Eu fiquei nas nuvens depois daquele momento. A verdade é que eu não consegui parar de pensar em tudo que aconteceu, eu tive sonhos lindos, naquelas horas de sono, foi realmente incrível, tão incrível que eu acordei no outro dia radiante, cheia de expectativas. Tudo bem, eu sei que não podemos criar expectativas, meu avô sempre disse que colocar muitas expectativas em algo que não depende do nosso controle, é abrir caminho para decepção. Eu sei que isso está certo, mas quando é com o coração, vale a pena correr o risco. Eu estava tão bem, que todos notaram minha mudança, todos notaram, mas só meu avô comenta:
— Bom dia para todos! Então, dormiram bem? — Eu falo toda animada.
— Bom dia! Nós dormimos bem, mas pelo jeito, ninguém dormiu melhor que você — meu avô fala, me olhando desconfiado.
— Ah, vovô! Não começa vai, eu tive uma ótima noite de sono — falo ainda sorrindo e claro, ignorando completamente a minha mãe, que não fala nem comprimenta ninguém em dia nenhum.
— Eu aposto que sua noite foi muito boa e eu aposto, que isso tem algo a ver com algum rapaz. Eu espero que possamos nos conhecer muito em breve — fala sério — eu não quero minha garotinha saindo com qualquer um — meu avô é muito ciumento.
— Quando tiver alguém pra conhecer, eu apresento vovô, pode apostar. Bom, agora tenho que ir, me deem licença — falo e me retiro da mesa.
Quando chego no hospital, assim que saio do carro, dou de cara com a Vanda, que está me esperando cheia de perguntas.
— E então, conta tudo! Como foi com o boy magia, teve pegação? Olha, se não teve, você perdeu uma chance de ouro de aproveitar a vida — ela pergunta e eu fico boquiaberta.
— Vanda, você está louca? Como assim pegação? — Eu pergunto, ainda meio sem graça.
— Louca? Por que? Alicia, você não é a madre Teresa querida, você está obviamente afim do boy e ele afim de você. Vocês ficaram naquela boate e com certeza ficaram numa sala de camarote, sozinhos, não teve nem um beijinho? Ah, vá!
— Vanda, tudo bem. — Me dou por vencida — teve sim uns beijinhos, mas só isso — falo e ela pula feito uma maluca, comemorando.
Nós seguimos conversando e entramos no hospital, a Vanda vê ao longe o Arthur e a Débora, os dois estão rindo. Pelo jeito a conversa estava bem animada. Eu e a Vanda conversamos a noite passada, ela me contou a história dela, e infelizmente minhas suspeitas se confirmaram, ela realmente gosta do Arthur e pior, isso tem anos. Eles se conheceram ainda crianças, quando o pai da Vanda foi trabalhar como motorista para a família do Arthur, sendo assim, o pai do Arthur pagou os estudos dela e também a colocou na melhor faculdade, junto com Arthur, essa história é longa. Nós estamos andando quando eu sem querer dou um esbarrão no Arthur.
— Ei! Você não encherga não? — Ele reclama irritado.
— Me desculpe, eu não vi você — me desculpei, mesmo sem querer. Minha vontade é que ele caísse.
— Ah, claro! Você não viu, está ficando lerda de tanto andar com essa daí — ele fala apontando pra Vanda, que está um pouco atrás de mim.
— Então, você deveria parar de me provocar, já que sabe que eu sou tão lerda, não perca o seu precioso tempo me provocando. Gaste com algo mais inteligente — Vanda responde irritada.
— É mesmo Arthur — a Débora entra na conversa — não vamos perder tempo com isso, vamos fazer algo mais interessante — completa a fala com desdém. Aquela cara irritante dela me enoja.
— Vamos sim, minha querida — o Arthur fala e sai dando um esbarrão na Vanda.
— e******o! — A Vanda grita atrás dele — eu odeio esse i****a! — Ele quando ouve a ofensa.
Nós seguimos para o nosso plantão. Hoje o hospital está muito movimentado, o que é bom pra nós, nós podemos aprender muito mais. Eu e a Vanda estamos chegando no corredor de emergência, quando entra um homem com uma garotinha nos braços, coberta de sangue.
— Emergência! Emergência! Por favor, preciso de ajuda! — Seu grito desesperado é ouvido em todo o corredor — salva a minha filha — suplica.
— Calma senhor. Por favor, coloca sua filha aqui — a Vanda fala, empurrando uma maca que ela pegou no corredor.
— Senhor, pode nos dizer o que houve com ela? — Eu pergunto, enquanto verifico os batimentos cardíacos da garotinha.
— Ela estava brincando na varanda, quando de repente escorregou e caiu na parede de vidro. Foi uma queda de três metros mais ou menos, por favor, Doutoras, salva minha menininha — Ele implora em desespero.
— Tudo bem, senhor, nós vamos fazer o possível, vai ficar tudo bem. Agora preciso que aguarde aqui, enquanto começamos o atendimento — eu falo e entro na sala de traumas, onde a Vanda já havia entrado com a paciente.
Nós verificamos e ela tem várias lacerações pelo corpo, algumas com pedaços de vidro ainda na ferida, mas o pior era um corte profundo no pescoço, esse tinha um enorme pedaço de vidro preso nele, que só poderia ser retirado com uma cirurgia minuciosa no local. Qualquer erro levaria a paciente à morte, nesse momento eu corri para fora da sala e pedi que chamassem um cirurgião para fazer a cirurgia.
— Aninha, corre e chama o doutor Jonas para vir com urgência. A paciente precisa de uma avaliação mais detalhada — eu pedi à enfermeira, que estava administrando o medicamento para estabilizar a pressão arterial da paciente.
— Como assim chamar, um médico? — O pai da garota pergunta — vocês duas, não são médicas? — Ele estava na porta, ouviu meu pedido e veio questionar.
— Calma senhor, nós somos médicas, porém estamos fazendo nossa residência ainda, então não podemos tomar decisões — a Vanda falou tentado acalmar o senhor, que já estava completamente alterado.
— Calma?! — Gritou — como você quer que eu tenha calma, se vocês não tem capacidade para atender minha filha e estão aí mexendo nela! Eu quero um médico, um médico! — Ele grita ainda mais alto, enquanto empurra a Vanda, que cai no suporte do soro, fazendo o mesmo cair e a agulha rasgar a veia da paciente.
Isso transtornou ainda mais o homem, que agarrou a Vanda pelo braço, dando solavancos, ele começou a fazer um escândalo na sala.
— Se vocês matarem a minha filha, eu vou matar vocês, eu mato vocês! — Ele grita, batendo a Vanda contra a parede.
— Por favor, senhor, calma, tenha calma. — Vanda pede calmamente — nos deixe fazer nosso trabalho — ela continua tentando acalmar o homem, até os seguranças virem e o tirar da sala.
— Eu vou matar vocês! Se minha filhinha morrer, eu mato vocês duas! — Ele saiu gritando, enquanto os seguranças o arrastou pra fora.
— Muito bem, Alicia, vamos estabilizar a paciente e levar para sala de operações. O doutor Jonas, já deve está lá — Vanda fala, enquanto organiza o suporte do soro e injeta uma nova medicação na paciente.
Quando a Vanda estava terminando de aplicar a medicação, a paciente começa uma parada cardíaca, imediatamente a Vanda iniciou uma massagem, ela repetiu várias vezes, mas sem sucesso, então usou o desfibrilador.
— Carregar em um... dois... três ... de novo, carregar em um... dois... três... volta garotinha, por favor, volta — a Vanda suplicava e eu também.
Nós tentamos a reanimação, até usar uma injeção de adrenalina, ela finalmente voltou. Nós seguimos com ela para a sala de cirurgia, onde o doutor Jonas já estava preparado, a cirurgia iniciou, eu e a Vanda estávamos auxiliando. Até a metade foi tudo tranquilo, depois da retirada do objeto foi a hora de fechar a incisão e nesse momento a paciente teve outra parada cardíaca, e dessa vez não tivemos sucesso na reanimação.
— Vanda, já chega! Ela não vai voltar, não dá — O Doutor Jonas fala, segurando as mãos da Vanda que continuou insistindo na tentativa de reanimar a menina.
— Mas... mas... ela não pode morrer, Doutor, ela é só uma criança! — Vanda fala quase chorando.
— Não somos nós que decidimos isso. Nós fazemos o nosso melhor, mas quem vive e quem morre não está em nossas mãos — suspira — infelizmente esse é um dos ofícios dessa profissão lidar com a morte — O Doutor Jonas, fala olhando para Vanda com carinho.
A Vanda deixou o desfibrilador e saiu da sala muito rápido, correndo praticamente.
— Vá atrás dela, esse é um momento difícil — o Doutor Jonas fala comigo e eu sigo procurando a Vanda.
Continua...