Ficou quase dois anos longe e agora quer mudar o meu Natal?

1081 Words
Deus! Ele que terminou comigo! Saiu da minha vida de um jeito intempestivo. Ficou quase dois anos longe e agora volta e quer mudar o meu Natal? — Desculpem-me, mas eu não vou. Eu já tenho o meu Natal planejado. — As palavras saem de mim com mais força do que eu esperava. Meu pai endurece o olhar, mas não recua. — Pois eu e sua mãe queremos ir e gostaríamos muito que você fosse conosco. Minha mãe chora ao lado de meu pai, abraçando-o como se isso fosse algum tipo de despedida. Um golpe baixo, um apelo. Eu sinto a raiva ferver, a impotência me corroer. — Pode ser nosso último Natal, ninguém sabe o que pode acontecer... — Minha mãe diz, chorando com a fragilidade de quem não consegue mais esconder a dor. Deus, isso é torturante. Eu encaro Omar. Ele está lá, parado, com o semblante sério, seus olhos fixos em mim. Há algo em seu olhar que me ferve por dentro, uma espécie de calor que eu não quero sentir. Mas é impossível não notar. Meus pensamentos voltam ao passado, ao momento em que ele se afastou de mim sem mais nem menos. E ali estava ele, cinco anos depois, tentando me forçar a reviver algo que eu já havia superado. Conheci Omar num dia de chuva pesada, numa tarde de novembro, ela manchava as ruas de Floripa com um brilho prateado. Minha bicicleta range a cada empurrão, as rodas deslizam com dificuldade sobre o asfalto molhado. Estou completamente encharcada, e o uniforme do McDonald’s que uso gruda na pele como uma segunda camada incômoda. m*l consigo enxergar, os pingos grossos atrapalham a minha visão. De repente, uma caminhonete preta para ao meu lado. O som do motor parece alto demais no silêncio cortado apenas pelo tamborilar da chuva. O vidro escuro desce, revelando um homem com um sorriso caloroso e um rosto que imediatamente reconheço: o vizinho bonitão que sempre vejo de manhã, saindo de terno e gravata. — Ei, você precisa de ajuda? — ele pergunta, inclinando-se ligeiramente para fora da janela. Eu hesito, envergonhada pela minha aparência, mas não posso recusar. — Minha bicicleta quebrou. Estou tentando levá-la para casa, mas ainda falta um bom caminho. Ele desce do carro sem pensar duas vezes, ignorando a chuva que agora também molha o seu terno impecável. Com facilidade, levanta a bicicleta e a coloca na traseira da caminhonete. — Vamos, eu te levo. Não faz sentido você se molhar mais ainda. Durante o curto trajeto, ele se apresenta como Omar, um analista de comércio exterior em ascensão. Seus olhos são intensos, e seu sotaque levemente exótico dá ênfase a cada palavra. Descubro que ele é marroquino, mas vive no Brasil desde os 12 anos. Conversamos pouco, mas o suficiente para que algo nele desperte minha curiosidade. Ao chegarmos em casa, ele desce novamente e me ajuda a tirar a bicicleta da caminhonete. Quando agradeço, envergonhada, ele apenas sorri. — Foi um prazer, Sofia. Quem sabe a gente se vê de novo? E nos vemos. No dia seguinte, recebo uma mensagem dele no f*******:. A partir dali, conversamos todos os dias, construindo uma ponte que logo se transformou em algo mais. Omar era o tipo de homem que parecia saber o que queria e por algum tempo achei que também saber o que queria: ele. Eu volto ao presente. É mas graças a Deus ele não me afeta mais. Incrível... Acho que estou curada. Eu retiro meus olhos dos dele e encaro meus pais. —Tudo bem, pelo jeito estava tudo planejado entre vocês. Eu apenas fui a última a saber, porque vocês me tratam como se eu fosse uma menininha. E menininhas não opinam. — Sofia. — Ele chama meu nome suavemente, mas as palavras me atingem como uma lâmina. Ele se levanta, aproximando-se de mim, e eu ergo o olhar, encarando-o com todo o desprezo que consigo reunir. — Não veja tudo isso pelo lado r**m. — Ele tenta, mas é tarde demais. — O lugar é agradável, tranquilo... você vai gostar. A praia é linda. Não? Eles só planejaram tudo pelas minhas costas. Minha garganta se aperta, e, por um momento, tudo que eu sinto é um desejo profundo de sair daquela sala. Eu queria que ele fosse embora. Já. — Tudo bem. Vocês venceram. E agora? Posso ir? — Eu aceno, minha voz quebrando sob a tensão. — Omar, tem algo a acrescentar? — Meu pai pergunta, mas a inquietação já está estampada em seu rosto. — Não. — A resposta de Omar é simples, mas carrega um peso que não consigo mais suportar. —E aonde você vai? —Vou sair com Leonardo. Eu já te disse isso. —O mecânico? —Sim. Eu já te respondi isso. Meu pai meneia a cabeça com um sorrisinho do tipo "isso não vai pra frente". Claro que ele vai puxar a sardinha para o cara que ficou rico ao trabalhar para Sheik negociando barris de petróleo com o mundo e não para o mecânico que conheci e me convidou para sair e que aliás, é um gato, pena que é comprometido. — Boa noite a todos. — Me levanto, sentindo um alívio estranho. O peso de Omar, do passado, já não me incomoda tanto. O que estava atrás, agora está onde deve estar: no passado. Lá fora, Leonardo está recostado no carro, sua postura relaxada, mas ao mesmo tempo cheia de uma força silenciosa. A perna esquerda está cruzada sobre a outra, um gesto tão simples e, ao mesmo tempo, tão enigmático. Sim, Leonardo é bonito. Bonito de um jeito que me tira o fôlego. Ele é forte, mas não de um jeito exagerado, tem o corpo definido, e isso fica claro através da camisa branca que se ajusta perfeitamente aos seus ombros largos e à cintura estreita. A calça jeans escura ressalta ainda mais sua presença imponente. E, Deus, aquela bunda... Eu nunca vi nada igual. E quando ele me olha com seus olhos verdes, curiosos e profundos, meu coração acelera sem pedir permissão. Relutante, dou um passo em sua direção. Uma mistura de medo e excitação toma conta de mim. Esta é a primeira vez que saímos, mas não estamos sozinhos. Leo tem namorada. E, sinceramente, não sei o que estou fazendo, mas o desejo de estar com ele, mesmo que por alguns momentos, me consome. — Obrigada por ter me esperado — digo, tentando manter a calma enquanto me aproximo.
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