Olivia
A festa de aniversário de uma das minhas amigas rolou até altas horas, havia muita bebida alcoólica à nossa disposição, afinal a garota rica pode bancar. A boate principal da cidade estava lotada, e foi alugada principalmente para a elite. Tremendos gatinhos dando mole no rolê, a gente podia pegar geral. Sem se preocupar com nada, a não ser essa madrugada louca.
Adorava essa minha vida despretensiosa, longe de regras, compromissos. Livre para curtir a noite inteira, sete dias por semana. Sem intervalo.
O Coronel Cristóvão pagava para manter a filhinha dele distante o suficiente para não envergonhá-lo. O que iriam dizer aos seus subordinados se não conseguia manter a própria primogênita na linha? Tirava sarro disso, desse golpe em seu destino.
Fugia dessa autoridade da qual minha amada mãe vivia, ela sim me amava. E me deu todo o carinho pelo qual ansiava. Meu pai nunca agia amorosamente, pois dizia à sua mulher que ela me mimava além dos limites aceitáveis.
Quando faleceu já tinha idade para morar sozinha, ele me dispensou como se fosse um soldado quebrado vindo da guerra, dando uma baixa em sua vida. Odeio os seus soldadinhos!!!
Dancei até onde o corpo conseguia suportar, trocando taças de champanhe vazia por cheias até a borda, e outras bebidinhas afrodisíacas. Oferecida pela casa de show.
Muitos rapazes chegavam perto o suficiente para dar uma boa conferida no conteúdo, me aproveitava, dava uns amassos, beijos, mordidas safadas, além de arranhões da gata sedenta por se aninhar em uma deliciosa p**a quente, e de preferência bem grossa para me deixar dolorida no dia seguinte. Gostava da adrenalina de ser domada e de agir feito uma domadora de um touro raivoso, os dois lados do prazer faziam parte da minha trajetória. Do meu espírito livre, completamente libertador.
Depois de me esbaldar na pista de dança, encerrei lentamente entre sorrisos com os conhecidos ao derredor, avistando ofegantemente um cara que me olhava não muito distante dali, bebericando uma dose de licor. Sensualmente sério, olhos escuros, barba alinhada na face, divino no tremendo cavanhaque moderno. Parecia não estar acostumado com as baladas da região, se mostrando meio fora de contexto. Revelava ser de mais idade dos que costumam visitar esse local. Ia questionar a dona da festança, mas a malandra já tinha saído de fininho para o toalete, aos beijos do primeiro escolhido da longa noitada.
Olhei novamente entre a multidão festiva e alegre, perdendo-o de vista, então decidi ir embora. Desanimada por me interessar no carinha misterioso, e ele dar linha na pipa.
- Tchau gente! - Me despedi erguendo as mãos para o alto saindo em meio a letra da música “eu vou… eu vou… sentar agora eu vou… parara tim bum…”
Que ironia, nem ia sentar hoje. Ahhhh!!!!
Gargalhei olhando para os lados, trocando os passos e esbarrando nos machos gostosos pelo caminho. Eles eram muito educados, quiseram me levar para casa, mas eu sabia as orgias perversas que permeiam naquelas cabeças recheadas de pensamentos pornográficos. E adorava tudo isso.
- Essa mocinha está comigo.
Olhei espantada pela voz, e ao contemplar de quem pertencia, dei quase um gritinho de vitória.
***
Pela manhã não sentia a i********e inchada, mas me recordava bem daquela pegada forte daquele desconhecido que me trouxe de volta para o meu lar. O refúgio da guerreira.
Estava sonolenta ainda, suspirando por ter visto um passarinho fora dos padrões aceitáveis dessa pegadora nata, mas a maneira que usou a britadeira deixou-me em farrapos. Por minutos, pois me recuperava bem rápido. O tempo todo me chamava de insaciável.
Não trocamos nomes, muito menos sobrenomes. Apenas conheciamos o be a ba do desejo cru, aquela paixão fugaz. Sem medir as consequências, brincamos de roleta russa. Mas seria muito azar da natureza se acontecesse esse lance de gravidez indesejada. Não nasci para ser mãe, embora tenha tido uma perfeita em minha existência.
Coronel Cristóvão
Droga! Por onde andava essa irresponsável? Liguei várias vezes naquele celular que vivia com ela, por que raios não fazia a ligação de volta? Nem ao menos para dizer que estava viva!
Somente servia para pagar os luxos daquela menina ingrata, quando precisava de mais grana recorria a mim feito uma garotinha pidona. Me ligava fora de hora, e pelas madrugadas.
Suspirei cansadamente, passando as mãos nas laterais da cabeça, sem deixar cair o quepe. Desisti de falar com a minha filha rebelde Olivia, mas ela tomaria o castigo adequado a sua falta de moral para com essa família desmembrada.
Descansei os braços na mesa, pondo raivosamente o telefone no gancho. Embora tenha a tecnologia ao alcance da mão, gostava dessas peças de museu adaptadas para o dia de hoje.
Voltei à redação no computador da base do exército, onde guardava uns poemas no arquivo. Daqui a meia hora a cerimonialista faria a homenagem fúnebre, chegando vai querer tudo pronto. Mastigado.
Desejava imensamente ter tido a ajuda da Oli, para relembrar momentos marcantes, das quais tivemos com a falecida Efigênia. Mãe e esposa leal.
“Perdoe-me amada minha, não pude deixá-la perto o suficiente, ela me fazia lembrar de você por fora. Na aparência. Contudo, na maneira de ser era tudo o que mais odiava nesse mundo. A inadimplência”
Pablo
Corremos ao derredor do perímetro do quartel, era de costume, ainda mais nessas manhãs ensolaradas.
Todos os dias tínhamos a nossa rotina, afazeres e costumes. Apreciava a minha vida de soldado. Inclusive ganhei algumas honrarias por ter feito um excelente serviço prestado. Como um bom virginiano que se preze mantinha a minha origem regrada, além de ser um pouco perfeccionista em algumas situações, ou pessoas.
- Pablo!
Veio o soldado Ronan, acelerando os passos para me alcançar. Encontra-me em primeiro lugar na ponta dos corredores, atrás do nosso sargento gritando que eles eram uns molengas por deixarem um veterano vencer. Sim, os demais corredores eram novatos, portanto precisava dar o meu melhor.
- Veio se juntar a nós, soldado?! - Questionou o nosso superior da base sem precisar se virar para olhá-lo.
Segurei a vontade de rir ao olhá-lo de viés. Ele sabia da mancada que deu, e principalmente de ter ousadia de comparecer assim do nada em plena atividade de obrigação.
- Hoje não senhor!
- Quando retornarmos você e seus amiguinhos de farra nas noites de folga, vão pagar quinhentas flexões com um saco de batatas nas costas! Bando de bundões!
Acelerou a corrida freneticamente sem dá-lo a chance de rebater a penitência.
Meu amigo de anos olhou-me super preocupado. Nem precisei vê-lo de frente para saber a sua expressão.
- O sargento está correto, e não é desde hoje que tem desviado os outros nas bebidas e festas, regada a muitas mulheres. Isso desgasta Ronan, precisa pegar leve, ou arrumar uma boa moça para se casar e sossegar esse facho.
Danou a gargalhar, mas a olhada enfezada do nosso superior o fez se calar imediatamente, pedindo desculpas.
- Falo sério, por que acha que isso é motivo de risadas?
- Por que você sonha com uma mulher perfeita para poder se casar, acha que eu não sei que se sente solitário nas noites de relaxamento, amigo? Vim te avisar que irei colocá-lo naquela listinha vip de final de ano. Necessita acasalar mano.
- E todo ano digo para não fazer isso.
- Não existe cinderela, oh príncipe!
Bateu no meu peito enquanto corríamos.
- Pode até ser, mas sei que a minha princesa pode aparecer a qualquer instante.
Os novatos riram baixinho, mas acabaram concordando comigo quando lancei um olhar durão.
- Tá certo, incurável romântico. - Falou num tom debochado.
- Estou brincando chapa, uma boa mulher que cuide de mim será o suficiente.
- Então ela nem precisa te amar.
- Não tenho requisitos. Só desejo ter uma família completa.
Olivia
Quatro meses depois..
Vomitei no vaso sanitário toda a lasanha do jantar, já não aguentava mais esse enjoo persistente. Sabia do que se tratava, mas queria negar a realidade a mim mesma.
Sentei no chão do banheiro, fechando a tampa do sanitário, pensando o que faria a seguir. O último dinheiro que tinha, usei para comprar a bandeja de comida pré pronta. Não sabia cozinhar, portanto tive que me virar com os alimentos industrializados. Além de não aceitar frutas, legumes e verduras. Sou uma negação ambulante, e largada nesse mundo.
Levantei a cabeça, meio tonta, mas consegui me erguer em direção ao quarto, vislumbrando, sem me importar com a sujeira da casa.
Tudo o que estava passando era culpa dele, do terrível Coronel de cocuruto raspado.
- Maldito careca!
Exclamei revoltadamente ao me jogar no colchão, de raiva queria chorar. Esfreguei o rosto no travesseiro sentindo o odor de suor da fronha.
Com os cortes precisei dispensar a diarista, a mocinha sabia cozinhar tão bem. Fazia todos os pratos que gostava. Merda! Por que razão fez isso comigo pai!?!
Me virei, deitando de costas naquele leito bagunçado, sem tomar a coragem de passar a mão no pequeno volume que já se mostrava no ventre.
Comecei a chorar compulsivamente, nem ao menos alguém conhecia o pai do meu filho naquela festa. O homem era um penetra, ninguém tinha o paradeiro dele. Pelo menos podia ter um amparo, me sentia sozinha, acuada, sabendo que se não conseguisse arrumar uma forma rápida de me sustentar eu e essa criança iríamos padecer, morrer de fome. Pensar nessa possibilidade me fez gritar de puro desespero.
Depois de extravasar a minha indignação, um telefonema chamou a minha atenção imediatamente.
Estiquei o braço até conseguir alcançar o aparelho na cabeceira cheia de coisas usadas, como lenço umedecido e papel de rosto. Peguei uma gripe desgraçada, não tinha muitas forças no corpo. Me sentia lerda.
Com o objeto em mãos, mirei rapidamente o visor. Sentindo alívio e ódio na mesma proporção.
‘- Pai…’
Funguei, contendo o choro, o orgulho e a minha indignação por ter sido largada novamente ao mundo.
‘- Preciso da sua ajuda urgente!’