capítulo 2

1150 Words
— Eu sabia que você me odiava, só não sabia que era tanto assim! Está bem, eu posso ser considerada dramática de vez em quando. Mas daquela vez, definitivamente não era drama, e sim indignação pela injustiça do meu irmão. Quando Matheus descobriu que teria uma irmã aos dois anos de idade, o pequeno garoto se jogou no chão e simplesmente chorou desolado. Temos um dvd com a gravação para provar. E agora, esse ódio contido voltava em forma de vingança da pior forma possível: — É só um quarto Margarett! Não é o fim do mundo. Havíamos acabado de descer as coisas em nossa nova casa, onde moraríamos os quatro para ficar mais perto da faculdade, quando Matheus simplesmente se apossou da única suíte da casa. Haviam outros quatro quartos, mas eles dividiam o banheiro. — Eu sou a única garota aqui Mat, você tem que entender que eu preciso dessa privacidade. Daniel e Toni se aproximaram por trás de mim, curiosos pelo assunto da discussão. — Somos todos como irmãos, todos aqui já até te viram p****a! E outra coisa, preciso ter uma suíte para as garotas se interessarem mais. Enfurecida, peguei a mochila que segurava e joguei na direção do rosto do meu irmão. Nem deu tempo para que eu me arrependesse, porque ele a agarrou com apenas uma das mãos. Não fiquei para escutar um sermão dele sobre como resolver as coisas sem violência, simplesmente saí pela porta da frente, e a bati com toda a força que encontrei. Só percebi que não tinha para onde ir, quando andei o terceiro quarteirão até a universidade, e passei pelos portões azuis descascados. Certo, não seria tão r**m se eu fosse vista na universidade durante a tarde um dia antes do começo das aulas, mas isso se eu fosse caloura. O que de fato não era o caso. Mas ignorei as vozes internas que me mandavam engolir o ego e voltar para casa, e continuei andando. Atravessei o campus, e escolhi o prédio administrativo para me esconder, já que lá havia um piano em perfeito estado. Não havia ninguém lá dentro, não havia quase ninguém no campus em si. Atravessei o saguão cumprimentando todas as secretárias ao redor, certa de que já sabiam o que eu fazia ali. Não era a primeira vez que aquela pequena sala no fim do corredor se passava como meu ponto de refúgio. Abri a porta de madeira depois de espiar a pequena janelinha de vidro, que indicava a solidão lá dentro. Eu adorei a ideia. Fechei a porta atrás de mim, me sentei ao piano, e ergui a tampa. Milhares de sons, notas e partituras me invadiram à mente, mas no fim, toquei a que sempre tocava em situações como essa. Tão famosa, típica e clássica... Für Elise. Não sei em que momento fechei os olhos. Não sei quando comecei a inclinar e reclinar o corpo conforme as notas, só sei que na metade da música já estava embalada de tal forma, que m*l me lembrava de quem era. Nada era capaz de descrever as sensações que me percorriam, quando os dedos paravam de se mover por mecanismo e passavam a se levar por puro instinto. Quando os arranjos e brincadeiras extras se encontravam com o clássico, em uma explosão de sons. Minha barriga gelou, meus dedos formigaram, e eu sorri. E então, uma batida na porta que tirou minha concentração por completo, me fez voltar daquele mar de sonhos dando um... grito nada afinado. É um pulo nada bonito. Arregalei os olhos para o garoto que agora entrava na sala, sem nenhuma cerimônia, após abrir a porta sem permissão. Digo, pra que bater se vai abrir a porta de qualquer forma sem resposta alguma? — Posso ajudar? Perguntei cruzando os braços na frente do peito. Reparando no garoto melhor, ele era realmente muito bonito. Tinha os cabelos escuros, um pouco mais escuros que os de Pedro, mas ainda assim não pretos. Os olhos eram azuis-escuro, semicerrados em minha direção, com as sobrancelhas grossas franzidas. Seus ombros eram largos, o corpo aparentemente atlético, e a altura um pouquinho menos exagerada que a de Daniel, o mais alto do g***o. — Sabe onde fica a secretaria? Para a matrícula. Um calouro fazendo matrícula um dia antes do começo das aulas? Me parecia suspeito. — Você acabou de passar por ela para chegar aqui. — Expliquei. — Aquele balcão cheio de secretárias é onde costumamos fazer matrícula por aqui. Voltei a me sentar no piano, mas por algum motivo o garoto permaneceu ali prado. — Elas disseram que a matrícula para meu curso é em outro lugar. Lancei mais um olhar para o garoto. Calça jeans e jaqueta de couro, correntes de prata ao redor do pescoço e pulso, botas de marca. — Medicina? O garoto me encarou com um ar de divertimento do rosto, enfiando as duas mãos no bolso da jaqueta preta. — Sim. Sua voz era rouca. E linda. Se ele não tivesse me interrompido em um momento tão delicado quanto meu desabafo ao piano, eu poderia ter considerado observá-lo mais um pouco. Mas quis logo acabar com a t*****a. — Somos do mesmo curso então calouro, me siga. Me levantei do banco do piano e passei por ele para sair da salinha. O cheiro de seu perfume me atingiu em cheio, quase me fazendo trombar na porta. Recuperei a compostura, e voltei a caminhar normalmente. O garoto me seguia a uma distância respeitável. Atravessamos o saguão das secretarias, eu me despedi delas, e saímos para o campus novamente. Alguns passos na pequena trilha de tijolos amarelos nos levava até o maior prédio do campus, praticamente um mundo à parte. As portas de vidro davam um ar de seriedade, as janelas imensas aumentavam o ambiente. Empurrei as barras de metal e nos introduzi na recepção do prédio, cumprimentando as garotas dali também. Todas elas encaravam o garoto atrás de mim com interesse, como se fosse uma espécime rara ou algo do tipo. — É aqui onde fazem a matrícula de medicina. Boa sorte. Girei nos calcanhares e voltei a caminhas, mas dessa vez para fora. Porém, em dois passos o garoto já estava perto de mim novamente... agarrando meu pulso. — Você não me disse seu nome. Meu celular vibrou dentro do bolso. Eu soube, por intermédio da intuição, que era Matheus tentando pedir desculpas. Ignorei o toque. — Você também não me disse o seu. Puxei a mão de volta, quase me arrependendo depois que o frio invadiu meu pulso nu. O garoto sorriu, e foi como um tiro no peito de tanta beleza. — Meu nome é Leonardo. Joseph Leonardo. Mas pode me chamar de J.L. Quis sorrir... que nome mais incomum. — O meu é... — Margarett! O que está fazendo aqui? Meu irmão implodiu pelas portas de vidro, seguido de mais três jovens desnecessários... Dani, Toni e Pedro. Revirei os olhos. — Nome bonito. O garoto murmurou. E eu senti que derreteria bem ali.
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