Kate Madson
*Dias atuais*
Às vezes, eu me pergunto se tudo seria diferente se eu tivesse descido 5 minutos antes. Se eu estivesse ao lado do meu pai quando seu coração falhou, eu teria conseguido salvá-lo?
Pensar nisso agora não muda o fato de que minha mãe está se casando com um homem que eu não suporto. E não digo isso porque ele não é o meu pai, ninguém nunca será como ele, e eu aceitaria bem isso, se o Steven não fosse o pior tipo de pessoa que existe. Um i****a preguiçoso, que só sabe beber e assistir televisão.
Só que a minha mãe o ama. Não sei por que, mas ela o ama e é feliz ao lado dele. Ela já sofreu muito pelo meu pai e mais ainda por mim e se a sua felicidade está em eu aceitar o Steven na família, que assim seja.
Então, aqui estou eu no registro civil, com esse ridículo vestido rosa, servindo de testemunha para o casamento da minha mãe com Steven. Ou devo dizer senhor e senhora Brandon.
O cartório tinha aquele cheiro peculiar de papel velho e café, um ambiente impessoal, repleto de documentos e arquivos, onde as histórias das pessoas eram reduzidas a assinaturas e carimbos.
Mamãe estava ao lado de Steven, o homem com quem ela escolheu dividir o resto de seus dias. Ela estava linda, vestida não como uma noiva tradicional, mas com um tubinho bege claro cheio de rendas, simples e elegante, que de alguma forma destacava ainda mais sua beleza naquele momento. Steven, por sua vez, usava uma camisa cafona e um sorriso que, para mim, parecia mais forçado do que o meu, apesar de sua tentativa evidente de mostrar emoção.
Eu apenas observava, me esforçando para entender como havíamos chegado até ali. Confesso que, apesar do meu desejo de ver mamãe feliz, algo em Steven me impedia de aceitar que esse casamento terminaria bem.
- Está tudo bem, querida? — a voz suave de mamãe me tirou dos meus devaneios.
- Sim, mãe. Só estou... pensando. — Disse, tentando disfarçar a minha hesitação com um sorriso.
Steven, percebendo a chance de interagir, decidiu quebrar o gelo com um comentário que, sinceramente, não me caiu bem.
- Sabe, Kate, sua mãe me falou tanto sobre você e tudo o que vocês passaram. Eu sei que você tem esse jeitinho meio fechado, mas é só uma questão de tempo até você se abrir comigo, não é?
A forma como ele disse "se abrir comigo" me fez franzir o cenho. Havia uma leveza inapropriada em sua voz, uma sugestão de que ele, de alguma forma, já me conhecia bem o suficiente para fazer tal julgamento.
- Vamos ver, Steven. — Minha resposta foi fria, reflexo do desconforto que suas palavras me causaram. - Eu só quero que a minha mãe seja feliz.
Mamãe me lançou um olhar preocupado, talvez percebendo a tensão crescente, mas optou por responder apenas ao meu comentário final.
- Eu sei, querida. E eu sou feliz, muito feliz. Lembre-se, Steven não está aqui para substituir ninguém. Ele apenas trouxe uma nova chance de felicidade para nossa família. Agora que você está curada, eu não preciso me preocupar em cuidar de você vinte e quatro horas por dia. Posso me permitir recomeçar também.
Aquelas palavras sempre me atingiam como um soco no estomago. Eu sei dos sacrifícios que minha mãe fez, mas bem, ela não foi a única. Assim que meu corpo se adaptou ao novo coração, eu assumi o papel de ‘provedora’ da nossa casa. Arrumei dois trabalhos de meio período para manter nossa conta no verde e não ficava com nem um único centavo do que ganhava. Não que eu fosse jogar isso na cara dela. Seja como for, antes que eu pudesse responder a minha mãe, Steven, sem dúvida tentando melhorar a situação, piorou-a.
- Exatamente, somos uma família agora e quem sabe, Kate, com o tempo, você aprende a nos dar uma chance. Afinal, não é todo dia que se ganha um novo pai, certo?
A palavra "pai" ecoou estranhamente em meus ouvidos, misturando-se com a sensação de que Steven não entendia — ou pior, não respeitava — os delicados limites da nossa relação.
- Steven, por favor, entenda que certas palavras têm peso. — Minha voz era firme, marcando claramente meu desagrado.
Mamãe apertou a mão de Steven, tentando conte-lo ou apoiá-lo. Ela é tão louca por ele que eu não saberia dizer.
- Kate, minha querida, o mais importante é que estamos juntos nisso. Todos nós. Vamos dar um passo de cada vez.
O oficial do cartório chamou, e nos aproximamos para a cerimônia. Observar mamãe e Steven trocando votos foi um misto de emoções.
Quando eles assinaram os documentos, oficializando a união, uma parte de mim desejava genuinamente que mamãe encontrasse a felicidade que tanto buscava. Mas outra parte, a parte que ainda sentia que o caminho à frente seria cheio de desafios, não estava tão confiante.
Ao sairmos do cartório, prometi a mim mesma que faria o possível para proteger a felicidade de mamãe, mesmo que isso significasse suportar Steven.
Fomos até um restaurante para celebrar. Mamãe escolheu um lugar requintado, que definitivamente não combinava conosco, ou melhor, com nossa realidade. Eu só conseguia pensar nas dezenas de dólares que sairia a conta.
Não houve moderação ao pedir. Controlei meu impulso de criticar a situação. Era o dia do casamento deles, ainda que a conta saísse do meu bolso.
Conforme o tempo avançava, Steven começou a beber mais do que deveria, transformando o tom da celebração. Ele ria alto, atraindo a atenção para nossa mesa.
- Steven, talvez devesse ir mais devagar com a bebida. - Minha voz estava carregada de preocupação, não por ele, mas pelo show que ele estava fazendo.
- Oh, querida, deixe-o. Ele está apenas feliz. Não é todos os dias que casamos com a mulher dos nossos sonhos, certo? - Mamãe interveio, seu tom cheio de desculpas veladas.
- Claro, mãe. Mas há maneiras de expressar felicidade sem... - Antes que eu pudesse terminar, Steven interrompeu, um pouco alto demais para o ambiente do restaurante.
- Veja bem, Kate... hoje é um dia de festa! — Ele enche uma taça para mim e outra para ele, erguendo-a como se brindasse a sua própria justificativa.
O olhar de mamãe alternava entre nós dois.
- Eu não bebo, Steven. – Ele ri alto.
- Nossa Kate aqui acha que sabe tudo sobre controle, sobre como ser perfeita. “Eu não bebo, Steven” – Ele repete minhas palavras em um tom estridente e debochado.
- Acho que você esqueceu que eu sou transplantada... i****a. – deixo escapar o insulto em um murmúrio baixo, me arrependendo em seguida.
- Do que você me chamou? – ele grita, furioso.
- Steven, talvez Kate tenha razão sobre a bebida. Você não quer sentir-se m*l amanhã, quer? - Mamãe tentou mediar a situação, sua voz suave, tentando não provocar um confronto.
- Você escutou do que sua filha me chamou?
- Eu juro que não escutei nada. Você deve ter se confundido.
- Pode ser. – Ele deixa de lado a discussão, enquanto enche o copo mais uma vez - Amanhã é um outro dia! Hoje, quero celebrar minha nova família. Minha linda esposa e minha... como devo chamar... minha rebelde filha? — Steven riu, provocando-me deliberadamente com as suas palavras.
Mamãe me lançou um olhar apologético, como se pedisse desculpas por algo que ela não conseguia controlar. Eu sabia que ela queria justificar o comportamento dele como felicidade, mas havia algo mais ali, algo que não podíamos simplesmente ignorar.
O dia terminou mais cedo do que esperávamos. Steven, embora relutantemente, concordou em voltar para casa. Enquanto mamãe cuidava dele, eu me perguntava sobre o futuro, sobre como seria viver os três juntos em um apartamento de 70 metros quadrados.