O novo hóspede

945 Words
Jéssica Williams Eu me encosto na vassoura, deixando o peso do momento se espalhar por mim, enquanto observo o chalé à minha volta. Cada canto desse lugar parece respirar as nossas lembranças, como se o tempo não tivesse passado. Parece que estou prestes a abrir uma caixa trancada há tanto tempo, mas que, ao mesmo tempo, continua pulsando dentro de mim. Este chalé não é apenas uma casa, é um pedaço da nossa história, e o meu refúgio com Jake, o amor que perdi. O chalé, simples e acolhedor, com o pé-direito baixo e as vigas de madeira expostas, me envolve. As paredes são de um branco suave, refletindo a luz do sol de uma maneira que me acalma, criando uma atmosfera serena, quase mágica. A lareira, escurecida pelo tempo e pelo uso, ocupa a parede central da sala, com sua prateleira cheia de objetos antigos e lembranças de tantos que passaram por aqui. O lustre de ferro, com suas cúpulas amareladas, emite uma luz suave, quase aconchegante, durante a noite, e me sinto invadida por uma sensação de conforto, como se o lugar estivesse me abraçando. O chalé é dividido de forma simples, mas com uma praticidade que me encanta. O quarto tem grandes janelas que se abrem para o lago, deixando que a brisa e o aroma das árvores entrem, trazendo uma tranquilidade indescritível. Eu adoro a sensação de dormir aqui, ouvindo as ondas do lago batendo suavemente na margem, como uma música que embala meus sonhos. O banheiro, rústico e amplo, com sua banheira de ferro fundido e azulejos brancos, é um dos poucos lugares onde posso me refugiar por completo. A sala, com a poltrona antiga e confortável, é onde adormecia tantas vezes, depois de uma conversa simples, mas cheia de significado com Jake, enquanto ele ria de mim, me chamando de "sua velha". Na cozinha, pequena e funcional, tantas vezes preparamos juntos refeições simples, mas que faziam com que tudo tivesse um sabor especial. Quando Jake estava aqui, tudo tinha vida e cor. Ele costumava brincar, dizendo que aquele era o nosso "paraíso particular". E, de certo modo, ele estava certo. O chalé fica afastado da casa principal, cercado por um vasto gramado que desce até o lago. Nos dias de verão, o sol reflete nas águas, criando um espetáculo dourado ao entardecer. E, nas noites de inverno, a neve cobre tudo, transformando o ambiente em algo silencioso e mágico, como um conto de fadas. Mas agora, eu olho para tudo isso com uma mistura de melancolia e resistência. Alugar o chalé sempre foi necessário, mas essa necessidade carrega um peso dolorido no meu coração. Minha mãe está certa, eu sei disso. A situação financeira da nossa família chegou a um ponto onde não há mais alternativas. A casa é grande, a manutenção é cara, e alugar o chalé, especialmente na temporada de verão, quando os turistas lotam as praias, é a única maneira de evitar a venda da propriedade. Suspiro, sentindo o pano sujo nas minhas mãos e observando o chão desgastado sob os meus pés. Minha mãe, sempre prática, me lembra que precisamos manter as aparências, atrair bons inquilinos. Ela está certa, mas meu peito aperta ao lembrar que, a cada novo inquilino, preciso abandonar um pedaço de mim. A casa principal, localizada em uma área cobiçada, perto do lago e da praia, sempre foi um bom investimento. E o dinheiro dos aluguéis, embora necessário, nunca deixou de ser um lembrete de que o passado precisa ser guardado, enquanto seguimos em frente. Este ano, um novo inquilino ocupará o chalé por um mês inteiro. Ricardo, nosso agente da imobiliária, cuidou de tudo. Ele sempre encontra inquilinos confiáveis, e, embora eu não saiba muito sobre esse homem, confio nas escolhas de Ricardo. O p*******o adiantado já está na conta, e embora esse alívio me traga uma sensação de segurança, ele também carrega a velha sensação de perda. Sei que é uma decisão sensata, mas ainda assim, não posso evitar a tristeza que ela provoca. Passo um pano úmido sobre a lareira, limpando as marcas de poeira acumuladas ali. Não consigo evitar os pensamentos sobre Jake. Ele sempre dizia que aquele era um lugar especial, e que qualquer pessoa que se hospedasse aqui teria a sorte de descobrir uma paz única. Eu o ouço em minha mente, o seu sorriso fácil e a visão otimista que ele tinha de tudo. Limpo uma lágrima que escapa, sem aviso, do meu rosto. Desde o acidente, há seis anos, tenho tentado seguir em frente sem ele, mas a dor ainda me encontra em momentos como este. Cada canto desse chalé guarda um pedaço dele, e pensar em outra pessoa ocupando este espaço me traz uma dor profunda, silenciosa, quase imensurável. Jake foi o amor da minha vida, meu primeiro e, provavelmente, o único a quem dei tudo de mim. Sinto que, com ele, experimentei um amor único, que ninguém mais conseguirá preencher. A princípio, a ausência dele foi quase insuportável. Mas o tempo, dizem, é o grande curador, e aos poucos, o trabalho, a faculdade e os amigos me ajudaram a preencher os dias e os meses. Ainda assim, alugar o chalé, ano após ano, traz à tona toda a saudade, entrelaçada com as lembranças dos momentos felizes que aqui vivemos. Eu sei que preciso seguir em frente, mas cada verão é como uma viagem ao passado, forçada a guardar as memórias mais uma vez, para que, algum dia, eu consiga deixá-las ir. Suspiro novamente e deixo o meu olhar percorrer o chalé, agora limpo, preparado para o novo hóspede e me pergunto que tipo de pessoa será ele. Mamãe anda muito misteriosa.
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