Você tem um déjà vu? Hum
Você tem um déjà vu, hein?
( Olívia Rodrigo: Deja Vu);
Neusa Cumbe
Meu coração não pára de palpitar, eu vou voltar a aquela maldita casa de praia, a casa onde ele me deu meu primeiro beijo, a casa onde ele quase tirou minha virgindade e quando eu não quis, ele terminou tudo entre nós. Nos últimos três anos, eu consegui escapar da viagem, mas este ano, eu não terei escapatória, eu voltarei a pôr os pés naquela maldita casa amaldiçoada, a casa manchada pelas minhas lágrimas de dor, a casa em que Arthur Karelly espezinhou o meu coração e o deixou totalmente trancado para qualquer tipo amor, independente do portador.
— Amiga, boa viagem, juízo por favor e vê se volta a tempo das aulas — Maddie me dá um braço e suas típicas broncas de amiga consciente.
— É isso mesmo sua vaca, vê se volta logo, eu não vou convencer seus colegas a te emprestar cadernos novamente — minha amiga Eunice, uma vaca sem coração sussura em meu ouvido para que só eu escute suas ameaças.
A verdade é que, Nicy é louca por mim, só finge ser uma pessoa fria para que eu não me acostume muito, palavras dela não não minhas.
Meu irmão Júnior me ajuda a colocar as malas no capô, do carro do meu pai, ele parece muito animado para a viagem, na verdade toda a minha família está toda feliz pela viagem, eu sou a única que está com a cara de cu. Eu queria ficar na casa da minha avó, como fiz das outras vezes, mas o meu pai foi claro ao falar que queria toda a família dessa vez. Não terei escapatória, passarei as últimas duas semanas do ano em Bilene na casa dos Karelly e pensando nele.
— Que cara é essa? Não está feliz? Está com medo de quê? — o fofoqueiro do Júnior provoca, ele é um verdadeiro fofoqueiro, provavelmente contará para a minha amiga Eunice que é outra fofoqueira de plantão.
— Não é dá sua conta fofoqueiro, vá jogar alguma coisa nesse seu celular — expulso escondendo meu celular. Júnior faz cará de cu e se afasta de mim.
Se ele visse o que estava pesquisando, provavelmente, ficaria me provocando a viagem inteira até chegarmos lá.
Como sempre, estou stalkeando as redes sociais dele, desde que ele foi embora, eu abri um perfil falso no i********: e desde então, uso o mesmo para stalkear ele.
Sempre são fotos em lugares chiques, luxuosos e com várias mulheres bonitas, não me surpreende que ele tenha terminado comigo, quem precisa de uma virgem indecisa e medrosa se pode ter todas as mulheres do mundo? Isso mesmo, ninguém.
Na nova foto dele, publicada hoje, ele está na França em algum hotel caro. Ele está na piscina do mesmo, sem camisa, mostrando seus músculos. Antes ele não tinha tantos músculos, agora ele parece um verdadeiro deus grego saído dos sonhos profanos de uma adolescente, com os hormônios a flor da pele. Ele deixou a barba crescer e fez uma tatuagem, ele está um verdadeiro pecado. Agradeço que ele esteja distante de mim, não imagino o que teria acontecido comigo se ele estivesse tão perto de mim.
— Neny, já chegamos por quê está tão distraída? Está tudo bem? — minha mãe indaga assim que chegamos.
Nem percebi quando chegamos a vila de Bilene, devo ter dormido por toda a viagem. De Maputo a Bilene de carro, são cerca de cinco horas de viagem.
— Já chegamos? Nem demoramos — Indago surpresa virando a cabeça de um lado o o outro, tentando visualizar tudo ao nosso redor.
— Sim, você dormiu por cinco horas — minha mãe responde preocupada.
Ela desconfia de algo só não sabe o quê? Ela quer perguntar o que está acontecendo mas não sabe como.
— Tudo isso? Meu Deus, eu perdi a viagem — me sobressalto no banco do carro, meus olhos estão arregalados e surpresos.
— Sim, você perdeu a viagem toda — minha mãe concorda sorrindo.
Descemos do carro, meu irmão Júnior tira as malas do capô e me entrega a minha. A família Karelly está a nossa frente, nos esperando em frente a mansão a beira do mar. O velho Ares Karelly, está com sua linda mulher, dez anos mais nova que ele e sua filha de cinco anos. O velho Ares Karelly, apesar da idade, é muito charmoso, um grego de mais de um metro e noventa de altura, olhos pretos intensos e o cabelo bem organizado.
— Venâncio meu caro, seja bem vindo a minha humilde casa — o velho com crise de meia idade, veste uns calções brancos largos, camiseta polo azul e chinelos de Moisés nos pés.
Os chinelos de Moisés, são como são chamadas as sandálias Gladiadoras em Moçambique, elas ganharam esse nome por causa de uma telenovela bíblica brasileira.
— Obrigada Ares — meus pai o cumprimenta apertando sua mão.
Eu não sei se é coisa de rico ou o velho Karelly é humilde, onde já se viu uma mansão a beira mar ser considerada humilde residência.
— Venham, vamos entrar — a senhora Karelly instrui cumprimentando minha mãe.
A pesar da idade da esposa do velho Ares, ela e minha mãe dão-se muito bem, podem se considerar amigas até.
Eu e Júnior entramos com nossas malas e assim que coloco os meus pés no interior da casa, uma sensação de Deja Vu me preenche. O cheiro da madeira invade as minhas narinas e eu tenho que me controlar para não chorar. Tudo volta de uma só vez, todas as lembranças que fiz questão de aprisionar por quatro anos, tudo está voltando, tudo sem dó nem piedade.
— Neny querida, você vai ficar no antigo quarto de Arthur, ele está desocupada, se importa? — a madrasta se Arthur informa e meu coração erra uma batida.
O destino está brincando comigo né? Depois de quatro anos sem pisar nessa casa, e quando eu volto eu tenho que dormir no quarto dele? Isso é uma maldição né? Por quê está acontecendo comigo? O que eu fiz.
— Não tia Sheila, eu não me importo, posso ficar lá — concordo fazendo todo o possível para as minhas palavras não saírem vacilantes.
— Que bom, ainda lembra onde fica né? — ele Indaga sorrindo, ela está tão animada em ter todos nós aqui que falta pular de emoção.
Se eu lembro onde fica o quarto? É claro que lembro, foram tantas às vezes que fugi do meu quarto até o dele para trocar uns bons amassos nas madrugadas, como vou esquecer onde fica esse quarto? Era o nosso ninho de amor, o nosso esconderijo, o lugar onde ele me tocou pela primeira vez, onde ele me deu meu primeiro o*****o.
“Ai, eu estou ferrada”
Eu Estou totalmente ferrada, totalmente perdida, totalmente fudida e não é no bom sentido, é pior dos piores sentidos.
— Muito bem, pode arrumar suas coisas querida, preciso de você para fazer um bom pudim de leite, adoro o seu pudim — tia Sheila murmura com um sorriso cúmplice.
Concordo com a cabeça, respiro uma, duas e três vezes antes de subir as escadas. Assim que os meus dedos tocam o corrimão da escada, uma memória passa por minha mente.
Eu e Arthur , eu com quinze ano e ele com dezassete. Estamos sentados no último degrau das escadas, nossos pais não estavam e junior estava dormindo, eu estou sentada em seu colo e ele passa as mãos por todo o meu corpo, nos beijamos com fervor e gana. Arthur devora os meus lábios, sua língua desliza para o interior da minha boca, se enrosca a minha e me sufoca.
Foi o nosso primeiro beijo de língua, o meu primeiro beijo de língua, ele já era um mestre na área dos beijos calientes. Expulso esses pensamentos impuros e decido enfrentar logo os meus demônios, preciso enfrentar logo no quarto de Arthur Karelly, preciso ficar nesse ambiente e tentar não sentir absolutamente nada. Com o coração palpitando, passo pelo corredor, o mesmo em que às vezes nós dois brincávamos de pega pega, igual a dois bobos apaixonados.
Meu coração aumenta a frequência quando finalmente chego na porta de seu quarto, aperto a tranca, ela está como sempre esteve, como deixei há quatro anos atrás. Com a mão tremula, abro a porta do mesmo, entro com passos vacilantes, com o coração palpitando e um bolo no estômago.
Assim que entro no interior do quarto, tudo volta, como uma avalanche de memórias, como se nunca tivesse passado quatro anos, como se eu e Arthur ainda estivéssemos juntos. Seu perfume ainda está por toda a parte, como se ele nunca tivesse saído daqui, sua cama ainda está com os mesmos lençóis de antes, tudo continua o mesmo, como se tivesse voltado há quatro anos atrás, naquela tarde em que ele me fez gozar pela primeira vez.