Capítulo 13

1302 Words
Miguel Acordei com a cabeça latejando, a boca seca, o gosto amargo das escolhas da noite passada me atormentando. A imagem borrada da mulher que puxei para os meus braços ainda me acompanhava, confusa, embriagada pelo álcool e pela culpa que não me deixava. Era como se Rafaela estivesse ali comigo, mas ao mesmo tempo, eu sabia que estava apenas tentando afogar minha própria solidão. O sol já começava a iluminar a rua quando me levantei, ajeitando a roupa amassada e tentando recompor a dignidade que havia perdido em algum lugar entre as latas vazias e as promessas quebradas. Precisava vê-la, falar com ela, mas sabia que a distância que eu estava impondo entre nós poderia feri-la de um jeito que talvez nunca conseguisse curar. A caminho de sua casa, meus passos eram pesados, mas meu coração batia ainda mais forte. Na minha mente, ouvi o som abafado das risadas dela, dos nossos segredos, e a imagem do anel de noivado em sua mão, uma promessa que eu estava desesperado para cumprir, mesmo sabendo que cada dia que passava tornava isso mais improvável. Rafaela O céu já estava completamente escuro quando ouvi batidas leves na porta. Meu coração deu um salto — só podia ser ele. Olhei para o relógio: 22h30. Bia se remexeu na cama, mas parecia adormecida. Hesitante, abri a porta o suficiente para ver Miguel ali, o rosto cansado, as olheiras profundas, como se carregasse o peso de uma vida que não era mais só dele. Sem dizer nada, ele deu um passo para dentro e fechou a porta com delicadeza, mantendo o olhar fixo em mim. — Estava preocupada, Miguel... você nunca atende, nunca diz nada. — Eu sussurrei, lutando para não parecer chateada, mas a angústia transparecia em cada palavra. Ele suspirou e tentou sorrir, mas parecia impossível para ele. — Me desculpa, Rafaela. — Ele disse, a voz rouca. — Eu... estou tentando, tentando mesmo... mas... Não deixei que ele terminasse. Segurei seu rosto entre as mãos, sentindo sua pele quente, como se ele tivesse corrido até aqui. Seus olhos, carregados de uma dor profunda, me observavam, procurando algo que nem ele sabia. — Acha que eu não sei o que está passando? — murmurei, aproximando meu rosto do dele. — Acha que não sinto suas lutas? Me diz, Miguel... por que não confia em mim? Ele fechou os olhos, como se não suportasse ouvir aquelas palavras, e suas mãos subiram até os meus pulsos, segurando-me com cuidado, mas firmeza. — Eu confio em você, Rafaela, mas... não sei se sou forte o suficiente para te dar o futuro que merece. Estou... sufocado, como se cada dívida, cada hora que passo naquele táxi me prendesse mais e mais. Eu queria... queria te dar tudo, mas o que tenho é tão pouco... Eu engoli em seco, sentindo a sinceridade em suas palavras, mas também algo sombrio que nunca havia visto antes. — Você é tudo que eu quero, Miguel. Eu posso esperar, posso passar pelo que for, desde que você esteja ao meu lado. O amor... nosso amor, vale qualquer sacrifício. — Minhas palavras saíram num sussurro emocionado. Ele me puxou para um abraço forte, um misto de desejo e desespero, como se eu fosse o único ponto fixo em um mundo que girava rápido demais. E ali, nos braços dele, senti que, por mais que a realidade fosse dura, por mais traiçoeira que fosse a vida, o amor ainda podia ser nossa âncora, nosso refúgio. Mas uma pergunta ecoava no fundo da minha mente: até quando o amor resistiria à realidade brutal? Miguel Abraçar Rafaela era como apertar contra o peito o único pedaço de paz que me restava. Senti o perfume dela invadir meus sentidos, suavizando por um instante o caos na minha mente. Eu queria ficar ali para sempre, esquecer o mundo, esquecer as contas, as madrugadas solitárias, os dias intermináveis ao volante. Mas era injusto com ela. E comigo. Me afastei um pouco, os olhos fixos nos dela, buscando a coragem que me escapava. — Rafaela... eu não posso prometer um conto de fadas. — A voz saiu mais fraca do que eu queria, quase uma confissão. — Tem dias em que tudo o que faço parece em vão. Às vezes, fico pensando... se você merece passar por isso comigo. Ela arqueou as sobrancelhas, surpresa, e balançou a cabeça com firmeza. — Por favor, não fala isso. — Os olhos dela brilharam, um misto de emoção e uma determinação que sempre admirei. — Eu escolhi estar ao seu lado, Miguel. Se você tiver que passar por tudo isso, então eu vou estar aqui também. O amor não é só sobre promessas, é sobre o que estamos dispostos a sacrificar... juntos. Essas palavras me atingiram em cheio. Ela acreditava em mim, mais do que eu acreditava em mim mesmo. Meu coração estava dividido entre a gratidão e a culpa, e era uma luta que eu já não sabia como vencer. Como eu poderia pedir para ela viver assim? Como eu poderia aceitar que talvez... estivesse arrastando a pessoa que eu mais amava para um destino amargo? Ela suspirou e se aproximou, segurando minha mão, seu toque delicado e firme ao mesmo tempo. — Só me promete que vai parar de se isolar, Miguel. Que vai me deixar te ajudar... seja lá o que for. Eu sei que você quer cuidar de tudo, mas eu também posso ser forte por nós dois, entende? — Ela me olhava com uma intensidade que quase me desmontava. Soltei uma risada sem graça, coçando a nuca, tentando desviar dos olhos dela. — Você... sempre tão certa, tão confiante... — sussurrei, admirado. — Eu vou tentar, Rafaela. Não sei como, mas eu vou. Ela sorriu, um sorriso doce, e inclinou o rosto em direção ao meu, os olhos se fechando levemente. Quando nossos lábios se tocaram, toda a angústia, todo o peso do mundo pareceu desaparecer, ao menos por um breve instante. Naquele beijo, senti que talvez o amor fosse mais forte do que eu imaginava. Que talvez, juntos, pudéssemos enfrentar qualquer coisa. Rafaela Miguel tentou ser forte, mas eu sentia seu cansaço, a exaustão impregnada no seu corpo. Ele era minha promessa de amor, meu sonho — e, mesmo que estivéssemos em meio a dificuldades, sabia que ele também era meu lar. Ele se afastou um pouco, o olhar ainda abatido, e eu sabia que, apesar das palavras bonitas, ainda havia uma resistência nele. Algo que o impedia de se entregar completamente. — Eu sei que as coisas são difíceis, Miguel, mas não há nada que possamos enfrentar se estivermos juntos... — murmurei, segurando a mão dele. — Vamos superar isso, só precisa confiar. Em nós dois. Ele abaixou a cabeça, respirando fundo, como se quisesse acreditar, mas a dúvida ainda o corroesse. Eu entendia. A vida não era fácil, não havia garantias. Mas sabia que o amor verdadeiro exigia coragem, e eu estava disposta a lutar até o fim. Dei um passo para trás, soltando a mão dele com relutância, mas mantendo meu olhar fixo no seu. Era um recado silencioso de que eu estava ali, ao seu lado, mas que ele precisaria dar o próximo passo também. — Quando estiver pronto... quando puder confiar em nós, estarei esperando, Miguel. Ele olhou para mim, surpreso, mas eu me mantive firme, apesar da dor em meu peito. Eu o amava com cada parte de mim, mas sabia que, para que esse amor resistisse, ele também precisaria estar disposto a enfrentar seus próprios medos. Miguel apenas assentiu, um olhar agradecido e arrependido ao mesmo tempo, e eu soube que algo entre nós estava prestes a mudar. Naquela noite, enquanto ele se afastava, senti que algo no ar havia mudado. Talvez o amor nos fizesse resistir. Talvez, finalmente, ele fosse meu.
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