Thalan Roux
Mais um dia na matilha e a raiva me consumia de uma forma que queira apenas sair daquela sala ignorando os anciões que insistem que me pai deva se afastar e deixar que faça a disputa para provar o meu valor como o Alfa que a nossa alcateia necessita.
— Não vou destituir o meu pai! — brado irritado.
— Esse momento vai acontecer em algum momento, Thalan! — Um dos anciões fala.
Viro lentamente para o homem com meu pescoço tenso com o sentimento de raiva que estou sentindo, a vibração em meu peito começa a ficar sem controle e tento manter pelo menos a minha sanidade.
“Cretino”
Meu lobo diz rosnando em minha cabeça, faz com que as veias em meu pescoço inflem e feche minhas mãos em punhos para tentar controlar o que estou sentindo. O cheiro do meu pai começa a ficar mais próximo de mim e sinto a sua mão em meu ombro apertando com delicadeza.
O que faz com que a minha atenção e meu foco saiam desse velho, que para mim está planejando em se ver livre do meu pai.
— Concordo com meu filho, ele já está pronto para participar da disputa. Mas acredito que ainda falta algo para que ele esteja pronto para assumir… — Meu pai começa a dizer e se afasta.
Estávamos no prédio que meu pai gosta de chamar de prefeitura, é onde centralizamos o que pode ser considerado o nosso governo. Não é porque nos transformamos em animais enormes que não temos um pouco de civilidade.
Tentamos sempre incorporar coisas do mundo humano a nossa sociedade lupina e secreta. O grande salão onde é feito os casamentos entre os lobos e as mais diversas cerimonias em nossa alcateia servia também como um lugar para as reuniões com o conselho de anciões. O que estava começando a me tirar a paciência.
“Podemos matá-los”
Meu lobo fala com sarcasmo, e mesmo que a ideia seja bastante atraente por sentir que esses velhos estejam aprontando algo. Não posso simplesmente me transformar e matá-los sem uma justificativa bem plausível, ou serei exilado da ilha e não posso sair daqui…
A lembrança da mistura de perfumes florais, a imagem de uma certa loba branca com seus olhos como duas labaredas de fogo, faz o meu lobo se acalmar dentro de mim. Posso senti-lo se deitar sobre as quatro patas e ignorar o que era falando dentro daquela sala.
Me afasto do meio do salão indo em direção a uma das paredes e fico próximo ao grande janelão que dava uma linda vista para o mar.
Sou grato a deusa Selene que nos abençoou com sentidos mais aguçados que dos humanos, o fato de poder enxergar a quilômetros, ouvir os muitos sons e principalmente o que mais gosto…
Sentir o cheiro que mais me atrai apenas por ver a sua silhueta enquanto corre pela margem do lago em Valldemossa. Olho novamente para o meu pai que insistia em falar com os anciões sobre a doença que está se espalhando em nossa alcateia. Ele acredita que alguém está nos envenenado e os anciões acreditam que meu pai não tem mais capacidade de lidar com isso depois de mais de trinta anos sendo o alfa de nossa alcateia.
Decido sair da reunião soltando uma lufada de ar por estar irritado com a dificuldade de aceitar que para fazer o que for, seja para o bem ou até mesmo para entrar em uma disputa precisemos ouvir os mais velhos.
Caminho pelos corredores do prédio que mais parece um palácio e cumprimento alguns lupinos que circulavam por ali. Todos sorriam para mim e pediam que mandassem lembranças a Greta.
Greta…
A loba albina que meus pais adotaram um dia que surgiu misteriosamente na porta de nossa casa. Estava com três anos na época e lembro que a novidade de ter uma irmã era legal.
Gostava de saber que seria o irmão mais velho e que a minha função seria protegê-la seja lá de quem quer que fosse. Com os anos meus pais foram nos explicando que não eramos irmãos e que não deveríamos pensar assim.
“A deusa tem seus mistérios e se Greta surgiu aqui descobriremos com o tempo o real motivo”
Essa sempre foi a fala de meu pai para mim e para Greta, que vem a cada nova lua me deixando muito mais enfeitiçado por ela. Como passo muito mais tempo em minha própria toca do que na casa de meus pais, não tenho a visto com frequência.
Estou tentando evitar ficar perto dela e deixar que outros percebam o meu interesse pela loba branca que se tornou a atração e interesse de muitos lobos desde que entrou na sua fase adulta.
Lembro quando estava com dez anos e a Greta teve a sua primeira transformação, minha mãe se desesperou preocupada com o que todos na ilha falariam sobre a pequena lobinha assustada.
Sentei ao lado da lareira de casa e a via sentada com a cabeça sobre as patas.
— Você vai aprender a dominar Lua! — Digo olhando para ela.
Suspiro ao ver abaixo de seus olhos as lágrimas que escorriam, sei que ela estava se sentindo anormal, por ter seus pelos diferentes de todos os lobos da ilha que em grande maioria são avermelhados ou cinzas.
Eu mesmo tenho meus pelos avermelhados e ver Greta tão alva, aquilo me intrigou e chamou muita a minha atenção. Com isso comecei a ser muito mais protetor para a loba que é criada em minha casa.
Odiava em saber que os vários lobos que cresciam e treinavam comigo falavam da loba três anos mais nova e linda.
Greta n**a com a cabeça e vira a sua cabeça na direção oposta evitando o meu olhar. De onde estava sentado via a minha mãe nos olhando com tristeza, talvez ela já tivesse conversado com a Greta antes que tivesse chegado em casa.
— Por que está tão triste? — Pergunto tentando forçar a lobinha deixar que a parte humana sobressaísse.
— Lembra que demorei quase uma semana a voltar ser humano? — Pergunto e começo a rir.
Deito ao lado da loba que bufa ao meu lado, olho para cima e espero a sua atenção. Depois de vários minutos podia sentir o seu corpo tremendo e os olhos avermelhados de Greta deixando o tom azulado voltar.
— Oi? — Digo rindo.
— Oi… — Via o seu olhar triste.
— Parabéns, me superou em seis dias! — Digo e ouço a minha mãe rir da cozinha.
— Pode ser, mas sou uma aberração, sou branca Thalan…
Assim que ganho as ruas da frente do prédio deixo que o fogo da minha transformação me consuma e deixo que o meu lobo o leve em direção ao seu desejo.
“A desejo”
O seu desejo é tão latente em minha mente que se torna palpável o seu desejo de transforma Greta em sua companheira. Mas tenho medo de sua rejeição, posso sentir que ela está em uma luta interna para não deixar que seus próprios sentimentos venham a tona.
Talvez a sua preocupação seja que meu pai ou que os anciões que a desprezam não permita uma aproximação comigo.
Fechos os meus olhos e deixo que meu lobo nos leve até onde ele pode senti-la, saímos do centro de nossa cidade Palma e percorremos quilômetros até alcançar as margens do bosque de Valldemossa.
Não muito distante dali é a minha toca, talvez a leve para conhecer.
Tento desacelerar a nossa corrida, afinal não quero que ela se assuste com o lobo eufórico que corria em sua direção como se ela fosse sua ou simplesmente pela falta que ele estava sentindo por não, a ver a mais de mês.
Reviro os olhos tentando controlar as patas pesadas que nos impulsionam para frente. Às vezes é irritante conviver com mais de uma consciência dentro de um corpo e tenho vontade de mandar o meu lobo para tirar umas longas férias no Alasca.
Sinto quando ele revira os olhos e bufa com a minha ironia por sua presença insistente e permanente.
— Tenho certeza que vai assustá-la! — Digo tentando controlá-lo.
Mas sinto os nossos batimentos mais acelerados, ele estava muito mais ansioso. Desejava ver a loba correndo e a instigar a correr ao nosso lado. Inalo o cheiro e posso sentir entre as diversas misturas que há no bosque o perfume de flores que não fazem parte da fauna de nossa ilha.
“Greta”
Pensamos juntos, o nosso sorriso fica maior e posso sentir o fogo do desejo e o t***o pela loba branca ressurgindo. Descobri que sentia algo por ela quando um dos meus amigos sentou ao seu lado e segurou em sua nuca tentando subjugá-la e ver que Greta em um momento de confusão deixou que o lobo tentasse mostrar que era bom para ela. Fez com que o ciúme me corroesse.
Por isso decidi me afastar para entender o que realmente estava acontecendo comigo o que se tornou uma tortura para o meu lobo que desejava mordê-la desesperadamente.