Zaya Oliveira
Eu era apenas uma menina, uma garota de quinze anos, aprendi desde cedo os trabalhos da lida, quão dificil é a vida na roça, todos os filhos de Maria e Cosme, aprendeu cedo os dever de sobreviver no mato, desde o catar lenha, os mais pequeno pegavam graveto, carregavam uma vasilha menor de água nas mãos quando cansavam muito, parava pra descansar ofegando na ladeira, algumas vezes os maiores até ajudava a carregar,trabalho esse que era meu e de Mário, o mais velho.
Nossos pais nunca deixou de ensinar que a vida é complicada, tudo que vem fácil, também fácil se vai, a criação era muito diferente de nossos primos Cleiton (Bucha) e Paulinho, todo mundo sabia que os filhos da minha tia Ana não prestavam, eram daqueles que todos apontavam o dedo para dizer que foram eles que fizeram algo em tudo que surgia de errado. A vida no campo não era fácil, desde acordar cedo, lascar lenha, acender o fogo, ir pra o rio pegar água fazer o café, cozinhar as raízes de batata, aipim, inhame e até inhabú pra tomar café, tirar o pano de cima dos bolos de milho, ou aipim pra colocar na mesa, pra quando mainha e painho acordar estar tudo pronto.
Se o café ficava forte demais, regulava por causa do pó, doce demais também eles falavam, eu só tinha quinze, mas era como moça véia, quando estava bom, eles secavam a garrafa inteira, sem dizer nada sobre o café, não era diferente da comida, se reclamasse e a gente respondesse, apanhava de bainha de facão, por isso sempre ouvir calado e estar sempre errado, era a nossa sina nada de razão, na conversa de adulto, criança não falava, nem eu com quinze, tampouco Mário com dezessete, mesmo se houvesse motivo, a razão sempre foi dos mais velhos.
Meus irmãos mais novos ou mais velhos também, éramos cinco, Mário, Zaya, Isabell, Filomena, Getúlio, e nenhum deles nunca se deram o desvalor de aprontar na rua, para ninguém apontar o dedo para os filhos de Maria de Cosme, que sempre foram bem visto na cidade e na roça também, eu sou a segunda a filha de todos eles. — Bença mãe, Bença pai! — Ao surgir na cozinha tinha que beijar as suas mãos, na roça não tinha isso de escovar os dentes, nem se falava, era frescuragem de rico, as vezes ali mesmo pelo canto de alguma parte da casa, se cuspia, a casa era barro, quem se importava, secava mesmo, até ajudava pra não subir a poeira.
A mulher amarrando o lenço amarelo na cabeça, estendia a mão em minha direção, me fazendo ajoelhar para beijar. — Deus te abençoe, o café tá pronto? — Sempre afirmei desde os doze, só bastou o sangue descer pra assumir as função de casa, em seguida direção ao meu pai, que demorava mais pra levantar, o filho que não tomava benção pela manhã sabia que ia ter um dia r**m, era como andar com as costas virada, eu já tinha certeza do dia r**m, mas pra ter um pior jamais, todos eles já era pesados, com trabalho não importava ser domingo, sábado ou feriado, dona de casa sempre trabalha, seja na lida ou em casa, isso eu aprendi desde cedo. — Bença a pai. — Era o mesmo processo, me curvava para beija a sua mão, o homem que lutava para amarrar a calça velha com a palha de banana, não dava ousadia, apenas dava a mão.
— Deus te abençoe. — Voltava aos afazeres dele, enquanto eu, depois da benção, apenas recolhia o minjadouro, o velho pinico branco de aluminio, ja cacarecado de amarelo no fundo, saia correndo pela casa, indo direto pra o terreiro, atirava as urinas porta a fora, colocava o pinico pra escorrer no canto da parede, jogar o mijo na porta de casa afastava os olhos gordos, tudo que era r**m voltava do caminho, em seguida servia o café nas duas canecas de aluminio com alça, era com a mesma mão, a mesma que pegava o pinico, ninguém se importava com essas coisa de higiene.
Pouco eles falavam, quando não era pra reclamar da lida, era pra falar de algum feito r**m, e mais uma vez o nome dos meninos surgia no meio, todo mundo sabia que os dois não ia ter um bom destino, Paulinho era um amor comigo, já Cleyton, que todos chamavam de bucha, era o cão, facilitasse colocava terra no feijão, que escuro nem dava pra ver, só pra colocar gosto r**m e me ver apanhar.
Depois de servir meus os pais, era só fazer as marmitas, farofa de feijão na sacola pra cinco. Mas neste dia depois de fazer a farofa, preparar a vasilha de água, já estava amarrando o lenço preto na cabeça quando a minha mãe disse. — Hoje tu fica em casa, cata lenha, carrega água, dá uma limpada que tá vindo gente aí. — Assenti recuando, ficar em casa era melhor que ir pra a lida, cortar mato, ara terra, arrancar mato, lidá com qualquer bicho que surgisse.
Vi eles sairem com as enxadas nas costas, mainha já reclamava de dor nas costas só no sair de casa, o dia nem tinha começado, mas ficava sobra do cansaço do outro dia, as vezes a noite parecia ser umas menor que as outras nem dava tempo a gente dormir direito, ser a mais velha das meninas, era assumir o papel de mãe, a medida que crescia as tarefas só iam aumentando, comecei a varrer o terreiro quando os meus primos pintaram de repente, com eles tinha um terceiro rapaz, não levantei as vistas pra ver. — Zoi de gato cadê os tio? — Apontei pra o mato, não era de falar muito, ainda mais na frente de estranho, mas o rapaz era bonito, não poderia deixar de olhar.
Paulinho veio em minha direção, alto, magro, de pele morena, mas era mais queimada de sol, os cabelos cortado, mas sempre deixando alguns fios de cacho de lado, o sorriso amarelado, como disse na roça ninguém ligava muito pra limpeza. — E porque tu não foi? — Depois de saltar da mula, me abraçou pelos ombros como de costume, fiquei parada apoiada no cabo com a vassoura de mato na mão, senti o seu beijo em minha bochecha, abaixei o rosto como sempre, painho já tinha dito que aquilo era errado, ainda mais entre primos, se ele visse, era certo apanhar de bainha de facão, mas eu gostava do danado, sempre me dava uma bala de hortelã ou canela, era melhor que mascar a própria canela, ou a folha de hortelá miudo.
— Mãe disse que vem visita, tenho que limpar a casa. — Afirmou ainda agarrado a mim. — Quem é a moça, Paulinho? Tua prima? — O moço no lombo do cavalo, falava bonito como se cantasse, bem vestido de calça jeans e blusa branca de gola. — É a nossa prima mais velha, Zoi de gato esse é Robs, um amigo de lá... — Coçou o lado do rosto, onde já tinha alguns fios de barba. — De longe, tu não ia saber de onde é, por isso não dá certo falar.
Vi a mão estendida pra mim, ajoelhei pra beijar, como fazia com painho e mainha, vai sabe se era alguma santidade, mais bonito e mais limpo nunca tinha visto.
Todos os dois riram, ergui os meus olhos pra ele, que estava sério, ajudou-me a levantar, era diferente, algo que ainda não conhecia, se fosse outro se aproveitava da benção, é assim toda vez que vemos o padre,ele ja vinha com a mão esticada, nós tem que fazer o mesmo no meio da rua. — Tudo bem senhorita Zoi de gato? — Assenti, mas odiava que ele me chamasse pelo apelido, em casa só mainha me chamava pelo nome, era como por o pé no mundo lá fora. — Meu nome é Zaya. — Mais uma vez meu primo riu, fazendo pouco de mim.
Bati nele com a vassoura, Bucha era o pior de todos. — Zaya? — Assenti pra ele que sorriu vistoso, vi os dentes brancos em sua boca, ele muito fora da minha realidade, eu sabia disso, não era ninguém. Depois de ficar de conversa, eles foram embora, mas voltaram quando as visitas chegaram, meu Tio Pedro irmão da minha mãe e sua mulher Rosa chegaram de Salvador, e quando esse povo chegava lá em casa eram tratados como uma realeza, o que era dito, ficava, ninguém tirava, as melhores comidas tinham que estar na mesa, como se fosse tempo de festa, galinha de molho pardo, meninico de bode, sarapatel, molho lambão, além da fartura de bolo.
Era sábado de manhã, quando vi Robson pela segunda vez, ele estava ainda mais bonito meu coração acelerou quando ele olhou pra mim, eu não sabia o que estava acontecendo até senti o braço de Paulinho pra me puxar pra ele com um cheiro de braço, sai do seu abraço rapidamente. Eu não queria mais sentir ele beijando a minha pele, roçando seu bigode em meu cagote. — Para com isso, Painho não gosta. — Avisei emburrada, mas os meus olhos não sairam do moreno, dentes brancos, cabelos castanhos liso, olhos escuros olhando em volta, até que me olhou.
Eles ficaram por lá, eu sempre trocando olhares com aquele novato, lhe servi licor com as mãos tremendo, era de cacau e ele bebeu numa virada só na boca, só provava que era muito macho mesmo, era bom de pinga e conversa, apesar de falar parecendo que cantava. Falando do lugar em que morava tudo era tão bonito, eu já tava cansada de lutar com as minhas pernas que tremia a cada vez que ia a sala, as mãos suavam, eu secava na saia em vão.
Até que secaram o litro de licor eu tive que ir buscar outro na venda, somente no meio do caminho correndo pra chegar em casa antes do anoitecer que o coração acalmou mais, pra não correr risco de voltar de novo, pedi logo três litro da mesma garrafada. Quando voltei todo o fogo do coração acelerado murchou ele estava de canto conversando com a minha irmã Bel de doze anos, tinha doze anos, mas era mais mulher que eu de quinze, já usava uns negócio vermelho na bochecha e na boca que a minha tia Rosa deu pra ela, eu não era chegada nessas coisas, pra mim ficava parecendo um macaca, e Bel além de ser chegada nos negocios de mulher, falava mais bonito como os povo da televisão, todo mundo sempre disse que ela é mais bonita.
Passei a noite inteira dançando forró perto de fogueira, até que o meu pai cansou de tocar, ele tava mesmo era bêbado e mãe também apoiada no pé de cajú no terreiro de casa, vendo que agora Bel conversava com Paulinho, levei mãe pra cama, pai vomitava tudo tive que ajudar a banhar. — Deixa isso Zói, do pai cuido eu. — Assenti pra o meu irmão Mario, era o mais velho, mais só tinha tamanho, nunca beijou uma mulher. E isso era motivo dos primos tirar sarro dele.
Ao ver que ele deu banho, corri pra dar o chá pra o dia seguinte pai não sentir dor de cabeça. — Vai ver onde tá a Bell traz pra casa. — Assenti assim que Mario disse, ao terminar de recolher os irmãos tudo joguei água na fogueira, pra apagar a chama. — Não sabia que em meio a esse ... — A voz do moço me assustou, ao me virar ele já estava atrás de mim, a sua mão percorria o meu braço, eu deixei que ele passasse a sua mão nele. — Não sabia que no meio desse sertão brabo poderia haver uma flor tão bonita como você!
Terminou a frase na minha orelha, as batidas de mais cedo voltaram como flechas atiradas, me deu o meu primeiro beijo, enquanto eu segurando a bacia de ulímínio nas mãos, a fumaça da fogueira apagada a força ardendo os olhos, senti a sua lingua entrar em minha boca, eu nem sabia o que estava fazendo, mas com ele eu queria. O sabor era de canela na boca, sua lingua tentava na minha, me fazendo babar toda a cara dele.
E como o primeiro, outros vieram as escondidas, ele dizia esconder dos meus primos e eu de todo mundo em casa, foi fácil, com meus tios recém chegados, A mania de mostrar que vivia numa condição boa, em Salvador, não demoraria a ficarem rico, exibia seus dinheiros e coisas caras que comprava, um vestido que uma atriz da televisão tocou, enquanto os meus pais disputava que a terra de tudo que plantava dava, meus queriam ter coragem pra sair daquele fim de mundo, mas não tinham, como o meu tio, parecia que a vida no Salvador era mais fácil. A água saia direto da torneira, e não precisava fazer as necessidades no mato, sem bicho pra picar a b***a.
Foi duas noites depois de beijos que eu me entreguei a Robson, inexperiente, a piriquita cabeluda, um m*l cheiro de bode debaixo do braço, mas o que ele queria estava bem debaixo das pernas, era só deixar ele fazer o buraco, e doeu muito deixar ele abrir este buraco, mãe e pai bebados, no meio da plantação de abobora, o povo de casa não viram e nem souberam e de uma vez outras vieram ali mesmo por dentro dos matos, até que o meu primo Paulinho descobriu. — Robs? Zói? — Eu estava por baixo dele quando a desgraça inteira foi descoberta, na verdade era um desgraça boa pra mim no momento, que descabelada, os beiços inchados, só sentir o p*u amolecer dentro de mim.
Apesar de oferecer dinheiro, coisas, nada adiantou ele contou tudo pra família, só evitou a parte em que eu estava dando mais que v***a em beirada de esquina, com os meus tios em casa, eu tinha que ficar pra fazer as coisas, era um pé em casa, outro no mato, apoiada nas paredes de taipa com barro,ele só levantava a saia, colocava, era tao diferente do que foi a primeira vez, que eu já fiquei viciada.
Até que a vergonha abateu a família, meus tios não deixaram eles me bater, isso só durou enquanto eles não foram embora, depois de uma semana de descoberta, apanhei no dia seguinte tomei uma surra de p*u, que fiquei toda móida, com medo da vergonha por ter acabado com a honra da família, minha mãe falou com o padre, a cidade inteira sabia que eu não era mais moça e nem de branco casei, era um vestido azul que pertenceu tia Ana, somente assim eu soube que minha mãe nunca se casou.
Nos casamos, Robson não gostou muito da ideia, ninguém sabia nem mesmo o que ele fazia no Rio, mas pra lá ele nunca falava em voltar, a minha vida continuou a mesma depois que ele trouxe as roupas dele pra casa, a gente ganhou um quarto nos fundos, o povo juntou pra fazer de madeira e barro amassado na mão, ao invés de ir pra lidá passei a ficar em casa, cozinhar, lavar, limpar a casa e carregar a água, era a minha sina, a noite ao invés de dormir, no começo tinha que trepar até meu pai tossir, ele parava de forçar contra a minha entrada, o buraco só alargava, o perfume tinha ido embora, só o cheiro de suor, os dentes brancos, amarelaram.
Sempre estava mau humorado, passou a beber cachaça como os outros de casa e limpar a boca com as costas da mão, reclamava da comida, e a noite sempre era a mesma coisa, a cama improvisada de madeira de arvore, podia tudo menos quebrar, dizer que estava r**m, não ia, o negócio era bom por demais, a cama se fizesse vontade rangia a noite toda, até a tossi de proposito de painho avisando, ele apenas suspirava em cima de mim, chateado, o p*u ficava mole na hora, quieto, parado saia de cima de mim, até que a luz do candeeiro sumia, quando sacudia ele já tava dormindo do meu lado.
Foi assim por meses, até a cobra me picar no mato um dia, era cobra preta grande, picou bem na perna, fiquei parada na mata sem conseguir andar, o lugar inchava cada vez mais, já tinha passado de horas quando ele me encontrou com um facão na mão e uma lamparina, ninguém mais veio, era sua obrigação já que me tirou de casa, não exatamente tirar, me carregou nos braços, eu não sabia o que ele via em mim, era bonito pelo menos antes de se tornar um de nós, as mãos encher de calos.
— Eu vou te tirar daqui Zaya. Eu vou te tirar daqui. — Me disse zangado, ao chegar em casa todo mundo tava deitado, ele tava chateado, mas ainda assim fez o remédio. Fiquei boa, ate que a barriga começou a crescer, todo mundo tava feliz, mas eu e ele não, eu não queria que o meu filho nascesse naquele fim de mundo.
Ele trabalhou de tudo que era tipo, cortando mato, fazendo farinha, carregando saco de farinha, enquanto raspei mandioca todos os dias da semana, pensei que o dinheiro era pra o bebê, mas não era. — Senhor Cosme, Senhora Maria eu e a sua filha estamos de trouxa pronta, vou levar a sua filha comigo pra o Rio. — Senti firmeza nas suas palavras, meus pais não se oposurem a nada. Entrei no ônibus pra Salvador e de lá pra o Rio, ele comprou só passagem de ida pra dois.
Tudo era bonito, não importava por onde a gente passava, era lindo de se ver. — Você vai gostar de lá Zoi. — Neguei. — Meu nome é Zaya, Robson, meu nome é Zaya. — Me olhou nos olhos, assentiu ao me ouvir, como alguém ia ser chamado de Zói num lugar bonito daquele.