Bruno estava deitado em sua cama, encarando o teto enquanto a madrugada lentamente cedia espaço ao amanhecer. A luz pálida que começava a infiltrar pelas frestas das cortinas iluminava levemente o quarto, mas seus pensamentos estavam mergulhados em uma escuridão tumultuosa. Aquele era o dia do casamento de Helena, o dia em que ela estava prestes a unir seu destino a Leandro.
Ele tentava convencer a si mesmo de que isso era o melhor para ambos. Helena merecia felicidade, e se essa felicidade estava com Leandro, ele deveria aceitar. Mas seu coração parecia se rebelar, apertando-se em seu peito como um punho implacável. Ele fechou os olhos com força, como se pudesse conter a torrente de emoções que ameaçava transbordar.
Com um suspiro profundo, Bruno se levantou da cama, suas pernas pareciam pesadas como chumbo. Ele seguiu até o banheiro, deixando a água da ducha cair sobre ele. A esperança era que a água pudesse lavar as lembranças de Helena de sua mente. Ele fechou os olhos, inclinando a cabeça sob o fluxo d'água, mas, ao invés de dissipar as memórias, elas pareciam ganhar vida. O sorriso genuíno de Helena estava diante dele, e ele podia sentir a suavidade de seus lábios nos dele como se fosse realidade.
A água escorreu por seu rosto e corpo, e ele finalmente desligou o chuveiro com um suspiro frustrado. Ele se enxugou rapidamente, sentindo-se mais agitado do que antes. Ele se vestiu com uma mistura de pressa e irritação, como se pudesse fugir de seus próprios pensamentos.
Descendo as escadas, Bruno fez um café preto, mas não teve paciência para esperar seus pais acordarem. Ele se serviu uma xícara e levou-a aos lábios, mas o gosto amargo do café parecia refletir a amargura que sentia dentro de si.
O dia estava começando a clarear lá fora, e a rua estava tranquila. Sem pensar muito, Bruno pegou sua bicicleta e começou a pedalar em direção à Nilton's Bike. Ele precisava se distrair, focar em algo que não fosse Helena e o casamento.
Enquanto pedalava pelas ruas, ele tentava se concentrar nas paisagens urbanas que passavam por ele. Mas não importava o quanto ele tentasse, a imagem de Helena parecia persistente em sua mente. Ele imaginava os braços dela envoltos em sua cintura enquanto ela o abraçava, a sensação da proximidade de seus corpos.
Chegando à loja, Bruno estacionou sua bicicleta e respirou fundo. Ele sabia que precisava se recompor, encontrar um jeito de lidar com seus sentimentos. Ao abrir a porta e entrar na loja, ele sentiu a familiaridade do ambiente ao seu redor. A loja estava repleta de bicicletas alinhadas, acessórios pendurados nas paredes e um cheiro característico de metal e borracha no ar.
A loja estava silenciosa no início, apenas o som abafado da cidade lá fora. Ele ligou as luzes, sentindo o ambiente se iluminar ao seu redor. Era um lugar onde ele se sentia em casa, onde passara incontáveis horas trabalhando e compartilhando sua paixão pelas bicicletas, mas naquele momento ele não se sentia em casa.
Ele começou a trabalhar, verificando algumas bicicletas que precisavam de manutenção, organizando ferramentas e acessórios nas prateleiras. Ele se envolveu nas tarefas, deixando que o movimento familiar da loja o distraísse de seus próprios pensamentos.
Não demorou muito para que seus amigos chegassem, entrando na loja com suas vozes alegres. Jonathan foi o primeiro a se aproximar, sorrindo para Bruno. "E aí, cara, como você está?"
Bruno olhou para Jonathan, seu sorriso um pouco forçado, mas ainda genuíno. "Estou bem, cara. Apenas outro dia na loja. "
Gabriel, sempre brincalhão, acrescentou: "Pelo menos ele não disse 'bem, considerando as circunstâncias', isso já é um progresso."
Lucas deu um leve t**a na parte de trás da cabeça de Gabriel. "Cara, nem começa."
Bruno riu com a interação dos amigos, apreciando a leveza que eles sempre traziam consigo. "Sim, Gabriel, estou bem, sem circunstâncias."
Jonathan olhou em volta, observando a loja. "Parece tranquilo por aqui hoje."
Gabriel arqueou uma sobrancelha, surpreso. " Pois é, ainda mais hoje que é o casamento da Helena... Hoje deveríamos estar cheio de coisa para fazer, agora o Bruno vai ter de ficar pensando nela..."
Lucas suspirou e deu outro t**a na cabeça de Gabriel. "d***a, Gabriel, para de falar sem pensar."
"Sim, é o casamento dela", Bruno concordou, tentando manter um tom neutro. "Não se preocupem, rapazes. Na verdade, vocês estão dispensados hoje. Aliás, demitidos."
Lucas deu outro safanão em Gabriel, mais forte dessa vez. Ele olhou para Gabriel com um olhar de advertência e disse: "Você não devia ter mencionado isso, cara."
Bruno deu um sorriso, apreciando a situação. "Calma, não estou dispensando vocês por causa do casamento. Aliás, já tentei evitar pensar nisso o máximo possível."
Gabriel e Jonathan olharam surpresos para Bruno, sem acreditar no que estavam ouvindo. "Sério?" Jonathan perguntou, claramente chocado.
Bruno assentiu com um sorriso. "Sim, sério. Eu sei que isso pode parecer repentino, mas acho que é hora de vocês começarem a se ajustar também. Em breve, cada um de nós seguirá seu próprio caminho, e eu preciso começar a aprender a lidar com a loja sozinho."
Os olhos de Lucas se arregalaram um pouco, enquanto Gabriel olhava surpreso para Bruno. "Você tem certeza disso?"
Bruno assentiu, sua expressão determinada. "Sim, tenho. Nós três sempre falamos sobre nossos planos individuais, e sei que é hora de começarmos a nos ajustar a essas mudanças. Vai ser estranho no começo, mas é algo que preciso enfrentar... sozinho."
Jonathan sorriu, parecendo orgulhoso do amigo. "Você está certo, Bruno. Nós sempre fomos uma equipe, mas também sabíamos que esse dia chegaria."
Lucas deu um passo à frente e abraçou Bruno com força. "Vai ser diferente, mas saiba que sempre estaremos aqui para apoiar você, assim como você nos apoiou."
Gabriel se juntou ao abraço, formando um grupo de amigos unidos. "Você é um irmão pra gente, Bruno."
Bruno sentiu um calor reconfortante espalhar-se por ele enquanto abraçava seus amigos. "Vocês também são meus irmãos. E obrigado por entenderem."
Depois de um momento, os amigos se afastaram, sorrisos nos rostos. Lucas brincou: "Agora, vamos sair daqui antes que você nos faça começar a trabalhar."
Gabriel riu. "Sim, se você ficar nos olhando, vai nos fazer trabalhar mesmo demitidos."
Jonathan balançou a cabeça, fingindo um olhar sério. "É melhor a gente sair antes que ele nos coloque para consertar alguma bicicleta."
Enquanto saíam da loja, Bruno observou-os com gratidão. Eles poderiam estar seguindo caminhos diferentes, mas a amizade que compartilhavam continuaria forte, mesmo que as circunstâncias mudassem. Ele olhou ao redor da loja, Bruno sabia que estava tomando a decisão certa. Era hora de dar o próximo passo, de enfrentar o futuro de frente. E, com amigos como aqueles ao seu lado, ele sentia que não importava quais desafios estavam por vir, eles sempre encontrariam uma maneira de superá-los juntos.
Enquanto pegava algumas ferramentas e começava a trabalhar em uma bicicleta, ele tentava se focar nas tarefas à sua frente. Mas cada som, cada movimento, parecia ecoar com a lembrança de Helena. Ele sentia sua presença em cada canto da oficina, como se ela estivesse ali com ele.
As horas passaram lentamente, e Bruno se esforçou para se manter ocupado. Ele consertou bicicletas, trocou peças, conversou com clientes, mas sua mente sempre retornava a Helena. Ele sabia que precisava aceitar a realidade, que ela estava seguindo em frente, construindo um novo futuro ao lado de Leandro. Mas isso não tornava as coisas mais fáceis.
***
Bruno estava na frente do caixa da Nilton's Bike, observando o balcão desorganizado e cheio de recibos e anotações do dia. Sua expressão estava cansada, mas havia uma sensação de realização no ar. Não tinha sido um dia fácil na loja, mas ele havia conseguido lidar com todas as demandas que surgiram.
Com um suspiro, ele finalmente fechou o caixa, sentindo a satisfação se espalhar pelo seu corpo. Olhou para o relógio na parede e percebeu que o expediente finalmente havia chegado ao fim. Com um sorriso de alívio, ele se levantou e esticou os braços, alongando os músculos cansados.
Caminhou até a frente da loja e olhou para fora, vendo o céu tingido de laranja pelo pôr do sol. Ele pensava nos próximos passos, nas mudanças que viriam, e considerava contratar algumas pessoas para expandir as atividades da loja para o turismo de duas rodas. Era um pensamento reconfortante, uma luz no fim do túnel após um dia cansativo.
Foi quando uma voz feminina suave o tirou de seus pensamentos. "Desculpe, ainda dá tempo de fechar um pacote de sete dias?"
Bruno ficou paralisado por um momento, quase incapaz de acreditar no que estava ouvindo. Lentamente, ele se virou, e seu olhar encontrou Helena, parada ali encostada em um carro. Seu coração deu um salto em seu peito, as palavras ficando presas em sua garganta.
Um sorriso começou a se formar no rosto de Bruno, uma mistura de surpresa e alegria. Ele finalmente conseguiu falar: "Olá, Helena Quase Albuquerque."
Helena riu suavemente, sua voz carregada de nostalgia. "Só Helena, Bruno. Apenas Helena."
Ela se aproximou, seus olhos fixos nos dele como se estivessem se reconectando após uma longa ausência. Bruno deu alguns passos na direção dela, a distância entre eles finalmente diminuindo. Ele podia sentir o peso do tempo e das palavras não ditas entre eles.
Finalmente, quando ela estava perto o suficiente, Bruno a puxou para seus braços, abraçando-a com força como se temesse que ela pudesse desaparecer. Ele sentiu o corpo dela contra o seu, a sensação , aquela que sentia ao entrar na loja, agora estava ali diante dele.
E então, Bruno tomou os lábios dela em um beijo cheio de todas as emoções acumuladas ao longo do tempo, uma mistura de arrependimento, desejo e amor. Era como se as palavras não precisassem ser ditas, porque aquele beijo estava dizendo tudo.