Capitulo 5

1709 Words
"A morte de um ente querido é uma coisa estranha. É como subir a escada para o seu quarto no escuro, e achar que tem mais um degrau...quando não tem. O seu pé afunda no ar, e acontece um grande momento de grande susto".-Desventuras em série  -O que estamos ouvindo?-Pergunto a Arthur. Ele olha para mim e volta a olhar para a rua. -Você deveria saber, trabalha lá. -Ele diz. Reviro os olhos e aumento o som do carro. Meu irmão está trabalhando e Arthur e eu temos que fazer compras. Eu não queria vir, mas sei que Arthur não traria nada que eu pedisse. No carro, está tocando a rádio. Começou com algumas músicas sertanejas e agora, um homem está falando. -E não percam hoje, às sete e meia, "Uma hora com Rebeka." E reforçando o convite, faltam apenas uma semana e meia para a festa mais esperada da cidade! -O que é esse Uma hora com Rebeka?-Pergunto. -Rebeka é a prima do Luís, a gêmea boa, ela tem um programa na rádio onde faz o que quiser em uma hora, todos da cidade a amam. -Ela é irmã da Ravenna? -Você por acaso é s***a? Foi o que eu acabei de dizer, a gêmea boa. Não falo mais nada até chegarmos no mercado. Após uma hora, já estamos com várias sacolas de compras em direção a porta da frente da casa. Entro e Arthur joga as coisas no balcão. Guardo toda a feira e subo para meu quarto. Até hoje, não teve um só dia que eu não me lembrasse dos meus pais, que eu não sentisse vontade de fechar os olhos e sumir. Que eu não imaginasse minha mãe afagando meus cabelos e meu pai me abraçando como se eu ainda tivesse 10 anos e tivesse marcado o gol da vitoria no futebol. Me lembro que eu era a única do time que realmente queria estar ali. Não por mim, mas pelo meu pai. Rael tinha acabado de se mudar e meu pai estava triste, ele e Rael eram unidos na época e lembro dos dois assistindo futebol sentados no sofá, rindo. Meu pai olhava para Rael como se ele fosse a criatura mais incrível do mundo e eu amava ver isso. Ele sentia muito orgulho de Rael. Do jeito que um pai deveria sentir. Então, para tentar deixa-lo feliz, eu entrei para o futebol. O seu sorriso, seus gritos da arquibancada, seu rosto vermelho de orgulho, fizeram valer a pena cada joelho ralado. Essa é a pior parte de perder alguém. A saudade, as lembranças. São a única coisa que restam. Mas, embora eles tenham partido, eu ainda os sinto aqui. É estranho, eu apenas sinto eles aqui comigo e isso é o que me conforta a cada dia. Eu só gostaria de ter minha alegria de antigamente. Eu era a pessoa mais excêntrica e feliz que podiam encontrar. Eu não ligava para que os outros pensavam, eu apenas queria paz e encontrava quando desligava os pensamentos e sorria para o mundo pelo único propósito de estar viva. Eu gostaria de ter aquela alegria de volta, mas casa vez que tento isso, ao invés do meu peito inflar de alegria, vem dor. Eu perdi tudo. Nunca vou ser aquela garota novamente. Hoje de manhã, percebi que havia uma chamada perdida de Giovanna. É lógico que não retornei. Para mim, nossa amizade morreu faz tempo. Tomo um banho e me deito. São quase sete e meia. Lembro da conversa que tive com Arthur. Estou curiosa sobre essa tal de Rebeka. Uma vez, quando eu estava limpando a casa, vi um rádio no quarto do meu irmão. Vou até lá e pego, sintonizo na estação e espero. As sete e meia em ponto, uma voz doce, mas não muito infantil, surge. -Boa noite, gente. Como estão? Eu estou ótima! Sabe, eu passei o dia todo pensando sobre o que vou falar com vocês, então eu pensei que vocês pudessem ligar e sugerir algo, por enquanto, deixo vocês com "Magic", de Coldplay, é uma música especial, pois perdi minha virgindade ouvindo ela e preciso dizer que não tem nada de mágico nisso. Solto uma risada baixa ao mesmo tempo que a batida que reconheceria de longe, começa a tocar. Sempre tive um carinho especial por essa música. Fecho os olhos e cantarolo baixinho cada verso da música. Assim que os últimos versos terminam, a voz da garota, volta. -Aiai, espero que ele tenha entendido a indireta...o que a gente não faz por saudades, não é?...já podem ligar para cá, o número continua o mesmo e...temos nossa primeira ligação!- Ela diz. Ela começa uma conversa com um garoto. Ele sugere que ela fale sobre términos de namoro e a mesma aceita. Bem apropriado para mim. -Eu, como muitos sabem, sempre fui uma pessoa...aberta a namoros. Lembro do meu primeiro, eu tinha uns...6 anos. Ele me trocou pela minha amiga porque ela tinha um gibi da turma da Mônica. Homem é assim gente, ele tá contigo mas ta olhando o que a outra tem a mais. Mas eu me vinguei, apareci no outro dia com DOIS gibis da turma da Mônica. E adivinha quem veio atrás de mim? Isso mesmo, meu ex namorado. Eu poderia ter 6 anos, mas aprendi a me valorizar depois daquilo. Sua forma de usar o humor para ensinar algo, é cativante. -E não para por aí, eu já tive 14 namorados, e com todos eles, aconteceram a mesma coisa, um tentando mostrar pro outro que está bem, mas na verdade ta enchendo a cara todo final de semana, lembrando que no meu caso, é enchendo a cara de refrigerante, eu não bebo, mãe...enfim, eu aprendi que tenho que começar um namoro já pensando no término, pois a vida não é um conto de fadas minha gente, a vida é aquele garoto que te trocou pela amiga, a vida é aquele trouxa que te traiu, a vida é feita de momentos e os casais apaixonados que me desculpem, mas daqui um tempo, será apenas momentos que sobrará desse seus "amor eterno". Uma garota que sofreu por uma traição reconhece outra. Aposto todas minhas fichas que o último namorado dela a traiu e arrisco mais um pouco que foi com uma amiga dela. Parece que não sou a única nessa situação. -Bom, desabafos a parte, quero aproveitar para divulgar sobre o baile de máscaras do tio Theo, como eu já havia dito, a vida é feita de momentos então venha viver esse momento único! Não é todo dia que o pão duro do meu tio faz uma coisa dessa de graça..."Sorry", tio, te amo. Agora fiquem com uma música do "Imagine Dragons". Assim que a melodia começa, fecho os olhos e me deixo perder na música. -Você tá bem?-É a voz do meu irmão. Abro os olhos já sentindo minhas bochechas esquentaram e desligo o radio. -To, eu só estava ouvindo um pouco de música.-Respondo. -Tá...Eu vim avisar que uns advogados me ligaram de São Paulo, parece que a nossa mãe tinha uma propriedade no nome dela. Era do nosso avô e ele deixou para ela quando morreu, mas por algum motivo ela não contou a ninguém. -Rael diz com cuidado, estudando cada reação minha. -Eu vou ter que ir para lá, agora a propriedade é nossa e querem saber o que vamos fazer com ela. Do que adianta manter isso? -Vamos vender. -Digo. -Sim, mas parece que tem alguns pertences dela, e se você quiser, posso trazer algumas coisas. -Ele diz. Mais coisas para lembrar deles? Meu Deus, a dor já é quase insuportável. Não é que eu queira esquecer meus pais, apenas quero que a dor amenize. Nunca vou esquece-los. -Não quero nada, Rael. Ele assente. -Tudo bem, eu vou na segunda feira, não sei quanto tempo vou ficar, talvez uma semana ou mais.-Ele diz. -Você vai perder o baile?-Pergunto. -Talvez...-Ele diz. Quero contestar, afinal, Rael é meu par, mas não faço. É da morte dos nossos pais que estamos falando. Essa palavra, morte, parece ter uma imensidão de sentimentos sombrios entre cada letra. É tão forte quanto às palavras "ódio " e "amor ". É uma palavra que muitos temem e eu acabo de usa-la para me referir ao acontecimento com meus pais. -Tudo bem.-Digo. Ele flexiona o lábio em um sorriso amistoso e sai. Ligo novamente o radio, mas o programa da Rebeka já acabou. Deito a cabeça no travesseiro e fecho os olhos pensando sobre...tudo. Então abro os olhos assustada, pois acabo de raciocinar. Se Rael vai viajar, vou ser obrigada a ficar sozinha com o insuportável do Arthur. Não vou aguentar uma semana com ele no meu pé do ouvido. Talvez Rael possa me levar, posso ser bem persuasiva quando quero.  ¤♡¤♡¤♡¤♡¤♡¤ -Pela alma da nossa falecida mãe, não me deixa sozinha com essa criatura.-Sussurro ao Rael. -Desculpa May. Você tem seu emprego e meu voo sai em uma hora.-Rael responde. Bufo. -Que tipo de irmão deixa a irmã menor com um porco de 20 anos que não sabe a diferença entre limpo e sujo. -Apelo para seus sentimentos uma última vez. -O porco de 20 anos está ouvindo. -Arthur diz atrás de Rael. Ele dá uma piscada e se joga no sofá com o controle do sei Xbox na mão. Rosno baixinho imaginando eu enfiando o controle dele goela abaixo. Eu iria fazer pipoca e o ver se debatendo e agonizando até o seu último suspiro de vida. Essa semana Arthur aprontou bonito comigo. Ele disse que me buscaria no trabalho e eu fiquei esperando mais de uma hora. Resolvi ir andando e ele quase me atropela e ainda brigou comigo por não estar esperando ele. -Por favor, Rael!-Imploro. -Foi m*l, o máximo que posso fazer é pedir que ele se comporte. -Está bem...quer que eu te leve até o aeroporto? -Pergunto. Ele sorri e assente. Se despede de Arthur e o ajudo com a mala até o carro. O caminho até o aeroporto foi tranquilo, implorei à Rael mais uma vez e o fato de eu estar abrindo a porta de casa, quer dizer que não deu certo outra vez. Quando abro a porta totalmente, a última coisa que pensei que encontraria era um cassino, mas aqui está Arthur, Lucas e outros três caras que não conheço bebendo e apostando as 23:00 de segunda feira. Isso é o que me espera essa semana e eu peço a Deus que não me faça perder o controle, ou eu quebro os dois braços de Arthur. E é provável acontecer pois os 30 minutos que estive fora de casa, a louça está quase encostando no teto. Isso eu não admito.
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