também.
— Eu sei...
Jane falou após um longo suspiro.
— Eu farei isso Phill. Eu só estou... sei lá... fiquei com tanta raiva dele por ter forçado esse casamento.
— Serei sincero mais uma vez. Você tinha escolha.
— Não. Claro que não. A saúde da minha mãe e...
Phillipe segurou Jane pelos ombros, ficando de frente para ela. A cena não passou despercebida aos olhos de Ethan que estava atento aos dois o tempo todo.
— Ele errou com você. Muito. E eu o soquei depois disso... para machucar.
— Oh...
— Mas apesar de todas as merdas que ele fez, eu realmente não consigo enxergá-lo como um monstro. Ele jogou Jane. Fez uma jogada de mestre e ganhou.
— Eu...eu não estou entendendo.
— Ele usou a saúde da sua mãe e a saúde financeira do seu pai. Ele forçou o casamento, mas do fundo do seu coração... você acha que se você tivesse dito não a ele, Ethan teria deixado sua mãe morrer? Você realmente acredita que ele seja tão monstruoso assim?
Phillipe desviou o olhar e encarou Ethan a poucos metros de distancia. Jane seguiu seu olhar e então voltou a olhar para o amigo.
— Você seriamente acredita que alguém que ame você tanto assim deixaria sua mãe morrer? Eu não sei o que aconteceu naquele dia horroroso para que ele fizesse o que fez, mas eu não tenho dúvida quanto ao sentimento dele por você. Ele te ama.
Jane engoliu seco. Não sabia o que pensar. Não sabia se Ethan a amava ou não. Mas sabia que apenas amor nunca seria suficiente. Ela não conseguia acreditar nele.
— Eu não consigo... não confio nele.
— Como poderá confiar se você não dá uma chance para que ele se aproxime e tente se explicar?
— Explicar o que? Como foi que ele comeu aquela v***a? Como ele fez com ela tudo o que era para ter feito comigo? É isso que está me dizendo para fazer Phill?
Lentamente Phillipe balançou a cabeça vendo a amiga engolir suas lágrimas. Ele não podia se intrometer mais do que já tinha feito.
— Não. Não é isso e você sabe muito bem. Estou pedindo para que dê uma chance ao seu coração. Uma chance de viver o amor que você ainda sente por ele. E por favor... não diga que não sente isso, porque eu sei que sim.
Jane não retrucou. Talvez por não sentir vontade de fazê-lo entender que não amava Ethan. Ou talvez porque nem ela mesma acreditava nessa mentira.
**
Há quanto tempo ele estava parado no meio daquele quarto olhando para o vazio? Ele não fazia ideia. Desde o momento em que entraram em casa Jane se afastou dizendo que tomaria um banho. Ele fez o mesmo no banheiro social e agora estava parado no quarto reservado ao casal.
Percebeu pela movimentação que Jane deveria estar no closet e seu nervosismo aumentava. Não sabia se ela estava disposta a ter aquela conversa agora, mas ele não podia mais. Não depois de vê-la sorrir alegremente para todos... exceto para ele.
Girou o corpo quando ouviu passos atrás de si. Perdeu o fôlego ao ver Jane com o rosto limpo, sem maquiagem, os cabelos presos em um coque e longa camisa de malha que chegava a metade de suas coxas. Algo que não ficaria sexy em outra mulher, mas que tinha um efeito devastador nela. Sentindo o coração disparar a ponto de deixa-lo sem ar, Ethan deu dois passos em direção a ela.
Porém, sem dizer nada Jane o fez parar com o olhar e foi até a cama. Estático ele observava a esposa pegar o travesseiro e o cobertor.
— Jane? O que pensa que está fazendo?
Ela girou o corpo e a frieza em seu olhar fez com que Ethan desse um passo para trás. A raiva borbulhava dentro dela a impelindo para frente até ficar tão próxima a ele que seu cheiro de flores frescas o deixou atordoado.
— Você conseguiu, seu desgraçado. Você me provou o que eu já sabia. Não passa de um canalha safado. Você me comprou usando as dívidas do meu pai e a doença da minha mãe. Eu sei que você fechou todas as portas para eles de forma a não me deixar alternativa. E aqui estou... eu me casei com você. E só. Não pense que serei sua esposa na cama porque isso jamais acontecerá. Não pense que vai conseguir possuir meu corpo. Essa chance Crown... você desperdiçou há doze anos quando se deitou com aquela v***a.
— Jane, por favor... vamos conversar. Eu preciso dizer tudo a você. Sei que não ouvi seu lado e você também não ouviu o meu, mas agora...
Ele balançou a cabeça se sentindo desnorteado. Tudo bem que Jane esteve distante e arredia, mas não parecia estar com tanto ódio durante a festa. O que mudou? Phillipe teria dito alguma coisa para deixá-la o odiando ainda mais?
— Tudo bem... diga. Eu estou ouvindo.
— Sente-se aqui... por favor.
Procurando manter uma distância segura Jane se sentou na cama. Apesar de nervoso, Ethan sabia que tinha chegado a um ponto em que não poderia recuar.
— Eu não fazia ideia de que você estava preparando algo especial para nós.
— E nem poderia. Seria uma surpresa.
— Eu fiquei o dia inteiro tentando falar com você. Apesar de nossos planos para... perdermos nossa virgindade juntos, eu queria fazer algo inesquecível para você. Eu não pensei que você pudesse se aproveitar da ausência de seus pais para fazermos amor. Você sempre os respeitou muito. Jamais me passou pela cabeça que planejava fazer isso após a festa. Eu te queria tanto...
— Oh sim... Você demonstrou como me queria.
— Eu sempre senti ciúme do Phillipe. Sempre. Mas naquele dia não consegui falar com você. A festa já tinha começado e você não aparecia... Phillipe também não. Eu comecei a beber so para relaxar, mas você sabe que sempre fui fraco para bebidas. E Sophie estava lá... me olhando com ar debochado.
Jane se remexeu inquieta. Sabia que deveria deixar Ethan ir até o fim, mas o simples fato de ouvir o nome de Sophie fazia sua raiva redobrar. Sentia vontade de bater em Ethan até extravasar todo seu ódio... e seu ciúme.
— Por fim ela se aproximou de mim e disse que sempre soube que isso aconteceria. E eu, i****a, perguntei a que ela se referia. Foi então que me disse ter visto você entrando com Phillipe no motel. E que me levaria la se eu quisesse.
Ethan balançou a cabeça, horrorizado com sua estupidez. Se tivesse confiado em Jane nada disso teria acontecido. Ele não teria ido com Sophie até aquele motel... e hoje estaria casado com Jane, mas de uma forma bem diferente da atual.
— Eu vi você saindo com ele... eu já estava um pouco tonto e surtei. Quis ir atrás de vocês, mas Sophie me impediu. Eu sentia tanta dor... tanta. Não conseguia raciocinar.
— Não conseguiu se lembrar de que eu não era uma v***a? Por Deus! Eu era virgem, ao passo que a vagabunda que estava com você era rodada na cidade inteira!
— Eu sei! Eu sei... mas eu me deixei levar. Meu ciúme, minha raiva, minha insegurança e imaturidade... além do álcool me levaram a fazer o que fiz. Eu me deixei convencer que deveria pagar na mesma moeda... e entrei com Sophie naquele motel. E claro... so entendi que ela armou aquilo quando vi você entrar no quarto.
— Eu perdoaria sua traição, Ethan. Revelaria uma fraqueza de caráter e até mesmo imaturidade. No fundo éramos imaturos... um pouco. Mas existe uma coisa que não aceito. Para mim, isso é mais grave que uma traição da carne.
Ele engoliu seco, os olhos ainda ardendo pela infinidade de lágrimas que já tinha deixado cair... e que sabia que não findariam tão cedo.
— Você se lembra de quando nos conhecemos não é? Eu estava meio enrolada com o Eric. Mas eu fiz questão de ser franca com ele e terminar tudo, mesmo sem saber se eu teria chances reais com você. Eu quis honestidade. Ele confiava em mim. Confiança, Ethan. Sabe o que significa isso? Não... você não sabe. É isso que eu não perdoo. Eu não admito que ninguém duvide de meu caráter.
Ela se levantou e ficou de frente para ele. Ethan agora soluçava, quase cego pelas lágrimas que escorreram de seus olhos sem que ele percebesse.
— Jane, por favor, me ouça.
Entretanto Ethan foi pego de surpresa quando ela apontou o dedo em sua cara, gritando como ele jamais viu.
— Depois de tudo o que fiz e disse você não confiou em mim! Eu fui sim ao motel com o Phillipe. E fui por ele já ser maior de idade, meu amigo e o único que poderia facilitar para que eu entrasse la. — Passou a mão nos olhos secando a lágrima que ela se recusava a deixar cair. — Era o único em quem eu confiava o bastante para me ajudar a preparar tudo para minha primeira noite com você. Ele estava me ajudando! Mas você não confiou em mim! Eu até entenderia se você tivesse acreditado em qualquer outro dos nossos amigos. Mas você acreditou em Sophie!
Ethan engoliu seco novamente, o peso daquele erro deixando-o atordoado.
— Você acreditou na p**a que todo mundo sabia que era louca para abrir as pernas para você! Em vez de acreditar na sua namorada você acreditou nela e quis pagar na mesma moeda. Agora eu pergunto... que amor é esse que você diz sentir? Que amor é esse que não confia?
Ela balançou a cabeça e seguiu até a porta do quarto, parando e falando antes de sair.
— Eu não odeio você. Tive mágoa, tive raiva, mas nunca odiei. Mas eu não quero em minha vida alguém que diz que me ama, mas confia em todos... menos em mim.
E como se uma faca atravessasse o peito de Ethan, ela pontuou cada palavra.
— Eu. Não. Quero. Você. Em. Minha. Vida. Não acabou quando eu vi você nu ao lado de Sophie. Acabou quando não confiou em mim.
— Eu não transei com ela!
Ele berrou e novas lágrimas escorreram pelo seu rosto. Jane parou, ainda de costas para ele enquanto seu cérebro processava a nova informação. Lentamente ela girou e caminhou novamente até ele.
— O que pretende com isso?
— A verdade...apenas isso.
— Eu vi vocês dois. Ou se esqueceu que eu entrei justo quando você vestia a cueca?
— Eu trai você naquele dia. Trai porque não confiei. Trai porque acreditei em Sophie. Trai porque permiti que ela me visse nu. Trai porque pensei realmente em t*****r com ela e fazer você pagar pelo que eu achava que tinha feito. Mas eu não transei com ela.
Jane permaneceu parada e em silêncio. Saber que a desgraçada viu o corpo de Ethan lhe causava uma dor dilacerante. Mas saber que ela não conseguiu seu intuito completamente era libertador. Ela acreditava em Ethan. Não havia como alguém fingir tanto sofrimento quanto o que ela via agora.
— Eu não senti nada exceto nojo. Dela e principalmente de mim. Por mais que eu estivesse destruído, meu corpo e meu coração ainda pertenciam a você. Nem mesmo o álcool foi capaz de tirar totalmente minha lucidez. Felizmente eu acordei a tempo. Não era aquele corpo, não era aquele olhar, não era aquele toque. Não era você. No momento em que você abriu a porta... eu tinha acabado de dizer a Sophie que ela nunca teria de mim o que eu queria dar a você.
— Oh...então... por que você me fez acreditar que transou com ela?
— Porque eu queria machucar você da mesma forma como eu estava. Eu queria que você sofresse. E também... porque ao olhar em seu olhos e ver a decepção neles, eu soube que mesmo se dissesse a verdade não mudaria nada. Porque eu confiei na pior v***a da cidade e não em você.
Ethan curvou seu corpo para frente e enterrou a cabeça entre seus braços. Jane o olhava agora com as lágrimas escorrendo pelo seu rosto. Surpresa, aliviada, mas ainda triste. Acreditava em cada palavra, mas ainda não era o tipo de confiança capaz de segurar um relacionamento. Ela não estava pronta. Talvez nunca estivesse.
Depois de um longo silêncio Ethan ergueu a cabeça e seus olhares se encontraram.
— Depois de muitos anos, após ter esgotado todas as minhas tentativas de você me ouvir... Eu acabei fazendo o que eu deveria ter feito com você. Não vou entrar em detalhes, mas... Eu nunca me relacionei com mulher alguma. Foi apenas algo p**o, frio, sem emoção, sem sentimento... apenas um alívio. Sei que não justifica nada, mas... Enfim. Eu seria e serei sempre incapaz de me relacionar com outra mulher. Você foi a última mulher que eu beijei.
Dizer que não estava surpresa seria mentira. Sempre imaginou Ethan levando uma vida de playboy, saindo a cada noite com uma mulher diferente. Sequer imaginou que ele utilizaria serviços profissionais para se satisfazer.
— Eu peço desculpas por tê-lo julgado m*l e não lhe dar chance para se defender. Mas... Eu vi a cena. Foi diferente de você que acreditou em palavras de uma víbora. Ambos erramos. Novamente peço desculpas, mas isso não muda o principal...
— Eu não confiei em você.
— Sim. E embora eu acredite em tudo o que me disse agora, eu não confio mais em você. Não para um relacionamento de qualquer espécie. Eu... eu não conheço mais você. Eu sinto muito.
Ethan se deitou de lado, amargando sua dor no momento em que ouviu a porta ser fechada. Estava livre daquele peso que o atormentava. Mas de que adiantava? O que ele poderia fazer para que Jane voltasse a confiar nele? Como fazer isso se ela estava claramente disposta a não facilitar?
Já no quarto de hospedes, Jane se jogou na cama, finalmente dando vazão às suas lágrimas. Claro que já o tinha perdoado. E queria muito ser capaz de confiar nele novamente. Mas como?