UM

1550 Palavras
SILVIE — Menina, eu já disse que não precisava vir trabalhar. Necessita de um descanso. Eu sei o quanto está sendo doloroso para você. — Senhor careless fala, segurando meus ombros, me puxando para um abraço apertado. Suspiro profundamente, sentindo minhas lágrimas escorrerem livres por minha face. Duas semanas, e parece que todos os dias revivo a morte de Hanna. Não tive coragem de visitar Olívia. Apolo me ligou algumas vezes, mas não atendi nenhuma. Eu só queria entender o que aconteceu com Hanna naquela noite. Porque corria tanto. — Eu sinto muito, Silvie! Vá para casa. Precisa descansar. Careless reforça, enxugando algumas lágrimas do meu rosto, se afastando com um sorriso pesaroso. — Nosso chefe me surpreende a cada dia. Primeiro contratou duas garçonetes, agora está sendo generoso com você. — Ele não é de todo m*l. — Completo, limpando minha face com o dorso da mão. — Verdade. — Concorda. — E Olivia, como fica? Kelly se aproxima parando a centímetros de mim, alisando minhas costas suavemente. — Com o pai, acho. Eu… na verdade não sei. Eu não tive coragem de visitá-la ainda. Kelly mais uma vez concorda, ficando em silêncio. Respiro fundo, pegando meu bloquinho de notas e caminhando em direção a uma mesa com clientes. — Menina, você é tão teimosa — Ouço meu chefe resmungar. Me viro em meus calcanhares, o fitando com um sorriso fraco. — Eu agradeço a preocupação, senhor. Mas eu prefiro trabalhar. Ir para casa e ficar sozinha só me deixaria pior. Ele assente com um olhar compreensivo. As próximas horas, passei andando de um lado para o outro, servindo mesas, anotando pedidos. Escutando piadinhas de clientes abusados, sentindo a exaustão dominar meu corpo lentamente. O que eu agradeço, por mais que provoque dor física, não me importo. Farei tudo para não sair desse estado de torpor que meu corpo se encontra. Todas as noites volto para a minha vazia e solitária casa e adormeço acordando no dia seguinte somente para trabalhar. Três Semanas Depois… Corro em direção ao Bob 's ofegante. Tive uma noite terrível. Pesadelos com mamãe e Hanna me assombraram por toda a madrugada. Arregalo os olhos e cesso meus passos abruptamente quando percebo Apolo me esperando ao lado da porta principal do bar. Sua aparência transborda cansaço, seus olhos azuis estão encobertos de tristeza por mais que me custe admitir, ele está sofrendo. — Sil, Oi! — Sussurra, assim que me aproximo. — Eu tentei falar com você várias vezes, eu… preciso da sua ajuda. — Apolo, desculpa. Eu não estou querendo falar com ninguém no momento. — Suspiro, segurando a alça da minha bolsa impacientemente. — Silvie, eu estou perdido. Preciso da sua ajuda. Por favor! Eu juro que tentei, mas eu não sou a pessoa indicada para ficar com a Olivia. Instintivamente dou um passo para trás, boquiaberta com sua fala. — Como assim, não é a pessoa indicada? Inquiro. Você é o pai dela! — Ressalto com o dedo em riste em sua direção. — Eu sei! — Berra, andando de um lado para o outro. Olho para ele, assustada. — Silvie, quero que fique com ela, que crie como sua. Solto uma risada amarga. — Você só pode estar louco. Eu não posso ficar com ela. Apolo, eu não tenho condições para acomodar uma criança. Eu não tenho nada para oferecê-la. — Hanna ia querer isso. — O encaro com ódio dominando minhas veias. — Cala essa maldita boca! Você não tem esse direito. Avanço para cima dele desferindo tapas em seu peito. — Sil, eu sinto muito. Mas eu só quero o melhor para a minha filha. Apolo abaixa a cabeça com uma expressão derrotada. — O melhor para a Olivia nesse momento, é você — Murmura, Soltando meus pulsos. Observo ele andar em direção ao seu carro e retornando segundos depois com duas malinhas rosas e um bebê conforto da mesma cor onde Olívia repousa tranquilamente. Uma lágrima solitária rola na minha face quando meus olhos encontram um par de olhinhos azuis brilhantes iguais aos da sua mãe. Olívia estende os bracinhos em minha direção, e não controlo os meus soluços, me agacho e a tomo nos braços. Aperto o seu pequeno corpinho junto ao meu, espalhando beijos por toda a sua face delicada. — Oli… Eu sinto tanto, querida. — E-u sinto muito! — Sussurro com a voz embargada, deixando um beijo no topo da sua cabecinha perfumada. Apolo começa a se afastar com os olhos marejados, negando veemente. — Não faça isso — Peço em uma inútil tentativa de trazê-lo à razão. — Apolo! — Grito enquanto ele entra em seu carro e o põe em movimento. — Silvie, só… cuide dela. — Murmura baixo, olhando diretamente para Olívia, em seguida, saindo em disparada, cantando pneus. Olívia começa a chorar assustada com os chiados provocados pelos pneus, junto ao cascalho e chão batido. Tento consolá-la, ao mesmo tempo que tento controlar as batidas do meu coração. Um nó se forma em minha garganta e me sento no meio fio com Olívia nos braços, deixando o choro entalado na garganta sair descontroladamente. Terei que ser forte, como Hanna foi um dia para mim. Olívia precisa e eu não vou decepcionar a minha irmã, onde quer que ela esteja. Por Hanna, cuidarei de Olivia como se fosse minha filha, é uma promessa. ********************** Confesso que cuidar de Olivia não está sendo fácil. Ver Hanna cuidando dela pareceu ser tão… simples. Estou exausta, destruída, tentando fazer o melhor que posso. Acordo todos os dias às cinco da matina, preparo uma mamadeira e arrumo uma pequena mala com tudo que Olívia precisará no dia. Senhor Careless como sempre, me ajudou dando um tempinho extra para poder arrumar alguém que possa cuidar da minha sobrinha em tempo integral, alguém de confiança. Foram várias tentativas, até encontrar Joana, uma senhora de quarenta anos, vizinha de Kelly. A mesma garantiu que Joana é uma pessoa de bem, então todos os dias deixo Olivia aos seus cuidados. Não tenho escolha. Se ela ao menos pudesse contar com o pai. Após deixar Olívia para trás, Apolo desapareceu, nenhuma ligação, nenhuma mensagem, nada. Não consigo deixar de odiá-lo. No momento que a própria filha mais precisa do pai, ele a abandona como um verdadeiro covarde. Olho para o teto, fechando os olhos em seguida. — Porque, Hanna? Você sempre soube que ele não valia nada, mesmo assim insistiu. — Resmungo baixo, me virando para o lado na cama, acomodando a pequena fadinha para mais perto de mim. Oli solta um longo suspiro atraindo minha atenção. Acaricio seus fios castanhos, admirando sua face. Ela é tão parecida com a mãe… Sentindo o seu cheirinho maravilhoso aos poucos adormeço. Na manhã seguinte desperto-me com os raios solares atravessando a janela do meu quarto, deslizo minhas mãos encontrando Olivia encolhida no canto da cama e quando a toco, percebo que sua temperatura corporal está elevada, e isso não é um bom sinal. Esfrego a face tentando dissipar o sono e me levanto correndo em direção ao meu guarda-roupa, procurando desesperadamente o termômetro. Alcanço o objeto e a pego no colo, ajustando o termômetro debaixo do seu braço esquerdo. Minutos passam e ele apita indicando a sua temperatura. Ofego com um suspiro estrangulado quando visualizo 39 graus de febre. Novamente o desespero me domina e não sei o que fazer. O que Hanna faria? Me pergunto mentalmente. Respiro fundo e tomo a decisão de enrolá-la em uma coberta, cato minha bolsa e os documentos dela e dirijo para o Vanetti, hospital mais próximo da minha casa. Não há tempo para surtar, preciso agir rápido. Chegando ao hospital, percebo olhares e cochichos em nossa direção, sei que é pelo fato de eu ainda estar com o uniforme do trabalho, ignoro. Minha prioridade é minha sobrinha agora. Felizmente por ser uma criança e está com 39 graus de febre ela foi rapidamente atendida pelo o médico de plantão. — Senhorita Blossom, aparentemente não há nada de errado com a pequena. Seus exames estão normais. — Ela passou algum estresse, trauma? — O doutor Gabriel pergunta me deixando arrasada. Abaixo a cabeça concordando. — Ela perdeu a mãe recentemente. E o pai… bom, ele não conseguiu lidar com ela. Eu estou tentando tudo que eu posso e como o senhor pode perceber, não está sendo o suficiente. Gabriel concorda, anotando algo em sua prancheta, em seguida seus olhos negros estão nos meus. O senhor de sessenta anos, com um sorriso sempre discreto, rasga o papel onde anotava algo e estende em minha direção. — Eu sinto muito, senhorita Blossom. E não se sinta culpada, Olívia é muito pequena, é natural sentir falta da mãe. A febre não passou de um fator emocional. veja, aqui está uma psicóloga, se quiser pode falar com ela, talvez seja uma forma de ajudá-las a lidar com isso. Assinto, agradecendo-o. Ficamos mais algumas horas no hospital, até ter certeza que a febre realmente havia passado. Conforme os dias foram passando, Olívia não teve mais febre. Tentei inúmeras vezes contatar o pai dela, mas como sempre, foi inútil. Acabei descobrindo que ele se mudou para outra cidade. Eu não sei o que fazer, as contas estão se acumulando. Não acredito em milagres, mas só um para salvar-me de afundar nesse momento.
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