Val terminou de montar as barracas, sentou ao lado da caixa das bebidas, retirou uma lata de cerveja e engoliu metade do conteúdo de uma só vez, soltando o ar dos pulmões ruidosamente ,seguido por um arroto ainda mais barulhento...
— Ai! Que nojo, Val!— Resmungar Vanessa
— Estou tendo que aguentar o barulho de vocês dois transplantando saliva do meu lado, quer coisa mais nojenta que isso?
— Você está é com inveja que não tem ninguém para trans- Hey... Aquela ali não é a Luíza e a irmã dela?
Val e Vanessa olharam na direção indicada por Alex e, de fato, as duas irmãs estavam caminhando em direção ao mar de mãos dadas. Val não pôde deixar de sorrir ao ver a mais baixinha das duas puxar a outra pela mão. Os cabelos vermelhos e brilhantes mais pareciam fogo, iluminados pelo sol, e o rosto dela lembrava uma deliciosa diabrete zombando da bela e alta morena que atentava como vítima.
De repente a voz grossa de Val formou as gargalhadas que assustaram Alex, que interrompeu mais um molhado e apaixonado beijo entre ele e Vanessa. Ele olhou na direção em que Val apontava e viu que Eduardo tinha levado um caixote bem na frente das moças e teve o corpo arrastado pela onda até a beirada da praia.
Como todo verdadeiro amigo, Alex e Val riram alto da queda do Eduardo, e Alex, entre risos, reclamou do fato de não ter gravado a cena. As risadas de Val logo se tornaram um sorriso franco e aberto ao ver o amigo conversando com as jovens, embora estivesse evidentemente vidrado na morena alta. Mesmo de longe, Val identificou os traços " de caçador" que Eduardo exibia naquele momento. Val sorria satisfeito, finalmente o amigo tinha encontrado a misteriosa moça de quem tanto falava desde que tinha sofrido o acidente. A baixinha ruiva que tinha lhe chamado a atenção se afastou do casal de forma nem um pouco discreta, pois tentava fazer gestos para a irmã que estava tão vidrada em Eduardo que não percebeu. Dando de ombros, Luíza seguiu na direção do quiosque de sorvete.
Val não sabia o que pensar de toda história que Eduardo contou, nem mesmo se acreditava nela, mas ele confiava em Eduardo com a própria vida. Talvez, pensou ele, Eduardo tenha tido uma visão do futuro enquanto estava em coma? Ele se lembrou das histórias de seu avô Bruno e sua tia avó Júlia a respeito de sonhos com fogo e de como tais sonhos se revelaram premonitórios.
— Lá está Eduardo jogando o laço. — Disse Alex observando o mesmo que Val.
— Não vai arrumar nada ali, Edu está latindo para o poste errado! — Disse Vanessa depois de bufar, debochada.
— Fala isso porque não conhece meu parceiro, quando ele sai pra caçar, não tem uma que ele não enlace! — Alex levantou a mão para que Val o cumprimentasse com um Highfive, ambos riram.
— E vocês falam isso porque, aparentemente, não estão sabendo da novidade! Parece que Rafael deixou para contar a vocês hoje aqui na praia, mas Bianca me disse ...
Enquanto Vanessa falava Val sentia um crescente aperto no peito pelo amigo. Ele viu quando Eduardo segurou Bianca pela cintura, viu quando saíram da água, viu quando Rafael apareceu como que caído do céu, e seus olhos se arregalaram ao ver Eduardo acertar um soco no meio do rosto do amigo. Na mesma hora, Val levantou de um pulo e correu na direção dos dois amigos engalfinhados na areia da praia como croquetes gêmeos passando pela farinha de rosca.
Bianca gritava por socorro ao mesmo tempo que pedia aos dois amigos que parassem de brigar. Val a afastou dos brigões com a cara emburrada. Se perguntava se era possível que em algum universo eles tenham sido amigos como Eduardo falou... Naquele momento a mera presença dela, implorando para ele interromper a briga. o irritava mais do que a briga em si. Se ela estava fazendo os amigos dele brigarem, então ele já tinha um péssimo conceito sobre ela...
Val levantou a mão para que Alex, que tinha vindo correndo atrás dele, não interrompesse a briga, mostrando dois dedos. Alex balançou a cabeça concordando, cruzou os braços sobre o peito e pôs-se a assistir a briga, aguardando os dois minutos que Val indicou. Na mente de Alex, os amigos precisam de pelo menos cinco minutos se socando para aliviar o stress, mas se Val achava que dois eram suficientes, então eles ficariam de guarda até que os dois minutos terminasse antes de separar.
— Vocês vão ficar parados aí olhando eles se matarem? — Perguntou Bianca aflita para Val, que estava mais próximo.
Val soltou ar pela boca ruidosamente com um HUMPF e ignorou a pergunta, sem tirar os olhos dos amigos. Definitivamente Rafael precisava aprender a dar um soco sem colocar o polegar dentro do punho, desde criança ele cometia o mesmo erro. E Eduardo precisava aprender a controlar a raiva, em um dia normal ele teria imobilizado Rafael em menos de um minuto, no entanto, estava levando uns bons socos, embora estivesse acertando o dobro do que estava levando. Val quase sentiu orgulho dos dois... quase! Bater no outros juntos, perfeição, bater uns nos outros era p******o e Val pretendia punir os dois!
Um som parecido com "Ow" saiu da boca de Alex enquanto ele fazia uma careta quando Eduardo segurou os cabelos de Rafael e bateu a cara dele na areia da praia. Rafael ergueu a cabeça e acertou o cotovelo no peito de Eduardo, fazendo-o cair do corpo dele. Alex balançou a cabeça admirando o golpe.
— Esse surpreendeu até a mim, né não, Val?
— É! Rafa está melhorando no revide desde que voltou a treinar!
— Por favor, eh..Valdemar, eles vão se m***r desse jeito!
Val respirou fundo ao ouvir o nome que detestava e olhou para a mão de Bianca em seu braço com hostilidade evidente nas feições. Ele estava pronto para pedir a ela que não se metesse e se afastasse, mas ao olhar os olhos desesperados dela, ele se apiedou. Uma estranha sensação de reconhecimento o confundiu, e os olhos dele se voltaram para Eduardo, que estava atracado com Rafael. Nenhum dois desferindo socos àquela altura, apenas se agarrando para que o outro não se movesse, o que o teria feito rir, se não fosse a sensação que a aproximação de Bianca, alguém que deveria ser apenas uma estranha para ele, o fez sentir. Ele se viu acometido por um enorme carinho por ela, como ele sentiria por uma irmã...
— Por que eu separaria eles quando ainda precisam socar um ao outro?— Ele perguntou erguendo uma sobrancelha. — Acha que tenho cara de super herói?
— Eles não precisam se bater, que absurdo! Precisam parar de brigar antes que algo de r**m aconteça!
— Que parar o que, Bianca! Não é todo dia que temos dois gatos caindo no t**a sem camisa e de graça! — Disse Luíza levantando uma latinha de cerveja como se brindasse à briga.
— Não fale uma coisa dessas, Lu! Nossa avó costumava dizer que briga de homem cheira a defunto!
— Que nada, esses aí brigam o tempo todo!— Disse Vanessa não parecendo nada impressionada com a briga, mas completamente irritada com as pessoas que se aproximavam para olhar. — O que estão olhando, cambada de fofoqueiros? Perderam o nariz aqui? — Alguns banhistas que estavam se aproximando abaixaram a cabeça e se afastaram ao ouvi-la. — Se bem que é a primeira vez que os vejo brigar por uma garota...
— Olha só, segunda vez que machos brigam por você, maninha, quase sinto inveja.. Não... Para ser honesta sinto inveja pra c****e!
Enquanto Luíza falava, Val decidiu separar os dois, cada mão agarrando os cabelos de um deles, levantando-os como quem segura dois bonecos de pano. Val esticou os braços para afastá-los.
— Me solta, Val, eu ainda não acabei com ele!— Gritou Rafael, o olho esquerdo praticamente fechado de tão inchado.
— Acabou sim, Rafa, já chega, dois minutos já deu!— Disse Val com a voz firme.
Eduardo permaneceu calado e com a fisionomia fechada, quase inexpressiva, com exceção dos olhos que brilhavam de tanta fúria.
— Por que as bonecas estavam brigando? — Perguntou Alex
— Pergunta para esse psicopata que começou a me bater tão logo soube que Bianca é MINHA namorada!
Val notou o desespero nos olhos de Eduardo apesar da fisionomia fria. Ele sabia que o amigo estava controlando a dor que sentia, tinha visto Eduardo com aquele olhar algumas vezes no passado, com o pai e com Priscila, mas nunca com tanto desespero...
Todos olhavam para Eduardo esperando ele se justificar, mas ele permanece calado. Um filete de sangue escorria pelo canto de sua boca.
Eduardo se virou para Bianca e seus olhos se encontraram. Ele se sentiu ainda pior ao ver lágrimas escorrendo pelo rosto dela. Mas uma vez ele a estava fazendo chorar.
— Ela não é sua...você não entende, Rafa... eu... no dia do acidente, eu-
— Eu sei o que você acha que aconteceu, mano, sei que você pensa ter sonhado com ela... Mas essa aqui é a realidade!
— O quê? — Perguntou Eduardo surpreso.
— Eu ouvi vocês conversando... você e Val, e eu não sei o que você sonhou, mas-
— Não foi sonho, Rafa, você não entendeu, se me escutar...
— Entendi sim, Edu, entendi muito bem! No seu sonho, fantasia, ou o que for, você abriria mão dela para o Val! Você disse isso! Você disse claramente que jamais furaria o olho de um amigo, mas aqui, na vida real, você estava dando em cima da minha mina e ainda quis me bater por isso!
— Que história doida é essa de sonho? — Perguntou Luíza cochichando para Val.
— Sh! Não seja uma gatinha curiosa!
— Já pode soltar meu cabelo, Val! — Disse Eduardo empurrando o braço de Val com força e se libertando.
— Solte o meu também! — Resmungou Rafael, se desequilibrando quando Val o soltou.
No mesmo instante Bianca correu na direção de Rafael e o abraçou, impedindo-o de cair. Ele a apertou contra o corpo olhando para Eduardo, como se estivesse pronto para voltar a brigar.
— Você está bem, Rafa? Será que não é melhor irmos a um hospital? — Ela Perguntou aflita segurando o rosto de Rafael delicadamente entre as mãos.
— Eu estou bem, BB, isso não é nada, não se preocupe. Vamos embora daqui, essa praia já deu, ok? — Bianca fez que sim com a cabeça e , de mãos dadas, se foram sem se despedir dos outros.
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