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1035 Palavras
Gabrielli Saímos do serviço às 16:00 como todos os dias, Marcele voltou comigo para tomar um banho e descansar um pouco para ir trabalhar na cozinha do bordel mais tarde, porém para nossa surpresa nosso pai tinha outros planos. Jorginho está no colo de Irma evitando ao máximo meu pai, meu irmãozinho ficou mais desconfiado depois do que houve conosco. Ele também tem pesadelos e muitas vezes acorda gritando e chorando de medo, penso que nunca vamos superar o que houve conosco e meu pai ficar vindo aqui também não vai ajudar em nada. Gusmão olha para nós com um nítido desprezo, nas cinco famílias as mulheres não trabalham, apenas servem seus maridos. Para ele deve ser desprezível nos ver chegando do trabalho suadas e sujas, mas não somos mais aquelas meninas que nosso pai criou, nossas vidas mudaram mesmo que ele não aceite isso. – Senhor Gusmão, como vai? – Gabrielli, não precisa de tanta formalidade, por que não me chama de pai como antes? Poderia dizer vários motivos pelos quais não considero ele como meu pai, porém estou cansada demais para discutir com ele justamente por ter trabalhado o dia inteiro e ainda ter que fazer o jantar e cuidar da casa, por mais que Irma me ajude ela também tem sua vida para cuidar, já é demais ficar com Jorginho durante todo o dia, resolvi ignorar sua pergunta sem discutir. – Irma, Jorginho tomou o leite todo ou ele estranhou a marca nova? – Tomou o leite todo e ainda pediu um pouco mais, almoçou muito bem e agora a tarde comeu as frutas que comprei. É um rapazinho muito comportado meu sobrinho lindo. Irma beijou o rosto de Jorginho recebendo beijos em agradecimento, Vagner e meu pai estavam sentados observando a interação entre Jorginho e Irma. – Vou tomar um banho e depois me deitar, Gabi, quando tiver pronto o jantar você me chama. – Porque vai começar a fazer o jantar a essa hora? São 17:00, não é hora de começar o jantar. Respirei fundo para não ser grosseira mesmo querendo muito ser, de verdade não sei por que ele veio aqui se não concorda com nosso modo de viver. – Marcele trabalha a noite na cozinha do bordel, é um dia sim e outro não, no dia que ela não vai sou eu quem vou. Faço o jantar mais cedo por isso, acordamos cedo para trabalhar, por isso tento ter uma rotina mais prática, Marcele fica na cozinha até as 23:00, depois Vagner vai buscá-la e assim ele também faz comigo. – Bordel? Vagner, por que não me disse que minhas meninas estão trabalhando em um puteiro? Estão correndo risco de serem estupradas, não é lugar para moças da Organização estarem. Por que ele insiste nesse discurso? Não somos mais moças recatadas da Organização, não vamos ser como éramos, é ilusão continuar insistindo nisso. – Podem por favor nos dar licença, vou conversar com o senhor Gusmão. Todos saíram me deixando sozinha com meu pai, me sentei no lugar que antes Vagner estava, seria uma conversa difícil, mas tinha que acontecer. – Senhor, preciso ser a mais sincera possível para que entenda o que somos agora, eu e Marcele trabalhamos na lavandeira durante o dia, Jorginho fica com Irma que nos ajuda como uma verdadeira amiga e irmã, então pare de olhá-la com desprezo pois essa ex prostituta cuidou de nós quando sua Organização virou as costas para nós. Sobre sermos moças da Organização, tem exatamente sete meses que não existe mais nada do que eu e meus irmãos fomos, olhe para mim, meus cabelos oleosos e despenteados, minha roupa suja e minha postura. O senhor está aqui pelo passado, e ele não existe mais, sobre os abusos que podemos porventura passar no bordel, não se preocupe já fomos estupradas por quem conviveu conosco a vida inteira, o que é ser abusada por desconhecidos? Nunca aconteceu, porque aqui somos protegidas e consideradas, será que quando voltarmos para a Organização o tratamento vai ser igual? Sua expressão não mudava, sempre sério e duro como um homem da elite da Organização deve ser. – Me odeia, não é? Não me perdoa pelo que houve, mas também perdi tudo que considerava importante na minha vida, sua mãe estava grávida quando morreu, mas não posso trazê-la de volta, apenas me conformar e seguir em frente. – Quem disse a você que não seguimos em frente? Não odeio você, somente a situação que sua presença traz, Jorginho fica confuso, Marcele fica triste, e eu tenho que lidar com os impactos que sua presença causam. Saber agora que mamãe estava grávida só me traz mais tristeza, ela morreu a toa, pois o senhor decidiu continuar nessa Organização e ainda nos entregou para nossos abusadores. Só Deus sabe como seremos tratadas pelas cinco famílias, mas isso não importa, para o senhor o que importa é limpar o nome Gusmão e ter sua preciosa honra de volta. Quero que saia da minha casa, e por favor não volte mais, na próxima semana não vamos mais nos reportar ao senhor e sim aos nossos futuros maridos, não seremos mais um problema seu, deveria seguir meu conselho: procure outra esposa, uma que lhe dê muitos filhos, homens de preferência, quero muito que esqueça da existência de Jorginho, pois ele não vai ficar com você. Ele tentou bater em mim, mas Marcele apareceu na hora entrando na frente dele, minha irmã sempre foi a preferida de papai antes de Jorginho nascer, sei que foi uma surpresa para ele minha irmã ter me defendido. – Vá embora, e não volta mais, por favor. – Filha, você não pode concordar com o que sua irmã está fazendo. – Concordo e apoio, por favor, não volte mais. Jorginho chora todas as vezes que vem, fica estressado e nervoso, só dorme depois de muito colo, e só eu consigo fazê-lo dormir quando fica assim. Seu olhar mudou percebendo que nada voltaria a ser como antes, foi embora sem olhar para trás, Marcele me abraçou chorando muito, é horrível essa sensação que sentimos, a decisão de nos entregar para os Assis terminou com a relação que poderíamos ter com ele ao escolher quem nos feriu.
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