ANGELO
Desde que me tornei o Sottocapo da máfia siciliana, eu tenho me dividido entre Roma e a Sicília.
Eu e a Aurora compramos uma casa com uma arquitetura colonial, que ela mesmo restaurou, a cinco quilômetros da casa do Don, na Sicília.
Antes, nós nos hospedávamos na casa do Enrico, que inclusive, tem inúmeras quartos. Mas, eu continuo apreciando estar só com a minha mulher a maior parte do tempo possível, apesar das reuniões de família serem cada vez mais frequentes desde que o Enrico assumiu o lugar do nosso pai.
Por falar no meu irmão, ele tem se saído muito bem como Don. Tem a paciência que eu não tenho com aqueles abutres da organização, tem feito bons acordos, impõe respeito...
O Maxim, o nosso Consigliere, parece que nasceu para isso. Ele tem sido de grande ajuda nas tomadas de decisão. Foi ele que ensinou para o Enrico tudo que ele precisava saber para assumir, enquanto nosso pai estava em coma.
Isso mesmo. O nosso pai, que se manteve distante por anos por uma promessa que ele e o nosso tio tinham feito para nonna, de não nos envolver nos assuntos da máfia, reapareceu a alguns anos. Ele e o nosso tio, o pai do Marco.
Não foi fácil perdoá-los. Eu os culpava por muitas coisas. Mas, principalmente, por achar que nos tratavam como marionetes, visto que, eles eram os donos da agência de justiceiro ao qual o Guepardo prestava os seus serviços e da agência secreta onde o meu primo Marco e a Serena eram agentes.
Como não podiam quebrar a promessa que tinham feito a nonna, essa foi uma das formas que eles encontraram para estar perto. Segundo o meu pai e o meu tio, eles tiveram, mesmo que de longe, todo o tempo, acompanhando cada fase das nossas vidas.
Infelizmente, há um tempo atrás, o meu pai e o meu tio sofreram um atentado. O pai do Marco infelizmente não resistiu, já o meu pai, ficou um tempo em coma no hospital. Por sorte, em uma conversa franca que tive com o meu tio, semanas antes da sua morte, eu consegui perdoá-lo, apesar de ainda guardar muita raiva do meu pai, na época.
Mas, talvez o medo de perdê-lo, enquanto o via entre a vida e a morte após o atentado, me fez enxergar que eu precisava focar no futuro, já que não podia mudar o passado.
Eu consegui perdoá-lo, chamá-lo de pai, e hoje tempos uma relação de pai e filho.
Apesar de tudo, hoje consigo enxergá-lo como mais uma vítima do egoísmo da minha mãe.
Na época em que eu e o Enrico nascemos, ele foi embora praticamente foragido após tentar matar a minha mãe. Ele descobriu que ela havia sumido com uma das crianças, que no caso era o Enrico, e se negava a contar o paradeiro.
Aquela mulher tem um talento impressionante para desestruturar qualquer pessoa, Eu não duvido que eu teria feito o mesmo no seu lugar.
Sobre o meu passado, eu nunca vou superar o que aconteceu com a Alice, mas mesmo diante de todo o sangue que eu já derramei, a vida resolveu me presentear com a Serena e o Enrico. Eu não os coloquei no lugar da Alice porque ela é insubstituível, mas o lugar deles é tão importante quanto o dela.
Sobre a minha mulher, essa veio para mudar a minha vida, a começar por mim.
Eu, que apreciava a minha solitude, não consigo imaginar a minha vida sem ela.
Eu passei a querer viver, a ter medo da morte, a conseguir dormir, a vê graça nas coisas, a sorrir... A Aurora coloriu a minha vida, que antes era em preto e branco.
Ela hoje é uma brilhante arquiteta, que desenvolve projetos para uma empresa de arquitetura e urbanismo de Roma, com filiais em toda a Europa.
A Aurora também cuida com muita dedicação do centro de acolhimento Alice Ricci. Aquele lugar cresceu muito desde sua inauguração.
Muitas mulheres, todos os dias, chegam buscando ajuda, e recebem um tratamento e um recomeço.
[...]
Eu estava no meu escritório, monitorando os passos de uma daquelas escórias que eu gostava de usar nelas o meu taco de beisebol, quando a Aurora entrou no meu escritório.
Ela estava vestida com um robe branco de seda, uma garrafa de vinho em uma mão e duas taças na outra.
— Amor, o meu projeto para a restauração da Catedral de San Gerlando foi aprovado — ela falou com um sorriso que ia de orelha a orelha, colocando a garrafa e as taças em cima da mesa.
— Eu sabia que seria aprovado — a puxei para o meu colo. — Você é incrível e muito talentosa, meu amor — falei a beijando.
Eu abri a garrafa de vinho, depositei a bebida em nossas taças e nós brindamos.
A Aurora me levou pela mão para sentar com ela no sofá do escritório.
— Você sabe que teremos que passar mais tempo na Sicília durante os seis meses da restauração, não sabe? — a Aurora perguntou com uma discreta ruga se formando em sua testa.
— Isso não é um problema. Eu posso estar em qualquer lugar em que você esteja. Nós temos pessoas de confiança no centro de acolhimento, e os meus trabalhos podem ser feitos daqui, sem nenhum problema.
— Por isso que você é o amor da minha vida — ela se aproximou me beijando.
— Só por isso? — perguntei, desatando o laço do seu robe, vislumbrando uma linda camisola branca, com um decote generoso.
— Por isso e por muitos outros motivos — ela falou, se inclinando, me surpreendendo com uma mordida no lóbulo da minha orelha.
Eu e você sabemos no que isso vai dar.