Seis meses depois
O quarto parecia encolher com a intensidade das palavras de Cristine, cada sílaba uma martelada em minhas incertezas. Eu a encarava, lutando para manter a compostura enquanto sentia o peso de sua preocupação me esmagar. Minhas mãos tremiam levemente, uma dança silenciosa de nervosismo e medo, refletindo o tumulto interno que suas palavras desencadeavam.
— Ele é um babaca, July! Por que você não termina logo com esse cretino? — Cristine questionou, com as sobrancelhas franzidas, claramente irritada ao me ver tentando ligar para Túlio pela milésima vez. Seu tom de voz exalava preocupação e irritação, um reflexo do cuidado que ela sempre teve por mim.
Olhei para baixo, sentindo um nó se formar em minha garganta. As palavras de Cristine ecoavam em minha mente, misturando-se com as dúvidas que eu tentava ignorar.
— Cristine, eu gosto dele, você sabe. Por favor, não comece com isso — eu disse, com a voz trêmula, lutando contra o mar de emoções que ameaçava engolir meu raciocínio. Meu dedo pairava sobre o botão de discar, como um pássaro indeciso à beira de um abismo, simbolizando a luta entre minha vontade de me apegar a Túlio e o medo de me afogar nas verdades que Cristine insistia em me mostrar.
Com um suspiro que parecia carregar todo o peso do mundo, Cristine arrancou o celular das minhas mãos, sua expressão um emaranhado de frustração e carinho desesperado. Ela se atirou na minha cama, uma ilha de desalento em meio à tempestade que se formava entre nós. Seu rosto, normalmente tão sereno e acolhedor, agora era um espelho de angústia e desespero.
— Você está iludida, amiga! Isso me estressa — suas palavras, embora duras, eram carregadas de um amor angustiado, um desejo ardente de me ver longe de qualquer sofrimento. Ela enterrou o rosto nas mãos, um gesto de exaustão diante da batalha que parecia interminável.
Respirei fundo, um sopro de tentativa de clareza, e recuperei meu celular com mãos trêmulas. Sentei-me ao seu lado, o contato de nossos ombros um pequeno consolo na tempestade de emoções. Minha voz, um mero sussurro, carregava o peso de minhas dúvidas e o desejo ardente de acreditar em algo mais puro do que as evidências sugeriam.
— Não é bem assim, Cristine. Eu não sou iludida — tentei me defender, embora cada palavra parecesse mais frágil diante da realidade que ela pintava. — Não seja tão dura, você está me magoando — admiti, a vulnerabilidade se infiltrando em minha voz, um pedido silencioso por compreensão e, talvez, por um pouco de esperança.
Cristine se levantou e continuou sua caminhada tempestuosa pelo quarto, uma tempestade de frustração e cuidado encapsulada em cada passo. Ela parecia dilacerada, uma lutadora no ringue da verdade e da compaixão, debatendo-se sobre quão direta deveria ser para abrir meus olhos sem partir meu coração.
— Tenho que ser sincera com você. Não vou passar a mão na sua cabeça. Ele faz o que quer, July, e você aceita tudo! — As palavras dela cortaram o ar, afiadas e diretas, uma espada desembainhada pela necessidade de me proteger daquela ilusão perigosa. Ela parou de andar, fixando em mim um olhar que era uma mistura de exasperação e um desespero para me fazer entender.
Eu desviei os olhos, incapaz de sustentar seu olhar acusatório, meu coração batendo uma marcha dolorosa. As palavras dela, embora duras, faziam minhas memórias desfilarem numa parada de arrependimentos e dúvidas. Meus pensamentos se perdiam entre os momentos que compartilhei com Túlio, uma busca febril por justificativas que se esvaíam como água entre os dedos.
— Ele não é assim, Cristine. Ele errou uma vez, mas já se desculpou. Esse assunto está resolvido — tentei infundir convicção nas minhas palavras, mas soaram como uma prece vacilante, um mantra frágil contra a tempestade de realidades que Cristine trazia.
— Uma vez? Você acredita mesmo nisso? — A voz de Cristine era um misto de choque e pesar, como se cada palavra fosse arrancada de um lugar profundo de dor e descrença. Seu conhecimento de Túlio, infelizmente, não trazia a mesma cegueira que o amor me havia imposto.
Fechei os olhos com força, um escudo fraco contra a avalanche de verdades que ameaçava minha bolha de negação.
— Ele jurou que foi só aquela vez. Eu acredito nele — murmurei, um sussurro trêmulo de fé no amor, na esperança de que o passado pudesse ser enterrado e esquecido.
Cristine balançou a cabeça, a incredulidade pintada em cada linha do seu rosto.
— Você caiu nessa conversa? Você acredita em Papai Noel também? — Sua pergunta, carregada de um sarcasmo dolorido, era um espelho da minha própria ingenuidade.
Abri os olhos lentamente, confrontando o desafio em seu olhar. Era um duelo silencioso entre minha vontade de acreditar no inacreditável e a dura realidade que ela tentava me apresentar.
— Você não pode apenas ficar feliz por mim? — a esperança em minha voz era uma chama frágil, tremulando diante do vendaval de dúvidas trazidas por Cristine. Minhas palavras, "Ele vai mudar", ecoaram pelo quarto como uma prece incerta, um pedido ao universo para que minhas ilusões se tornassem realidade.
— Ele não presta, July. Não vai mudar porque ele não quer — Cristine, aproximando-se com uma determinação ardente, segurou meus ombros com uma força que buscava despertar-me de um sonho perigoso. Sua proximidade era palpável, transmitindo uma urgência que fazia meu coração acelerar, não de paixão, mas de medo da verdade.
A tristeza invadiu minha voz enquanto eu tentava formular uma defesa
— Não é assim, Cristine… — mas dentro de mim, uma voz pequena e sufocada questionava se minhas palavras tinham algum peso, ou se eram apenas o eco de uma esperança desfalecida.
Cristine, percebendo minha hesitação, suavizou sua abordagem. Seu toque se tornou menos insistente, suas palavras tingidas de uma doçura amarga, uma mistura de preocupação e um profundo desejo de ver-me livre daquela angústia.
— Eu quero que você seja feliz, de verdade. Mas isso não vai acontecer enquanto estiver com ele. Vocês são diferentes. Você é encantadora e acredita no amor. Ele só quer curtir— sua sinceridade era um bálsamo doloroso, uma verdade que eu temia aceitar.
Engoli em seco, tentando ancorar-me na última réstia de fé que me restava.
— Estamos num relacionamento. Ele é meu namorado e está tentando mudar, mesmo que você não acredite — minha voz era um fio tremulante de convicção, uma ponte frágil sobre um abismo de incertezas.
Cristine me soltou delicadamente, seu recuo um reflexo da resignação que a tomava. O espaço entre nós crescia, preenchido por um silêncio pesado, suas próximas palavras pairando no ar como uma névoa gélida.
— Você realmente acha que o Túlio é fiel?
A pergunta atingiu-me com a força de um soco, cada sílaba um martelo que despedaçava a frágil estrutura de negação que eu havia construído. O peso da incerteza tornou-se insuportável, um monstro que crescia nas sombras da minha própria negação.