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Afterlife: Heartless (Livro 3)

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Blurb

A Morte tem seus planos, e sei que em nosso segundo encontro, nem tudo foi revelado. Algumas peças ainda estão faltando, e eu sou aquele que está próximo o bastante para descobrir. Mas... Por quê? Ela... Ela se foi. Presa em sua própria falta de coração. Minha luta começou por causa dela, mas não vai terminar pela mesma razão. Por que devo continuar a brandir minha espada?" - Leonard Ross

Três meses após seu retorno a Terra e sua jornada por Godheim, Leonard está em meio a sua família outra vez: os Heartless. Ele treina para sustentar-se e proteger-se. Entretanto, seus companheiros de viagem encontram o dono do segundo nome dado pela Morte: Jared Blackwood. Com o exército de Kifo batendo na porta da Cidade-Refúgio de Nova York, ele, Týr, Thais e Desmond deixam a cidade para cumprir a missão daquele que os escolheu.

Nathanael desperta de seu sono. Está em um lugar, mas bizarramente familiar que servia de cela. As memórias dos acontecimentos de Aztlan estão difusas em sua mente. Todavia, ele tem apenas uma pergunta: onde está a Ọkan tirada de Elena?

Um inimigo cresce em poder nas sombras montanhesas da China. E Hayley, a quarta Senhora de Guerra, precisa da ajuda Leonard Ross para vingar seus irmãos.

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Capítulo 01: Segredos - Pt.1
Nova Jerusalém, Paraíso – O que está fazendo? – A voz doce de Rouen vinha de trás; ele desviou sua atenção do guarda-sol que tentava colocar de pé na areia para poder olhá-la. Rouen estava maravilhosa naquele biquíni preto; seus cabelos castanhos refletiam o sol como se eles fossem parte do grande astro-rei. Ele parou o que fazia, olhou para o sol. Estranhou; não sabia o que era o sol, lera sobre ele em alguns livros de histórias, como o Silmarillion. Sentiu um peso na mão e, quando olhou, estava com o referido livro em sua palma. Sorriu, pois gostara da história e, ainda, fora o livro que Rouen “tomou” dele quando se conheceram próximo ao rio que corta a cidade de Rouen, na França. – Você tem o mesmo nome de uma cidade. – Ele comentou. – Onde nos conhecemos. – Não se cansa dessa piada, não? Estamos casados faz algum tempo já, né... – Ela falou um nome que soou estranho e familiar ao mesmo tempo. Ela sentou-se na cadeira que estava ao lado do guarda-sol que ele tinha fixado no chão. Todavia, ele não havia terminado de colocá-lo naquela posição. Foi então que percebeu que era um sonho. Só podia ser; um sonho criado pela alma de Caleb que estava ganhando força dentro de si e agora estava afetando seu controle. Vizard abriu os olhos. As paredes de pedra eram as mesmas dos últimos meses, apesar de ele não ter certeza absoluta do tempo, já que a luz que ilumina o Paraíso nunca cessa ali, mesmo dentro da sala, sem fazer sombra, nem mesmo a sua. Tinha certeza que estava no centro do Paraíso, na Cidade de Prata, ou Nova Jerusalém como é chamada agora. Fora ali que mais de cinco mil anos antes ele combatera e fora selado de volta ao Abismo na Primeira Guerra Celestial. Por que não fala comigo?, ele perguntou com a mente, sabendo que Caleb estava escutando, mas se recusava a responder. A alma estava no fundo de sua mente, podia senti-lo, mas ele se recusava. Ao mesmo tempo, porém, o resto parecia completamente em silêncio; ele não sentia os outros Filhos do Abismo pela memória coletiva. Era mais ou menos quando estava no outro mundo, Duat, apesar de que lá, ele podia sentir os dois que haviam ido com ele, mas morreram no processo. Agora, desde que voltou, estava completamente isolado. Cobriu os olhos com o antebraço; era a única maneira de esconder-se da luz e manter-se no escuro, apesar de que assim tudo parecia ainda mais solitário. Resolveu levantar-se. Respirou fundo; olhou em volta. Nada de diferente nas paredes de pedra, nem na cama de pedra, que era apenas uma placa de pedra saindo da parede. Então, pela centésima septuagésima terceira vez, ele assumiu sua forma verdadeira e, com isso, trouxe a armadura que ganhara dos deuses. A armadura de ouro, de fato, era duas ombreiras com várias camadas uma sobre a outra, além de outras duas proteções laterais nas coxas. Alguns panos verde-água enfeitavam aqui e ali, principalmente para evitar o contato direto do metal com o pelo. Sua espada e seu machado, cuja lâmina era com a parte afiada para cima, estavam presos às costas. Ele gostou da ideia daqueles objetos desaparecerem e reaparecerem toda vez que ele assumia sua forma verdadeira. Levantou ambas as mãos apontando para um único tijolo de pedra e se concentrou. Usou toda sua força e poder para tentar mover aquela pedra; ele podia sentir a pedra em seus dedos, como se estivesse tocando-a diretamente. Contudo, ela não se movia; ficava parada, firme, naquela posição. A ira cresceu dentro de si, e com isso, seu poder. Nenhuma pedra se moveu; no entanto, pôde sentir os grãos de areia no chão. Conseguiu manipulá-los a amontoar-se diante de si; era uma pilha de apenas um centímetro de altura era muito pouco para fazer qualquer coisa. Os anjos que vinham interrogá-lo sempre perguntavam sobre Jeremy, a alma humana que havia sobrepujado o controle de um dos Filhos e agora estava dentro da memória coletiva. Isso havia acontecido após a queda de Roma, quando os Filhos, liderados por Kifo, dominaram a cidade; mas, em seguida, juraram lealdade a Vizard. Jeremy controlou sua alma de volta, pois um dos Ryaks falhou ao tentar voltar a sua forma original e manter o poder da alma. Vizard fizera o possível para não revelar seus segredos, todavia, a Magia Celestial era muito difícil de resistir, chegando a ser impossível. Durante a Primeira Guerra Celestial os anjos não tinham esse poder. Ao voltar a ter o rosto de Caleb, o Filho ouviu movimentação do lado de fora da cela. Sentou em sua cama e esperou; o anjo apareceu do outro lado da porta de Sídero Theía, conferiu se o prisioneiro estava em seu lugar e então voltou a fazer a guarda. Olá, Vizard.­ Uma voz disse de repente dentro de sua mente; não era a voz de Caleb, muito menos de qualquer um de seus subordinados em Roma. Já esqueceu-se de mim? Kifo? Vizard tinha certeza de que era ele; lembrava-se da voz com que ele tinha falado meses antes, após ser renegado pelos outros Filhos. Como? Os anjos têm me isolado da memória! Ah, irmãozinho, meu poder cresce a cada dia! Uma força sombria e sinistra abraçava sua mente, como uma névoa que cobre o topo de um lago ou uma estrada, impedindo que motoristas vejam o caminho. – Guarda! – Ele gritou, tentando evitar tocar nas grades da cela; não sabia se o metal o afetaria de alguma maneira. – Eu preciso falar com Miguel. _____________________________ Miguel estava reunido com os querubins através das telas de vídeo conferência. Como cada um estava em uma cidade-refúgio, como eram conhecidas as cidades que não haviam sido dominadas pelos Filhos e foram muradas pelos anjos, de modo a mantê-las seguras. Eles estavam tentando decidir o que fazer para vencer aquela guerra. Desde que voltara do Duat, Kifo estava tentando não chamar atenção para si, mesmo que os maiores movimentos da guerra aconteciam em volta dele. Milhares de Filhos que estavam na América do Sul e Central estavam marchando para encontrar com o Filho da Morte. E tudo que Miguel e suas tropas vinham fazendo era derrotar pequenos grupos isolados dos inimigos, já que os grandes exércitos não estavam se movimentando. – General Miguel – Constantine, um dos querubins que pertenceram a Guarda de Prata disse; apesar de não concordar com a presença deles, já que eles foram traidores, eram eles quem demonstravam mais respeito para com Miguel – eu recebi a notícia recente de que Kane está avançando suas tropas para o leste, em direção aos países do leste europeu e Ásia. Ele está recrutando. – Com sucesso? – Miguel perguntou. – Não, senhor. Apesar de seu exército ter aumentado, ele continua tendo o menor número de soldados. Desde o retorno de Kifo, nenhum dos Senhores de Guerra tem aumentado sua força ou avançado. – Miguel massageou as têmporas; aquela guerra estava tirando seu sono. – E o que Kifo quer? – Salazar perguntou. – Poder, é claro. – Valentine respondeu. – Essas criaturas foram criadas para isso. – Mas Kifo não é como os outros. – Miguel retrucou. – Ele não está agindo simplesmente por poder. Existe um objetivo, mas é impossível dizer qual é. Ele conquistou Roma, uma das Passagens para a morada do Criador, mas a perdeu para nosso prisioneiro. Sozinho, ele não seria capaz de dominar as cidades, por isso precisava de um exército; ele foi para Duat conseguir poder e, com isso, seu exército. Agora, o que fará a seguir? – Virá até mim. – Miguel ouviu a voz de seu prisioneiro da porta; virou-se irritado, afinal, ele não poderia ser interrompido naquele momento, ainda mais por um prisioneiro. – O que você está fazendo fora de sua cela? – Ele parecia falar com Vizard, todavia, olhava para o anjo que o escoltara até ali. – E o que você quer dizer com isso? Miguel, que estava escorado na mesa central e redonda, à qual havia sete cadeiras – aquela era a Sala de Guerra, onde os querubins se reuniriam pessoalmente para futuros conselhos; a sala havia sido criada nos últimos meses, desde que Lael voltou do Duat – levantou-se e sentou, indicando uma das outras cadeiras para que o Filho sentasse. Salazar não gostou muito, afinal, Vizard estava sentando naquela que pertencia a ele. – Após a Batalha de Roma, os Filhos que invadiram se voltaram contra Kifo e juraram lealdade a mim. O Filho da Morte culpou a mim e jurou que se vingaria. – Vizard, que estava com as mãos presas por uma algema de Sídero Theía, coçou a cabeça. – E, como eu conheço o Filho, sei que ele não tem as prioridades corretas, então, antes de fazer qualquer ataque contra as cidades-refúgio, acho que ele virá atrás de mim para conseguir Roma de volta, e meu exército. – Achei que após jurar lealdade, seus soldados não poderiam pertencer a ninguém mais, a não ser que os outros dois fossem libertos. – Miguel comentou; ele não estivera na Primeira Guerra Mundial, mas lera todos os registros sobre tal. – De fato, está correto. Mas, se eu jurar lealdade a ele, todo meu exército é forçado a fazer o que ele mandar. – Vizard ficou um tempo em silêncio, como se não tivesse certeza se devia ou não perguntar. – Quantos anjos você tem nesta cidade? – Você é o inimigo. Revelar o segredo do tamanho de nossas defesas não é a melhor estratégia. – Miguel afirmou, incrédulo que um Senhor de Guerra dos Filhos do Abismo faria uma pergunta tão i****a. – Leve ele de volta para a cela, e force-o a contar as defesas dele em Roma. – Eu não me importo com suas defesas, Miguel. – Vizard afirmou, enquanto levantava; o anjo estava logo ao lado dele. – Perguntei apenas para imaginar quantos soldados Kifo irá trazer. Espere, ao menos, o quadruplo do que você tem. Miguel escondeu sua surpresa. Ele sabia que os Filhos eram numerosos; no total, eles superavam de dez para um os anjos, apesar de não serem tão poderosos e pelo menos um décimo deles já ter sido selado ou morto, em outras palavras, atualmente, os Filhos superavam de nove para um. Kifo havia reunido um exército, mas o tamanho dele ainda era impossível de dizer com certeza. Os outros querubins nas telas não diziam nada. Estavam estupefatos, praticamente paralisados. Sabiam que Vizard não estava mentindo; sabiam que Kifo viria por ele, era apenas uma questão de tempo. Um ataque em Nova Jerusalém era iminente. _____________________________ Cidade de Dite, Inferno Antes de abrir olhos pela milionésima vez, Nathanael tinha esperança de que estaria fora daquela cela de paredes vermelhas, cor de sangue; contudo, ao abrir, o teto permanecia o mesmo. Vermelho e um tanto escuro, considerando a pouca luz provinda do sol fraco, antigo e avermelhado – Nathanael sabia que o sol era um reflexo da luz que iluminava o Paraíso e, portanto, ali no Inferno, pouquíssima dessa luz chegava. Levantou-se. Mesmo depois de tanto tempo, ainda estava irritado que havia sido capturado por Vráchos, o Daityoni que controlava aquele Círculo do Inferno e a Cidade de Dite. Daityoni foram uma espécie de demônios que habitavam o Inferno antes da chegada de Lúcifer; haviam nove deles. Até alguns anos antes, quando Nathanael, Aaron e seus outros companheiros invadiram o Inferno, dois haviam sobrevivido ao m******e trazido por Lúcifer, Vráchos e Apoliom, mas este último foi derrotado e morto por Phillip Jones. De fato, Nathanael estava tendo dificuldades para compreender com certeza como ele, um anjo, três dos magos mais poderosos da Terra e uma Dusü baki Nagara, uma caçadora de demônios, haviam sido tão facilmente presos. Sabia que o tempo que estava passando no Inferno começava a afetar sua memória, mas ainda assim, deveria ser capaz de se lembrar, afinal, fora a última coisa que aconteceu antes de ser jogado naquela jaula. Refez mentalmente os seus passos desde que conseguira retirar a Ọkan de Elena em Aztlan e mandar Leonard no corpo de Dorian de volta a Godheim. Aaron sugerira que o melhor lugar para guardar o corpo desacordado de Elena era na Mansão dos Mortos, a prisão de Lúcifer. Havia dezenas de quartos e, com selo inquebrável na porta da frente seria impossível que qualquer ameaça externa atacasse; e quanto ao próprio Lúcifer, bastava manter o corpo de Elena em um dos quartos e selá-lo de modo que ele não fosse capaz de abrir. Nathanael abriu um portal direto para o Nono Círculo, a partir daí sua memória estava turva. Não tinha certeza, nem ao menos, de onde estava a Ọkan. Sabia que não estava consigo, nem com qualquer um de seus companheiros, se é que estavam com ele no Inferno. Se foram emboscados antes de chegarem até ali... Só de pensar que a Ọkan poderia estar em mãos erradas Nathanael teve calafrios. Do nada, uma lembrança atingiu sua mente, como se ela tivesse sido mandada pelo próprio Criador, pois ele não estava nem perto de pensar naquilo. Ela era sobre sua jornada pelo Inferno três anos antes; lembrou-se de que ele havia forjado uma conexão mental com seus companheiros de viagem, de modo a manterem-se conectados, mesmo que por acaso fossem separados. A conexão nunca fora desmanchada e, se na época ela funcionava no Inferno, agora não seria diferente. Então, ele falou uma palavra na Língua de Prata que não dizia desde aquela aventura: – Odkaz. E esperou. Nada aconteceu. Aquele foi um tiro no escuro de fato, já que eles não usavam a conexão há anos. Todavia, se quisessem, ela estava lá. Pelo menos, Nathanael foi capaz de descobrir uma coisa: nenhum deles estava no Inferno. Tal conexão mental tinha limite, como toda magia. As pessoas conectadas tinham que estar no mesmo mundo, ou seja, se não funcionou, eles não estavam ali. A não ser é claro que Vráchos estivesse mexendo em suas mentes. E como o anjo estava tendo problemas para lembrar-se dos acontecimentos, sabia que o Daityoni estava afetando seu cérebro. Um demônio de pele vermelha e chifres que cresciam da testa, contornavam sua cabeça careca e paravam na nuca, parou diante da porta da cela. Nathanael o tinha visto algumas vezes, já que se tratava do guarda de sua sala, mas ele nunca disse qualquer palavra para ele. Ao ver que o anjo ainda estava na cela, deu-se por satisfeito e voltou a andar. Nathanael foi até a porta da cela e tentou observar o corredor. Notou que ele fazia curva em ambas as direções, indicando que tinha o formato circular. Não era capaz de ver qualquer outra porta de cela, então não fazia sentido chamar por seus companheiros; também havia a possibilidade de Vráchos os ter isolado por magia, e, se esse fosse o caso, teria isolado o som também. Em outras palavras, era inútil tentar qualquer tipo de contato.  Deitou-se outra vez no chão, já que em sua cela não havia cama, nem mesmo um pano. Pelo menos, a pedra era quente, como tudo no Inferno. Ouviu os guardas gritando na Língua Proibida; eles diziam desesperadamente que estavam sendo invadidos, que a prisão corria perigo. Nathanael sorriu, afinal, seus amigos não tinham sido capturados e, melhor ainda, estavam vindo salvá-lo. Longos minutos depois, provavelmente os mais longos desde que fora preso, uma pessoa surgiu do outro lado da porta. Era um humano, felizmente; todavia, não era quem esperava. Era uma mulher, uma muito linda para os padrões humanos. Sua pele tinha um tom cinzento e pálido, o que contrastava com seus longos cabelos pretos de reflexos arroxeados quando era iluminado pela pouca luz. Seus olhos eram roxos, como os reflexos, porém brilhavam de uma maneira encantadora. O mais impressionante era sua roupa; usava um vestido preto com detalhes lindíssimos e trabalhados em roxo; o corpete era justo, emoldurando as curvas invejadas dela. A saia, no entanto, não era de pano, mas sim feita de algum material preto e sombrio que, conforme ela andava, se movimentava como se estivesse vivo. Nathanael achou-a muito diferente de seu antecessor, não apenas pelo fato de ela ser mulher e o outro homem, mas por que ela parecia muito mais viva do que ele. Também havia algo de familiar nela, como se ele já a tivesse visto antes. A mulher, sem hesitar, fez uma imensa foice surgir das sombras que formavam a saia do seu vestido. A foice tinha marcas na Língua de Prata e na Língua Proibida em sua lâmina. O anjo reconheceu-a imediatamente; aquela era Klakrumm, “aquela que muda de forma”. Forjada por Lúcifer, a foice tinha uma habilidade especial: dependendo de quem a segura, ela muda de forma. Para alguns, era uma foice; para outros, espadas; e para outros ainda, arco e flecha. Era impossível prever que formato assumiria. Um único golpe foi necessário para partir a tranca da cela e liberar a porta. Então, fê-la desaparecer outra vez nas sombras vivas. – Temos que ir. – Ela falou, com uma voz firme de alguém que sabe exatamente o que está fazendo. – Vráchos logo irá perceber minha presença. – Eu conheço você... – Foi a única coisa que conseguiu dizer. – Sim, todo mundo conhece. Eu sou a Exorcista. – Enquanto falava, ela tirou das sombras uma espada extremamente familiar para Nathanael. – Como Vráchos... As espadas dos anjos são invisíveis e intocáveis até que seus próprios donos fazem menção de pegá-la de uma bainha invisível e intocável presa em suas cinturas, querem eles estejam usando cintos, túnicas, ternos ou não. Nenhum ser humano era capaz de roubar a espada de um anjo. Contudo, ali estava a Exorcista entregando sua espada, que provavelmente havia sido retirada por Vráchos. – Ele é muito poderoso. – Ela falou, apressada. – Agora vamos, ou as coisas vão ficar feias. Nathanael seguiu-a pelo corredor à direita. Correram por vários metros, até terminarem em uma escadaria que subia muitos metros. O topo dela acabava no canto oeste de Dite, um pouco mais afastado do centro e do castelo de Vráchos, onde estava concentrada a maior parte da população. Agora, estavam a céu aberto, Nathanael poderia voar livre. – Eu sei quem você é. – Repetiu, pois agora ele tinha certeza quem era a garota por trás daqueles olhos roxos e vestido sombrio. – Sim, eu sou... – Não. – Interrompeu. – Eu sei quem você era antes. Aaron me falou de você, mostrou fotos; ele procurou por você depois de seu desaparecimento. Um barulho de centenas de pés marchando na direção deles interrompeu a conversa. Nathanael e a Exorcista puderam sentir que um exército vinha na direção deles. Nathanael alçou as asas; a Exorcista agarrou uma parte da sombra de seu vestido. Antes que ela pudesse desaparecer, ele pegou de leve no antebraço dela: – Obrigado, Jessica. Ela afirmou uma vez com a cabeça. Nathanael voou; olhou para baixo a tempo de vê-la puxando a sombra de sua saia e jogando sobre si mesma. Em seguida, ela desapareceu em um vortex de escuridão. O anjo olhou em volta e viu, um pouco do lado de fora da cidade, um buraco gigante e sem luz, que ele sabia levar para o centro do mundo e, consequentemente, os outros três Círculos do Inferno. Foi rapidamente para esse buraco, sabendo que precisava chegar ao Nono Círculo o mais rápido possível. _____________________________ Grand Canyon, Paraíso Kifo observava a alma ajoelhada diante de si. Era um homem, aparentava ter quarenta anos com sua barba grisalha, mas sem muitas rugas no rosto. Contudo, o Filho da Morte sabia que as aparências, ainda mais no Paraíso, eram completamente inconfiáveis. Sem piedade, agarrou a alma pelos cabelos e jogou sua cabeça para trás, de modo que pudesse observar seu captor com clareza. Com a mão livre, depositou o dedo sobre a testa dele. Não precisou recitar qualquer palavra, pois Apófis havia lhe dado à habilidade de apagar memórias; as palavras estavam gravadas em seu ser, eram parte de si, assim como era parte dos deuses do Duat. Aos poucos, soltando um brilho branco como a luz, o homem foi perdendo sua forma. Perdeu seus braços, suas pernas, seu tronco, até sobrar apenas à cabeça; e esta, também sumiu. No lugar, uma bola brilhante do tamanho de uma bola de tênis, sobrou. As almas no Paraíso apenas tem forma humana por causa das memórias, eram um reflexo delas e, sem elas, voltavam a ser esferas, como a que estava diante de Kifo. Enquanto os outros Filhos do Abismo apenas observavam, Kifo levou a alma até sua boca e a engoliu inteira sem fazer qualquer esforço. Imediatamente, sentiu o poder da alma em si. Era como se tivesse tomado uma injeção de adrenalina direto no estômago. Sentiu a energia correndo por suas veias, seus nervos e músculos; e como aconteceu das outras duzentas e noventa e nove vezes, sentiu dor logo após o frenesi do poder. Seus músculos doeram pior do que antes, parecia que iriam explodir. De fato, iriam, se ele não fosse Kifo, o Filho da Morte. Durante os meses em que seu exército esteve acampado naquele Canyon, Kifo foi capaz de fazer algumas experiências. A primeira foi consigo mesmo, logo que voltou. Ele absorveu sua primeira alma, o que causou a reação esperada nos outros Filhos do Abismo: juraram lealdade a ele. Todos, sem exceção, vieram de todos os cantos daquele continente, que Rafael chamou de América. Infelizmente, os Filhos que estavam em outros lugares do mundo não puderam vir, pois não podem cruzar as águas; e a maioria dos Pnamryaks já tinham jurado lealdade a Abigail, Kane ou Vizard. Só de pensar no nome do traidor de Roma dava mais determinação a Kifo. Sentia ira, sentia ódio, e esses sentimentos ajudavam a controlar a alma. Assim que pudesse, voaria até ele e conquistaria seu exército, se isso não bastasse, o mataria, mesmo que tivesse que m***r e roubar a espada Miʻridʻr. Respirou fundo várias vezes, apenas quando a dor parou, foi que voltou a lembrar. O segundo experimento que fizera fora com dois dos seus soldados. Um regular e um Ryak, um Heyroryak, para ser preciso. Kifo deu a eles uma alma cada. No entanto, eles não aguentaram e, então, explodiram, literalmente. Suas presenças na mente coletiva desapareceram, como acontecia quando Leonard Ross matava-os. Nenhum deles tentou absorver outra alma; eles não eram fortes o bastante para isso; portanto, todas as almas capturadas eram trazidas para Kifo, que as absorvia e se tornava ainda mais poderoso. – Sabe, eu existo desde, bem, sempre – uma voz fria e superior disse; Kifo reconheceu-a imediatamente – e eu já vi tudo que existe neste Universo. Mas nunca, nunca mesmo, vi algo tão nojento, vil e baixo, ainda mais que meu próprio filho o estivesse fazendo. Kifo virou-se para olhar seu pai, a Morte. Ele estava como sempre: terno preto riscado, descalço e seus olhos de abismo querendo consumir todas as almas do Paraíso. Diferente, porém, era que ele estava acompanhado. Uma dúzia de homens vestindo túnicas de capuz pretas, que escondiam completamente seus corpos, exceto pelas mãos, que eram magras e cadavéricas. Cada um deles detinha uma foice, cujos cabos eram feitos de ossos e as lâminas de Sídero Theía. Rafael, que contara muito dos segredos dos mundos, tinha falado sobre eles; aqueles eram Ceifadores, antigos anjos Caídos que trabalhavam para Morte coletando almas pelos sete mundos. – O que você quer? – Kifo perguntou, tentando controlar o medo; a figura da Morte causava medo até mesmo na mais poderosa criatura presente no Paraíso. – Quero que pare de fazer seja lá o que pense estar fazendo. – A Morte falou, sereno. – Por quê? Eu estou cada vez mais perto de vencer essa guerra. – Exato. Não podemos vencer essa guerra antes do tempo. Em breve, isso irá acontecer; dois dos selos já foram partidos. – Do tempo. – Kifo assumiu seu tom sarcástico; sentia a raiva crescendo em si. – Você quer dizer antes de meus irmãos estarem livres? – Com seus irmãos, teremos controle sobre todos os Filhos do Abismo e, assim, poderei concluir meu plano. – Não precisamos deles! – Vociferou, cada vez mais irado; os outros Filhos em volta deles assistiam sem se mover. – Eu não preciso deles! Sozinho, sou capaz de ter todos os Filhos sob meu comando, velho! De fato, quatrocentos mil deles já estão em meu controle. Mas é claro que, sem eles, você não tem controle sobre mim, sobre nenhum de nós! – Kifo esticou os braços, apontando e girando para mostrar seu grande exército; dentro da memória coletiva seus soldados gostaram da forma como ele se impôs. A Morte nada falou. Kifo sempre fora o mais rebelde de suas crias, todavia, quando Shi e Tod, seus irmãos mais velhos estavam presentes, nenhum deles de fato iam contra a vontade de seu pai. A Morte controlava-os, da mesma forma que os três juntos controlavam os Filhos do Abismo. Mas Kifo tinha razão; ele poderia unir todos os Filhos sozinho, sem dúvida, mas a Morte sabia que se isso acontecesse, Kifo se tornaria uma ameaça, não apenas ao Paraíso ou às almas, mas para todo o Sétimo Universo. Shi e Tod tinham que ser libertos para que o caos não reinasse. – Você não pode me m***r, por que sem mim, não teria controle de nada, mesmo que Shi e Tod estivessem aqui. Você precisa de nós três, mas todos de quem preciso estão nesse Canyon. – Assim que disse isso, todos os Filhos prepararam-se para lutar, transformando partes de seus corpos em armas ou controlando os elementos, no caso dos Ryaks. – Então, velho e******o, o que vai... Kifo não terminou de se gabar, pois a palma da mão da Morte estava tocando seu peito. Se ele não fosse imortal, com certeza pereceria ali mesmo. Foi então que sentiu algo pior do que a destruição, sentiu todas as almas dentro de si desaparecerem, enquanto a Morte falava: – Você acha que apenas por que tem um exército e um punhado de almas dentro de si você pode me enfrentar? – A Morte soava calma, porém firme, como um pai que está dando uma lição em seu filho. – Eu sou a Morte. Sou um dos Três Supremos. Você está aqui apenas por ser parte de meu plano, e não passa de um peão em um jogo cósmico que vai muito além da sua compreensão. Quando terminou de arrancar as almas, a Morte desencostou de Kifo, que caiu de joelhos no chão, completamente sem forças; parecia que seu pai não apenas tinha tirado as almas, mas também seu próprio poder. Sentiu-se um inútil, alguém que deveria apodrecer e morrer. – Peguem todas as almas humanas e as mandem para o Éden. – Falou para seus Ceifadores, que andaram por todo acampamento dos Filhos. Kifo observava enquanto todas as almas que estavam sob seu poder serem levadas. Tudo que ele havia conquistado até ali desaparecendo por um capricho de seu pai. Sentiu raiva, sentiu ódio; queria destruir o velho, mas não conseguiria, não com tão pouco poder. E agora, depois daquele encontro, levaria um tempo para se recuperar. Estaria completamente indefeso, se não houvesse um exército tão grande; exército o qual, naquele momento, nada fazia contra os Ceifadores. Depois da Morte partir, os quatro generais de seu exército ajudaram-no a se levantar e a chegar a seus aposentos em uma pequena gruta escondida da luz. Havia ali uma cama confortável, já que após absorver uma alma, ele levava um tempo para controlá-la. – Quantos somos no total? – Ofegou para o general que estava mais perto chamado Elret. – Quatrocentos e vinte e sete mil. – Ele respondeu de maneira solene. – Pegue duzentos mil e traga para mim todas as almas desse maldito continente! – Senhor, grande parte dessas almas estão protegidas pelos anjos. – Ousou dizer, abaixando a cabeça em referência. – Traga-me as almas! – Disse, antes de cair na inconsciência. _____________________________

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