EPISÓDIO UM| VIDA TURBULENTA

3243 Words
NEFERTARI ...Sinto a calma em volta de mim ,o teu vento vem me perturbar me envolve me leva daqui, me afoga de novo no mar.(Marjorie Estiano)  O lado do meu rosto doía como se eu tivesse sido alvejada por um paralelepípedo . O cheiro almiscarado do casaco de Alec invade meus sentidos no momento em que levo o mesmo a cobrir o lado do meu rosto , quando passei ao lado do porteiro . Não poderia permitir que visse meu estado deplorável – era vergonhoso e também me sentia humilhada , sem falar que poderia chamar a policia. E como eu iria me explicar diante das autoridades que os meus próprios pais tinham o conhecimento do que acontecia comigo e que não dava a mínima ? . Minha mãe era a Barbie artificial , só pensava em ostentar e ser submissa ao marido , tanto ela quanto meu pai eram fãs fanáticos de Nicolas . Então eu me encontrava num labirinto sem saída , o que se tornava uma catástrofe , então por hora teria que lidar com toda essa bagunça sozinha . Chego em casa indo direto pra dentro da geladeira . Meu pai não estava em nenhum lugar à vista , apenas minha mãe vem atrás de mim uma vez que viu a hora que cheguei . Faço uma careta pressionando o gelo contra minha bochecha e olho. - Nefertari ..o que houve ? – Minha mãe inquere me virando para ela e soltando um arfar de horror assim que vê o estrago em meu rosto . – O que aconteceu ? , foi assaltada ?! - O que acha que aconteceu mãe ? – Desanimada a encaro sentindo um aperto em meu coração , quando jogo o gelo dentro da pia . Ela engole seco – O de sempre e que a senhora e o papai fingem não ver , nunca! . - Filha não é bem assim ...é que...- A mesma tenta se explicar , pode ser impressão minha mas ainda consigo enxergar uma fagulha de culpa em seu rosto perfeitamente maquiado. - É que ? ... tem noção o quanto tudo isso é humilhante ? – As lágrimas alcançam minhas bochechas – Não adianta mais tentarem forçar esse relacionamento doentio e tóxico com o Nicolas , porque eu já estou farta de tudo isso . Não dá mais pra ficar assim . Não dá! – Aponto pra meu rosto , meu olho esquerdo nem abrir mais não abre e quando tento, a dor maçante intensifica . - Só está magoada minha querida , logo logo vai passar . Venha sente-se aqui – Ela me coloca sentada na cadeira , enterro meu rosto em minhas mãos sem ter mais forças para me sustentar. Ao mesmo tempo que queria gritar já me sentia fraca. Ter que lidar com essa montanha russa exigia todo meu auto – controle e sanidade mental . E no final só restava uma casca de mim , esvaída sem vontades e dominada por desejos dos outros . – Nicolas , deveria estar muito alterado com a bebida . É normal , essas coisas acontecem .- Ela fica massageando minhas costas - Não acredito que está defendendo aquele louco doentio ao invés de sua própria filha! – Minha voz sai esganiçada , uma vez que ergo minhas vistas para ela . Engole seco abrindo um sorriso fraco . - Meu amor... não me entenda m*l . Sabe que seu casamento com Nicolas é o que precisamos para alavancar a carreira politica do seu pai, essa aliança com a família dele é muito importante para todos nós . Eu n**o desgostosa com um balanço de cabeça afastando meu corpo para longe de suas mãos . Estava me fazendo mais m*l do que bem , na verdade conviver com meu pai e minha mãe era um m******e . Ao menos sabia o que era ter domínio sobre a minha própria vida . - O que está havendo aqui ? – Meu pai aparece quando estava dando dois passos para sair da ala da cozinha . Seus olhos param em meu rosto , mas não existe nada em sua expressão facial – o olhar que o mesmo me dá é como se um de meus olhos não estivesse fechado pela porrada que levei e minha bochecha inchada. – Nicolas fez isto , presumo . Ele não mede mesmo a dose com você . Irei pedir que se contenha , não será bem visto que chegue ao alcance de outras pessoas notícias como esta . Cansada de ficar olhando pra cara dos dois , saio correndo de perto deles . Não conseguia parar de chorar . A raiva estava encravada por dentro do meu peito me deixando à beira de uma crise de ansiedade . Arranquei as roupas do meu corpo , colocando o casaco do Alec bem dobrado por cima da minha cama , quando de ponta de pé fui em direção do banheiro . Queria retirar quaisquer resquícios das mãos pegajosas de Nicolas de cima de mim . Arrasto a escova por minha pele como se fosse arrancar o couro – com meus dentes travados no outro sendo golpeada pelo desespero iminente . Assim que termino o banho , me enrolo num roupão voltando para o quarto e colocando minha camisola . Me jogo debaixo do cobertor arrastando o casaco de Alec para cima de mim , sentia como se de alguma maneira ele estivesse me protegendo . *** No dia seguinte me levantei sentindo uma dor arrasadora no meu corpo – já fazia um tempo que não ia a academia , aposto que se estivesse assídua aguentaria o tranco dessa vez , no entanto não é o que acontece , já que me levanto soltando gemidos estrangulados – abro o criado mudo pegando um comprimido para dor muscular – já fazia parte de mim. Pego o copo com água que havia deixado à noite reprimindo uma careta quando engulo . Tudo o que eu mais queria era poder faltar a faculdade hoje , mas não posso – sendo que tem prova . Tudo o que terei que fazer é inventar que estou com conjuntivite- já que o único jeito é colocar os óculos escuros mesmo sendo à noite ,e disfarçar o machucado em meu rosto com maquiagem e bastante corretivo . Nem descer para o café da manhã eu quis , simplesmente peguei o telefone e liguei para o interfone da cozinha pedindo a Jacira que me traga no quarto . Não queria ver a cara dos meus pais ,- se é que poderia chamá-los desta forma . Em algum tempo depois ela bate na porta - Entra . – Digo me acomodando melhor na cama , me encostando na cabeceira . Jacira passa pela porta com a bandeja em mãos , no momento seguinte que se vira para mim seus olhos arregalam-se incrédulos . Lhe dou um tchauzinho tentando um sorriso amistoso . Ela era legal mas não iria lhe contar o que vinha acontecendo comigo nos últimos tempos frequentes – quanto menos falar à respeito ,melhor vou saber lidar . - Minha nossa senhora! . O que aconteceu com você menina ? – A mesma deposita a bandeja em cima da cama se sentando ao meu lado e agarrando em minhas mãos . Seu rosto está tomado por horror e piedade . - Infelizmente quando estava voltando da festa ontem à noite fui assaltada ,eu tentei resistir mas acabei ganhando isso aqui de presente – Aponto pra meu rosto , resolvendo aderir a mentira deslavada na qual a minha mãe preferia acreditar em seu submundo superficial . - E o senhor Nicolas ? , não veio com você?, onde aconteceu isso ? – Uma das coisas em relação a Jacira é que ela não se contenta com uma metade da história , ela quer ficar por dentro de todos os detalhes . O que eu não tinha para dar , então se ela queria um enredo ‘’ eu lhe daria um . -Infelizmente desci uma quadra antes de casa , queria andar um pouco . Nicolas quis vir comigo mas o impedi , às vezes é legal uma mulher andar sozinha , mas ontem não foi mesmo uma boa ideia – Dou de ombros , passando meus olhos pela bandeja já catando um pão francês com geleia . - Não pode ficar andando por aí sozinha menina Nefertari . Cuidado . Se tivesse visto os malandros quem foi , poderíamos denunciar eles ! – Seu rosto está irritado . - Já passou . O que importa é que estou bem – Corto a conversa . Omitir algo assim está me matando , então prefiro mudar de assunto . – E o Hugo ? , como está indo no novo trabalho ? No mesmo instante seus olhos iluminam-se . Ele era meu chofer , me levava para todos os lados , mas à cerca de um mês atrás conseguiu trabalho e pediu demissão daqui de casa . Eu fiquei feliz por ele , se encontrou algo melhor para fazer , era isso que importava . - Sinto pena do meu menino , quase não nos vemos . Ele trabalha demais , quando ele está chegando eu estou saindo para o trabalho . Essa vida de trabalhar como segurança noturno , está lhe custando boas noites de sono . – Jacira faz uma careta se levantando de cima da cama e ajeitando os lençóis , enquanto eu sorrio um pouco tomando meu café da manhã . – E você , fica bem logo . Agora deixa eu voltar para meus afazeres , se sua mãe me pega por aqui eu estou ferrada . Aceno para ela concordando com a sua fala a medida que Jacira me da um beijo na testa saindo porta a fora . – Ela me tinha como uma filha e me dava mais carinho do que a minha própria mãe . Solto um suspiro e me concentro em terminar o café da manhã .Mastigar está me custando , já que para isso necessito movimentar a mandíbula , por isso estou comendo tão devagar . *** Passei o dia inteiro dentro do meu quarto . Almocei por aqui também , e estudei a maior parte do tempo. Portanto assim que a noite chegou eu já estava arrumada , com o rosto carregado de maquiagem e com meus óculos escuros , meu olho machucado ainda não abria – ardia quando eu tentava . - Filha , vai para a faculdade ? – Minha mãe pergunta assim que fecho a porta do meu quarto logo atrás de mim . - Não é óbvio ? – Sou seca , tomando meu rumo lhe ignorado propositalmente . Odiava encarar a minha mãe e saber que ela é conivente com a minha tragédia , apenas por causa da carreira na política do meu pai . O dinheiro para eles importa mais do que a filha . Vou de Uber – por isso mesmo saí as pressas , uma vez que o chamei . Para evitar burburinhos , eu precisava chegar primeiro do que todo mundo . No momento seguinte que passo pelo portão , sinto minha nuca pinicar – é como se alguém estivesse me vigiando . Olho para todos os lados , começando a achar que só devo estar paranoica , ignorando meu ‘’ estado de alerta ‘’ confiro se é mesmo o cara do Uber e então caio para dentro em seguida . Claro , que todas as vezes que eu pego um,- confiro primeiro pela foto se é a mesma pessoa e o modelo do carro , tudo o que não preciso é de pegar um ladrão ou até mesmo um psicopata que queira abusar de mim e jogar meu pobre corpo por algum matagal ou viela – Deus que me livre . Para dispensar os pensamentos ruins que começaram a rondar por meu cérebro , eu conecto os fones em meu ouvido e fecho os olhos navegando na música de ‘’Kid Abelha – como eu quero ‘’ . Instantaneamente imagens do cara misterioso intitulado por Alec , invade as minhas memórias – junto à um sorriso involuntário surgindo em meu rosto . Durante o período da aula versus prova, consegui sair ilesa sem maiores inquisições de meus colegas de turma . Para meu prazer , apenas Fabí perguntou o porque de eu estar usando óculos escuros à noite – claro , deduzi muito antes que essa parte não sairia fora de roteiro sem precisar ser questionada à respeito. Então como já tinha programado em minha mente lhe disse que não passava de conjuntivite e que eu logo ficaria boa , por fim me deixou em paz e não mais me perguntou sobre , valendo também para os demais . Já que possamos dizer que Fabí tem uma língua um tanto solta – logo a notícia se espalhou e eu fiquei bem . - Nefertari . tem mesmo certeza de que não quer sair para beber com a gente ? – Fabí e Ketlyn me perguntam pela milésima vez , após o término das aulas . – Elas estavam vestidas de acordo . Ketlyn e Fabí vestiam vestidos sexys , com escandalosos batons vermelhos estampados em seus lábios fartos . - Não meninas , valeu . Preciso ir mesmo para casa , cuidar disso aqui antes que piore .- Suavizo minha recusa abrindo um sorriso para elas . Fabí rola os olhos e Ketlyn dá com as mãos se afastando se aproximando do outro grupo que estava mais adiante conversando alegremente , senti uma pitada de inveja por não ter a mesma empolgação que eles – nem era mesmo por ‘’ não ter’’ mas por me sentir constantemente aprisionada as vontades de meus pais . - Logo hoje você foi inventar de ficar com os olhos doente..? – Fabí faz um bico descontente o que faz com que eu sorria de seu jeito . - Claro Fabí , como eu previ isso antes claramente foi para sujar o seu lance e não poder comparecer a saidinha da turma . – Debocho Ela solta um suspiro desanimado se dando por vencida , finalmente . – Tudo bem! , mas não se esqueça de que fica me devendo essa – Aponta um dedo desaforado para mim pegando seu rumo enquanto eu murmuro um ‘’ok ‘’ lhe dando tchau exibindo um meio sorriso de boca fechada . Chamo o Uber pelo aplicativo me maldizendo por não ter feito isso antes , no entanto a constante perseguição ‘’ das meninas não me ajudaram a pensar com maior sensatez – enquanto tentava me livrar do embaraço de manter a minha mentira deslavada intacta ‘’. Quando chego no ponto vejo uma mensagem chegando no meu celular , meu coração dá um salto contra meu peito quando vejo o texto de um número desconhecido . Trêmula passo o dedo pela tela do celular desbloqueando . Tivemos que adiar a visita desta semana , fique a disposição para um novo contato . – Engulo em seco , saindo da mensagem de texto . Um suspiro aliviado escapole por entre meus lábios , junto com a famosa culpa familiar me atingindo em cheio .- Sei que não deveria me sentir aliviada . Querendo ou não essas visitas deveriam ser algo com a qual eu já deveria estar acostumada e não me sentir como um cãozinho acuado . Todas as vezes que visito Alvarez no hospital , me vem à tona memórias indesejáveis daquela noite , e então novamente não durmo por dias seguidos . Então sou despertada pela buzina do Uber – tomo um susto conferindo no celular se é a mesma foto do motorista e o modelo do carro – assim que tenho as informações as quais eu necessito , entro no carro e de novo eu sinto minha nuca pinicar , - como se alguém estivesse me observando . Sacudo minha cabeça me sentando no banco e fechando a porta , dando apenas um ‘’ boa noite ‘’ ao motorista , ele acena e então toma o caminho . Agora sentada e mais tranquila , uma dor familiar me invade repentinamente e eu sei que é por causa da mensagem que recebi agora à pouco . Tem 2 anos que não penso naquele dia , onde entro em uma rotina esmagadora de culpa . Ele foi o culpado!- eu lembro a mim mesma , repetindo o que sempre meus pais dizem . Foi a decisão dele de me sequestrar e coincidentemente colidiu com o carro naquele dia .- foi ele quem escolheu o seu próprio destino . A racionalidade me dá um choque de realidade – sei a força que essas palavras possuem , mas ainda assim tenho uma grande dificuldade em aceitá-las . Já basta Nefertari! Pare de se martirizar ! , foca na estrada.-Eu mesma me dou um tapa mental para deixar de me sabotar . Não sou a culpada! . Respirando com força , e querendo desligar o foco da minha mente , começo a entrar na deriva de prestar atenção as ruas conforme vamos alcançando o meu destino . É um roteiro de aproximadamente 40 minutos . Minha barriga dá um protesto , me fazendo consciente de que estou prestes a entrar naqueles dias ‘’ . Então isso me faz ter a certeza de meu lado melancólico , que tem haver com meus hormônios em polvorosa . Assim que chego em casa , evito outra vez meus pais e vou direto lavar minhas mãos e procurar o que comer, tudo isso com meus fones plugados em meus ouvidos – estava mesmo barrando qualquer tipo de proximidade ou conversa que meu pai ou minha mãe pudesse querer ter comigo , hoje não era mesmo o dia . No entanto , não tenho esse êxito . - Minha querida! , que bom que já chegou! – Minha mãe , como não costuma respeitar a vontade alheia , arranca os fones dos meus ouvidos , fazendo com que eu gire meu corpo para ela sem disfarçar a minha irritação . – Veja que ramalhete lindo de flores chegou para você . – Desço meus olhos para suas mãos encontrando um buquê de rosas vermelhas – olhar para elas me dá a impressão de ser uma poça de sangue . – estou assim de saúde mental ‘’. - Nem preciso perguntar de quem foi , não é ? – Digo com o tom mais desanimado possível , na verdade é como me sinto . - Nicolas te ama meu amor , isso não é bom ? – Eu bufo fingindo que não escutei o absurdo que sai de sua boca – Demonstra que ele está arrependido do que te fez – Ela está com um sorriso congelado em seu rosto . Esse eu já conheço , é daqueles falsos’’ para tentar ‘’ me convencer ‘’. Arrebato o buquê das mãos dela e enfio na lata de lixo , pegando meu prato e levando para meu quarto , a deixando boquiaberta em pé no meio da cozinha . Estou farta de sempre ele me agredir e depois vir com um maldito buquê de flores – como um pedido de desculpas . Merecia estar atrás das grades , e não perambulando por aí com a cara lavada dele .
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