Um homem de sucesso - parte 1/4

1411 Words
O "tio Augusto", tão querido por todos, sempre foi uma pessoa cheia de sonhos, mas o que o diferenciava dos demais sonhadores era que ele se mantinha determinado em realizá-los. Ali, na Cidade Esperança, estava localizada a empresa Metal Industrial, que produzia diversos tipos de equipamentos industriais, e era a maior do estado, empregando mais de três mil pessoas. A indústria era uma das empresas metalúrgicas mais conhecidas país afora e tinha muitos clientes pelo mundo inteiro. O lucro da empresa era sempre muito alto. Milhões e milhões eram ganhos anualmente, segundo as melhores revistas de economia do mundo. O sr. Augusto Gentil era o dono dessa "fábrica de fazer dinheiro". Um senhor inteligente, um profissional invejável. Sabia o que fazia, e as mídias não cansavam de afirmar que ele era um "visionário". * * * * * Sua história de sucesso começou com um sonho. Quando ainda era um adolescente, apelidado de "Gu" por seus colegas, já queria fazer a diferença. Almejava ser influente, reconhecido no mundo todo, e essa ideia fazia com que seus amigos fizessem piadinhas sobre ele. - Não queremos desapontar você, Gu, mas como é que você vai ser conhecido assim? Você não é um astro do rock, um popstar. Não é político e nem empresário. É quase impossível. - Não sei como realizarei o meu sonho - respondia ele. - Mas impossível, eu tenho absoluta certeza de que não é... - Eu disse quase, não afirmei que era impossível - rebateu Fabiano, que já era seu melhor amigo na época. - Mas olha aqui, Gu, não importa como. Se você sonha com isso, vamos em frente! Promessas... * * * * * O tempo não para, todos nós sabemos disso, e Fabiano deixou saudades. Prestes a completar dezoito anos, ele se mudou para outro estado. Seu pai havia morrido, e ele foi obrigado a morar com sua mãe, que voltou para a casa dos pais. Foi muito doloroso ter que deixar a vida e a rotina que tinha, principalmente por ter que enfrentar a perda do pai longe de seus amigos queridos. Isso o deixou arrasado, foi como se um abismo se abrisse à sua frente e o separasse de tudo que ele mais prezava na adolescência. Por causa da falta de dinheiro, o abismo se abrira ainda mais, aumentando a distância dos amigos, que não tinham como viajar sempre que a saudade batia. Um mês ou outro se falavam por telefone, e, conforme o tempo foi passando, e é claro, modificando as coisas, o abismo engoliu a amizade deles. * * * * * Augusto foi atrás de seu sonho sozinho. A pobreza de sua família não foi empecilho para ele, que nunca abandonou os estudos. Fez diversos cursos técnicos e, por fim, formou-se em Engenharia Mecânica, beneficiado por uma bolsa de estudos, graças à sua inteligência. Ainda jovem, trabalhou na Metal Industrial, que era coordenada pelo sr. Ralf, um homem que havia ensinado ele a ter visão. De cargo em cargo, Augusto foi se especializando em diversas áreas e conquistando a confiança do sr. Ralf. Até que um dia recebeu o choque. O sr. Ralf fora diagnosticado com câncer em estágio avançado, e foi fácil visualizar a evolução da degradação de sua saúde. Mas o choque maior foi quando o velho debilitado disse que um de seus últimos desejos era que Augusto o substituísse, porque ele não tinha herdeiros nem parentes. * * * * * Aos quarenta e três anos, Augusto chegou ao auge graças ao reconhecimento recebido de Ralf. Deus o tenha, sr. Ralf, o senhor foi essencial em minha vida - Esse era quase um mantra nas orações do empresário. Na sua mesa, tinha uma pequena placa metálica, com os dizeres: "SR. AUGUSTO GENTIL, PRESIDENTE". E ele sempre a fitava. Poderia estar apenas olhando para aquele objeto de modo distraído, mas não, havia um motivo para tanta admiração. Ali já estivera o nome do falecido sr. Ralf, seu mentor, que lhe dera o melhor presente de sua vida. Há dias, Augusto andava cheio de devaneios, o que lhe deixava desatento. Sua preocupação insistente não tinha nome, mas soava como uma pergunta: "Quem nomearia como presidente da Metal Industrial?" E, para piorar, sua solidão era semelhante à que vivera o antigo dono da empresa. Preciso estudar e decidir para quem vou deixar isso tudo. Uma cobrança por encontrar alguém que o substituísse estava piscando em sua mente todos os dias, como um letreiro de motel barato. Mas quem o substituiria? Ele não havia se casado, não tinha filhos. Entretanto, diferente de Ralf, ele tinha uma família. Suas irmãs eram sua família. Ou seja, herdeiros ele tinha, mas isso não acabaria com sua preocupação principal. Essa preocupação era tão explícita, que não adiantava mentir que estava bem. Não era convincente, pois cada músculo de seu rosto dizia o contrário. Sentia demasiado estresse e cansaço, e não somente velhice. Quem não o conhecia, naqueles dias, o chamaria de velho rabugento. Num dado dia, depois que Augusto chegou do trabalho, Abilene o seguiu pela escada que ia até o seu quarto. Lá vem ela... Abilene fora a primeira da casa a perceber que o velho não estava bem e decidiu que iria importuná-lo até ele desabafar, porque, além de executar os serviços de governanta, era sua conselheira. Dava bronca quando era necessário e elogiava quando achava que devia. Ela, mais que uma empregada, era uma amiga. - O senhor está bem? - perguntou Abilene. - Ah não, mais uma - respondeu ele, sem emoção. - Estou, estou bem sim. - Não está. - Estou - insistiu ele. Abilene lançou um olhar inquisidor e falou, com sua voz tranquila, mas ao mesmo tempo desafiadora: - Meu caro senhor, a velha aqui sabe muito bem quando o senhor não está bem! Não tente me enganar! - Eu me rendo - respondeu Augusto, como uma criança medrosa. - Eu não estou tão bem assim... - concordou. Abilene não disse nada. Esperou. - Você não desiste mesmo, não é? Ela cruzou os braços. - Tudo bem, eu falo. E Augusto revelou que suas preocupações giravam em torno da sua aposentadoria, da divisão da herança e, claro, da decisão sobre quem nomearia para substituí-lo. - Vamos analisar os fatos, está bem? Eu, para ser sincera, acho que o senhor deveria ter se preocupado há muito tempo com isso, não acha? - Augusto fez que sim com a cabeça. - Mas ainda é tempo - continuou Abilene. - Que tal fazer um testamento para seus parentes? Ou, melhor dizendo, para suas duas irmãs? São as pessoas mais próximas do senhor - sugeriu Abilene. Sempre no seu tom firme, mas calmo. "Dá-se um jeito para tudo", ela dizia. - Isso resolveria o problema da herança. E, sobre a substituição, o senhor tem que pensar como o sr. Ralf, que Deus o tenha, e encontrar um Augusto eficiente, assim como foi com o senhor. Está em suas mãos. Augusto ficou pensativo por alguns instantes, reorganizando as palavras que acabara de ouvir. - Eu gostaria de poder ajudá-lo com isso, mas não me compete. - Ela sustentou sua expressão angelical e calma. - Tudo ficará bem, acredito demais no senhor e sei que isso é temporário, vai resolver logo. Analise as pessoas que podem e que, principalmente, merecem tal cargo. Afinal, acredito que não existam muitas pessoas competentes para substituí-lo. Augusto não se sentiu nem um pouco próximo de resolver essa pendência, mas o modo como Abilene falava tornava o problema mais suave. Ele foi obrigado a suspirar e assentir. - Farei isso, pensarei como o sr. Ralf e encontrarei um novo Augusto, como disse. - Só faltou abrir um sorriso para me convencer de que vai gastar menos energias com essas preocupações, mas tudo bem. Agora, vamos parar de pensar no futuro por um momento e viver o presente. O senhor vai ter uma surpresa, e espero que seja boa. - Do que está falando? - perguntou Augusto. - Só um momento - disse ela, indo buscar a surpresa. Essa Abilene! Voltou segurando um envelope branco e amassado, cheio de selos. "Para sr. Gentil", dizia. Ele pegou a carta. Lia-se o nome de Valéria como remetente. Valéria! Quanto tempo! Abilene não compreendia a distância que eles instalaram entre si, mas não poderia fazer nada, pois os três irmãos - Augusto, Valéria e Isadora - tinham gênio forte, e cada um havia tomado seu rumo. O quê a levou a escrever agora?
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