— E você, Sofia? Não sai da linha, nunca? Pizza de couve-flor, coca diet. — Estela provoca, com um sorriso malicioso.
Eu a encaro, e, apesar do desconforto que sinto, consigo manter a calma. Solto o ar com mais força e evito olhar para Leo.
— Não. Eu gosto de me sentir bem com meu corpo. E já me acostumei, não sinto falta de gulodices. Claro que, de vez em quando, saio da linha. Eu gosto muito de chocolate. Não deixo de comer, mas só o de 70% cacau. — Respondo, orgulhosa, lembrando-me do quanto mudei desde os tempos em que eu me sentia insegura.
— Você faz exercícios? — Ela pergunta, curiosa.
— Eu corro antes de ir ao trabalho. — Respondo, com um sorriso.
— Não é de se admirar. Por isso que você tem esse corpão. — Estela diz, de maneira quase reverente.
Eu pisco para ela, entrando na realidade novamente.
— Sim, mas eu já fui gordinha. Por isso, eu me cuido.
O garçom começa a servir as pizzas na mesa ao lado. O cheiro está delicioso, e por um momento, a tentação é grande, mas continuo firme na minha decisão.
Quando ele nos serve, Leo toma as rédeas e diz:
— Não, pode deixar, eu as sirvo.
Ele serve Estela primeiro, depois pega um pedaço generoso para ele, e por fim, me serve. A pizza de couve-flor não parece tão r**m assim, mas é difícil me concentrar na comida com tudo o que está acontecendo.
Comemos em silêncio por um momento, até que Estela quebra a tensão.
— Meu amor, você está tão calado... — Ela diz, com um pedaço de pizza na boca.
— Estou com dor de cabeça. — Leo responde, tomando um gole de chope.
Eu desvio os olhos, sentindo uma mistura de alívio e desconforto.
— Estela, por que não experimenta um pedaço da minha pizza? Você verá como é boa! — Digo, tentando suavizar o clima.
— Eu quero! Vamos ver se é boa mesmo. — Ela responde.
Eu pego o prato de Estela e me levanto, cortando um pedaço para ela, e entrego a ela, antes de me sentar novamente.
— É... é boa, mas não é tudo isso. Dá para perceber o gosto de couve-flor na massa. — Ela diz, sem muito entusiasmo.
— Verdade. O segredo é colocar queijos com sabor forte na massa, aí o gosto do couve-flor some. Eu faço essa receita para os meus pais. — Eu explico, com um sorriso.
— Verdade? — Ela pergunta, interessada.
— Sim.. — Digo, sorrindo.
Estela ri, mas não sei o que pensar sobre ela. Rica, aparentemente sem preocupações com a realidade de Leo.
Deus! Pare com isso!
Leo se reclina na cadeira, dando um último gole no chope e olhando distraidamente pela janela.
— Leo me disse que vocês se encontraram na rua e ele resolveu te convidar para sair com a gente. Eu imediatamente sugeri que ele chamasse um amigo meu, assim você não ficaria segurando vela. — Estela diz, olhando para mim.
Eu engulo em seco, e tento disfarçar.
Com um sorriso forçado, digo:
— E por que não chamou o seu amigo?
— Porque eu não permiti. Não tem nada a ver trazer uma pessoa estranha. — Leo diz, com um olhar enigmático.
— Besteira dele. Ele é super gente boa. — Estela diz, e vira-se para Leo, abraçando-o.
Eu, sem saber o que pensar, sorrio para Leo, tentando desfazer a tensão entre nós.
— Tudo bem. Eu não ligo de segurar vela. A noite está agradável e foi bom sair um pouco. Hoje eu realmente precisava de um respiro.
— Você não costuma sair? — Estela pergunta.
— Não. Minha vida é muito corrida. Trabalho, estudos... Ah, terminei meu curso de Administração. Estou formada! — Digo, com um sorriso de orelha a orelha.
— Parabéns! — Estela diz, com um sorriso, puxando a conversa para um campo mais pessoal. — Eu ainda tenho mais um ano pela frente.
Eu a olho por um momento, sem saber se deveria responder. Estela faz curso de Nutrição na mesma faculdade que eu, mas as realidades de nossas vidas são completamente diferentes. Ela estuda à tarde, enquanto eu enfrento a noite para concluir o meu curso. E, claro, o pai dela paga os seus estudos, enquanto eu, bem, tenho que me virar sozinha. Não que eu me importe com isso — ao contrário, sinto um certo orgulho do que conquistei com o meu esforço.
Mas, de alguma forma, a disparidade me incomoda agora.
Leo interrompe meus pensamentos:
— Vamos? — ele pergunta, quebrando o silêncio.
Estela olha para ele com um brilho nos olhos e, de repente, surge com uma sugestão:
— O que acha de irmos ao cinema?
Eu me arrepio um pouco com a ideia. Sinto que, mais do que nunca, eles são um casal e eu estou apenas ali, uma presença desconfortável entre eles. Mas Leo responde rapidamente, sua voz suave, mas firme:
— Hoje não. Eu estou morrendo de dor de cabeça.
Estela não esconde a decepção no rosto. Ela baixa a cabeça, visivelmente contrariada, e diz, quase num suspiro:
— Eu não quero ir para casa. Quero ficar com você mais um pouco.
Leo parece hesitar por um momento, mas sua expressão logo se torna resoluta.
— Hoje não. — Sua voz é mais fria agora, como se já tivesse tomado a decisão. — Não estou me sentindo bem.
— Tudo bem. — Estela responde, contrariada, mas se esforçando para esconder sua frustração.
O silêncio cai sobre nós enquanto nos levantamos para ir embora. Quando chegamos à saída, Leo paga a conta das pizzas com um gesto distraído. Eu tento oferecer minha ajuda, mas ele recusa rapidamente, como sempre faz. Eu sabia que ele não aceitaria, mas a gentileza do gesto me fez sentir um pouco mais distante.
Saímos do restaurante sem trocar muitas palavras, cada um em seu próprio espaço de desconforto. Eu, tentando lidar com a pressão do que sinto por Leo. Estela, talvez mais magoada do que aparenta, mas fazendo o melhor para manter a postura. E Leo... Leo, com sua dor de cabeça e sua indiferença crescente.
Ver Leo ignorando Estela, mesmo que por uma dor de cabeça, só aumenta o turbilhão dentro de mim. Por mais que eu queira me afastar, essa confusão toda parece me puxar para ele de novo, me fazendo esperar por um gesto, por uma palavra. Mas, ao mesmo tempo, sei que não posso continuar nessa montanha-russa de sentimentos, onde a esperança é alimentada pela incerteza e a dor se mistura com o desejo.