Adeus

1188 Words
Kate Madson Minha decisão estava tomada, firme e definitiva. Esperei todos irem dormir antes de sair novamente do meu quarto, dessa vez, com uma pequena mala nas mãos. Ela parecia estranhamente leve, como se, ao invés de carregar meus pertences, eu estivesse deixando para trás o peso de uma vida inteira de compromissos quebrados e promessas vazias. Antes de sair, escrevi um bilhete para mamãe, deixando-o na cozinha, um lugar que eu sabia que ela não poderia ignorar. As palavras fluíram de mim, carregadas de tristeza. Mãe, Queria que tudo tivesse sido diferente, que papai estivesse vivo e nossa vida seguisse monótona e feliz. Eu não posso voltar ao tempo em que éramos uma família, mas posso te deixar ser feliz com a família que você escolheu. Infelizmente para isso, eu não posso mais viver aqui. Não sob o mesmo teto que Steven. Espero que um dia você possa entender. Mas, por agora, eu preciso fazer isso por mim. Eu te amo. Kate Com o bilhete colocado cuidadosamente ao lado da cafeteira, peguei a minha mala e com um último olhar para a casa que já não podia mais chamar de lar, fechei a porta atrás de mim. Meu coração batia forte no peito, o medo do futuro começava a roer minhas entranhas enquanto esperava pelo Ubԑr. Quando o carro chegou, coloquei minha mala no banco traseiro e segui para o endereço da única pessoa em quem sabia que podia confiar: Emma. Emma e eu nos conhecemos no cinema, um vínculo que surgiu nos muitos turnos e pausas para o café que compartilhamos juntas por mais de um ano. Acho que posso dizer que ela é a primeira amiga de verdade que fiz na minha vida. Ela é um pouco mais velha que eu e muito mais ambiciosa, sonhando com fama e riquezas. Sendo assim, não demorou muito para que aquele trabalho no cinema se tornasse pequeno demais para seus sonhos, e a cerca de seis meses atrás, ela conseguiu algo muito mais rentável e se matriculou no melhor curso de artes cênicas da cidade. Fiquei feliz por ela, mas mais que isso, fiquei feliz que a nossa amizade permaneceu, uma linha de apoio constante em meio às turbulências da minha vida. Quando cheguei ao prédio dela, meu coração já estava na garganta. Ao tocar a campainha, as portas se abriram para revelar uma amiga com os braços abertos para me receber. - Oi, Kate! - Não consegui mais conter a avalanche de emoções que vinha segurando. Meu corpo, movido por um ímpeto quase involuntário, impulsionou-me em direção a ela, e eu me joguei em seus braços, soltando um rio de lágrimas que pareciam brotar de um poço sem fundo dentro de mim. - Shh, está tudo bem agora. Emma me abraçou com força, seus braços firmes e reconfortantes ao redor de mim, enquanto me guiava para dentro do apartamento. O espaço era pequeno, estilo estúdio, com apenas um quarto e muitas coisas espalhadas por todos os cantos. A bagunça refletia a espontaneidade e a alegria de sua moradora. Uma sensação de segurança começou a se infiltrar lentamente em meu ser, combatendo o frio da incerteza que havia se aninhado em meu peito. - Obrigada, Emma. Eu... eu simplesmente não tinha para onde ir. - Minha voz era um sussurro entre soluços. - Você vai ficar comigo pelo tempo que precisar. Vamos resolver isso juntas, ok? - Sua voz era firme, cheia de uma determinação que me fazia acreditar que talvez, só talvez, houvesse um caminho a seguir. Eu apenas acenei, ainda incapaz de encontrar as palavras adequadas para expressar a minha gratidão. As lágrimas haviam secado, mas a emoção ainda embargava minha voz. Enxugando os olhos ainda marejados, olhei para Emma, sentindo uma onda de constrangimento por tê-la arrancado de seu trabalho. - Emma, me desculpe por fazê-la sair do trabalho. Espero não ter causado nenhum problema para você. - Não se preocupe com isso, Kate. Dia de semana, ainda mais uma terça-feira, sempre é mais fraco. — Sua voz era suave, tentando me aliviar da culpa que eu carregava por incomodá-la. - Obrigada, Emma... Eu... — Hesitei por um momento, tentando organizar meus pensamentos antes de continuar. — Eu só precisava sair de lá o quanto antes. - Eu entendo. — Emma assentiu, seu olhar carregado de empatia. — E estou aqui para quando você estiver pronta para conversar, Kate. Mas não segure tudo isso sozinha, está bem? Concordei, sentindo uma gratidão imensa por ter alguém como Emma ao meu lado nesse momento tumultuado. Ela se levantou e foi até o quarto, retornando momentos depois com um jogo de toalhas limpas nas mãos. Ela se aproximou de mim, uma expressão de cuidado estampada no rosto. - Agora, o que você precisa fazer é descansar ou pode até passar mąl. Que tal tomar um banho antes de tentar dormir? — Ela perguntou, estendendo as toalhas em minha direção. A ideia de um banho era tentadora, um chamado para lavar toda a angústia que parecia grudada na minha pele. - Sim, acho que um banho seria bom. — Aceitei, levantando-me com um suspiro. Emma me deu um sorriso encorajador, indicando o caminho para o banheiro. - Use o tempo que precisar, Kate. A casa é sua. Assim que a água escaldante começou a cair sobre mim, cada gota queimando a minha pele, eu agarrei a bucha com desespero, esfregando meu corpo com tanta força que beirava a dor. Era como se eu tentasse limpar cada partícula de mim que havia sido contaminada, arrancando as lembranças do toque de Steven ao me livrar de algumas camadas de pele. A água misturava-se com as lágrimas que começaram a correr livremente dos meus olhos, cada soluço sacudindo o meu corpo enquanto eu tentava exorcizar a sensação de impotência que me dominava. Eu me sentia suja, de uma forma que nenhum sabonete poderia limpar, uma sujeira que se infiltrara profundamente em mim, marcando-me de maneiras que eu temia nunca poder esquecer. Eu esfregava cada centímetro do meu corpo repetidamente, até a pele ficar vermelha e dolorida. Mas não importava o quanto eu esfregasse, aquela h******l sensação não desaparecia. Era como se suas mãos ainda estivessem lá, arrastando-se pela minha pele, deixando um rastro. A água que escorria pelo ralo parecia levar consigo pedaços de minha alma, deixando-me nua e tremendo sob a luz fria do banheiro. - Por que eu? - perguntei a mim mesma, a voz perdida no ruído da água. - Por que isso tinha que acontecer comigo? - Eu me sentia fraca, desamparada, e o pior de tudo, terrivelmente sozinha. A descoberta de que estava sozinha no mundo, sem a p******o ou o conforto de minha própria mãe, era quase tão doloroso quanto o ataque em si. Eu fiquei ali dentro por muito tempo, o bastante clarear a mente o suficiente para pensar no meu futuro - talvez, apenas talvez, sair de casa não fosse o fim. Talvez fosse apenas o começo de uma nova jornada, uma que eu jamais teria a coragem de empreender, se não fosse pela tempestade que me obrigou a buscar um novo porto seguro.
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