CAPÍTULO 4 RAFAELA

859 Words
**CAPÍTULO 4 - RAFAELA** —Dr. Rafaela, você ficará de plantão hoje cobrindo a Sandra, que não poderá comparecer. Rafaela: Claro, sem problemas, chefe. Não tenho nada agendado e até prefiro não voltar para casa. Nesse momento, minha chefe entra na minha sala e fecha a porta. Fabrícia: Você ainda não superou a morte do seu marido, não é? Rafaela: Acho que nunca vou conseguir, Fabrícia. Ele era tão jovem e saber que não consegui salvá-lo é um tormento diário. Como médica, deveria ter conseguido salvar meu próprio marido. Fabrícia: E importante reconhecer que a colisão foi muito severa e, infelizmente, as chances de sobrevivência eram extremamente reduzidas. Você fez o máximo que pôde, mas, lamentavelmente, as circunstâncias estavam além do controle. Rafaela: Sei, eu sei, mas mesmo assim me culpo. Acho que essa é a única maneira que encontrei de lidar com a minha dor. Fabrícia: Você sabe que pode contar comigo para o que precisar, não é? Rafaela: Sim, eu sei, chefe. Agradeço por toda a paciência e apoio nesses anos, por me ouvir. Ela sai e eu permaneço na sala, mergulhada em meus pensamentos, que insistem em me perturbar. Meu nome é Rafaela Dias Duarte, tenho 32 anos e sou cirurgiã geral. Fui viúva há um ano; meu esposo, Jaime Duarte, era biólogo e era apaixonado pelo que fazia. Iríamos completar cinco anos juntos no dia em que ocorreu o acidente de carro que resultou em sua morte, a caminho do hospital. Essa perda devastou minha vida, pois sem ele, tudo parecia perder o sentido. No entanto, minha profissão como médica me proporcionou a motivação necessária para seguir em frente. Desde então, passo mais tempo no hospital do que em minha própria casa. Trabalho no Hospital Samaritano Botafogo há quase 7 anos, desde a minha formação. Dedico minha vida a esta instituição e não pretendo sair, a menos que ocorra alguma circunstância extrema. Amo o que faço; salvo vidas diariamente. No entanto, a experiência com meu marido foi devastadora, pois não consegui salvá-lo. Estava no hospital quando recebi uma ligação sobre um acidente na estrada. Um caminhão colidiu com o carro do meu marido, conduzido por um motorista embriagado. O acidente ocorreu quando meu marido parou em um semáforo, o que levou à colisão. Ao ser chamada, fui com minha equipe para o local, mas ao chegar, deparei-me com a cena mais dolorosa da minha vida: meu marido estava jogado para fora do carro, todo ensanguentado. Pelo que percebi, ele não estava usando o cinto de segurança, o que resultou em sua projeção para fora do veículo. Havia também uma jovem ao seu lado, cuja identidade eu não conhecia e que, infelizmente, não sobreviveu ao acidente. Não procurei saber quem ela era, pois poderia ser uma colega de trabalho que ele estivesse levando para casa. Apesar do nervosismo causado pelo acidente de Jaime, segui com o protocolo e a encaminhamos para a ambulância, realizando os primeiros socorros. Infelizmente, ele não conseguiu resistir e faleceu antes de chegarmos ao hospital, deixando-me devastada e sem chão. Organizei todo o protocolo do velório, visto que a família dele não era da cidade. Quando eles chegaram, o corpo já estava na igreja. Foi uma experiência devastadora para mim, e tive que me manter forte. Meus pais, que vivem aqui, estiveram ao meu lado o tempo todo, me oferecendo o apoio que eu tanto precisava. Jaime foi meu primeiro amor, minha primeira experiência em tudo, e eu me entreguei completamente, por isso sofri tanto com sua partida. Dias se passaram desde a sua morte, e eu permaneci na casa dos meus pais durante o período em que estive de licença do hospital. Contudo, decidi voltar ao meu apartamento, onde morava com Jaime, pois precisava encarar a situação e não fugir dela. Ele faleceu e eu continuei viva, mas parece que meu coração também se foi quando ele morreu em meus braços naquela ambulância. Permaneço no mesmo apartamento, fiz algumas mudanças, mas mesmo assim, hoje em dia me sinto só. A solidão, por vezes, me domina, e a falta dele se torna insuportável. Vivemos momentos maravilhosos juntos; foram 5 anos que pareciam 10, e jamais o esquecerei. Prometi a mim mesma que nunca mais amaria e que minha vida agora seria dedicada exclusivamente aos meus pacientes. Não gosto de festas e raramente saio. Meu deslocamento se resume ao hospital e à casa dos meus pais, que decidiram morar perto do meu apartamento para ficar mais próximos a mim. Sendo filha única, sou bastante mimada por eles, e aprecio muito esse carinho. Hoje, fiquei de plantão no lugar da Sandra, uma mãe solteira. O pai da menina não assumiu a paternidade, e ela, como uma verdadeira mãe, seguiu em frente, criando a filha sozinha. Sandra é pediatra, e, embora eu seja cirurgiã geral, tenho um conhecimento amplo em várias áreas, o que me permite assumir plantões de colegas, e minha supervisora acaba tirando proveito disso. Eu sorrio ao pensar que, se ela não me escutar, poderá me conceder uma semana de licença. Em seguida, deixo minha sala e me dirijo à ala da pediatria para iniciar o atendimento aos pacientes da doutora Sandra.
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