Marielle narrando
— Mana, mama! – Isabela me sacode na cama, toda amuada. – Quero mama.
— Que horas são, Isa? – eu pergunto, ainda com os olhos fechados.
— Não sei – ela responde – mas quero mama.
— Deita aí, que eu já vou buscar, filha.
Ela resmunga, mas deita de novo, e eu me levanto, com o sono pesando nos meus olhos. Desço as escadas e encontro minha mãe largada no sofá, completamente bebada. Ela m*l consegue abrir os olhos.
— Acordou, Marielle – ela diz, com a voz arrastada.
— Vim fazer a mamadeira da Isa – eu falo, já indo pra cozinha.
— Essa menina toma leite demais... – ela reclama, mas eu ignoro, já abrindo a geladeira.
— A senhora não trouxe leite? – eu pergunto, sentindo o cheiro da cachaça no ar.
— Que leite? – ela responde, com a voz embriagada.
— A senhora saiu pra comprar. Como é que vou dar leite pra Isa agora? – eu insisto, já nervosa.
— Não tinha leite, acabou.
— Mãe, a senhora recebeu a pensão ontem! Eu só recebo daqui três dias! – eu falo, já começando a perder a paciência.
— Eu falei que não entrou nada, não tenho grana! – ela grita, me fazendo pular de susto.
— E tá bebendo tudo? O cheiro de droga tá forte, mãe!
— Não tenho dinheiro, Marielle, não tenho! – ela volta a gritar, e eu nem respondo.
— Mana, quero mamar! – Isabela começa a choramingar de novo.
— Vem, vem, vou te dar logo – eu falo, já pegando ela no colo. Saio de casa e vejo que já tá bem tarde, a rua bem escura. Eu vou até a venda do seu Dante, onde sempre tem um monte de traficante. Isabela, meio dormindo, ainda pede pela mamadeira. Quando chego lá, seu Dante já me olha com aquela cara de poucos amigos.
— Marielle – ele fala, com aquele tom de quem não quer conversa – Espero que tenha vindo me pagar.
— Ainda não – eu falo, sem muita paciência. – Boa noite, Dante, só vou receber daqui três dias.
— Mas a sua mãe tava enchendo a cara, né?
— E não é com o meu dinheiro, o senhor sabe que eu recebo no meu trampo. E tô sem leite em casa!
— Desculpa, mas você tá me devendo dois meses, bem dizer.
— Mas eu paguei uma parte boa do último mês! – eu tento argumentar, mas ele já tá impaciente.
— Mas continuou comprando – ele diz, enquanto um homem entra na loja e coloca umas garrafas de cerveja no balcão. – E eu preciso receber, Marielle.
— É só um leite, juro que p**o tudo, tudo mesmo quando eu receber – eu insisto.
— Fica 50,00 – Dante fala pro homem, que já tava estendendo o dinheiro. – Desculpa, Marielle, mas não posso mais te vender fiado.
— Mana, eu não vou tomar mamadeira? – Isabela me pergunta, toda cansada e chorosa.
— Por favor, é só uma caixa de leite! Eu p**o o dobro, eu prometo.
— Não, sua conta tá alta aqui, não dá – ele responde, dando o troco pro homem.
— Quanto é a caixa de leite? – Jk pergunta, me olhando com aquela cara de quem já sabe a situação.
— 4,00 reais – Dante responde, sem tirar os olhos de mim.
— Toma – Jk fala, estendendo o troco pra mim. – Compra o leite pra sua irmã.
— Ela não vai comprar nada – Dante rebate. – Ela vai me pagar, e esse valor vai ser abatido da dívida dela.
— Eu só preciso de uma caixa de leite, só isso, por favor! – eu falo, tentando segurar a onda.
— Então eu compro – Jk diz, já pegando a caixa inteira. – Pode descontar, eu vou pagar. Ei, você – ele chama um cara que tava perto. – Mosca, leva a caixa de leite pra ela até a casa dela.
— Obrigada – eu falo, aliviada.
— Valeu, tio – Isabela fala, ainda meio sonolenta, e eu dou um sorriso forçado.